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terça-feira, 24 de novembro de 2020

Lágrimas Amargas

Clássico do cinema, produzido na década de 1950 e estrelado pela atriz Bette Davis. A história é bem interessante. Um drama com toques autobiográficos, o filme "Lágrimas Amargas" narra a vida de Margie (Bette Davis), uma atriz que foi estrela no passado, mas que agora enfrenta muitos problemas em sua vida pessoal e profissional. Os estúdios já não mais a procuram para participar do elenco de seus filmes. Ela se torna uma profissional do passado que ninguém mais quer contratar. Os trabalhos que aparecem são indignos e sem dinheiro ela acaba indo morar em um pequeno apartamento muito simples, nada adequado com sua vida de luxo do passado. Para piorar, Margie procura afogar suas decepções com a bebida e acaba indo presa. Sua filha Gretchen (Wood) também não tem como lhe ajudar pois é uma jovem que já tem seus próprios problemas pessoais. De volta à liberdade, Margie decide que é hora de mudar sua vida de uma vez por todas.

Bette Davis foi uma das grandes personalidades da história do cinema americano. Ela ousou romper com o chamado Star System e procurou construir uma carreira independente e corajosa. Por ser uma mulher de atitude, enfrentou vários problemas, inclusive a falta de convites para fazer mais filmes, talvez por essa razão esse "Lágrimas Amargas" seja tão essencial para os cinéfilos entenderem quem realmente foi Bette Davis. Ela própria passaria por situações semelhantes em sua vida profissional. Vencedora do Oscar, não se importou em publicar nos classificados de um jornal de Los Angeles um anúncio em busca de trabalho. O Oscar que ela venceu inclusive é usado numa das cenas desse filme.

Não conheço nenhum outro filme da filmografia de Davis que seja tão simbólico como esse. É praticamente uma biografia da mulher corajosa e valente que ela foi em vida. Já para os que são fãs da eterna Natalie Wood, a produção tem um brinde a mais, sua participação no elenco como a filha de Bette Davis. Segundo consta, ela teria sofrido um pequeno acidente nas filmagens que quase lhe causou seu afogamento. Isso criou um trauma que lhe seguiu pelo resto da vida. Tragicamente ela morreria afogada décadas depois após um acidente até hoje mal explicado em um barco, durante suas férias ao lado do marido Robert Wagner. Fica então nossa dica de filme clássico do dia, o edificante "Lágrimas Amargas". Não deixe de assistir.

Lágrimas Amargas (The Star, Estados Unidos, 1952) Estúdio: 20th Century Fox / Direção: Stuart Heisler / Roteiro: Dale Eunson, Katherine Albert / Elenco: Bette Davis, Sterling Hayden, Natalie Wood, Warner Anderson / Sinopse: Margaret Elliot (Davis) é uma atriz que no passado foi uma estrela em Hollywood. Agora, mais velha e com problemas envolvendo alcoolismo, ela amarga um injusto ostracismo em sua vida. Filme indicado ao Oscar na categoria de melhor atriz (Bette Davis).

Pablo Aluísio.

segunda-feira, 23 de novembro de 2020

Marinheiro do Rei

Clássico dos filmes de guerra, esse "Marinheiro do Rei" segue sendo uma boa obra cinematográfica. A história se passa em um cenário onde grandes batalhas navais foram travadas. Três navios de guerra da marinha real inglesa se encontram no Atlântico Norte, protegendo embarcações de carga durante a Segunda Guerra Mundial, quando o comandante da esquadra é informado que na região se encontra um importante cruzador alemão. Para destruí-lo ele envia então dois encouraçados de sua frota. O combate travado se revela mais complicado do que se esperava. Mesmo avariado durante a batalha nos mares, o navio alemão consegue destruir um dos navios ingleses. Um dos sobreviventes acaba sendo resgatado pelos alemães, o especialista em comunicações Andrew 'Canada' Brown (Jeffrey Hunter), que agora fará de tudo para sabotar os planos da marinha nazista.

Como se pode perceber temos aqui uma produção que homenageia a bravura e a coragem dos marinheiros ingleses durante a Segunda Guerra Mundial. Esses são representados por um homem em especial, Andrew Brown (Jeffrey Hunter), que começa uma série de sabotagens contra um cruzador alemão. Esse navio de guerra sofreu uma grave explosão de um torpedo em seu casco e por essa razão precisa se esconder nas famosas ilhas Galápagos, aquelas mesmas em que Darwin realizou suas pesquisas que anos depois daria origem ao seu famoso livro "A Origem das Espécies" de 1851. Assim a parada naquela região se torna estratégica para que o navio possa passar por reparos. O filme "Marinheiro do Rei" aposta na aventura e em boas cenas de batalha naval. A marinha inglesa contribuiu ativamente com o filme, disponibilizando três navios de guerra de sua esquadra para a produção, sendo que um deles assumiu o papel do navio alemão, o Essen, uma alegoria na verdade com o famoso "Bismarck" que foi afundado pelos ingleses no mesmo conflito. O personagem interpretado pelo bom ator Jeffrey Hunter acaba virando uma espécie de "exército de um homem só" o que traz muita ação e movimentação para o filme.

O curioso é que o enredo começa quase como um romance, quando o oficial britânico interpretado por Michael Rennie (o mesmo ator de "O Dia Em Que a Terra Parou") conhece e se enamora por uma linda garota em uma viagem de trem. Eles se apaixonam e tencionam se casar mas o estouro da guerra o faz se afastar dela, nunca mais a encontrando novamente. Ele depois exerceria a função de comandante da frota de navios britânicos que entraria em batalha com o navio alemão. Essa é na verdade a linha narrativa principal do roteiro. Essa parte inicial poderia ser cortada sem nenhum problema, mas os roteiristas certamente a usaram para trazer alguma profundidade psicológica aos personagens. De qualquer maneira, o que vale mesmo são as cenas de guerra - todas muito bem realizadas. Deixo assim a recomendação dessa boa produção que procura resgatar o valor dos marinheiros ingleses durante a maior guerra que o mundo já viu.

Marinheiro do Rei (Single-Handed / Sailor of The King, Estados Unidos, Inglaterra, 1953) Estúdio: Twentieth Century-Fox / Direção: Roy Boulting / Roteiro: Valentine Davies, baseado no livro de C.S. Forester / Elenco: Jeffrey Hunter, Michael Rennie, Wendy Hiller / Sinopse: Durante a segunda grande guerra mundial, um marinheiro inglês se torna peça crucial na destruição de um importante navio de guerra da frota alemã que se encontra com problemas em distantes ilhas do oceano Atlêntico.  

Pablo Aluísio.

domingo, 22 de novembro de 2020

Narciso Negro

Esse filme é um grande clássico da história do cinema. A história é das mais interessantes. Uma ordem de freiras católicas envia um grupo de cinco irmãs para uma região remota, nas proximidades do Himalaia, com a missão de construir uma escola para crianças e um hospital para a população local. Numa altitude de mais de 2.800 metros acima do mar, elas tentarão estabelecer as bases de evangelização de um povo que ainda não conhece o cristianismo. As freiras são jovens e chegam numa antiga casa abandonada onde lá viviam as esposas do rei em um passado distante. É justamente nesse local que fundam um novo convento de assistência e educação para a população da região. "Narciso Negro" é um filme magnífico. Mostra bem um dos aspectos mais louváveis da igreja católica que é a evangelização em lugares remotos, situados numa verdadeira fronteira da fé cristã. Nessas regiões só existem escolas e hospitais por causa da força missionária da Igreja. No caso aqui temos cinco freiras da ordem das irmãs de Maria que vão até esse distante local para ajudar no que for possível a população local. Em termos religiosos há um templo budista também localizado nas encostas montanhosas, além de um enigmático "homem santo" que passa seus dias contemplando o horizonte em meditação. Apesar de sua profundidade espiritual nada fazem em prol do povo local. Apenas as freiras católicas se esforçam para educar e trazer assistência médica para aquelas populações. O filme mostra bem como foi complicado tentar evangelizar uma cultura tão diferente da ocidental como aquela. Nesse aspecto conseguimos entender muito bem como a Igreja Católica atuou como ponta de lança em países distantes, bem longe do mundo civilizado ocidental.

A produção é excelente, com fotografia belíssima, afinal a região do Himalaia é naturalmente linda, com suas altas montanhas com picos de neve eterna. O roteiro é extremamente bem escrito, com todas as personagens muito bem desenvolvidas. O destaque obviamente vai para Deborah Kerr que interpreta a irmã Clodagh. Apesar de jovem ela é designada como chefe da missão de evangelização, o que representará um grande desafio em sua vida religiosa. Outro destaque vai para David Farrar que interpreta um agente inglês que preserva os interesses do império britânico no local. Como único ocidental na região, ele se torna um amigo e um apoio para as freiras católicas. Essa aproximação inclusive acaba criando uma tensão sexual entre ele e as religiosas, fazendo com que o roteiro discuta ainda que sutilmente a questão do celibato dentro da Igreja católica.

"Narciso Negro" é considerado um dos melhores dramas da década de 1940, fruto é claro de seu ótimo roteiro, das atuações de excelente nível e da marcante produção. O filme até hoje chama a atenção por ter todos os elementos em perfeita harmonia. Um bom exemplo disso encontramos no clímax quando umas das freiras, esgotada pela austeridade e trabalho duro a que é submetida, tem um surto de loucura. A cena que se desenvolve ao pé do precipício, no badalar dos sinos, me fez recordar inclusive do mestre Hitchcock, por causa do ótimo clima de suspense e tensão que se desenrola nesse momento. Um primor cinematográfico. Em suma, eis aqui mais uma obra-prima que não pode faltar na coleção de nenhum cinéfilo que se preze. "Narciso Negro" é um filme que realmente merece o título de clássico da sétima arte.

Narciso Negro (Black Narcissus, Estados Unidos, Inglaterra, 1947) Estúdio: Universal Pictures / Direção: Michael Powell, Emeric Pressburger / Roteiro: Rumer Godden, Michael Powell / Elenco: Deborah Kerr, David Farrar, Flora Robson / Sinopse: Um grupo de freiras é enviada pela Igreja Católica para aturar numa ordem religiosa instalada no Himalaia, região distante, onde a população local sequer conhecer o cristianismo. Filme vencedor do Oscar nas categorias de melhor direção de fotografia (Jack Cardiff) e melhor direção de arte (Alfred Junge). Filme premiado pelo Globo de Ouro na categoria de  melhor direção de fotografia (Jack Cardiff).

Pablo Aluísio.

Farsa Trágica

Todo cinéfilo que se preze, sabe que Vincent Price foi um dos maiores nomes dos filmes de terror na era clássica do cinema americano. Alto, elegante, geralmente emprestava sua peculiar imagem para fitas que marcaram época. Na vida pessoal era um homem muito culto, amante das artes e de fino humor. Seu bom humor inclusive pode ser conferido aqui em "Farsa Trágica" onde Vincent não se furta de rir de si mesmo. Afinal de contas saber lidar com sua imagem cinematográfica a ponto de rir dela, sem traumas ou desculpas, é o que diferencia os grande mitos dos meros narcisistas da tela. Nessa produção Vincent Price interpreta Waldo Trumbull, um agente funerário bem picareta. Ele finge enterrar as pessoas em elegantes caixões vendidos a preço de ouro para logo depois jogar os pobres falecidos na terra nua, com o objetivo de vender o mesmo caixão várias vezes para outros clientes, por anos a fio. Ele é ajudado por seu subalterno, Felix Gillie (Peter Lorre), um pobre diabo, que aguenta todas as humilhações possíveis simplesmente porque nutre uma paixão pela mulher de seu patrão. Beberrão, sem papas na língua, o personagem de Price é assumidamente um pilantra que não pensa duas vezes ao passar a perna em seus clientes.

As coisas porém andam de mal a pior. Ele tem cada vez menos enterros e sua funerária corre o risco até de ser despejada por não pagar o aluguel há um ano! Pressionado pelo proprietário do imóvel (em magistral interpretação de Basil Rathbone, o eterno interprete de Sherlock Holmes), não resta outro alternativa ao personagem de Price a não ser procurar por soluções mais radicais. Já que seu ramo é o da morte e as pessoas estão vivendo muito mais do que o esperado, ele decide então dar uma ajudinha aos velhinhos da cidade! Em situações de puro humor negro, o agente funerário começa a ele mesmo matar seus futuros "clientes". Como se pode perceber "Farsa Trágica" é uma comédia de terror das mais espirituosas e engraçadas. Vincent Price está cercado por um elenco magistral, onde vários grandes mitos dos filmes de terror da era de ouro de Hollywood estão reunidos. O grande Boris Karloff, por exemplo, está hilário como o sogro muito velho de Price. O veneno aqui é usado em cenas bem divertidas. Com esse papel ele mostra que tinha um especial talento para comédias. Sem dúvida é um dos mais divertidos filmes do gênero. Ah, e antes que me esqueça, vale a citação também do gatinho Rhubarb que consegue roubar várias cenas com sua "atuação". Enfim, não deixe de assistir a essa deliciosa e divertida comédia de humor negro no mais puro estilo britânico.

Farsa Trágica (The Comedy of Terrors, Estados Unidos, 1963) Direção: Jacques Tourneur / Roteiro: Richard Matheson / Elenco: Vincent Price, Peter Lorre, Boris Karloff, Basil Rathbone / Sinopse: Agente funerário (Price) quase falido resolve dar cabo dos velhinhos da cidade para conseguir mais "clientes" para seus serviços. O plano porém dá errado quando um deles volta da tumba para acertar suas contas com ele.

Pablo Aluísio.

sábado, 21 de novembro de 2020

Marnie - Confissões de uma Ladra

Marnie Edgar (Tippi Hedren) é uma ladra, uma mentirosa e uma vigarista. Ela sempre aplica o mesmo golpe. Arranja emprego como secretária em escritórios de renome. Após algumas semanas trabalhando, sendo ótima funcionária, ela começa a estudar a rotina do escritório. O mais importante é descobrir onde fica a senha para abrir o cofre, onde estão os dólares. Uma vez que consegue o que deseja, o furto é realizado, geralmente na calada da noite. Ela tem uma mãe doente que mora em Baltimore. Parte do dinheiro que rouba é usado para ajudá-la. Só que após tantos golpes Marnie é finalmente descoberta por Mark Rutland (Sean Connery). O mais estranho é que ele não a entrega para a polícia. Ao contrário, se apaixona por ela. E se torna seu marido em um casamento estranho, obsessivo, à beira da insanidade. Marnie se casa com receios de ir para a prisão, mas logo seus diversos problemas psicológicos começam a surgir. Ela tem pavor da cor vermelha, tem pesadelos recorrentes e não consegue conter seus impulsos para o crime. Mal o marido dá as costas ela já começa a planejar como roubar o cofre dele. Também se revela, mais uma vez, mentirosa e manipuladora. Casar com uma mulher como essa se revela acima de tudo ser algo bem perigoso.

"Marnie" é considerado um filme menor do grande mestre Alfred Hitchcock. Discordo bastante dessa opinião. Conforme o filme avança o roteiro vai explicando melhor o que acontece na mente de Marnie, seus traumas de infância, as violências que sofreu e porque odeia homens em geral. Ela sofre de um caso grave de frigidez sexual, o que torna intolerável o mero toque de um homem em seu corpo. E ela não baixa a guarda nem para seu próprio marido, uma pessoa que em última análise também é um chantagista emocional. Como todos sabemos o grande Sean Connery faleceu no último 31 de outubro, aos 90 anos. E foi justamente esse o gatilho que me levou a rever esse clássico do mestre Hitchcock. Na época em que atuou nesse filme Connery ainda era James Bond. Ele procurava por novos caminhos, para não ficar marcado com um só personagem. Claro, ele alcançou seus objetivos e está excelente nesse papel. Um sujeito elegante que tenta ajudar a mulher que ama. No começo ficamos com um pé atrás sobre essa sua paixão. Afinal Marnie se revela uma mulher criminosa e perigosa, mas ele passa por cima de tudo por esse sentimento de amor. Em suma, um filme de Hitchcock que merece ser melhor avaliado nos dias atuais. Suas nuances psicológicas, o desenvolvimento dos personagens, é algo que impressiona. O mestre do suspense realmente não brincava dem serviço.

Marnie, Confissões de uma Ladra (Marnie, Estados Unidos, 1964) Direção: Alfred Hitchcock / Roteiro:  Jay Presson Allen, baseado no romance escrito por Winston Graham / Elenco: Tippi Hedren, Sean Connery, Martin Gabel, Diane Baker, Louise Latham / Sinopse: Marnie Edgar (Tippi Hedren) é uma ladra que vive de pequenos e grandes golpes. Descoberta por Mark Rutland (Sean Connery), ela passa a ser ajudada por esse que acaba se tornando seu marido. Filme indicado pelo Cahiers du Cinéma como melhor filme do ano.

Pablo Aluísio. 

Sahara

Temos aqui um clássico dos filmes de guerra, estrelado pelo astro da época em Hollywood, o ator Humphrey Bogart. A história do filme se passa durante a II Grande Guerra Mundial. Um tanque das forças armadas americanas sob o comando do Sargento Joe Gunn (Humphrey Bogart) acaba perdido no meio das areias do deserto do norte da África. Cercados por tropas alemãs por todos os lados, Gunn e seus homens tentam desesperadamente encontrar algum poço com água na região pois suas reservas estão quase no final. No caminho acabam fazendo dois prisioneiros, um soldado italiano e um oficial alemão, que se recusam a colaborar com seus inimigos americanos. A despeito de ter sido feito durante o esforço de guerra dos Estados Unidos, ainda no meio dos acontecimentos, em plena II Guerra Mundial, e ter como principal objetivo levantar a moral das tropas aliadas, "Sahara" é um belo retrato dos militares que lutaram nas areias escaldantes do deserto africano. O sargento interpretado por Bogart é um exemplo disso. Eles encontram um soldado italiano no meio do deserto. Como havia escassez de água e comida, levar o inimigo não seria uma boa ideia. Deixá-lo no Sahara também não, pois o condenaria à morte certa. Por uma questão de humanidade decide então salvar a vida do soldado, mesmo sendo seu inimigo. É o bom mocismo das tropas americanas colocada em primeiro plano no roteiro, uma forma de deixar claro que aqueles homens estavam lutando pelos verdadeiros ideais, pelo lado certo do conflito.

Outro aspecto interessante em "Sahara" é a linha dramática que o filme explora. Após procurar por um poço de água no meio daquele inferno de areias sem fim, os soldados americanos descobrem um que está praticamente vazio, apenas no fundo encontram uma gruta que pinga algumas gotas de água para finalmente matarem sua sede. O local assim passa a ser disputado de forma violenta por americanos e alemães que também sofrem com o clima hostil da região. O personagem de Bogart mesmo sabendo que há pouca água no poço, resolve transformar o local numa moeda de troca com as tropas de soldados alemães que estão em maior número, mas sedentos de sede. O que se desenrola a partir daí é umas melhores coisas do filme, pois os americanos, como se estivessem num jogo de poker, começam a blefar com os oficiais alemães, prometendo água (que na realidade não possuem em abundância) em troca da rendição das tropas do III Reich. Um brilhante jogo de tensão psicológica então se impõe entre os inimigos, revelando um roteiro muito bem escrito, acima da média, para um filme da época. Assim deixo a dica para quem gosta de filmes sobre a II Guerra Mundial. "Sahara" mostra que acima das ideologias e das doutrinas políticas, existe apenas a luta pela sobrevivência do homem contra as forças da natureza ao qual ele não tem o menor controle.

Sahara - Em Busca da Sobrevivência (Sahara, Estados Unidos, 1943) Estúdio: Columbia Pictures / Direção: Zoltan Korda / Roteiro: John Howard Lawson, Zoltan Korda / Elenco: Humphrey Bogart, Bruce Bennett, J. Carrol Naish / Sinopse: Um tanque do exército americano se perde nas areias do deserto do norte da África, durante a II Guerra Mundial. Eles fazem prisioneiros entre os inimigos e procuram por água de forma desesperada, pois estão sem ela para conseguir sobreviver naquele inferno quente e seco. Filme indicado ao Oscar nas categorias de melhor ator coadjuvante (J. Carrol Naish), melhor direção de fotogtafia (Rudolph Maté) e melhor som (John P. Livadary).  

Pablo Aluísio.

sexta-feira, 20 de novembro de 2020

Paris Está em Chamas?

Clássico dos filmes de guerra. A frase "Paris Está em Chamas?" é atribuída ao ditador nazista Adolf Hitler. Ele havia ordenado aos generais alemães em Paris para que queimassem toda a cidade, não deixassem nenhum monumento em pé, que a destruição fosse total. Isso aconteceu no período final da guerra, quando a Alemanha nazista já estava sendo derrotada em praticamente todos os campos de batalha da Europa. Como vingança Hitler queria a destruição completa da capital francesa. Um ato final de loucura de um dos mais infames ditadores da história moderna. O roteiro porém faz um amplo painel do que aconteceu antes que Hitler desse essa ordem insana. Quando o filme começa, vemos os bastidores da dominação nazista em Paris. Descontente com os rumos da administração alemã na cidade de Paris, naquele momento ocupada pelos nazistas, o ditador Adolf Hitler resolve mudar o comandante da capital da França. Envia para lá um general linha dura com expressas ordens de destruir a cidade antes dela ser invadida por forças aliadas. Vendo a aproximação de tropas americanas na região, os moradores de Paris então intensificam os ataques contra os soldados alemães na cidade. A resistência francesa ganha cada vez mais apoio da população em geral, todos esperando ansiosamente pela tão sonhada libertação de Paris.

Essa é uma produção francesa, com elenco cheio de estrelas francesas e americanas, que procura narrar os eventos que antecederam a libertação da cidade de Paris pelas tropas aliadas. Hitler queria que a cidade fosse incendiada antes que os americanos tomassem posse dela, um ato absurdo e lunático que levaria a perder centenas de anos de história, arte, cultura e arquitetura. O ditador alemão não queria ver nada de pé caso os alemães perdessem o controle da principal cidade francesa. O título do filme, "Paris Está em Chamas?", reflete bem isso, pois essa foi uma pergunta feita por telefone por um alto oficial alemão ao comandante do eixo na capital após os americanos entrarem na cidade, triunfantes.

É um filme bastante longo, com quase quatro horas de duração, que procura mostrar todos os personagens envolvidos na invasão de Paris. Isso talvez canse alguns espectadores pois o roteiro, apesar de obviamente ter uma linha narrativa principal, procura contar muitas histórias paralelas ao mesmo tempo. Isso porém não atrapalha o resultado final. Os atores americanos do elenco surgem em pequenas participações interpretando generais e oficiais das forças aliadas que foram decisivos na expulsão dos alemães da cidade. Em termos de produção, nada a criticar. Filmado nas próprias ruas de Paris, com uso inclusive de cenas reais captadas no calor da luta, o filme é realmente um ótimo retrato daquele momento decisivo na história da França e da Segunda Guerra Mundial. Um excelente programa para quem estiver em busca de conhecimento sobre aqueles eventos históricos tão importantes.

Paris Está em Chamas? (Paris brûle-t-il?, França, 1966) Estúdio: Marianne Productions, Transcontinental Films / Direção: René Clément / Roteiro: Larry Collins, Dominique Lapierre / Elenco: Jean-Paul Belmondo, Alain Delon, Kirk Douglas, Glenn Ford, Charles Boyer, Leslie Caron / Sinopse: Filme histórico, mostrando os momentos que antecederam a invasão dos aliados (Estados Unidos, Inglaterra e demais países ocidentais) em Paris. A cidade estava completamente dominada pelos nazistas e demais forças do Eixo. A queda de Paris iria se tornar um dos eventos mais simbólicos da derrota da Alemanha na Segunda Guerra Mundial. Filme indicado ao Oscar nas categorias de melhor direção de fotografia (Marcel Grignon) e melhor direção de arte (Willy Holt, Marc Frédérix). Filme indicado ao Globo de Ouro na categoria de melhor trilha sonora incidental (Maurice Jarre).

Pablo Aluísio.

Corvetas em Ação

Título no Brasil: Corvetas em Ação
Título Original: Corvette K-225
Ano de Produção: 1943
País: Estados Unidos
Estúdio: Universal Pictures
Direção: Richard Rosson, Howard Hawks
Roteiro: John Rhodes Sturdy
Elenco: Randolph Scott, James Brown, Ella Raines, Barry Fitzgerald, Andy Devine, Fuzzy Knight

Sinopse:
O comandante 'Mac' MacClain (Randolph Scott) perde uma de suas embarcações após o ataque de um submarino alemão. Muitos de seus homens são mortos mas ele sobrevive. De volta à terra ele aguarda o comando de seus superiores para assumir outro navio de guerra. Nesse meio tempo acaba conhecendo a bela Joyce Cartwright (Ella Raines), irmã de um de seus oficiais mortos em batalha. Seu breve romance porém logo tem que ser interrompido pois o oficial é designado para assumir o comando de um nova corveta, a Donnacona. Ao conhecer sua nova tripulação acaba tendo uma surpresa e tanto pois outro irmão de Joyce se encontra novamente em sua equipe, um jovem rapaz recém saído da academia militar!

Comentários:
Durante a Segunda Grande Guerra vários filmes foram feitos visando ajudar no esforço de guerra. Essas produções tinham duas características básicas: um tom bem patriótico, visando aumentar o moral das tropas americanas no exterior e roteiros mais simples que tinham como objetivo valorizar o militar que estivesse lutando no front da guerra. Os filmes inclusive eram passados para as tropas para elevar seu senso de honra e patriotismo. "Corvetas em Ação" segue por essa linha. Ele foi realizado em plena guerra, com a ajuda das forças armadas americanas, no caso aqui da Marinha. O ator Randolph Scott, especializado em faroestes, deixou o coldre e a espora de lado para vestir um elegante uniforme de gala da forças navais. Seu personagem, o comandante MacClain, é o símbolo máximo da honradez do marinheiro dos Estados Unidos. Íntegro, honesto e confiável, ele passava a mensagem subliminar para os soldados de que seus oficiais estavam acima do bem e do mal. Homens a quem se deveria obedecer sem medo ou receio. Esse bom filme de guerra foi dirigido pelo talentoso cineasta Howard Hawks, sempre valorizando eletrizantes cenas de combate ao lado de doces momentos de galanteio de Scott para com a bonita Ella Raines. Sua fórmula como sempre era muito bem executada e funcionava muito bem, como vemos aqui. Em suma, um bom entretenimento até hoje, mesmo sendo bem ufanista e idealizada.

Pablo Aluísio.

quinta-feira, 19 de novembro de 2020

Al Capone

Filme clássico que conta a história de Al Capone, o mais famoso criminoso da grande era dos gangsters. Seu "reinado" se deu justamente durante os tempos da lei seca. E o roteiro é muito interessante. Na trama encontramos as origens de sua subida ao topo do mundo do crime. Após passar vários anos como capanga do mafioso Johnny Torrio, o gangster Al Capone (Rod Steiger) decide assumir ele próprio os rumos de seu "negócio". Forma um grupo de criminosos leais a ele e começa uma série de mortes, eliminando todos aqueles que não aceitam sua liderança. Depois começa a corromper políticos e autoridades policiais, para que garantam passe livre para suas atividades ilegais. Com a lei seca, consegue fazer fortuna ao comercializar bebidas aos principais bares clandestinos de Chicago. Investindo também em prostituição e jogos, Capone logo se torna um homem rico e poderoso. Tudo parecia caminhar muito bem para ele até o massacre de St. Valentine's Day que acaba chocando a população da cidade pela brutalidade e violência envolvidas na chacina. A partir daí sua queda se torna inevitável.

Esse clássico do cinema é mais uma produção que foca suas lentes para a vida do mais famoso gangster de todos os tempos, Alphonse Gabriel "Al" Capone (1899 - 1947). O roteiro tem uma interessante visão sobre o criminoso, mostrando seus dias de glória ao mesmo tempo que o mostra senil e corroído pelas sífilis em seus últimos anos. Rod Steiger brilha na composição de seu personagem. Ele não era apenas parecido fisicamente com Capone, mas também adotou todos os trejeitos do famoso bandido. Como era um grande ator leva o filme todo praticamente nas costas já que a produtora Allied Artists Pictures não tinha recursos para bancar uma grande produção.

A parte mais interessante vem da subida de Capone dentro da hierarquia da máfia de Chicago. Sujeito de origem humilde, com pouco estudo, rude e violento, ele se mostra muito astuto ao entender a verdadeira natureza humana a ser corrompida. Assim em sua escalada, Capone dava duas opções aos que cruzavam seu caminho: ou se corrompiam junto a ele através de subornos e corrupções ou então viravam alvos de sua quadrilha. Embora não seja historicamente tão preciso, o roteiro mostra algo bem vital na subida de Capone ao poder, o uso de políticos corruptos em prol de seus interesses. O criminoso inclusive elegeu em seu auge vários prefeitos de Chicago que depois que chegavam ao cargo tinham que garantir caminho livre para as atividades de seu bando. Assim fica a recomendação desse muito bom filme. "Al Capone" mostra muito bem a subida de um criminoso a uma posição jamais imaginada por um sujeito como ele antes. Talvez por isso seja lembrado até hoje.

Al Capone (Al Capone,  Estados Unidos, 1959) Estúdio: Allied Artists Pictures / Direção: Richard Wilson / Roteiro: Malvin Wald, Henry F. Greenberg / Elenco: Rod Steiger, Martin Balsam, Fay Spain / Sinopse: O filme conta a biografia do famoso criminoso Al Capone. Após subir dentro da hierarquia do mundo do crime ele começa um amplo jogo de poder e dominação, corrompendo políticos e policiais da cidade de Chicago.

Pablo Aluísio.

quarta-feira, 18 de novembro de 2020

A Ponte de Waterloo

Clássico do cinema com a inesquecível atriz Vivien Leigh. A história se passa durante a segunda guerra mundial quando um oficial inglês, interpretado pelo ator Robert Taylor, relembra quando era apenas um jovem soldado durante a Primeira Guerra Mundial. Naquela época conhecera uma jovem garota, que sonhava um dia se tornar uma grande bailarina. Seus sonhos porém acabam com a explosão da guerra que varreria toda a Europa. Ela se chamava Myra (Vivien Leigh). Tentando sobreviver nas ruas de Londres, abalada pela morte de seu grande amor nos campos de batalha e precisando sobreviver de todas as formas, ela acaba tendo que abrir mão de tudo, inclusive de sua dignidade pessoal. Poucos sabem, mas a estrela Vivien Leigh (1913 - 1967) participou de poucos filmes ao longo de sua carreira. Foram apenas 20 produções entre 1935 e 1965. A atriz inglesa não se dava muito bem com o sistema industrial de fazer cinema em Hollywood e por causa de sua saúde ficava longos anos sem realizar nenhum filme. Também era extremamente seletiva na escolha dos roteiros de que iria participar. Depois de "E O Vento Levou" de 1939 choveram ofertas dos principais estúdios de Hollywood, mas Leigh sabiamente rejeitou a grande maioria deles.

Esse "A Ponte de Waterloo" foi lançado logo após "Três Semanas de Loucura" que sucedeu a "E O Vento Levou". Ao contrário do anterior, que apostava em um texto mais leve e até bem humorado, "Waterloo Bridge" era um dramalhão daqueles bem trágicos, com história bem pesada, mostrando os dramas de uma jovem garota (Leigh), cheia de sonhos e planos a realizar na vida, mas que tinha de desistir de todos eles para lutar pela sobrevivência. O cenário não poderia ser pior, a Europa durante a sangrenta Primeira Guerra Mundial. As cidades destruídas, com a população civil passando por necessidades básicas.

A fome, por exemplo, se tornara uma companheira constante. Vivien Leigh se entrega completamente ao personagem, dando o melhor de si, como sempre aliás. Talvez seu maior problema tenha sido o fato de dividir o filme com Robert Taylor que era apenas um galã sem muito talento dramático. O desnível deles se torna muito evidente ao longo do filme, com Leigh empenhada e muito talentosa e Taylor cheio de poses e olhares canastrões (chega a ser risível sua canastrice em cena!). Talvez por isso o filme não tenha tido a repercussão merecida. De qualquer maneira vale apenas pelo talento da eterna Vivien Leigh, um dos maiores talentos da história do cinema americano em sua fase mais clássica.

A Ponte de Waterloo (Waterloo Bridge, Estados Unidos, 1940) Estúdio: Metro-Goldwyn-Mayer (MGM) / Direção: Mervyn LeRoy / Roteiro: S.N. Behrman, Hans Rameau / Elenco: Vivien Leigh, Robert Taylor, Lucile Watson / Sinopse: Durante a Guerra Mundial, um casal tenta concretizar seu amor em mundo destruído pelo maior conflito armada de toda a história. Filme indicado ao Oscar nas categorias de melhor direção de fotografia (Joseph Ruttenberg) e melhor música (Herbert Stothart).

Pablo Aluísio.

terça-feira, 17 de novembro de 2020

Lady Hamilton

Depois do grande sucesso de "E O Vento Levou" a atriz Vivien Leigh decidiu deixar Hollywood para trás. Estava cansada dos grandes estúdios, dos produtores, dos executivos americanos. Ela via a atuação de uma outra maneira, como grande arte. Não apenas como algo para se fazer grandes fortunas, em filmes comerciais produzidos em ritmo industrial. Assim ela voltou para sua terra natal, a Inglaterra. Ao lado de Laurence Olivier, seu marido e grande nome do teatro e cinema britânicos, ela começou a procurar por um roteiro realmente artístico para voltar ao cinema. Acabou encontrando em "Lady Hamilton". Esse filme se tornaria a primeira adaptação para o cinema do romance histórico "Fire Over England" escrito por AEW Mason.

A história era bem evocativa de um passado glorioso do império britânico. Sir William Hamilton (Alan Mowbray), um viúvo de meia idade, se torna o embaixador britânico na corte de Nápoles. Emma (Vivien Leigh) é uma jovem inglesa que em visita a sua mãe acaba conhecendo Lord Hamilton. Não demora muito e eles começam um romance. A paixão é compartilhada e em poucos meses eles decidem se casar. Apesar da diferença de idade, o casamento vai bem até Emma, agora Lady Hamilton, conhecer o jovem e destemido Lord Nelson (Laurence Olivier), um militar condecorado, considerado um verdadeiro herói para os britânicos. Apesar da rígida moralidade da sociedade inglesa de sua época, Emma não consegue se controlar e acaba tendo um ardente romance com Nelson, gerando um escândalo na sociedade Londrina.

Essa produção, cujo enredo foi baseado em fatos históricos reais, tem muita classe e sofisticação. Fica claro, desde os primeiros momentos, que os britânicos queriam mostrar aos americanos toda a superioridade de seu nível cultural, sempre mais refinado e elevado. O filme apresenta uma produção pomposa, com figurinos luxuosos e cenários ricamente decorados. Laurence Olivier surge com um tapa-olho na maioria das cenas e Vivien Leigh desfila uma infinidade de vestidos elegantes a cada momento. Aliás o figurino do filme, considerado deslumbrante na época, foi um dos destaques. As roupas foram todas assinadas pela figurinista inglesa Marjorie Best.

A direção de fotografia de Rudolph Maté também foi um dos destaques do filme, sendo indicada pela academia ao Oscar, Um filme bonito de se ver, com direção de arte caprichada, foi considerada naquele ano como uma das produções mais bem realizadas em sua reconstituição de época. Os produtores esperavam por uma indicação de Vivien Leigh ao Oscar, mas ela não veio. Na época se dizia que a comunidade do cinema em Holywood havia ficado ofendida pelo fato de que a atriz inglesa havia voltado para Inglaterra, dando as costas para o cinema americano. Havia uma dose de rancor em sua "não indicação". Apesar de tudo isso, o filme ainda hoje é considerado um dos melhores momentos da carreira de Vivien Leigh. Um filme histórico que tem drama, romance e até mesmo uma pitada de tragédia para emocionar os mais sentimentais.

Lady Hamilton, a Divina Dama (That Hamilton Woman, Inglaterra, 1941) Estúdio: Alexander Korda Films, London Film Productions / Direção: Alexander Korda / Roteiro: Walter Reisch, R.C. Sherriff / Elenco: Vivien Leigh, Laurence Olivier, Alan Mowbray / Sinopse: O filme "Lady Hamilton, a Divina Dama" conta a história real, baseada em fatos históricos, do romance de uma dama da alta sociedade inglesa com um famoso almirante da marinha de seu país. A paixão entre ambos causou grande escândalo, porque ela era uma mulher casada. Filme indicado ao Oscar nas categorias de melhor direção de arte (Vincent Korda e Julia Heron). melhores efeitos especiais (Lawrence W. Butler, William A. Wilmarth) e melhor direção de fotografia (Rudolph Maté). Filme vencedor do Oscar na categoria de melhor som (Jack Whitney).

Pablo Aluísio.

segunda-feira, 16 de novembro de 2020

O Indomado

Clássico do cinema estrelado pelo ator Paul Newman, aqui em grande forma, em uma de suas melhores atuações na década de 1960. Sob direção de Martin Ritt, que tinha o talento de deixar o ator bem à vontade durante as filmagens, além de ser seu amigo pessoal, o resultado do ponto de vista cinematográfico não poderia ser melhor. O protagonista, o personagem principal do filme, se chama Hud Bannon. Interpretado de forma brilhante por Paul Newman, ele é o filho rebelde de um respeitável fazendeiro, que vive permanentemente em conflito com seu idoso pai. O conservadorismo do velho se choca o tempo todo com o modo de agir do filho, que parece querer mesmo abalar todas as estruturas do patriarca ao velho estilo. Quando o filme chegou aos cinemas houve muitas comparações entre esse personagem de Paul Newman e os rebeldes do passado que tinham sido interpretados por Marlon Brando e James Dean. 

Porém as semelhanças são apenas aparentes. James Dean interpretava jovens perdidos, com problemas psicológicos. Marlon Brando interpretava rebeldes mais perigosos, como em "O Selvagem", mas que ainda mantinham uma certa bondade embaixo de suas roupas de couro. Já o rebelde de Paul Newman nesse filme é acima de tudo um sujeito bem egoísta, rude e que não serve para nada além de infernizar a vida do pai. Ao lado de uma elenco de apoio ótimo, Paul Newman criou um dos personagens mais sem ética pessoal de sua carreira.

O roteiro desse filme também surpreende por trazer para as telas um oeste bem diferente dos filmes clássicos de western. Aqui não há mais aquele clima bravio, de grandes homens do passado. O personagem de Paul Newman vive em uma fazenda, mas não está nem aí para cavalos e tradição. Ao invés disso ele aterroriza a vizinhança em um Cadillac novinho em folha. E como mais importante, explora o choque de gerações que acontecia naquele período histórico, onde os mais jovens não estavam mais preocupados com os valores dos mais velhos. O que era importante no passado, passou a ser visto como algo careta, praticamente uma piada, pelos mais jovens. A mudança de gerações realmente nunca foi algo fácil e na década de 1960 as diferenças eram ainda mais reforçadas.

O Indomado (Hud, Estados Unidos, 1963) Estúdio: Paramount Pictures / Direção: Martin Ritt / Roteiro: Irvine Ravetch, Harriet Frank / Elenco: Paul Newman, Melvyn Douglas, Patricia Neal, Brandon de Wilde / Sinopse: Em uma fazenda no interior dos Estados Unidos, pai e filho vivem em pé de guerra. O jovem é rebelde e não está nem aí para os valores de seu velho pai. Filme indicado ao Oscar nas categorias de melhor ator (Paul Newman), e melhor direção (Martin Ritt). Filme vencedor do Oscar nas categorias de melhor atriz (Patricia Neal), melhor ator coadjuvante (Melvyn Douglas) e melhor direção de fotografia em preto-e-branco (James Wong Howe). Filme indicado ao Globo de Ouro na categoria de melhor filme - Drama.

Pablo Aluísio.

A Longa Viagem de Volta

Tem coisa melhor, em termos de cinema, do que um bom filme clássico dirigido pelo mestre John Ford e estrelado pelo ator John Wayne? Não, não tem. Antes de tudo é bom salientar que esse, apesar dos nomes envolvidos, não é um western, um faroeste. Esse tipo de engano seria até bem comum, afinal quando se ouve falar em John Ford e John Wayne trabalhando juntos em um filme, logo se pensa nos clássicos filmes de western em que eles brilharam no céu de Hollywood em seus anos de ouro. Mas não, essa é uma produção diferenciada, até porque eles não queriam também ficar presos em apenas um gênero cinematográfica. A versatilidade também era um objetivo a se alcançar. A história é bem interessante. "The Long Voyage Home" traz o cotidiano do cargueiro Glencairn. Nele convive uma tripulação que entende que todos precisam de todos, onde a camaradagem e a amizade não são apenas uma questão de escolha, mas de necessidade vital se quiserem continuar vivos pelas longas viagens que fazem pelos mares. A união é a força e também uma questão de sobrevivência. E lá que trabalha o velho lobo do mar Olsen (John Wayne), um sujeito durão, mas também justo e íntegro, dono de um enorme coração. Ele é um marinheiro típico, trabalhador, mas igualmente apaixonado pelas coisas boas da vida, como a paixão por uma bela mulher em cada porto que chega.

Uma das surpresas que o cinéfilo vai encontrar nesse filme é seu estilo mesclado, pois se inicialmente o filme se propõe a ter sua carga dramática, também há muitos elementos de aventura, afinal John Ford tinha talento para praticamente todos os gêneros cinematográficos. Também é um filme bonito de se assistir com cenas belíssimas da natureza, captadas com capricho pelas lentes do mestre do cinema. Ele conseguiu trazer para o filme momentos perfeitos para a tela do cinema usando apenas de recursos naturais, como uma tensa neblina, que inclusive, em certos momentos, faz o espectador relembrar dos melhores momentos do cinema noir. O ator John Wayne por essa época (estou me referindo ao começo da década de 1940) estava prestes a se tornar o ator mais popular do mundo. Nesse filme ele está em sua caracterização habitual, a do homem durão, pura honestidade. Ao invés do cowboy cavalgando no deserto, ele aqui dá vida a um marinheiro da velha escola. Ficou muito bem no papel, não podia ser diferente. A novidade veio da complexidade que o roteiro procurou trazer para seu personagem. Por essa razão ele teve que se esforçar um pouco mais, porque suas cenas traziam uma carga dramática mais forte do que seus costumeiros filmes de faroeste.

O bom humor também está presente, como aliás era bem habitual nos filmes de John Ford. Mas não pense que o filme se resume a isso. Há também toda uma atmosfera de melancolia e solidão que permeia a vida dos marinheiros. Esse clima do filme até hoje impressiona a quem o assiste.  Para falar a verdade o espectador se sente bem no meio das longas travessias escuras mar adentro que o filme mostra. Uma aula de cinema do mestre John Ford. Espetacularmente subestimado, o filme é extremamente recomendado aos fãs da sétima arte em geral, em especial para quem procura um filme clássico focado na vida de marinheiros em alto mar.

A Longa Viagem de Volta (The Long Voyage Home, Estados Unidos, 1940) Estúdio: Argosy Pictures, Walter Wanger Productions / Direção: John Ford / Roteiro: Eugene O'Neill, Dudley Nichols / Elenco: John Wayne, Thomas Mitchell, Ian Hunter / Sinopse: O filme "A Longa Viagem de Volta" conta a história de um grupo de marinheiros que trabalham em um velho cargueiro que faz longas viagens pelo mar, em especial da Inglaterra até os Estados Unidos. Entre eles está o velho lobo do mar Olsen (John Wayne) que tanto deseja a fortuna como a sorte no amor.  Filme indicado ao Oscar nas categorias de melhor filme, melhor roteiro (Dudley Nichols), melhor direção de fotografia (Gregg Toland), melhor edição (Sherman Todd), melhores efeitos especiais (R.T. Layton, Ray Binger) e melhor trilha sonora (Richard Hageman).

Pablo Aluísio.

segunda-feira, 26 de outubro de 2020

Radiomania

Bill Lawrence (James Stewart) é um trabalhador comum. Ao lado da esposa e dois filhos, ele leva uma vida bem rotineira e pacata. Todas as manhãs ele acorda e segue para o trabalho numa grande loja de magazine de sua cidade. Sua vida começa a mudar quando recebe o telefonema de uma estação de rádio local. A atendente lhe avisa que à noite, durante um popular programa, ele terá que responder a uma pergunta que vale 24 mil dólares. No começo Bill não leva nada muito à sério e resolve juntar todos os seus amigos para ouvirem o rádio juntos. Tudo acaba virando uma grande festa. Quando a grande hora chega e a pergunta é feita Bill, ele acaba acertando, se tornando o vencedor do cobiçado prêmio. O que ele não contava é que o prêmio vai lhe trazer uma série de dores de cabeça, virando sua vida literalmente de cabeça para baixo. Para começo de conversa os 24 mil dólares não surgem em dinheiro vivo, mas sim em vários produtos que são enviados pelos patrocinadores do programa. De repente sua casa é invadida por uma série de entregadores, que lhe trazem desde pôneis, até uma quantidade enorme de carne de bezerro, dezenas de vasos de plantas, centenas de relógios e tudo o mais que você possa imaginar. Para piorar o fisco americano acaba ficando de olho em sua premiação, o enchendo de cobranças de taxas e impostos dos mais variados tipos! Sua vida acaba assim virando um verdadeiro caos da noite para o dia.

"Radiomania" é muito divertido. Uma comédia hilariante que se encaixa perfeitamente no tipo de personagem que era ideal na pele de James Stewart. O sujeito comum, simples, que de repente se vê tendo que lidar com coisas que nunca fizeram parte de sua rotina, como um decorador esnobe (que joga fora toda a sua mobília) e até uma bela artista que vem pintar seu retrato como parte do prêmio ganho. A questão é que a grande maioria dos prêmios não tem a menor serventia na vida de Bill e sua família. Tudo acaba virando uma grande metáfora sobre a inutilidade de um sonho consumista sem sentido.

O roteiro, além de ser muito divertido, é muito bem escrito pois não deixa a bola cair em nenhum momento. Como o filme é relativamente curto (algo em torno de 80 minutos) o espectador nem percebe o tempo passando pois o personagem de Stewart se envolve numa série de confusões, uma mais engraçada do que a outra. Para os fãs da atriz Natalie Wood o filme ainda traz um atrativo extra, pois ela está no elenco, interpretando a jovem filha de Stewart. Incrível, mas ela deveria ter uns 12 anos quando fez o filme. Enfim, mais um belo momento da carreira do sempre ótimo James Stewart. Uma comédia leve, simpática, que deixará você com um inevitável sorriso no rosto após terminar de assistir.

Radiomania (The Jackpot, Estados Unidos, 1950) Direção: Walter Lang / Roteiro: John McNulty, Phoebe Ephron / Elenco: James Stewart, Barbara Hale, James Gleason, Natalie Wood / Sinopse: Bill (Stewart) é um sujeito comum que de repente vê sua vida virada de ponta cabeça após ganhar um prêmio em um programa de rádio!

Pablo Aluísio.

domingo, 25 de outubro de 2020

Uma Aventura na África

Clássico do cinema, dirigido pelo mestre John Huston, esse filme se tornou uma espécie de modelo para os filmes de aventura que viriam a seguir. Na história o astro Humphrey Bogart interpretava um veterano capitão de barco chamado Charlie Allnutt. Ele comandava sua pequena embarcação chamada The African Queen pelos rios e riachos de uma África ainda bem selvagem e inexplorada. Ele acaba sendo contratado por uma missionária estrangeira, Rose Sayer (Katharine Hepburn). Ela acabara de enterrar seu irmão naquela terra esquecida por Deus. Após aceitar fazer essa viagem, que logo se percebe ser bem perigosa, atravessando rios com enormes correntezas, o capitão interpretado por Bogart acaba percebendo que está na verdade em uma "missão" não oficial para atacar as forças alemãs no continente. A história do filme se passa em 1914, quando a primeira guerra mundial começava a eclodir na Europa, com reflexos violentos nas colônias africanas das grandes potências da época.

Além de ser ótimo com cinema, o filme também ficou famoso pelos bastidores de filmagens. O diretor John Huston ficou obcecado com uma caçada bem no meio da produção. Isso atrasou o cronograma de filmagens, causando atrasos e prejuízos para o estúdio. Enquanto John Huston seguia sua caça, o resto do elenco e da equipe técnica ficaram no meio do nada, em regiões distantes da África, esperando pelo retorno do diretor. Esses fatos  dariam origem a um outro filme bem famoso, décadas depois, com Clint Eastwood, chamado "Coração de Caçador". A história dessas conturbadas filmagens foram registradas na época pelo roteirista do filme, dando origem a um ótimo livro sobre os bastidores do cinema americano.  

Essa aventura acabou se tornando o último filme em que trabalharam juntos Humphrey Bogart e Katharine Hepburn. Eles eram parte do primeiro escalão de astros e estrelas em Hollywood. Seus filmes na época eram sucessos tanto de público como de crítica. Eram da realeza da indústria do cinema. Mesmo com todos os problemas que tiveram de enfrentar na África, acabaram se tornando bons amigos. As filmagens nem sempre trouxeram o conforto esperado por eles, sendo que muitas vezes ficaram ao capricho de John Huston, cada vez mais obsessivo com suas caçadas. Mesmo assim, com todas as dificuldades, toda essa experiência acabaria deixando boas histórias para se contar. O próprio Bogart adorava relembrar tudo o que havia passado nas filmagens desse clássico. O mais estranho de tudo é que depois de um tempo na África, John Huston decidiu que todo mundo iria voltar para Hollywood, para finalizar o filme. Essa segunda parte, filmada dentro de estúdio, com os atores atuando na frente de uma tela exibindo as imagens da África selvagem, destoam da outra parte da produção; Isso criou um certo problema visual ao filme como um todo. Nem sempre a técnica se revela convincente, fazendo com que o espectador perceba o truque.

De uma forma ou outra o público atual deve tentar ignorar tal aspecto negativo ou erro técnico, pois o que vale mesmo é a ótima parceria entre Bogart e Hepburn que dão um banho de carisma na tela. Aliás para grande surpresa do próprio Bogart, ele foi premiado com o Oscar por sua atuação! Dizem que o Oscar lhe foi dado como um reconhecimento de sua obra e não pelo que faz em cena. Faz certo sentido, pois todos em Hollywood já sabiam naquele momento que ele estava com um câncer terminal. Com isso a premiação também ganhou contornos de homenagem e agradecimento por tudo que ele fez ao longo de décadas de carreira.

Uma Aventura na África (The African Queen, Estados Unidos, 1951) Direção: John Huston / Roteiro: James Agee e John Huston, a partir do romance "African Queen" de C.S. Forester / Elenco: Humphrey Bogart, Katharine Hepburn, Robert Morley, Peter Bull, Theodore Bikel / Sinopse: Charlie Allnutt (Bogart) é um capitão veterano e aventureiro, que aceita participar de uma viagem perigosa e cheia de desafios pelos rios da África Oriental. Filme vencedor do Oscar na categoria de Melhor Ator (Humphrey Bogart). Também indicado ao Oscar nas categorias de Melhor Direção (John Huston),  Melhor Roteiro Adaptado e Melhor Atriz (Katharine Hepburn).

Pablo Aluísio

sábado, 24 de outubro de 2020

A Cruz de Ferro

Esse é um clássico de guerra assinado pelo mestre Sam Peckinpah. Para muitos críticos de cinema o diretor Sam Peckinpah foi uma espécie de estilista da violência, algo bem singular, transformando cenas de puro impacto, de ação, em momentos de arte. Um exagero por parte desses especialistas em cinema? Pode ser, em termos. De qualquer forma esse filme tem como cenário uma das manobras militares mais violentas da II Guerra Mundial, quando a Alemanha Nazista de Hitler decidiu cruzar a fronteira oriental, invadindo a Rússia comandada por Stálin. Foi um choque violento entre duas ditaduras, com exércitos poderosos. O resultado desse conflito de certa maneira selou os destinos da guerra.

A história desse filme se passa então no ano de 1943. O sargento alemão Rolf Steiner (James Coburn) é promovido e condecorado por seus oficiais em razão de seus atos de bravura. A campanha militar de seu pelotão porém acaba sofrendo um sério abalo com a chegada de um graduado oficial prussiano, o capitão Stransky (Maximilian Schell). Arrogante e inexperiente, ele decide que todos os homens sob seu comando devem obedecer suas ordens sem qualquer contestação. O oficial exige obediência cega, mesmo que suas ordens muitas vezes se revelem equivocadas, colocando os homens sob seu comando em perigo real. É o velho problema de se estar em uma situação de vida e morte, sendo comandado por alguem sem a devida competência para isso.

Talvez o público mais jovem irá estranhar certas partes do filme, pois ele é fragmentado em sua linha narrativa. Foi uma opção pessoal do diretor, uma forma de mostrar em cena o caos em que aqueles militares viviam naquele momento crucial da guerra. Outra opção muito interessante desse roteiro foi enfocar a visão, o lado dos soldados da Alemanha. "A Cruz de Ferro" foi um dos primeiros filmes do cinema ocidental a mostrar o lado dos alemães, retratando os personagens em seu lado mais humano. Nos antigos filmes sobre a II Guerra Mundial eles eram retratados como vilões absolutos, sem alma e com o único objetivo de promover genocídios e massacres. Na década de 1970, quando o filme foi produzido, já havia uma distância maior dos acontecimentos históricos, o que possibilitava ao cinema finalmente mostrar o outro lado do conflito.  

Em um filme tão interessante é importante destacar a presença e a atuação do ator Maximiliam Schell. Ele interpreta esse oficial da velha escola Prussiana, considerada a elite do exército alemão na época. Vaidoso e incoerente, muitas vezes tomando as decisões erradas, ele acaba colocando sua tropa em perigo. Muitos não sabem, mas a verdade é que vários generais alemães simplesmente odiavam Hitler e o nazismo. Alguns inclusive estavam convencidos de que ele era completamente maníaco e louco. Não é à toa que o Führer tenha sido alvo de vários atentados contra sua vida. Estrategicamente a guerra estava perdida e a única chance de sair daquele lamaçal era liquidando o líder nazista. Agora considere lutar uma guerra defendendo uma ideologia em que não se acreditava. O filme tenta capturar em parte esse sentimento e se sai muito bem. Mostra o caos da frente russa e o desmantelamento do exército alemão. É um belo exemplar do cinema cru e realista do cineasta e mestre Sam Peckinpah.

A Cruz de Ferro (Cross of Iron, Alemanha, Inglaterra, 1977) Direção: Sam Peckinpah / Roteiro: Julius J. Epstein, James Hamilton, Walter Kelley / Elenco: James Coburn, Maximilian Schell, James Mason, David Warner / Sinopse: Em 1943, durante a Segunda Guerra Mundial, em pleno front russo, um sargento alemão e um oficial da velha escola de guerra prussiana entram em choque sobre os rumos que o pelotão em que servem deve seguir. Filme premiado no festival alemão de cinema Golden Screen.

Pablo Aluísio. 

Meu Ofício é Matar

A pequena cidade de Suddenly é das mais pacatas do meio oeste dos Estados Unidos. Há muitos anos nenhum crime mais sério é registrado, talvez por isso o principal passatempo do xerife local seja tentar conquistar o afeto da jovem viúva Ellen Benson (Nancy Gates). Seu marido morreu na segunda guerra e ela ficou sozinha para criar seu único filho. Morando com seu pai, um veterano do serviço secreto, numa casa localizada em uma colina bem em frente à estação de trem, ela, por enquanto, não deseja mesmo se envolver romanticamente com ninguém. A rotina sossegada da cidadezinha muda porém quando o xerife Tod Shaw (Sterling Hayden) é informado que o presidente dos Estados Unidos chegará na estação local para passar alguns dias de folga. Ele pretende pescar e desfrutar da tranquilidade local. Isso obviamente muda completamente a rotina dos moradores. Agentes do serviço secreto e membros da polícia estadual logo tomam as ruas para garantir a segurança do presidente. Até mesmo a casa de Ellen é visitada por supostos agentes do FBI. Liderados por John Baron (Frank Sinatra) eles entram em sua casa dizendo-se membros da segurança do presidente. O que a família de Ellen não sabe é que na verdade são assassinos profissionais que estão ali justamente para matar o presidente. A localização da casa, bem em frente ao local onde o presidente desembarcará de seu trem é perfeita para um tiro de longa distância dado por Baron.

"Meu Ofício é Matar" surpreende por vários aspectos. Muitos anos antes do assassinato do presidente JFK, o roteiro antecipa várias coisas que aconteceriam com Kennedy. O atirador que almeja matar o presidente, interpretado muito bem por Frank Sinatra, era, assim como Lee Oswald, o assassino de JFK, um veterano das forças armadas. O uso de uma janela, acima de qualquer suspeita, para a colocação de um rifle de alta precisão também é similar ao que aconteceria na vida real anos depois. O grande diferencial porém é que Oswald conseguiu uma certa tranquilidade em seu local de tiro (um armazém de livros em Dallas) enquanto o personagem de Sinatra teve que lidar com várias pessoas dentro da casa de Ellen, tendo que se preocupar não apenas em atirar de forma certeira no presidente, mas também administrar seus reféns.

Frank Sinatra está muito bem como o atirador, o assassino profissional contratado para o serviço de sua vida. Afinal matar um presidente dos Estados Unidos não era algo fácil de fazer. Com ares de delírio o personagem de Sinatra se mostra um psicopata perigoso e cruel. O curioso é que o roteiro glorifica os esforços das pessoas que estão feitas reféns dentro da casa para evitar a morte do presidente. O desfecho assim é dos mais interessantes. Gostei muito desse filme. Diria até que foi um dos melhores filmes que assisti com Frank Sinatra. Assim deixo a recomendação desse surpreendente "Meu Ofício é Matar", um filme que antecipou em quase dez anos o que aconteceria na morte de um dos mais populares e marcantes presidentes da história americana.

Meu Ofício é Matar (Suddenly, Estados Unidos, 1954) Direção: Lewis Allen / Roteiro: Richard Sale / Elenco: Frank Sinatra, Sterling Hayden, James Gleason, Nancy Gates / Sinopse: Durante a visita do presidente dos Estados Unidos a uma pequena cidadezinha, um grupo de assassinos profissionais toma de refém uma família para da janela de sua casa mirar e acertar o líder americano assim que ele descer de seu trem.

Pablo Aluísio.


sexta-feira, 23 de outubro de 2020

Quando Só o Coração Vê

Esse filme é um clássico do cinema americano. Na trama temos três personagens centrais. Selina D'Arcey (Elizabeth Hartman) é uma jovem garota cega, muito oprimida, que vive em um pequeno apartamento ao lado de sua mãe (interpretada pela excelente atriz Shelley Winters) e de seu avô Ole Pa (Wallace Ford), que tem problemas de alcoolismo. A mãe é irascível, coleciona amantes e é dada a violências domésticas contra a própria filha. Uma megera desbocada, sem valores morais. Um péssimo exemplo. Uma mulher abusiva, acima de tudo. Já Selina é muito terna, sensível, amorosa, uma pessoa de grande coração. Sua vida de opressão e tristeza começa a mudar quando ela começa a passar as tardes em um parque próximo. Lá ela acaba conhecendo o simpático Gordon Ralfe (Sidney Poitier) que logo se torna seu grande amigo. Não demora a tardar e Selina começa a nutrir sentimentos românticos em relação a ele, afinal seu novo amigo é inteligente, agradável e uma ótima companhia. Seu sonho de encontrar finalmente um namorado parece se concretizar, porém esbarra na mãe que fica chocada ao saber dos encontros. A coisa piora ainda mais quando ela descobre que Gordon é um homem negro!

Esse filme foi um marco dentro do cinema americano. Em plena década de 1960 ele ousou colocar na tela o romance entre uma jovem branca e um homem negro. O roteiro explora maravilhosamente bem esse enredo, mostrando como esse tipo de situação era extremamente chocante para os padrões morais da sociedade americana da época! O racismo era parte da mentalidade de muitos americanos brancos (aliás ainda faz parte, é bom frisar). O interessante é que se formos analisar bem, a personagem da Selina é deficiente visual justamente para ser usada como instrumento narrativo da história. Ela avalia Gordon apenas por sua personalidade, deixando de lado toda e qualquer visão preconceituosa sobre ele! Sem saber como ele aparenta, ela se apaixona apenas pelo que ele realmente é, pois sua forma de ver o mundo se baseia em outros critérios. O que importa para Selina são as qualidades internas dele como ser humano. Essa proposta torna o texto um primor de roteiro.

Aliás o filme é todo muito bem desenvolvido, com excelentes atuações tanto da parte de Sidney Poitier, como também de Shelley Winters e Elizabeth Hartman. Em torno de uma história relativamente simples, o filme consegue discutir temas complexos, como por exemplo a questão do relacionamento entre pessoas de etnias diferentes e a maneira como a sociedade encara algo assim. Outro ponto inovador foi colocar uma protagonista com necessidades especiais. Não me lembro de nenhum outro filme anteior a esse que tivesse uma deficiente visual como personagem principal. Esse é outro ponto muito louvável desse rico argumento cinematográfico.

O preconceito racial, o racismo, também é ponto de destaque dentro do roteiro do filme. O personagem Gordon é um bom rapaz, tem emprego fixo, é inteligente e articulado, mas tudo isso parece ruir apenas pelo fato dele ser negro. Selina inicialmente não sabe como ele de fato é, nem entende completamente porque não poderia se relacionar com uma pessoa de outra cor, mas aos poucos começa a compreender o preconceito racial em sua forma mais danosa e prejudicial, e isso vindo justamente de sua própria mãe. Em conclusão, temos aqui um belo filme, que traz uma mensagem muito positiva sobre o problema racial e seus desdobramentos. Um filme essencial para quem estiver em busca de um entendimento maior da questão negra dentro dos Estados Unidos durante a década de 1960, no auge da luta pelos direitos civis.

Quando Só o Coração Vê ( A Patch of Blue, Estados Unidos, 1965) Estúdio: Metro-Goldwyn-Mayer / Direção: Guy Green / Roteiro: Guy Green, baseado na obra de Elizabeth Kata / Elenco: Elizabeth Hartman, Sidney Poitier, Shelley Winters, Wallace Ford / Sinopse: jovem branca, com deficiência visual, se apaixona por homem negro e precisa lidar com todo o preconceito racial vindo de sua mãe, que não admite de jeito nenhum o seu relacionamento. Filme vencedor do Oscar na categoria de melhor atriz coadjuvante (Shelley Winters). Também indicado nas categorias de melhor atriz (Elizabeth Hartman), melhor direção de fotografia (Robert Burks), melhor direção de arte (George W. Davis) e melhor música (Jerry Goldsmith). Filme vencedor do Globo de Ouro na categoria de melhor revelação feminina (Elizabeth Hartman).

Pablo Aluísio.

Férias de Amor

Clássico drama romântico de Hollywood em seus tempos de ouro. A história é bem interessante. Após fracassar na universidade, Hal Carter (William Holden) começa a vagar a esmo pelo país. Viajando em vagões de carga, ele acaba chegando numa pequena cidade em busca de um velho colega que conheceu em seus anos como estudante universitário. A comunidade é pequena, dada a celebrações tradicionais, como um picnic anual onde todos os moradores se divertem. Hal vê ali uma oportunidade de arranjar um emprego na empresa do pai do amigo, mas comete um erro fatal ao se envolver romanticamente com sua namorada e futura noiva, a bela Madge Owens (Kim Novak). A decisão acaba trazendo consequências trágicas para todos os envolvidos. A primeira impressão sobre "Férias de Amor" é a de que se trata de um filme romântico ao velho estilo, como era bem comum na década de 1950. Mas isso é uma visão superficial. O roteiro é muito bem escrito e trabalha excepcionalmente bem com todos os personagens que povoam a cidadezinha do Kansas onde a história é passada. Esse é o melhor ponto positivo desse filme. O roteiro consegue ser muito bom, apesar de ter que dar conta de vários, dezenas de personagens. Cada um deles tem seu próprio espaço dentro da história que é no fundo um espelho do que seria a própria sociedade da época.

E entre os moradores daquela cidadezinha temos os mais diversos tipos de pessoas e seus próprios dramas pessoais. Existe aqui uma coleção de bons personagens em cena. Há a professora solteirona, frustrada, que tenta se agarrar ao sonho de um dia vir a se casar, embora procure não demonstrar isso para ninguém. Há também seu namorado, um comerciante solteirão como ela, que não se decide em se casar ou não, pois considera que isso já é tarde demais para ele naquela altura de sua vida. No núcleo central temos as duas irmãs, a mais jovem é uma adolescente inteligente que irá para a universidade em breve. Ela no fundo sente uma pontinha de inveja de sua irmã mais velha, a linda Madge (Novak). Essa por sua vez é incentivada a entrar em um relacionamento com o jovem rico da região, mas no fundo não gosta dele. Sua mãe, muito interesseira, quer que ela se case e tenha uma vida de dondoca rica.

E entre tantos personagens diversos, o protagonista interpretado pelo ator William Holden obviamente se destaca. Ele é um sujeito bipolar que tenta encontrar seu lugar no mundo, mas sem muito sucesso. Seu romance com a atriz Kim Novak é um dos pilares do filme. Foi o que tornou essa produção um sucesso de bilheteria na época. Os dois astros realmente passam muita química juntos, em boas cenas românticas.. É um casal que deu certo no cinema. E some-se a essa boa escolha de elenco, a boa direção de Joshua Logan, considerado pela crítica da década de 1950 como um dos mais talentosos cineastas daqueles tempos áureos do cinema americano. É um belo trabalho de direção, atuação e até mesmo romantismo ao velho estilo. Um filme que merece o status que tem na história do cinema clássico.

Férias de Amor (Picnic, Estados Unidos, 1955) Estúdio: Columbia Pictures / Direção: Joshua Logan / Roteiro: Daniel Taradash, William Inge / Elenco: William Holden, Kim Novak, Betty Field / Sinopse: Um homem sem rumo na vida acaba indo parar numa pequena cidade do interior dos Estados Unidos, onde acaba se envolvendo com a mulher errada dentro daquela comunidade interiorana. Filme indicado ao Oscar nas categorias de melhor filme, melhor direção (Joshua Logan) e melhor música (George Duning). Vencedor do Oscar nas categorias de melhor edição (Charles Nelson e William A. Lyon) e melhor direção de arte (William Flannery e Jo Mielziner). Filme vencedor do Globo de Ouro na categoria de melhor direção (Joshua Logan).

Pablo Aluísio.

quinta-feira, 22 de outubro de 2020

O Inferno é Para os Heróis

O ator Steve McQueen foi um dos grandes ídolos do cinema de ação das décadas de 1960 e 1970. Ele morreu relativamente jovem, por um câncer agressivo causado por exposição ao amianto, justamente no período de sua vida em que prestou serviço militar. Curiosamente foi como soldado que ele conseguiu seus primeiros papéis no cinema. Afinal de contas ele ficava muito bem nesse tipo de personagem, justamente por ter sido um militar na vida real. De certa maneira nem precisava interpretar tanto, nem fazer pesquisa sobre seus personagens. O laboratório de interpretação havia sido sua própria vida antes de ir para o cinema. Era a arte imitando a vida. Aqui temos um filme de guerra estrelado por ele, uma produção que de certa maneira caiu no esquecimento depois de tantos anos de seu lançamento original, isso apesar de sua boa qualidade cinematográfica. O cenário onde se passa a ação desse filme é a Europa devastada pela Segunda Guerra Mundial. No front de guerra, um pequeno grupo de soldados americanos é deixado para trás pelo exército, com a missão de  manter uma posição estratégica. 

O problema é que o pequeno pelotão está em menor número frente ao inimigo. Para tanto precisam convencer as tropas alemãs de que são bem mais numerosos do que realmente são. A linha de combate é ampla e cobre um grande território, mas os americanos se mostram firmes em defender sua posição. O roteiro explora muito bem a crueza do chamado combate corpo a corpo. Há boas cenas envolvendo um grupo avançado cujo objetivo é destruir uma casamata fortemente armada e defendida pelas tropas nazistas. Um dos aspectos que mais chamam a atenção em "O Inferno é Para os Heróis" é sua crueza e até mesmo frieza. O diretor Don Siegel optou por uma linha mais realista, deixando de lado toda a patriotada que caracterizou muitos filmes de guerra no apogeu de Hollywood. O clima é de leve desesperança, melancolia até, em um mundo destruído, em ruínas. O personagem de Steve McQueen passa longe de ser um herói romântico ou algo parecido. Para impactar ainda mais nesse aspecto o filme tem uma fotografia preto e branco bem mais escura do que o normal, enfatizando o clima de opressão e conflito que impera em toda a fita.

Outro ponto de destaque vem no elenco de apoio. Bobby Darin, cantor popular na época, principalmente cantando doces baladas românticas ao estilo de Frank Sinatra, encara um papel completamente diferente em sua carreira e não faz feio em cena. Já Nick Adams, da turma de James Dean e grande amigo pessoal de Elvis Presley, tem um pequeno papel, mas que no final se mostra bem relevante. Por fim James Coburn, com toda a sua competência habitual, acrescenta bastante ao filme interpretando um coronel durão. Era exatamente o tipo de papel que caía como uma luva em seu repertório de atuação. Enfim, se você gosta de bons filmes sobre a Segunda Guerra, "O Inferno É Para os Heróis" pode se tornar uma ótima pedida para o fim de semana.

O Inferno é Para os Heróis (Hell Is for Heroes, Estados Unidos, 1962) Direção: Don Siegel / Roteiro: Richard Carr, Robert Pirosh / Elenco: Steve McQueen, Bobby Darin, James Coburn, Nick Adams, Bob Newhart, Fess Parker / Sinopse: Durante a Segunda Guerra Mundial um pequeno grupo de soldados americanos tenta manter de todas as formas sua linha de defesa contra as tropas alemãs, mesmo estando em menor número do que os soldados do III Reich.

Pablo Aluísio.