segunda-feira, 31 de janeiro de 2005

Elvis Presley - A Date With Elvis - Parte 1

Esse álbum "A Date With Elvis" seguia basicamente a mesma fórmula do "For LP Fans Only". São duas faces da mesma moeda, ou melhor dizendo, discos que se espelham um no outro. O mesmo tipo de conteúdo, a mesma "filosofia" na escolha das canções. Basicamente aqui os executivos da RCA Victor pincelaram músicas avulsas gravadas por Elvis, desde os tempos em que o cantor gravava na Sun Records, para a composição de uma coletânea de, vamos colocar nesses termos, músicas "Lado B". Boas músicas, algumas excelentes faixas, mas que até aquele momento não tinham chamado maior atenção dos fãs (estou em referindo ao final dos anos 1950).

Uma das belas canções que foram usadas nesse álbum foi a bonita balada "Is It So Strange". Aqui eu costumo dizer que temos um arranjo bem simbólico daquela primeira fase do rock americano. Percebam bem o estilo de tocar guitarra de Scotty Moore. Esse tipo de arranjo era algo muito característico nas músicas românticas dessa época. Como diria George Harrison anos depois a guitarra"chorava" em cada nota produzida pelo músico. Algo muito bonito, bem nostálgico daqueles tempos mais românticos e mais sentimentais. Gravada em 19 de janeiro de 1957, composta por Faron Young, essa linda música nunca ganhou o espaço merecido dentro da discografia de Elvis Presley.

Arthur Neal Gunter foi um músico negro americano que desde os primeiros passos na carreira no estado da Georgia onde nasceu, tentou fazer sucesso com sua música. Porém nunca alcançou os picos da glória. Ele circulou por uma série de pequenas gravadoras do sul dos Estados Unidos até ir parar em Nashville. Só que Gunter não era um artista country, mas sim de blues e gospel. Ele inclusive vinha de um grupo vocal chamado Gunter Brothers Quartet, onde ao lado de seus irmãos e primos tentava chamar alguma atenção das gravadoras da época.

Em novembro de 1954 ele assinou com o selo fonográfico Excello para a gravação de um pequeno compacto (single). No lado A desse disquinho gravou a sua música "Baby Let's Play House". O sucesso foi mediano, mas satisfatório, chegando até mesmo a se destacar dentro da parada Billboard. E não demorou muito a chamar a atenção de um jovem chamado Elvis Presley que decidiu gravar sua versão da música. Claro, Elvis erotizou bastante a letra e o jeito de interpretar a canção, ao ponto inclusive de ser taxado de perversão pelos reacionários de plantão. Não importa, na voz de Elvis essa música realmente se tornou imortal. Curiosamente alguns meses antes de morrer em 1976 Arthur Gunter disse em uma entrevista para uma revista americana de música que "nunca teve a oportunidade de conhecer Elvis pessoalmente, nem de apertar sua mão". Infelizmente eles nunca se conheceram pessoalmente. Teria sido um encontro muito interessante, sem dúvida.

Pablo Aluísio.

Elvis Presley - A Date With Elvis - Parte 2

Esse álbum, como já frisei, foi lançado enquanto Elvis estava servindo o exército na Alemanha Ocidental. Era a época da guerra fria, da cortina de ferro. Os socialistas da Alemanha Oriental consideravam a presença de Elvis naquela região como uma provocação, uma propaganda política do lado capitalista decadente. Coisas da época. Pois bem, uma das músicas desse disco havia sido lançada originalmente no primeiro single de Elvis na Sun Records. Era a baladinha country "Blue Moon of Kentucky". Gravada em julho de 1954, havia sido composta por Bill Monroe.

Eu fico imaginando os fãs da época, roqueiros e tudo mais, colocando o novo disco de Elvis para tocar e se deparando com um country ingênuo desses. Afinal poucos tinham tido acesso aos compactos originais da Sun. Para a imensa maioria dos fãs aquela faixa, mesmo antiga como era, soava como novidade. E de repente o Rei do Rock surgia cantando uma balada country de montanha. Deve ter sido algo bem estranho para aqueles jovens roqueiros, cheios de brilhantina no cabelo, posando de Teddy boys. Não era o tipo de som que essa juventude estava acostumada a ouvir. Não era mesmo.

E mais estranho ainda deve ter sido ouvir a canção "Milkcow Blues Boogie". Essa aqui ainda era mais provinciana e radical do que "Blue Moon of Kentucky". Também havia sido gravada por Elvis na Sun Records para um público muito específico do sul. Era um tipo de som para fazendeiros, pessoas que viviam no meio rural. Uma sonoridade de nicho. Imaginem novamente esse tipo de country de raiz surgindo aos ouvidos de quem morava nos grandes centros urbanos, como Nova Iorque ou Los Angeles. Mais esquisita ainda deve ter soada para o público internacional. No Brasil, por exemplo. Pouca gente por aqui tinha familiaridade com o Boogie rural do sul dos Estados Unidos. A gravação também era abafada, causando mais estranheza ainda aos ouvidos de quem não era daquelas bandas. Era a música da vaca leiteira, enfim.

Mais familair para a moçada de lambreta era "(You're So Square) Baby I Don't Care". Essa havia sido tirada da trilha sonora do filme "Jailhouse Rock". Já era o Elvis roqueiro que todo mundo conhecia. O astro jovem de Hollywood, o ícone do rock em seus primórdios. Mais uma pequena obra-prima composta pela dupla Jerry Leiber e Mike Stoller. Dessa faixa sempre é lembrado o fato de que Elvis tocou baixo nela. Bill Black se enrolou no solo da canção, se aborreceu e saiu do estúdio. Ele era assim, temperamental e cabeça quente. Elvis então viu ali uma oportunidade de mostrar seus dotes de instrumentista. Ele estudou baixo por anos e anos. E se saiu muito bem. Como raramente Elvis tocava em suas gravações, a música trazendo o "Elvis baixista" ficou marcada para sempre. Uma curiosidade para os fãs do cantor.

Pablo Aluísio.

domingo, 30 de janeiro de 2005

Elvis Presley - A Date With Elvis - Parte 3

A música"Young And Beautiful" foi escrita pela dupla de compositores Aaron Schroeder e Abner Silver. Gravada por Elvis em 30 de abril de 1957, fez parte da trilha sonora do filme "Jailhouse Rock". Sempre foi uma bela balada subestimada, nunca usada adequadamente fora do contexto do filme. Curiosamente durante a década de 1970, em ensaios, Elvis esboçou uma tentativa de levar a música para os palcos, porém só ficou na intenção mesmo. Há uma boa versão dessa época, lá por volta de 1972, onde Elvis ensaia a canção com seu grupo em estúdio. Ficou bonita, apesar de ser uma versão bem despretensiosa.

E a RCA Victor encaixou outras faixas de filmes de Elvis nessa coletânea. Uma delas foi "We're Gonna Move". Oficialmente ela veio creditada como sendo composta por Vera Matson e Elvis Presley. Na verdade hoje sabemos que todo o material do filme "Love Me Tender" foi composto pelo maestro da Fox Ken Darby. Ele apenas não quis assinar essas criações, por motivos diversos, colocando as músicas como sendo feitas por sua esposa Vera e por Elvis, para agradar ao Coronel Parker que estava de olho nos direitos autorais das músicas gravadas por Elvis. Nada pessoal, uma questão puramente de negócios.

Eu adoro a dupla Jerry Leiber e Mike Stoller. Em minha opinião as melhores músicas gravadas por Elvis nessa fase roqueira dos anos 1950 foram compostas por eles. Só que, apesar dessa admiração, devo dizer que "I Want To Be Free" se torna bem enjoativa depois de algumas audições. Gravada em abril de 1957, dentro do pacote de "Jailhouse Rock", essa música é certamente uma das mais fracas dessa celebrada trilha sonora. O que poderia ser pior do que isso? Basicamente temos alguns grandes clássicos nesse filme, mas essa aqui pode ser chamada de "musiquinha" sem medo de soar como uma injustiça. Enjoativa e banal, nem parece uma música com a assinatura dos geniais Leiber e Stoller.

Um fato curioso sobre esse álbum é que em sua edição original norte-americana, havia uma bonita direção de arte. Dentro de uma capa que abria - tal como se fosse um álbum duplo - havia muitas fotos de Elvis no exército, além de um enorme calendário do ano de 1960, que seria aquele em que Elvis retornaria aos Estados Unidos após cumprir serviço militar. Na década de 1980, para ser mais específico, em 1982, saiu a última edição desse disco em vinil no Brasil. Fazia parte da série "Pure Gold". Pena que toda a bonita direção de arte da edição original foi deixada de lado. Em uma edição pobre trazia capa e contracapa iguais, sem nenhum luxo. Uma versão bem decepcionante para os colecionadores da época.

Pablo Aluísio.

Elvis Presley - A Date With Elvis - Parte 4

Em setembro de 1954 Elvis participou de uma das sessões mais produtivas em seus anos na Sun Records. Em apenas um dia ele gravou seis músicas! Ora, isso era mais da metade de um disco de vinil da época, algo que Sam Phillips poderia pensar em fazer, caso sua gravadora não fosse tão modesta. As sessões começaram com "I'll Never Let You Go", cujos primeiros takes nunca foram lançados e se perderam para sempre. Outra que se perdeu e nunca foi lançada foi "Satisfied". Essa gravação foi realmente uma perda e tanto pois Elvis nunca mais gravaria a música em sua carreira. As baladas "I Don't Care if the Sun Don't Shine" e "Just Because" também foram gravadas. Como se pode perceber Elvis estava com bastante energia e vontade de mostrar seu talento nessa ocasião.

Para finalizar essa sessão de gravação mais do que produtiva Elvis encerrou os trabalhos com chave de ouro ao gravar o clássico "Good Rockin' Tonight" de Roy Brown. Para o dono da Sun Records, o produtor Sam Phillips, esse foi certamente um dos pontos altos de Elvis na gravadora de Memphis. Havia apenas três músicos dentro do estúdio naquele dia. Elvis cantando e fazendo acompanhamento em seu violão. Scotty Moore na guitarra e Bill black em seu enorme contrabaixo. Não houve baterista. Não havia mais ninguém. É de se impressionar ao ouvir a faixa nos dias de hoje e perceber que apenas três músicos conseguiram um efeito tão bom. Naquele mesmo mês de setembro a gravadora se apressou para lançar o single Sun 210, o segundo de Elvis pelo pequeno selo de Memphis. Não havia tempo a perder.

Outra música dos tempos da Sun Records que a RCA Victor aproveitou para eolocar nesse álbum "A Date With Elvis" foi "I Forgot to Remember to Forget". Escrita pela dupla Stan Kesler e Charlie Feathers. É uma baladinha country que tem um título curioso, que em português significaria algo como "Eu esqueci de lembrar de me esquecer". Um trocadilho até divertido de palavras. Os Beatles, que eram grandes fãs de Elvis nesse período da Sun Records, gravariam a música em seu programa na BBC de Londres. O registro sobreviveu ao tempo e foi lançado anos depois no excelente box "The Beatles - Live at the BBC".

Finalizando essa análise do álbum "The Date With Elvis" aqui vão algumas informações adicionais. O disco foi lançado no mercado americano em agosto de 1959 com o código fonográfico LPM 2011. Foi o oitavo LP de Elvis a chegar ao mercado pela RCA Victor. Não foi um grande sucesso de vendas, chegando apenas ao trigésimo segundo lugar entre os mais vendidos. Curiosamente o disco foi lançado um mês antes na Inglaterra, onde vendeu muito bem, chegando ao quarto lugar das paradas inglesas. Elvis era adorado pelos fãs das ilhas britânicas. No Brasil o disco só chegaria ao mercado quase um ano depois, numa edição bem simples, sem todo o capricho gráfico da edição americana.

Pablo Aluísio.

Elvis Presley - O Coronel Tom Parker

O último dos grandes empresários do show business americano, herdeiro da velha escola de P.T.Barnum (aquele que disse "Nasce um otário a cada minuto") O Coronel Tom Parker faz parte do folclore. As histórias que se contam sobre ele já fez muita gente dar risada: de como vendia cachorro quente só com as pontas das salsichas aparecendo, o interior do pão sem carne nenhuma, como pintava pardais de amarelo e os vendia como canários, ou como fazia seus perus dançarem colocando-os sobre uma chapa de ferro quente aquecida por uma resistência elétrica. E muitos outros disparates. Mas afinal quem é esse homem misterioso que adora elefantes? Outra historinha: durante as filmagens de "Em cada sonho um amor", em Cristal River, na Flórida, o Coronel insistiu em visitar um velho paquiderme que tinha conhecido em seus tempos de circo. Tom Parker só ficou sossegado quando chegou ao Zoo e alimentou o animal, que demonstrou reconhecê-lo, abanando a cabeça e arrastando o pé acorrentado. Na década de 30 o Coronel trabalhava com o Royal American Shows, um circo que viajava pelos Estado Unidos e Canadá num trem particular de 70 vagões. Sobre o que fazia nesse circo existem divergências: alguns afirmam que o Coronel vendia algodão doce e maçãs carameladas; outro o colocam como intendente da companhia, um trabalho de muita responsabilidade para alguém com vinte e poucos anos.

Tudo o que sabemos é que sua escola foi o circo, onde aprendeu a manipular o público. Tom Parker também era um homem com extraordinários poderes psíquicos. Ele era, por exemplo, um ótimo hipnotizador. Durante os anos em que as organizações Presley esteve confinada a uma tediosa rotina de fazer um filme atrás do outro, o Coronel uniu seu estilo bonachão aos seus poderes de controlar a mente produzindo cenas de irresistível humor, como conta Albert Goldman em seu livro "Elvis": "Durante as filmagens de Kid Galahad, certa vez o coronel hipnotizou Sonny West, o guarda costas de Elvis, instruindo-o para que dissesse ao diretor Phil Karlson que o filme cheirava mal, a atuação era horrível, a direção era nojenta e toda a produção era uma terrível perda de tempo. Num intervalo da filmagem, o grande, corpulento Sonny caminhou até o diretor e lançou-lhe a impressionante e insultuosa conversa. O diretor ficou boquiaberto com o choque, enquanto o Coronel bebia a cena, rindo consigo mesmo e esforçando-se para que seu rosto não o traísse. Finalmente Karlson gritou: "Quem é esse sujeito? Tirem-no daqui!" Quando lhe explicaram a piada, o diretor ficou espantado por Sonny West ter atuado tão convincentemente e sem dar um sorriso sequer. "Ele estava hipnotizado" explicou o Coronel. "Ele não poderia ter feito isso de outro jeito". Virando-se para Sonny o diretor do filme perguntou: "Isso é verdade?" "Sim Senhor, é verdade sim", admitiu Sonny. Os dotes psíquicos do Coronel não eram limitados apenas à hipnose. Há anos ele sofria de uma ruptura de disco na coluna, motivo pelo qual ele sempre usava uma bengala. Mas nunca se submeteu a uma cirurgia, preferindo controlar a dor, às vezes insuportável, através do poder de sua mente.

O que mais sabemos sobre o Coronel? Ele nunca assinou um cheque, nunca teve um cartão de crédito e pagava tudo em dinheiro vivo, além de fazer questão de não dever um centavo ao imposto de renda. Embora atuasse em um negócio internacional ele nunca teve um passaporte. Por quê? Segundo o próprio não podia provar seu nascimento pois era um filho enjeitado. Nunca devendo ao imposto de renda, evitando submeter-se a investigações para a obtenção de cartões de crédito e não se sujeitando ao escrutínio do pessoal da imigração para tirar um passaporte, um homem pode passar toda sua vida nos Estados Unidos sem precisar dizer exatamente quem ele é. O Coronel foi casado durante mais de 50 anos com a mesma mulher, Marie, e não teve filhos. Antes de Elvis, por nove anos, de 1944 a 1953, o Coronel dedicou-se a empresariar o cantor Eddy Arnold. A patente de "Coronel", que tantos benefícios lhe trouxe, é um título honorário, que lhe foi concedido por Jimmy Davis, governador da Louisiana, em 1948. Virtualmente único em sua profissão, por sempre se dedicar exclusivamente a um único cliente, o Coronel tinha somente duas paixões, fora o trabalho. Uma era comer, o que fez com que seu peso subisse até os 150 Kg, a outra era o jogo. Tom Parker era um jogador prodigioso. Em Las Vegas, onde mantinha um apartamento, era considerado um dos maiores jogadores da história. Na roleta, sempre fazia a aposta máxima, 10 mil dólares, chegando a perder, às vezes, mais de um milhão de dólares por mês. O Coronel tinha 47 anos quando ficou famoso, graças à sua associação com Elvis Presley, mas nunca conversou com jornalistas. Não que recusasse a atender a imprensa. Pelo contrário - qualquer jornalista que lhe pedisse uma entrevista, era atendido gentilmente pelo Coronel: "Ficaria encantado em lhe conceder uma entrevista. Você deseja uma curta ou uma longa? O preço da curta é de 25 mil dólares, a longa custa 100 mil".

Após a morte de Elvis, a verdadeira identidade do Coronel Parker foi sendo descoberta pelos autores que escreveram sobre o cantor. Alguns acontecimentos sempre chamaram a atenção, como por exemplo, o fato de Elvis nunca ter cantado fora dos Estados Unidos (exceto uma única vez no vizinho Canadá). Outro fato também intrigou os autores: durante seu serviço militar na Alemanha, Elvis nunca foi visitado por Tom Parker. Sem dúvida havia algo de errado com o Coronel, a questão que surgiu foi saber por quê o Coronel evitava sempre viajar para fora dos Estados Unidos? Após uma investigação descobriu-se que o Coronel não havia nascido em Hungtington, West Virginia, como sempre afirmou e sim em Breda, na Holanda, em 26 de junho de 1909. Nome verdadeiro: Andreas Cornelius Van Kuijik. Não se sabe como o Coronel veio parar nos Estados Unidos, mas com certeza foi de maneira ilegal. Seus primeiros registros em solo americano datam de 1929, quando ele tinha 18 anos. Em 1929 o Coronel se alistou no exército americano, onde serviu de 1930 a 1932. E depois disso ele apagou todas as pistas sobre seu passado. Albert Goldman matou a charada em 1980. Junto a Lamar Fike eles resolveram ir direto ao coração do problema. É Goldman quem recorda: "Quando descobrimos essa história, Lamar Fike, que viajou muito com o Coronel nos velhos tempos afirmou que não via o Coronel como uma figura inalcançável e propôs: 'Porque não telefonamos ao Coronel e esclarecemos o mistério?' Quando Lamar conseguiu falar com o Coronel, foi muito bem tratado e começou: 'Coronel, vocês sempre me disse que se houvesse alguma coisa que eu quisesse saber sobre você, deveria perguntar-lhe pessoalmente'. De Hollywood a voz do velho homem fez-se ouvir em Nova Iorque: 'Está certo Lamar, o que você quer saber?' 'Bem, Coronel', disse Lamar, 'tem um livro aqui que diz que seu nome verdadeiro é Andreas Van Kuijik e que você nasceu em Breda na Holanda'. Houve uma pequena pausa na linha e uma perceptível mudança de tom na voz de Parker: 'Oh, sim', respondeu o Coronel, 'Isso já saiu em mais de quinze lugares. Essa é velha... não é nenhuma novidade!' Lamar ficou tão impressionado com a inesperada resposta que protestou: 'Mas Coronel, eu o conheço há mais de 20 anos - porque nunca me contou que era holandês?'. O Coronel, sempre com uma resposta na ponta da língua, retrucou: 'Porque você nunca me perguntou'. Muitos anos depois, quando perguntado como resumiria sua sociedade com Elvis Presley o Coronel afirmou: 'Quando conheci esse rapaz ele só tinha o potencial de um milhão de dólares. Agora ele já ganhou muito mais do que o seu Milhão!'. Coisas de Tom Parker, ou melhor, Andreas Van Kuijik...

Fonte: Elvis, Documento Histórico.

quinta-feira, 27 de janeiro de 2005

Elvis Presley - Back in Memphis (1969)

Elvis Presley - Back in Memphis
Esse disco trazia uma segunda leva de gravações realizadas por Elvis Presley em Memphis, no American Studios. Na verdade o álbum foi um desdobramento do primeiro LP duplo da carreira de Elvis, "From Memphis to Vegas / From Vegas to Memphis". Eram dois LPs. Um dedicado a gravações realizadas ao vivo em Las Vegas - na turnê que marcou o retorno de Elvis aos palcos depois de muitos anos afastado - e o outro recheado de músicas inéditas produzidas por Elvis na sua volta aos estúdios de sua cidade de coração, Memphis. Poderia haver algo mais saboroso para um fã de Elvis na época? Depois de anos e anos precisando aguentar trilhas sonoras infantis era realmente uma mudança e tanto no rumos da carreira do cantor. Eu costumo afirmar que os anos 70 para Elvis começaram bem antes, em 1969. Nesse ano ele realmente mudou tudo e para melhor. As músicas ficaram mais consistentes, lidando com temas mais significativos em arranjos mais bem elaborados, letras falando dos problemas decorrentes de relacionamentos adultos, sem bobagens adolescentes pelo meio do caminho. Finalmente Elvis parecia se comunicar com seu público que também estava em uma faixa etária mais avançada. Não havia mais como bancar o eterno cantor garotão adolescente conquistando corações de meninas bobinhas. Era necessário crescer, sair da adolescência musical, algo que Elvis finalmente conseguiu com seus registros no American.

"Back in Memphis" na realidade não tem nenhum grande hit em sua seleção musical. Isso porém não significava nada no final das contas pois a seleção musical era de uma qualidade maravilhosa, superior a qualquer outra coisa que Elvis havia produzido nos últimos anos. Comparar com trilhas recentes como "Speedway" chegava a soar como covardia até. Colocando as cartas na mesa não existem músicas insignificantes em "Back in Memphis" (afirmação que inclusive pode ser ampliada para praticamente todas as canções gravadas no American Studios). Era um novo artista que nascia das cinzas, não fazendo mais concessões descabidas do ponto de vista comercial. Claro que de uma maneira em geral as sessões foram extremamente bem sucedidas comercialmente falando, como Suspicious Minds, por exemplo, que acabou se tornando a primeira canção a alcançar o número 1 da Billboard depois de longos anos, mas isso nunca foi o foco principal dessas gravações, muito longe disso. Se pudesse escolher apenas uma palavra para descrever "Back In Memphis" eu usaria a expressão elegância. O álbum é muito elegante, tanto em sua proposta como em sua essência. As canções foram escolhidas por Felton Jarvis que parece ter se concentrado naquela nata mais substancial das sessões, procurando a fina flor de todo o material disponível. Como se sabe essas sessões foram realizadas no esquema de maratonas, ou seja, Elvis entrou em estúdio para gravar uma grande quantidade de músicas que depois seriam lançadas de forma gradual pela RCA Victor. Nesse quesito Jarvis foi muito feliz pois realmente acabou compondo duas belas seleções musicais (tanto em relação a esse álbum como no anterior, "From Elvis in Memphis"). Era o começo de novos tempos na carreira do Rei do Rock.

Inherit The Wind (Eddie Rabbit) - Uma bela canção, mostrando a sofisticação das músicas gravadas por Elvis Presley no American Studios. Ouso dizer que algumas dessas músicas se encontram entre as mais sofisticadas de toda a carreira de Elvis, em qualquer época que você queira comparar. Na letra temos quase uma súplica em primeiro pessoa, em que o narrador apela com sinceridade para que a garota não se apaixone por ele de jeito nenhum, pois ele certamente a magoará no futuro. Assim como seu pai sempre fazia com sua mãe, ele também muito provavelmente a decepcionará, indo embora pela manhã, sem dizer adeus ou olhar para trás. Composta por Edward Thomas Rabbitt, um cantor country popular nas décadas de 1960 e 1970, a canção evoca um tema bem comum nesse universo, a do amor que já nasce fadado ao fracasso completo, à desilusão e à decepção completa. Vale a pena amar sabendo que sofrerá bastante lá na frente? A versão de Elvis difere em certo sentido da gravação original por trazer um desalento completo em sua voz, um clima de leve decepção e melancolia que cresce bastante em seu refrão. Aliás o trabalho de Chips Moman com o grupo vocal feminino é um dos grandes destaques da gravação. Um apelo quase desesperado para que não venha a nascer um amor entre ambos, pois a decepção certamente será completa. Excelente música!

This is The Story (Arnold / Morrow / Martin) - Uma letra que poderia muito bem ter sido escrita pelo próprio Elvis. Ele iria vivenciar mais à frente em sua vida essa mesma situação, a do homem abandonado que descobre que sua mulher amada o deixou por amar outro homem. O arranjo é bem intimista, justamente para o ouvinte se sentir no quadro descrito na letra. Uma pessoa que foi abandonada, lendo a carta de despedida (e desculpas) da sua querida que partiu para ir viver outro romance, outro amor, com outro homem. Ao seu redor tudo a lembra, a música que ele ouve, a fotografia dela ao lado de sua cama, os móveis, um livro na prateleira. Seu mundo literalmente cai após ser abandonado. Essa música foi providenciada por Felton Jarvis e gravada originalmente por Elvis no American Studios. É verdade que ela nunca chegou a ser um sucesso em sua carreira, porém se tornou extremamente importante dentro do contexto dos discos "From Memphis to Vegas / From Vegas to Memphis" e seu desdobramento "Back in Memphis". É interessante notar que ela foi a segunda música gravada por Elvis no American, logo após "Long Black Limousine" e ao contrário dessa não deu muito trabalho para se chegar na versão oficial. Em apenas dois takes Elvis matou a gravação, provando que nessa noite ele estava mais do que afiado, pronto para dar o melhor de si (depois de anos desperdiçando seu talento em obras menores como as músicas de filmes de Hollywood). Enfim, "This is Story", apesar da clara tristeza de sua letra depressiva e melancólica, é certamente um dos melhores momentos do disco. Pequena obra prima.

Stranger in My Own Home Town (Mayfield) - E então chegamos no blues "Stranger in My Own Home Town". Certa vez o cantor de blues Howlin' Wolf encontrou Elvis por acaso nos corredores dos estúdios da RCA Victor em Nashville e foi logo dizendo: "Ei garoto, o que você pensa que está fazendo?". Elvis ficou um pouco assustado e Wolf completou: "Sua voz é do blues, você nasceu para cantar blues! Quero ouvir você no blues garoto!". Era pura verdade. Ao longo dos anos Elvis provou que tinha um incrível feeling para o blues, embora tenha interpretado relativamente  poucas canções nesse estilo. Uma pena, tanto talento desperdiçado em canções pop de filmes! Certamente teria sido melhor aproveitado se tivesse se dedicado mais para essas velhas cantorias de escravos à beira do rio Mississippi. Sim, porque o blues nasceu exatamente dentro desse contexto histórico, do lamento do trabalho pesado sob sol a pino nas plantações de algodão do sul. Já que Elvis adorava tanto a cultura musical negra de seu país era óbvio que mais cedo ou mais tarde ele iria também desaguar nas águas do blues sulista. "Stranger in My Own Home Town" vai justamente nessa direção. A versão original é excelente. Gosto muito desse estilo mais sincopado, porém a minha preferida é a versão completamente envenenada que foi lançada pela primeira vez em 1995 no box "Walk a Mile in My Shoes: The Essential '70s Masters". Ali você pode sentir a vibração blueseira que estava rolando dentro do estúdio. O blues é aquele tipo de ritmo musical que você precisa sentir o que está cantando. É um gênero essencialmente sentimental, para se cantar com a alma aberta. Elvis conseguiu atingir esse ponto perfeito. É curioso que a música sequer estava na primeira lista de músicas que seriam gravadas naquela noite, mas Elvis curtiu muito a fita de demonstração que ouviu assim que chegou no American. Praticamente ele usou a gravação para se aquecer, uma forma de entrar no clima ao lado de sua banda. Todas as versões são excelentes, ainda mais pelo fato do produtor Chips Moman ter aceitado a sugestão de Elvis para que sua voz fosse afundada no meio do som do grupo, lá no fundo, quase inaudível. Para Elvis um bom blues tinha que sequer esse tipo de balanceamento. Nada de colocar sua voz em destaque. Isso nunca existiu nos velhos singles clássicos de blues. Elvis sabia disso. Os instrumentos em primeiro plano e o vocal mergulhado bem no meio da sopa sonora. Perfeito. Ele estava novamente certo. Ponto para Mr. Elvis Presley. Ouça e sinta-se como ele, um estranho em sua própria cidade.

A Little Bit Of Green (Arnold / Morrow / Martin) - Essa é uma antiga música lançada pelo cantor country Eddy Arnold. Para quem não sabe a história de Arnold se confunde com a do próprio Elvis pois ele era da mesma região e tinha o mesmo empresário que Presley. Sim, o Coronel Parker também era o manager de Arnold. É curioso porque muito do que aprendeu em termos de negócios no mundo da música, Parker aprendeu justamente dirigindo a carreira de Eddy Arnold, um dos primeiros artistas que empresariou. Depois de um começo modesto em Memphis e Nashville sua vida mudou quando Parker lhe arranjou um acordo com uma das empresas mais poderosas dos Estados Unidos. Em 1944 conseguiu um contrato para ele com a RCA Victor, a mesma que seria a gravadora por toda a carreira de Elvis. Pois bem, deixando isso um pouco de lado vamos tecer alguns comentários sobre a música então. Nunca achei uma grande canção e passa longe de ser um clássico dentro do repertório de Elvis. A letra novamente trata do tema sobre corações partidos. Em primeira pessoa o autor lamenta a perda da mulher amada, que agora está nos braços de outro. É o velho arrependimento que só bate quando você perde um grande amor e só se dá conta de sua importância quando ela resolve finalmente arranjar outro para tocar sua vida para frente. Assim, em termos gerais, a letra não é das mais originais e nem tampouco é tão bem escrita. Analisando bem são apenas três estrofes, nenhum deles excepcionalmente bem escrito. O refrão também não me agrada muito. Falta um pouco mais de conteúdo nessas passagens. A harmonia também não chega a surpreender. É bem gravada e executada, como tudo o que diz respeito ao material que foi gravado no American Studios (a banda que acompanhou Elvis era realmente acima da média), mas realmente novamente não impressiona. Acredito que o fato dela estar no meio de tantas obras primas ajudou a ofuscá-la ainda mais. Ela foi gravada no dia 15 de janeiro de 1969 no mesmo dia em que Elvis também gravou somente outra faixa: Gentle on My Mind. Pelo visto não foi uma das noites mais produtivas de Elvis no American.

And the Grass Won't Pay No Mind (Neil Diamond) - Elvis adorava Neil Diamond. Estava sempre conferindo o trabalho desse cantor e compositor nova-iorquino. O interessante é que tão absorvido ficou com o material que Diamond vinha gravando que ele mesmo resolveu fazer suas próprias versões em estúdio do material composto pelo colega músico. Um exemplo é essa faixa "And the Grass Won't Pay No Mind". Ela foi originalmente lançada como Lado B do single "Soolaimon". Elvis não gostava muito da canção principal, mas adorou seu Lado B. Por isso achou que a canção merecia um melhor destino, um tratamento mais digno. Assim na madrugada do dia 18 de fevereiro, quando o relógio já indicava 1 da manhã, Elvis começou a trabalhar com a canção ao lado de seus músicos. A sessão só chegaria ao fim às quatro hora da madrugada, com um Elvis bem satisfeito por seu resultado. Ele realmente se esforçou para dar um belo tratamento na criação de Neil Diamond. O resultado, como se pode perceber, superou e muito a própria gravação original de Diamond, algo que não era raro acontecer em se tratando de Elvis Presley. A letra de "And the Grass Won't Pay No Mind" é no mínimo interessante. Os primeiros versos que dizem: "Escute, você pode ouvir Deus chamando / Andando descalço na correnteza" pode dar a falsa impressão que você está prestes a ouvir uma música gospel, mas não! O autor logo muda o rumo, entrando em uma mistura de música hippie de amor, com clara conotação até mesmo um pouco esotérica. O melhor da canção como um todo é a sua linda melodia, bem suave, calma e relaxante. Elvis a canta ternamente, algo que nem estava sendo usado muito na época por ele, já que para as sessões do American o cantor tinha optado por uma vocal mais incisivo e marcante. Uma bela faixa que a despeito de todas as suas qualidades acabou não sendo também muito bem trabalhada pela RCA Victor, nunca a transformando numa música de trabalho. Uma pena, uma música tão linda merecia melhor sorte, tanto na voz de Neil Diamond como na de Elvis Presley. De qualquer maneira ela venceu a barreira do tempo por causa de sua beleza ímpar.

Do You Know Who I Am? (Bobby Russell) - Imagine saltar de sessões de trilhas sonoras ruins e fracas como "Charro" e "Speedway" direto para essa fantástica sessão de gravação do American Sound! A diferença de qualidade era algo de absurdo. Aqui Elvis interpreta uma música do cantor e compositor Bobby Russell. Ele foi um artista bem famoso e badalado no meio country de Nashville entre meados dos anos 60 e o começo dos anos 70. Entre 1966 e 1973 Russell conseguiu emplacar cinco grandes discos de sucesso. O curioso é que Elvis podia, em uma mesma sessão, interpretar velhos clássicos country das décadas de 1940 e 1950 e ao mesmo tempo registrar músicas contemporâneas que estavam fazendo sucesso nas rádios sulistas de country na mesma época em que ele as gravava. Era um cantor eclético e atemporal. É o caso de " Do You Know Who I Am?". A versão original de seu autor foi lançada um ano antes de Elvis gravá-la. No single original ela eram bem mais country, com todos aqueles instrumentos e arranjos bem característicos da música rural americana. Elvis e o produtor Felton Jarvis resolveram suavizar um pouco mais esse aspecto, dando-lhe uma roupagem mais moderna e urbana. A letra foi justamente o que atraiu Elvis. O próprio título com a pergunta "Você Sabe Quem Eu Sou?" fez com que Elvis se identificasse imediatamente com a mensagem. Ele já havia dito em entrevistas que o artista e o ser humano costumavam ser coisas bem distintas. E pessoas que viveram ao seu lado, mesmo sua esposa Priscilla, sempre deixaram claro que na verdade conhecer o verdadeiro Elvis Presley era uma das coisas mais complicadas de se fazer. Na poesia da canção o tema central é o reencontro. O autor, em primeira pessoa, indaga, em um casual e inesperado reencontro, se a mulher amada realmente poderia ainda dizer que o conhecia. Haveria ainda a possibilidade de um retorno aos velhos tempos mesmo após tantos anos? O clima é de leve melancolia. Como eu escrevi no começo a diferença entre as bobas canções de filmes e essas novas músicas, com melodias e letras extremamente mais bem elaboradas era realmente algo abissal. Elvis saiu da adolescência inocente da carreira para a maturidade plena em poucos meses. Um feito e tanto.

From a Jack to a King (Ned Miller) - Priscilla Presley adorava essa canção. Era uma de suas preferidas do American. Isso de deve muito ao fato de Elvis ter o single original (lançado em 1957 por Ned Miller, cantor country). Sempre ouvindo a canção em casa a sua melodia acabou sendo quase uma trilha sonora para o namoro de Priscilla, principalmente depois que ela foi morar em Graceland ao lado de Elvis. A canção ainda teve outras versões ao longo dos anos, em especial a de Jim Reeves em 1962, cujo single Elvis também comprou (repare na data, 1962, o mesmo ano em que Priscilla foi morar em Memphis). Como virou uma espécie de standard do country music "From a Jack to a King" ganhou ainda muitas outras gravações depois da de Elvis no American. A mais recente foi gravada em 1988 na voz do cantor Ricky Van Shelton. Particularmente eu não gosto muito desse country, mas essa é meramente minha opinião pessoal. Acho que sua melodia é um pouco estranha, fora do convencional, com um ritmo pouco atraente. Enfim, um ponto de vista bem subjetivo, pessoal. A letra também nunca me agradou muito. O autor fez uma analogia entre jogo de cartas e romance. Algo que soa hoje em dia meio brega. O uso de um anel de casamento nos versos só piora ainda mais a situação. Talvez a Priscilla estivesse obcecada em se casar com Elvis, daí sua identificação com a letra, quem sabe... Mesmo assim, como se trata de Elvis Presley, você sabe que no mínimo terá uma boa interpretação pela frente. O curioso é que o produtor Chips Moman tentou mudar os arranjos, mas Elvis dessa vez preferiu ser mais fiel ao espírito country and western. Para Elvis não havia como mudar o jeito da canção já que ela seria assumidamente muito country, impossível de mudar. Basta imaginar um bando de cowboys ao redor de uma mesa jogando cartas para entender bem isso. Para reforçar então suas origens o músico John Hughey, especialista em Steel Guitar em Nashville (a capital mundial da música caipira e rural americana), foi especialmente contratado para se unir à banda de Elvis. Enfim, uma prévia do que Elvis iria fazer nos anos 70, com muito country em seus álbuns.

The Fair's Moving On (Fletcher / Flett) - Essa canção foi lançada como lado B do single "Clean Up Your Own Back Yard", tema do filme "The Trouble With Girls" (Lindas encrencas, as garotas, 1969). É mais um country. É a tal coisa... Tanto o Coronel Parker como Elvis pensavam principalmente em seu público. E qual era esse público? Certamente não era o internacional. Elvis não gravava seus discos pensando em Londres, Paris ou Madrid. Elvis gravava seus álbuns pensando nos estados do sul dos Estados Unidos, onde ele fazia suas turnês e era adorado por sua faixa de fãs mais fiel e leal. Por essa razão temos um certo excesso de country music em seus discos, principalmente a partir de 1969. É interessante notar que em pouco tempo Elvis estaria de volta às turnês e essas seriam realizadas em sua grande maioria justamente para os sulistas americanos. E essa gente vivia sob a forte influência cultural de Nashville, a capital mundial do country. Por isso tantos discos de Elvis tiveram essa linha. Ele gravava pensando nisso e o repertório mais voltado para esse tipo de música era gravado para que Elvis também o utilizasse em shows. "The Fair's Moving On" é apenas na média. A letra da canção tinha tudo a ver com o enredo de "The Trouble With Girls". No filme Elvis interpretava um gerente de um parque de diversões itinerante. Um tipo de circo de variedades que era muito popular no começo do século XX nos Estados Unidos. Enquanto ele ia de cidade em cidade ia conhecendo novas pessoas, se envolvendo com as garotas locais e a vida seguia em frente, tudo pensando na próxima cidade a se visitar. Veja esses versos: "Todos os caminhos já foram percorridos / É tarde e não sobrou nenhum prêmio a ser ganho / Os caminhos estão fechados, é o fim do dia / Os cavalos estão indo embora / Sim, o parque está indo embora / E logo mais eu também irei". Dá para perceber bem que é aquele tipo de música que só fazia muito sentido dentro da temática do filme. O curioso é que ela não foi gravada nas sessões de gravação da trilha sonora de "The Trouble With Girls", mas bem depois, quando Elvis já estava empenhado nas sessões do American Studios, trabalhando inclusive com outra banda. Uma verdadeira estranha no ninho dentro daquela coleção de músicas.

You'll Think of Me (Mort Shuman) - Essa canção ficou notabilizada dentro da discografia de Elvis por ter sido o lado B do single de grande sucesso comercial "Suspicious Minds". Por isso acabou pegando carona com o hit principal do compacto e acabou se tornando relativamente bem conhecida. Outro fato que chama a atenção é que ela foi composta por Mort Shuman. Ao lado de Doc Pomus ele escreveu dezenas de músicas para Elvis na década de 60. Ele era um talentoso pianista e conseguia sempre escrever temas que caíam no gosto popular. O sucesso que abriu as portas para sua carreira foi a linda "Save The Last Dance For Me", gravada pelo grupo The Drifters, que logo se tornou um imenso hit, chegando ao topo da Billboard. A partir daí vários cantores encomendaram músicas à dupla. Para Elvis, Shuman escreveu entre outras o tema principal do filme "Viva Las Vegas", além de "Little Sister" e "(Marie's the Name) His Latest Flame" que acabaram se transformando em singles premiados com discos de ouro. Essa gravação assim acabou se tornando uma despedida de Shuman da discografia de Elvis, sem parceria dessa vez com Pomus. Um trabalho solo. A letra da música fala em despedida. Na primeira pessoa o autor se despede do grande amor de sua vida. Há um ressentimento em suas palavras, como se ela tivesse feito algo que o magoou. Isso porém fica sempre subentendido, nada é dito de forma muito clara. Para o autor aquela que ficará para trás vai se arrepender do fim desse amor. Isso fica bem claro logo na primeira estrofe: "Desculpa, garota, mas vou te deixar / Há algo profundo em minha alma que me chama / O vento do inverno, garota, não vai te enganar / E na sua cama vazia e fria, você vai pensar em mim...". O curioso é que nos versos o autor também deixa claro que é um caso perdido, que nunca se ligará fortemente com ninguém por ter "um coração perturbado" e uma alma livre. Ecos de um romance que nunca daria realmente certo. O arranjo ficou bem bonito. Há um verdadeiro "diálogo" entre guitarra e baixo ao fundo que funcionou muito bem. Some-se a isso o belo acompanhamento vocal feminino (que era uma novidade nas gravações de Elvis na época) e você terá uma bela faixa, com boa letra e performance bonita de Elvis e seus músicos.

Without Love (There is Nothing) (Danny Small) - Essa é uma velha canção dos anos 50. Ela foi gravada inicialmente por Clyde McPhatter, um cantor negro de R&B e soul em 1957. O single se destacou nas paradas conseguindo uma ótima nona posição entre os mais vendidos na lista Billboard Hot 100, a mais importante da indústria americana. Anos depois o guitarrista Scotty Moore afirmaria que essa música vinha sendo ensaiada por Elvis desde os tempos da Sun Records. Ele tentava gravar, mas por uma razão ou outra isso nunca acontecia. Moore provavelmente se enganou, pois o single original dela só foi lançada em 1957, quando Elvis já estava na RCA Victor. Por essa razão ele nunca chegou a ensaiá-la nos tempos da Sun Records simplesmente porque ela ainda não existia naquela época. É certo que o guitarrista confundiu datas, gravadoras e sessões de gravação, algo esperado de uma pessoa de sua idade. De qualquer forma o mais importante nessa informação é o fato de que Elvis vinha planejando gravá-la há muito tempo, algo que ele conseguiu concretizar no American Studios. Essa canção foi a escolhida para fechar o disco. É uma faixa triste, com acompanhamento melancólico. Sua introdução conta apenas com um dueto entre a voz de Elvis e piano. Depois sutilmente entra o coro vocal feminino, tudo culminando em uma explosão de sentimentos no refrão que é claro em sua mensagem: "Sem Amor (Não existe Nada)". O curioso é que sem saber disso Elvis a gravou em um momento em que dois outros grandes astros a registravam também em estúdio, com suas respectivas versões. A primeira a sair foi a de Ray Charles. Três meses depois outro single com a mesma música chegava nas lojas, dessa vez na voz de Tom Jones. Com isso as chances comerciais da versão de Elvis ficaram nulas. Certamente uma terceira versão em poucos meses não chamaria mais a atenção do público. A RCA prevendo isso a colocou discretamente fechando ambos os álbuns ( Back in Memphis e From Memphis to Vegas – From Vegas to Memphis). Foi uma boa escolha pois o clima da melodia se adequava perfeitamente com a proposta dos discos em questão.

Elvis Presley - Back in Memphis (1969) - Elvis Presley (voz, violão, baixo e piano) / Reggie Young (guitarra) / Tommy Cogbill (baixo) / Mike Leech (baixo) / Gene Chrisman (bateria) / Bobby Wood (piano) / Ronnie Milsap (piano) / Bobby Emons (orgão) / John Hughey (steel guitar) / Ed Kollis (harmonica) / Sonja Montgomery, Mary Green, Mary Holladay, Donna Thatcher, Susan Pilikington & Sandy Bolsey (vocais) / Charlie Hodge (vocais) / The Memphis Horns (metais) / The Memphis Strings (cordas) / Orquestra Sinfônica Municipal de Memphis / Felton Jarvis (produção) / Chips Moman (produção) / Data de gravação: 13 a 22 de janeiro e 17 a 22 de fevereiro de 1969 / Gravado no American Studios, Memphis / Data de lançamento: Novembro de 1969 / Melhor posição nas charts: # 12 (Billboard) e # 3 (UK).

Pablo Aluísio.

Elvis Presley - Elvis in Person at the International Hotel, Las Vegas, Nevada (1969)

Blue Suede Shoes (Carl Perkins)
A versão de "Blue Suede Shoes" desse álbum foi a terceira a ser lançada na discografia oficial de Elvis. Recordando: a primeira vez que esse clássico rock surgiu na voz de Elvis foi em seu primeiro LP na RCA Victor, logo após ele assinar com a gravadora, em 1956, o grande ano de sua fase como roqueiro. Ela abria o lado A do disco e havia sido gravada nas primeiras sessões do cantor na nova empresa. Essa gravação é considerada uma das melhores já realizadas pelo então chamado Rei do Rock. Quatro anos depois Elvis gravou "Blue Suede Shoes" novamente, dessa vez para a trilha sonora do filme "Saudades de um Pracinha" (GI Blues, 1960). Eu sempre gostei muito dessa segunda versão principalmente pelo fato de ser extremamente bem gravada, com ótimo arranjo. Não tem o mesmo feeling roqueiro da primeira versão, mas supera essa em termos de performance e execução. Não resta dúvida que foi muito bem trabalhada em estúdio. Por isso a considero um verdadeiro primor de Elvis durante os anos 60. Embora "Blue Suede Shoes" seja uma criação de outro astro da Sun Records, o grande Carl Perkins, ela sempre foi muito associada a Elvis e por essa razão era de se esperar que mais cedo ou mais tarde voltasse à sua discografia oficial. E foi o que de fato aconteceu. Em 1969 ela ressurgiu aqui, dessa vez gravada nos palcos de Las Vegas. Devo dizer que é uma excelente gravação, com Elvis e sua TCB Band extremamente empenhados em dar o melhor de si. Há uma introdução musical que fazia parte dos primeiros concertos de Elvis em Vegas, pois na época ele ainda não usava a conhecida "Also Sprach Zarathustra", composição clássica de Richard Strauss. Pois bem, essa abertura que ouvimos nesse álbum foi gravada justamente no concerto do dia 25 de agosto, quando a RCA montou seu equipamento de gravação no showroom do International Hotel justamente para aproveitá-la naquele que seria o primeiro disco ao vivo de Elvis em Las Vegas. Infelizmente temos que reconhecer também que logo Elvis perderia o interesse por "Blue Suede Shoes" nos shows que viriam. Seria notório que a execução desse clássico iria se tornar, com o passar dos anos, mais displicente e negligente por parte de Elvis. Não raro ele a cantava em medíocres versões com menos de um minuto de duração! O que teria acontecido? Penso que o repertório de Elvis ficou tão sofisticado e pessoal a partir de determinado momento de sua carreira ao vivo que "Blue Suede Shoes" acabou ficando ofuscada, diria até mesmo obsoleta. Quando Elvis a gravou pela primeira vez ele era apenas um jovem de vinte e poucos anos. O tempo passou e o velho rock foi perdendo o sentido para o cantor. Algo normal de acontecer. Na maioria das vezes só servia mesmo como um lembrete de que aquele cantor que estava no palco na frente de seu público havia sido um dos nomes mais importantes da história do rock e seu surgimento. Nada muito além disso.

Johnny B. Goode (Chuck Berry)
Outra canção a surgir pela primeira vez na discografia oficial de Elvis nesse álbum foi "Johnny B. Goode", o clássico rock de Chuck Berry. A música foi originalmente lançada em 1958 na gravadora Chess de Chicago. Durante anos a RCA Victor sugeriu a Elvis que gravasse sua versão em estúdio já que esse sempre foi considerado um dos mais celebrados rocks da história, mas Elvis sempre declinava do convite. Para muitos o fato de Elvis nunca ter gravado a música em estúdio nos anos 60 se deveu ao fato dela ser uma verdadeira marca registrada de Chuck Berry, extremamente conhecida e identificada com esse artista. Faz sentido. Se formos analisar bem a carreira de Elvis perceberemos que, com algumas exceções, o cantor preferia gravar canções menos conhecidas, que não fosse hits absolutos de outros cantores. Para isso basta olhar bem o exemplo de Chuck Berry. Ao invés de gravar "Johnny B. Goode" em estúdio Elvis preferiu fazer versões de músicas menos conhecidas dele, como por exemplo, "Memphis Tennessee". Por isso, embora seja um marco da primeira geração de roqueiros americanos, Elvis nunca a tenha gravado oficialmente em estúdio. Já uma versão ao vivo era outra história. Em concertos Elvis se sentia mais livre e solto de amarras. A versão que ouvimos aqui, gravada na primeira temporada em Las Vegas, tem todo o vigor e energia necessários para transformá-la naquela que talvez seja a melhor performance de Elvis da canção. É verdade que outras versões seriam lançadas em discos oficiais, com destaque para a do álbum duplo "Aloha From Hawaii", mas aquela, embora fosse boa, já não tinha mais o pique de antes. Aqui no "In Person" havia aquela vontade de dar certo, de se apresentar bem, isso depois de anos afastado dos palcos. Elvis nessa primeira temporada queria provar a todos que ainda era um grande artista de palco, acima de tudo. Esse foi o diferencial. O destaque em termos de banda, não poderia ser dado a outro músico, pois quem realmente arrasa nessa execução é o guitarrista James Burton. Vindo do grupo de Ricky Nelson, Burton acabou virando um dos principais elementos da TCB Band. Sua atuação aqui foi certamente irrepreensível.

All Shook Up (Otis Blackwell / Elvis Presley)
Embora tenha sido um dos maiores cantores de todos os tempos o fato é que Elvis Presley não levava jeito para compor músicas. Definitivamente ele não era um compositor, fato que ele próprio reconheceu em muitas entrevistas. Na verdade Elvis era um intérprete fenomenal, mas seu talento musical era restrito aos vocais e nada muito além disso. Não há nada de errado nesse aspecto, sendo apenas uma característica sua como artista. Ele não compunha e tocava apenas o básico de certos instrumentos como violão e piano. Dito isso é curioso ver que um de seus maiores sucessos foram creditados a ele. "All Shook Up" ainda hoje é citada como uma composição da dupla Otis Blackwell e Elvis Presley. A verdade foi que Elvis contou a Steve Sholes um estranho sonho que tivera na noite anterior ao de uma sessão de gravação em Nova Iorque. O produtor então ligou para Blackwell para que ele providenciasse um tema em cima disso e assim a canção foi composta. De forma bem divertida e rindo muito Elvis explicaria depois que a inclusão de seu nome na criação dessa música era uma "grosseira tapeação". Pois bem, sendo dele ou não, pouco importa. O fato é que Elvis tinha que voltar com força total aos palcos de Las Vegas após passar vários anos sem realizar shows, se concentrando apenas nos filmes e em suas trilhas sonoras. Por isso era necessário também valorizar seu próprio legado de sucessos. Assim esse novo arranjo foi criado, muito em cima da versão que já havia sido apresentada no NBC TV Special no ano anterior. Como era de praxe nesses antigos rocks Elvis não a levou muito à sério. Era a oportunidade de levantar o público, apresentar algum coreografia agitada e nada muito além disso. É interessante notar que nessa primeira temporada em Vegas Elvis veio com fúria total no palco, porém aos poucos ele foi percebendo que o público da cidade era um pouco diferente daquele que ele encontrara nos anos 50. A maioria era formada de casais na meia idade, todos eles sentados confortavelmente em suas mesas. Algo bem diferente das plateias formadas por jovens adolescentes gritantes de seus anos como roqueiro. Por isso ao longo do tempo Elvis foi colocando seus rocks antigos meio de lado, valorizando canções mais de acordo com aquele público, diria, mais conservador e comportado.

Are You Lonesome Tonight? (Lou Handman / Roy Turk)
Depois que Elvis Presley retornou da Alemanha, onde havia estado por longo tempo para cumprir seu serviço militar, o Coronel Parrker e a RCA Victor decidiram que era o momento dele promover mudanças em sua carreira. A imagem do Elvis roqueiro, rebelde e selvagem, não era mais adequada. Parker tinha planos de transformar Elvis em um astro galã de Hollywood ao velho estilo. Nada de associações com James Dean, Marlon Brando ou com o Rock. O mundo musical havia mudado desde que Elvis fora embora. Os antigos ídolos roqueiros estavam com problemas legais, alguns deles tinham sido presos e não era mais conveniente se associar a esse tipo de coisa. Havia um estigma ruim ligando o rock e a criminalidade, dentro da imprensa e da sociedade americana. Assim Elvis foi remodelado, transformando-se de jovem roqueiro desafiador em um bom moço, cumpridor dos deveres patrióticos, cantando músicas romântica e ternas. Músicas mais agitadas? Apenas se fossem do estilo pop suave. Dentro dessa nova diretriz uma canção como "Are You Lonesome Tonight?" era mais do que adequada. Era o tipo de som que iria imperar nos álbuns e singles do cantor dali para frente. Na verdade "Are You Lonesome Tonight?" era uma regravação de um antigo sucesso da década de 1920, ainda no alvorecer da nascente indústria fonográfica americana. Antes do advento dos gramofones e dos discos de cera (que foram anteriores ao vinil), os compositores ganhavam dinheiro vendendo as partituras de suas músicas em lojas de instrumentos musicais. Como quase toda casa nos Estados Unidos tinha um piano ou alguém que soubesse tocar algum instrumento (a educação musical vinha das escolas públicas) era natural que a venda dessas melodias e letras impressas trouxessem algum retorno financeiro para seus criadores. Esse mundo que já não existe há quase cem anos foi o mesmo em que "Are You Lonesome Tonight?" surgiu. Segundo alguns historiadores a música foi composta por volta de 1910 ou até antes disso. Só depois de alguns anos foi gravada pela primeira vez. Por causa de sua antiguidade a canção trazia um trecho falado, muito popular nos tempos do cinema mudo, que Elvis resolveu manter em sua gravação original no começo dos anos 1960. Curiosamente nos palcos essa parte acabava sendo alvo de brincadeiras por parte de Elvis, o que não deixa de ser uma pena, uma vez que o aspecto histórico dessa composição sempre foi um de seus maiores atrativos.

Hound Dog (Leiber / Stoller)
O que aconteceu com "Blue Suede Shoes" acabou acontecendo também com "Hound Dog". Aliás algo semelhante foi ocorrendo com todos os rocks clássicos de Elvis dos anos 50, ou seja, ele foi perdendo o interesse nessas músicas conforme os anos foram passando. Em determinado momento as execuções de Presley foram ficando medíocres, uma mera sombra de um passado glorioso. Nessa primeira temporada de 1969 o cantor ainda dava energia nas apresentações dessas canções, mas depois realmente a perda de seu interesse foi ficando óbvia. Uma pena porque "Hound Dog" foi um símbolo de uma era. Basta lembrar de suas históricas apresentações na TV americana nos anos 50 para entender bem isso. Claro que em Las Vegas "Hound Dog" não poderia mais surgir no palco como foi gravada nos anos 50. O rock puro, com apenas quatro instrumentos, foi modificado. Havia uma orquestra inteira com Elvis no palco e por essa razão um arranjo com muitos metais foi escrito. Além disso a guitarra foi colocada em primeiro plano, com James Burton em destaque, algo que não existia na versão original com Scotty Moore. É interessante que esse rock de Leiber e Stoller foi também um dos que mais receberam arranjos diferentes ao longo do tempo. Nos anos 70 iríamos ouvir nos concertos de Elvis além daquelas mini versões irrisórias - que duravam menos de um minuto - outras bem diferenciadas, com um certo molejo, outras vezes um pouquinho jazz e até mesmo - pasmem! - uma versão com ritmo de discoteca! Não sei como essa última foi feita pois Elvis simplesmente odiava discoteca. Enfim, muito provavelmente ele estava tão desinteressado por "Hound Dog" que simplesmente deixou pra lá, sem ligar para o que estavam fazendo com ela.

I Can't Stop Loving You (Don Gibson)
O álbum "Elvis in Person at the International Hotel, Las Vegas, Nevada" foi um desdobramento do disco duplo "From Memphis to Vegas / From Vegas to Memphis" e trazia apenas as canções gravadas ao vivo por Elvis em Las Vegas na sua primeira temporada na cidade (realizada em agosto de 1969). Como era de se esperar em um concerto ao vivo Elvis interpretou vários sucessos de sua carreira. O LP aliás abria com uma seleção deles, "Blue Suede Shoes", "All Shook Up", "Are You Lonesome Tonight?" e "Hound Dog". Não vou escrever sobre essas músicas porque já falei sobre elas antes. Vamos nos ater apenas naquelas que surgiam pela primeira vez na discografia oficial de Elvis. Assim a primeira inédita desse disco era o country "I Can't Stop Loving You" de Don Gibson. Essa é uma velha música lançada pela primeira vez em 1957 pelo próprio autor na RCA Victor. Desde que a ouviu pela primeira vez Elvis a adorou, chegando inclusive a cogitar gravá-la ainda naquele ano. Só desistiu por causa do produtor Steve Sholes que o aconselhou a não misturar seu trabalho na época (em sua fase mais roqueira) com o sucesso de outro artista country. Realmente naquela fase não havia espaço para essa música na discografia de Elvis. Já em Las Vegas, 1969, o contexto era outro. Elvis selecionou um repertório que fosse ao mesmo tempo um revival de seus anos de glória - que aconteceram justamente na década de 1950 - com uma nova seleção musical que também fosse de seu gosto pessoal, que lhe agradasse. A despeito disso nunca considerei "I Can't Stop Loving You" uma grande canção. Ela tem todas as matrizes que fazem parte do universo country mais comercial de Nashville - entre eles os arranjos excessivos e a letra piegas e sem novidades. Muito provavelmente Elvis e o Coronel Parker já estivessem de olho nas turnês que realizariam em cidades do sul dos Estados Unidos e a incluíram na lista dos shows, já que ela era considerada naqueles tempos uma das grandes representantes do som rural do Tennessee, um verdadeiro standard. Curiosamente Elvis nunca a gravou em estúdio oficialmente. Em termos de discografia oficial a canção retornaria mais uma vez no LP "Welcome to My World" de 1977. Essa foi uma coletânea com claro sabor country, repleta desse tipo de estilo musical. A capa era excelente, mas o conteúdo era formado apenas por reprises. Em suma, não vejo "I Can't Stop Loving You" como um grande momento musical na carreira de Elvis, embora seja inegável que o cantor a apreciava, sempre a interpretando em inúmeras turnês e concertos realizados nos anos 70. Só indicada mais firmemente para quem aprecia especialmente o lado mais country de sua carreira.

My Babe (Willie Dixon)
A Chess foi uma gravadora muito importante na história da música americana. Ela foi fundada por dois irmãos (Phil e Leonard) que tinham o objetivo de explorar o rico cenário musical negro na Chicago dos anos 1950. A ideia deu extremamente certa e em pouco tempo a Chess estava colecionando sucessos nacionais. Assim como a Sun Records, o segredo vinha da revelação de novos valores, músicos talentosos, mas desconhecidos, que tinham sua primeira oportunidade no selo. Willie Dixon foi um desses cantores e compositores negros que tiveram sua grande oportunidade na Chess. De origem humilde ele ganhava a vida tocando blues em bares e pequenos festivais do sul, onde nasceu. Mais tarde se mudou para Chicago em busca de trabalho. Acabou caindo nas graças dos irmãos Chess e conseguiu finalmente gravar seus primeiros singles. "My Babe" foi lançada como compacto em 1955. Ele apenas adaptou a canção "This Train (Is Bound For Glory)" da cantora gospel Rosetta Tharpe, mudando sua letra original, retirando seu teor religioso, a transformando num típico R&B que a cada dia ia ficando mais popular. Essa ideia seria também aproveitada por Ray Charles na criação de seu hit "I Got a Woman". No lado B Dixon encaixou a instrumental "Thunderbird". O single fez sucesso e chegou a se destacar na parada nacional de blues da Billboard. Elvis, que sempre foi um admirador da música negra americana, logo pensou em "My Babe" para seus shows em Las Vegas. Ela seria apresentada numa versão mais rocker, sem seguir fielmente os arranjos originais. Vinte anos tinham se passado e não havia como resgatar aquela sonoridade clássica mais ao estilo blues. "My Babe" acabou se tornando um dos pontos altos da primeira temporada de Elvis no International Hotel, mas curiosamente não teve vida longa nos palcos. Embora bastante agitada, com refrão pegajoso, ela também se tornava um pouco cansativa para Elvis e banda por causa das repetições de sua letra e melodia. Elvis jamais a gravou em estúdio, nunca tendo sido reaproveitada dentro de sua discografia oficial. Da maneira como foi executada por Elvis e a TCB Band ela realmente só tinha vocação para os concertos ao vivo. Uma canção para levantar o público, nada muito além disso. A letra é básica, se formos extrair mesmo sua essência e conteúdo teremos apenas uma ou duas linhas relevantes. O que vale é a repetição do refrão e a melodia de blues, tudo de acordo com o gênero. O embalo é certamente sua maior qualidade.

Mystery Train / Tiger Man (Parker / Phillips / Hill Louis / Burns)
Há um consenso geral entre analistas sobre música de que Elvis Presley não deu o tratamento merecido e adequado a vários de seus rocks clássicos dos anos 50 quando retornou aos palcos em fins dos anos 60 e depois na sua longa trajetória na estrada pelos anos 70 afora. Todos esses sucessos surgiam em versões preguiçosas, mal executadas, com Elvis pouco empenhado em apresentar uma boa versão ao vivo. Existiram porém algumas exceções. Um exemplo veio, por exemplo, nesse medley "Mystery Train / Tiger Man". A primeira canção é uma verdadeira obra prima gravada originalmente na Sun Records. Sua gravação deu origem a um dos cinco mitológicos acetatos que Elvis gravou e lançou pela pequenina gravadora de Memphis quando era apenas um cantor promissor e praticamente desconhecido fora dos limites de sua cidade. O produtor Sam Phillips certamente não contava com  maiores recursos técnicos na época, porém era mestre em criar sonoridades diferentes em seu pequeno e acanhando estúdio. "Mystery Train" era a prova de seu talento nesse aspecto. Já "Tiger Man" surgiu na carreira de Elvis durante as gravações do NBC TV Special. A letra é bem tolinha para falar a verdade, mas tinha um feeling rocker que há tempos não se via na discografia de Elvis. Era algo que fazia falta naquele momento. Cumpriu seus propósitos. Sozinha ela poderia não ter força suficiente para empolgar o público em um show, mas em medley com o clássico da Sun a coisa poderia ficar muito interessante. Palmas para o maestro Bergen White que foi o responsável pela ideia e pelos arranjos para o grupo orquestral que tocou ao lado de Elvis no palco do International Hotel naquela sua primeira temporada. O medley foi apresentado a Elvis durante os ensaios. Assim que ouviu o arranjou ele disse imediatamente: "É isso aí, vamos usar no concerto de hoje à noite". Na ocasião ficou tão satisfeito com tudo que até mesmo criou uma coreografia própria para o medley, resultando em um dos melhores momentos desse álbum ao vivo. Um exemplo perfeito de como um velho material poderia muito bem render ainda ótimos momentos nessa nova fase de sua carreira.

Words (Robin Gibb / Barry Gibb / Maurice Gibb)
Houve um claro divisor de águas na carreira de Elvis a partir do momento em que ele retornou aos shows ao vivo em 1969. Durante toda a década de 60 Elvis havia se enfurnado dentro do estúdio produzindo um material que lhe era imposto pela gravadora RCA Victor e demais companhias de cinema. Esses álbuns produzidos do tipo Made in Hollywood tinham pouca coisa a ver com o que acontecia lá fora, no mundo real. A maioria das músicas só faziam sentido dentro do contexto das cenas dos filmes. Os arranjos tinham parado no tempo e qualquer polêmica envolvendo as letras era sumariamente eliminada pelos produtores. Elvis vivia em uma espécie de bolha. Não é de se admirar que conforme o tempo foi passando seus discos deixaram de vender bem. Pois bem, quando voltou aos concertos ele precisou se atualizar, cantar um repertório que criasse uma ligação com o gosto popular novamente. Não haveria mais câmeras e nem cenas enlatadas. Elvis tinha que encarar seu público face a face e fazer com que eles voltassem a gostar dele. Por isso o repertório mudou tanto. Elvis tinha que catar os sucessos das paradas para agradar as pessoas que tinham comprado um ingresso para vê-lo ao vivo. "Words" do Bee Gees vai justamente nessa direção. Elvis tinha pouca coisa a ver com musicalidade desse grupo que era muito bom e tudo, mas que não seguia uma linha que pudesse ser associada ao trabalho que ele próprio havia realizado em sua carreira artística em todos aqueles anos. Então por que Elvis resolveu apresentar sua própria versão desse hit do grupo Bee Gees? Simplesmente porque era sucesso nas rádios, tocando o tempo todo. Elvis queria acima de tudo demonstrar que estava novamente se religando ao que estava no topo do gosto popular, mesmo que ele próprio não fosse lá muito fã desse grupo. Em minha concepção penso que a versão de Elvis para "Words" ficou muito boa. Tal como outras canções desse álbum, Elvis também não a gravou oficialmente em estúdio. É uma versão rápida, não muito bem trabalhada, mas que conta com uma boa performance de Elvis, além dos elogios sempre merecidos para a banda de apoio, com ênfase para os tecladistas (Glen Hardin, em especial). Além da boa sonoridade "Words" também é uma raridade já que em pouco tempo Elvis a descartaria do repertório de seus concertos. Pelo visto o cantor não se empolgou muito com a canção como um todo. Ossos do ofício.

In the Ghetto (Mac Davis)
Essa foi a segunda vez que a música "In the Ghetto" apareceu na discografia de Elvis. Antes ela havia feito um belo sucesso de crítica e público quando foi lançada como single em 1968. Essa música foi um raro exemplar de música política dentro da carreira de Elvis Presley. Era fato notório que o Coronel Parker não queria que Elvis desse declarações públicas sobre suas opiniões políticas. Assuntos como guerra do Vietnã, luta pelos direitos civis das minorias e suas preferências partidárias eram proibidos por Tom Parker. Em uma época muito intensa nesse campo, principalmente dentro dos Estados Unidos, toda a imprensa (e o público) queriam saber o que Elvis Presley pensava sobre tudo o que estava acontecendo, mas em entrevistas Elvis era instruído a sempre sair com respostas evasivas. Provavelmente se Elvis tivesse falado o que pensava iria surpreender muita gente. Ele era um conservador na verdade, votava no partido republicano e tinha ideias patrióticas bem definidas sobre a intervenção americana no Vietnã. Elvis, que tinha sido militar no final dos anos 1950, tinha uma postura bem clara sobre o que estava acontecendo dentro da sociedade americana. Ele achava um absurdo que outros artistas, como Jane Fonda ou John Lennon, fossem contra a guerra. Para Elvis o importante era apoiar as tropas americanas no exterior. Ser um patriota, acima de tudo. Já no campo da luta dos direitos dos negros ele tinha uma postura bem mais liberal. Elvis cresceu em Memphis, um dos polos mais racistas do sul americano (que por si só já era uma região absurdamente separatista entre negros e brancos). Por exemplo, Elvis estudou em um colégio onde apenas brancos podiam estudar. Os banheiros, ônibus e até estabelecimentos comerciais de sua cidade eram separados. Havia bairros onde apenas brancos poderiam morar. Aos negros eram destinados os piores lugares da cidade, muitas vezes sem infra estrutura alguma. Até as igrejas evangélicas eram separadas. Mesmo assim, com toda essa segregação, desde muito jovem Elvis criou uma intensa curiosidade sobre a cultura dos negros. Ele ouvia preferencialmente estações de rádio voltados para o público negro e foi dessa convivência que ele tirou grande parte de sua musicalidade. Por isso não foi surpresa que tenha sido acusado no começo de sua carreira de ser "um cantor branco cantando músicas de negros". Assim "In The Guetto" de Mac Davis era um sopro de novidade em sua discografia. Uma letra que tinha muito o que dizer e que em última análise funcionava justamente como uma declaração pública mesmo que indireta do próprio Elvis sobre a situação precária em que vivia o negro norte-americano, sofrendo todos os tipos de preconceitos desde a mais tenra idade.

Suspicious Minds (Mark James)
Foi justamente nesse álbum "Elvis in Person" que pela primeira vez surgiu na discografia de Elvis uma versão ao vivo do grande sucesso "Suspicious Minds". Essa música, gravada maravilhosamente bem nas sessões do American Studios em Memphis, foi um verdadeiro alívio para Elvis Presley. Fazia sete anos que ele não conseguia atingir o primeiro lugar na parada de singles da Billboard. Essa era considerada a mais importante dos Estados Unidos, um verdadeiro termômetro do sucesso de cada artista dentro da indústria fonográfica. Desde "Good Luck Charm" em 1962 Elvis não conseguia chegar lá, bem no topo. Era um reflexo de como Hollywood e suas trilhas sonoras tinham arruinado o lado musical de Elvis. Dentro da indústria da música ele já não tinha mais muito prestigio, justamente pelos vários fracassos comerciais que foi colecionando ao longo dos anos 60. Para quem havia surgido no mercado como um dos maiores vendedores de discos da história era uma situação constrangedora e até mesmo vergonhosa. Assim "Suspicious Minds" serviu para melhorar sua posição dentro do mercado fonográfico, ao mesmo tempo em que passava a relevante mensagem para todos de que, apesar de tudo, Elvis ainda estava vivo musicalmente e ainda podia surpreender. O tema de "Suspicious Minds" é o ciúme. Basicamente é uma mensagem sobre um casal que vê seu relacionamento ruir por causa da desconfiança, das suspeitas. Quando foi lançada e começou a fazer sucesso nas paradas alguns críticos implicaram com suas primeiras linhas escritas, que soavam esquisitas. Ela dizia: "Nós caímos em uma armadilha. E não posso sair dela". A tal armadilha era justamente as mentes desconfiadas, que se suspeitavam mutuamente. Um tipo de relacionamento que ia aos poucos se tornando doentio. Certamente muitos casais se identificaram, inclusive o próprio Elvis. Há tempos ele vinha ouvindo rumores de que sua esposa Priscilla estava tendo um caso extraconjugal. O problema é que o próprio Elvis era um marido infiel e resolveu não ir atrás das fofocas sobre sua mulher (e que iriam se revelar em um futuro próximo como bem verdadeiras). Assim acabou-se criando mais uma irônica coincidência entre uma letra de uma canção e a vida pessoal de Elvis, algo que ele iria propositalmente procurar nas gravações futuras de seus discos. Um reflexo de seus sentimentos em meras notas musicais.

Can't Help Falling In Love (Weiss / Peretti / Creatore)
A canção "Can't Help Falling In Love" fez parte do disco mais vendido da carreira de Elvis Presley, a trilha sonora do filme "Blue Hawaii" (Feitiço Havaiano, no Brasil). Considerado pelo Coronel Tom Parker o "produto perfeito", acabou sendo realmente um marco comercial para Elvis. Já para os críticos em geral, tanto da área musical como cinematográfica, o projeto como um todo não era grande coisa. As canções, com arranjos havaianos, só funcionavam bem em sua maioria dentro do contexto do filme. Fora dele soavam pouco interessantes para DJs e programadores de rádio da época. Uma das poucas exceções era justamente essa canção  Can't Help Falling In Love" que tinha uma bela melodia, extremamente bem escrita, embora com letra sem maiores recursos. Foi a música mais badalada do filme, sendo inclusive vendida como single. Duplamente vitoriosa do ponto de vista comercial, determinou o caminho que Elvis iria seguir nos próximos anos. Na volta aos palcos Elvis trouxe poucas canções de sua fase em Hollywood. A maioria das músicas que gravou para filmes realmente não serviam para apresentações ao vivo. Para não deixar esse longo momento de sua carreira sem representante em seus shows Elvis resolveu levar "Can't Help Falling In Love" para o desfecho de todas as suas apresentações após seu retorno em 1969. Isso levou Elvis a cantá-la literalmente mais de mil vezes ao longo de todos aqueles anos, até sua morte em 1977. Obviamente que a saturação atingiu sua performance em cheio. Por essa razão a versão definitiva em termos de qualidade seguiu sendo a primeira, gravada em estúdio, em 1961. Todas as suas execuções ao vivo deixaram sempre um pouco a desejar. Além disso nunca conseguiram reproduzir o lado mais melódico da gravação do filme. Aquele arranjo ao mesmo tempo lírico e terno deveria ter sido preservado pois era a maior qualidade da composição. De qualquer forma, como símbolo de sua despedida ao público, acabou servindo aos seus propósitos. Assim que dava a sua nota final Elvis corria para os bastidores enquanto Al Dvorin informava aos presentes que ele não se encontrava mais no recinto. "Elvis has left the building".

Elvis Presley - Elvis in Person at the International Hotel, Las Vegas, Nevada (1969) / Data de Gravação: Agosto de 1969 / Local de Gravação: Hotel International, Las Vegas, Nevada / Produção: Felton Jarvis, Glen D. Hardin, Glenn Spreen, Bergen White, Elvis Presley / Músicos: Elvis Presley (vocais, violão), James Burton (guitarra), Jerry Scheff (baixo), John Wilkinson (guitarra), Bob Lanning (bateria), Ronnie Tutt (bateria), Charlie Hodge (violão), Glen Hardin (piano), Larry Muhoberac (Piano, órgão), The Imperials (vocais), The Sweet Inspirations (vocais), Millie Kirkham (vocais), Bobby Morris e Orquestra. / Melhor posição nas paradas: #12 (Billboard USA)  #3 (Inglaterra) / Data de lançamento: Outubro de 1969.

Pablo Aluísio.

quarta-feira, 26 de janeiro de 2005

Elvis Presley - On Stage, February, 1970

C.C. Rider (Presley) - "On Stage - February 1970" foi o primeiro álbum gravado ao vivo por Elvis Presley a ser lançado na década de 70. De certa forma foi o pioneiro numa série de discos de grande sucesso de público e crítica. Saiam de cena as trilhas sonoras de filmes e entravam os discos gravados nas temporadas de Elvis em Vegas e nas suas turnês pelos Estados Unidos. A ideia desse primeiro disco foi bem interessante. Ao invés de lançar um LP aos moldes do anterior (Elvis in Person), trazendo um show na íntegra, com vários sucessos de Elvis gravados ao vivo, os produtores resolveram fazer uma seleção apenas com músicas inéditas dentro da discografia de Elvis. Assim iria satisfazer tanto o fã que estivesse em busca de um disco gravado no palco por Elvis como aquele que estivesse em busca de novidades, de material inédito do cantor. A faixa que abriu o disco foi justamente essa C.C. Rider que ao longo do tempo iria tradicionalmente abrir os concertos de Elvis nos anos 70. A origem da canção é desconhecida. Já na década de 1910 ela já era bem tocada por cantores de blues em bares no sul. Quem a criou? Provavelmente um desses artistas cujo nome se perdeu no tempo... Apenas em 1924 seria gravada pela primeira vez por Gertrude "Ma" Rainey ainda nos tempos dos acetatos de cera dos gramofones. Como era uma canção tradicional nunca desapareceu, sempre tocada em eventos pelos estados sulistas. Aqui Elvis a revitalizou, dando um arranjo mais moderno, mais rock ´n´ roll. Curiosamente se você tiver a oportunidade de encontrar uma cópia original do LP americano verá que a canção foi creditada no selo do disco ao próprio Elvis Presley. Na verdade Elvis não a compôs, mas sim ajudou nos arranjos. Esse fato acabou justificando a retificação nas reedições posteriores do disco quando então foi creditado da forma correta com a expressão "Arr: Elvis Presley". Essa primeira versão que ouvimos aqui é excelente, mais acústica do que as demais. Além disso soava como novidade, algo que não iria se repetir com a exaustão de execuções repetidas dos anos seguintes quando ela finalmente ficaria saturada.

Release Me (Miller / Pebworth / Yount) - Sempre gostei muito dessa regravação de Elvis de um velho sucesso da década de 1940, gravada originalmente por Ray Price. Ele foi um artista muito popular durante a adolescência de Presley em Memphis, sempre tocando nas emissoras de rádio da cidade. "For the Good Times", outro de seus sucessos radiofônicos, seria gravada também por Elvis em pouco tempo (sendo lançada no álbum "Good Times" de 1974). Assim Elvis resolveu dar uma nova roupagem a esse velho hit country, usando de certa maneira como base a versão posterior de Engelbert Humperdinck, que chegou, imagine você, a disputar com um single dos Beatles (Penny Lane / Strawberry Fields Forever), a primeira posição nas paradas de sucesso da Inglaterra! Assim você já pode perceber que "Release Me" já era muito conhecida quando Elvis a interpretou em Las Vegas em sua segunda temporada. Como o cantor queria trazer mais material renovador para seu repertório a canção acabou se enquadrando muito bem no que ele tencionava fazer nos palcos da cidade.<br /><br />Em termos de melodia e letra "Release Me" é bem simples, fruto da época em que foi composta, no período da II Guerra Mundial. Aqueles soldados americanos que estavam lutando na Europa só queriam ouvir uma boa música country para relembrarem suas namoradas que ficaram nos Estados Unidos. Por essa razão a mensagem era simples e fácil de entender. Nada muito intelectualmente sofisticado. Como se sabe muitos desses militares na Europa ou no Pacífico encontraram novos amores nas cidades por onde passavam, assim a letra trazia essa mensagem ao mesmo tempo nostálgica de um amor do passado e libertária em relação a novos relacionamentos. Em termos de carreira de Elvis eu costumo qualificar canções como essa como "músicas de palco". Elvis nunca a gravou oficialmente em estúdio e ela só foi lançada na discografia oficial justamente nessa versão ao vivo. A interpretação do cantor foi excelente nessa noite e de todas as performances de Elvis cantando "Release Me" ao longo de sua carreira essa é a certamente a melhor. Curiosamente Elvis também a descartaria rapidamente do repertório dos concertos, sem muita explicação. Assim ao longo dos anos ela seria sutilmente esquecida por Elvis e sua banda. Uma pena.

Sweet Caroline (Neil Diamond) - Um dos pontos altos da temporada de fevereiro de 1970 foi essa versão de Elvis para o sucesso de Neil Diamond, "Sweet Caroline". Essa era uma música bem recente nas rádios pois ela havia sido lançada como single (com "Dig In" no lado B) poucos meses antes. Elvis, como todos sabemos, era fã incondicional da música de Diamond, a tal ponto que ao longo de sua carreira gravou várias canções desse artista. Para sua apresentação no palco em Las Vegas acabou criando uma coreografia própria que ficou excelente. O grande diferencial da versão de Elvis para a original de Diamond vem dos arranjos. A música na voz de Neil Diamond soava mais pueril, com uma sonoridade bem hippie. Com Elvis ela ficou mais marcante, fruto dos metais da orquestra. A singeleza do resto, principalmente em relação à letra, manteve-se. Outro detalhe técnico chama a atenção. Alguns autores afirmam que "Sweet Caroline" foi sugerida a Elvis ainda quando ele estava produzindo nas sessões do American Studios em Memphis, no ano anterior. Isso provém do fato de que a versão de Diamond foi produzida por Chips Moman (que também produziu aquelas sessões com Elvis) e Tommy Cogbill (que também tocou com Elvis naquela ocasião). Apesar de ter sido oferecida a Elvis e tudo mais o cantor não a gravou em estúdio. As razões de sua recusa seguem desconhecidas. Talvez a grande qualidade das outras canções tenha ofuscado "Sweet Caroline", quem sabe... Foi um erro de Elvis porque ele teria gravado a versão antes de seu autor e teria feito bastante sucesso nas paradas se a tivesse lançado como single, ainda em 1969. Depois disso o próprio Elvis foi surpreendido pela versão original de Neil Diamond que lançada como compacto pelo selo MCA fez bonito nas paradas, ganhando um disco de platina por suas vendas. Todo esse sucesso poderia ter sido de Elvis caso ela não a tivesse descartado no American. Tentando contornar a bobagem que havia feito Elvis resolveu levá-la para os palcos em Vegas, confirmando o velho ditado que diz "Antes tarde do que nunca".

Runaway (Del Shannon / Max Crook) - Diante do propósito de só trazer canções inéditas para esse álbum, Elvis subiu ao palco em Las Vegas para cantar o hit "Runaway" de Del Shannon. Essa música foi número 1 na lista Billboard Hot 100 em fevereiro de 1961. Dois aspectos são dignos de menção. O primeiro é que a canção nunca havia sido gravada por Elvis em estúdio antes (por essa razão era inédita em sua discografia). O segundo é que ela na verdade não havia sido gravada em fevereiro de 1970 como constava na capa do LP original, mas sim em agosto de 1969, na sua primeira temporada de retorno aos palcos em Nevada. A RCA Victor quase a lançou no disco anterior, Elvis in Person, mas por precaução resolveu arquivá-la por mais algum tempo. Quando pintou o projeto desse novo LP ela se mostrou ideal para fazer parte de seu repertório. Ótima decisão. Segundo o próprio Del Shannon em uma entrevista essa canção acabou lhe trazendo uma das maiores alegrias de sua vida. Ele, como tantos outros milhares de admiradores de Elvis, fez questão de assistir o Rei do Rock ao vivo em Las Vegas. Para um artista que parecia só realizar concertos de dez em dez anos era uma oportunidade única, imperdível. Na noite em que estava na plateia Elvis parou repentinamente a apresentação e resolveu comunicar para os presentes que Del Shannon estava ali, naquela noite, lhe prestigiando. Shannon ficou completamente surpreendido, pois sequer havia comunicado ao staff de Elvis que iria assistir ao seu concerto. Depois de agradecer sua presença Elvis então mandou ver em sua própria versão do sucesso "Runaway", deixando Shannon emocionado. Depois o encontrou em seu camarim. Sobre esse encontro o autor declarou: "Assistir Elvis cantando minha canção foi muito emocionante. Depois ao encontrá-lo no camarim pude constatar como Elvis era educado, humilde e solícito. Ele me deixou emocionado. Nem quando os Beatles fizeram sua própria versão de Runaway pude ficar tão emocionado. Aquela foi uma das grandes noites de toda a minha vida. Uma lembrança que jamais esquecerei".

The Wonder of You (Baker Knight) - Esse era o tipo de música que Elvis vinha procurando para apresentar ao vivo, principalmente em palcos como o de Las Vegas, onde esse tipo de exuberância orquestral era praticamente um pré-requisito para qualquer artista se dar bem e ser aclamado por público e crítica. O curioso é que a música em si era antiga, gravada e lançada no final da década de 1950 pelo cantor pop Ray Peterson, justamente na época em que Elvis estava servindo o exército americano numa base na Alemanha. Não há maiores informações sobre se Elvis a teria conhecido na Europa ou na sua volta aos Estados Unidos em 1960, até porque naqueles tempos não havia ainda a facilidade de comunicação e divulgação que temos hoje em dia, mas o fato é que a música conquistou o cantor, tanto que ele pensou em gravá-la durante as sessões no American Studios em Memphis, no ano anterior. A canção chegou inclusive a ser selecionada, o novo arranjo elaborado e até ensaiado pela banda, mas no final passou mesmo em branco. Elvis jamais a gravaria em estúdio. O arranjo composto porém não seria desperdiçado. Já nos primeiros ensaios de sua segunda temporada Elvis resolveu inclui-la no repertório, ainda mais agora que a RCA Victor estava em busca de músicas inéditas dentro da discografia de Elvis. O próprio Felton Jarvis diria a Elvis que o "On Stage" seria na verdade um álbum de gravações inéditas, só que nas versões live, ao vivo. Assim com tudo certo a bela faixa foi incluída. Considero essa performance impecável, tanto por parte de Elvis como por parte da TCB Band. É fato que eles sabiam que estavam gravando músicas para o novo LP de Presley e por essa razão foram perfeccionistas na execução da música. Acertaram em cheio. A gravação que foi incluída nesse disco foi a registrada pela RCA em 19 de fevereiro de 1970. Assim que desceu do palco Elvis mandou um recado para seu produtor, para que essa versão fosse a escolhida para o álbum pois ele bem sabia que ela havia ficado simplesmente maravilhosa. Uma das melhores interpretações ao vivo de Elvis em toda a sua carreira.

Polk Salad Annie (Tony Joe White) - Essa canção é uma das mais sui generis da carreira de Elvis. O autor, Tony Joe White, foi criado nas regiões pantanosas da Louisiana e assim escreveu essa letra, meio maliciosa, sobre uma garota pobre do sul, que tinha hábitos alimentares bem regionais. Usando de gírias de sua região natal ele criou esse enredo meio nonsense, algo que no final das contas nunca fez muito sentido ou foi de fácil entendimento para os ouvintes de outras regiões dos Estados Unidos. Por essa mesma razão sua letra soava incompreensível para quem não era do sul. Assim, sempre que Elvis a cantava, usava uma pequena introdução tentando explicar do que se tratava. Na maioria das vezes não adiantava nada, mas o que valia era a boa intenção. Em uma época em que o psicodelismo imperava, com letras que não faziam nenhum sentido, até que Elvis poderia dispensar esse tipo de preciosismo, já que para falar a verdade ninguém estava muito se importando mesmo com a letra da música. O que salvava "Polk Salad Annie" era o seu embalo, o ritmo e as coreografias que Elvis apresentava no palco. E por falar em misturas e misturebas, Elvis também resolveu jogar em um mesmo caldeirão movimentos que tinha aprendido com mestres em artes marciais e o estilo dançante da canção, resultando tudo em algo novo. Nesses primeiros concertos Elvis ainda se esmerava em dar o melhor de si, as melhores performances, mas com o passar dos anos a execução de "Polk Salad Annie" foi se tornando mais displicente, quase uma gozação por parte de Elvis nos shows. De uma forma ou outra o que não se pode negar é que a música era ótima para concertos ao vivo! Por outro lado Elvis nunca gravou uma versão oficial com sua banda em estúdio. Era desnecessário. "Polk Salad Annie" afinal era pura festa e diversão.

Yesterday (Lennon / McCartney) - A canção "Yesterday" dos Beatles foi um dos maiores sucessos dos anos 60. Lançada originalmente no álbum "Help!" em 1965 ela acabou virando um verdadeiro fenômeno de vendas e popularidade naquela década inesquecível. Durante anos se especulou se Elvis algum dia iria lançar sua própria versão, já que praticamente todos os outros grandes cantores americanos, como Frank Sinatra e Dean Martin,&nbsp; acabaram fazendo as suas. Em estúdio isso jamais aconteceria. Embora Elvis gostasse de vários discos e canções dos Beatles, ele nunca se interessou em gravar suas próprias versões do repertório do quarteto inglês, pelo menos até 1969. Isso mudou com sua volta aos palcos. Como artista de concertos ao vivo Elvis sentiu a necessidade de incluir algumas canções dos Beatles em seu repertório. "Yesterday", a imortal criação de Paul McCartney, foi a primeira delas a sair em um disco oficial de Elvis Presley. Ela veio não numa versão de estúdio, como era esperado, mas ao vivo, no palco. Um fato curioso envolve a inclusão dessa faixa nesse álbum. Como sabemos o disco foi intitulado "On Stage - February, 1970" (Em bom português: "No Palco - Fevereiro de 1970"). Isso levava o ouvinte a pensar que todas as gravações tinham sido realizadas nesse período, justamente a da segunda temporada de Elvis em Las Vegas. Isso era apenas parcialmente verdadeiro. "Yesterday" na verdade havia sido gravada em agosto do ano anterior, na primeira temporada de Elvis em Las Vegas. Para ser mais exato no dia 25 de agosto de 1969, algo que nunca foi informado ao fã que comprou o disco uma vez que não havia ficha técnica e nem maiores detalhes na edição original desse disco. Apesar disso a boa seleção acabou deixando tudo com um aspecto bem imperceptível ao fã menos atento. Na realidade o consumidor menos detalhista poderia até mesmo jurar estar ouvindo a uma única apresentação de Elvis, realizada na mesma ocasião. Deixando isso um pouco de lado temos que admitir que essa versão live de "Yesterday" é muito boa, embora não seja tecnicamente perfeita. Se Elvis a tivesse gravada em estúdio, com todo o aparato e cuidado técnico que esse tipo de gravação traz, o resultado teria sido inegavelmente muito superior.

Proud Mary (John Fogerty) - Dentro do conceito de trazer músicas inéditas dentro da discografia de Elvis na época (estamos falando de 1970) a RCA Victor selecionou essa versão ao vivo do grande clássico do rock americano, "Proud Mary". A canção havia sido lançada originalmente em janeiro de 1969 pelo grupo Creedence Clearwater Revival, um dos melhores de sua geração. O single (com "Born on the Bayou" no lado B) acabou se tornando um dos maiores sucessos da banda. Realmente é uma grande composição, um exemplo perfeito do tipo de country / rock que Elvis estava procurando para renovar seu repertório. Certamente cantar novas versões de sucessos dos anos 50 como "Hound Dog" ou "Don´t Be Cruel" em Las Vegas até poderia soar interessante, principalmente para os fãs mais veteranos, porém era igualmente necessário não esquecer o tipo de sucesso que andava tocando nas rádios naquele período. Segundo Felton Jarvis, o produtor e arranjador de Elvis, tudo o que o cantor queria na época era equilibrar seu legado, suas antigas canções, com o mundo musical contemporâneo. Não soar apenas como um artista meramente nostálgico, que vivia de glórias passadas. A escolha foi perfeita. A interpretação de Elvis foi uma das mais empolgantes e se tornou o ponto alto da temporada. Curiosamente, apesar da boa repercussão, Elvis iria deixar a música de lado nos anos seguintes. É bom lembrar porém que "Proud Mary" surgiu duas vezes na discografia oficial de Elvis. A primeira foi aqui, no "On Stage". Uma versão bem executada, bem elaborada, com um ritmo mais cadenciado e um sabor quase acústico. A segunda gravação veio no álbum "Elvis as Recorded at Madison Square Garden" de 1972. Para muitos essa segunda versão seria bem melhor, contando com um pique e ritmo que ficaram bem conhecidos dessa eletrizante apresentação de Elvis em Nova Iorque. Por fim, um detalhe interessante: Embora muitos reconheçam que o single do Creedence Clearwater Revival tenha sido vital para que Elvis a gravasse, sua maior influência teria vindo mesmo da versão de Ike &amp; Tina Turner, que lançada nesse mesmo ano (1970), teria impressionado pela garra e vitalidade da interpretação da cantora. Ouvindo todas as versões (a do Creedence, a de Tina Turner e a de Elvis) chegamos na conclusão que realmente Elvis retirou muito mais inspiração da segunda gravação, que combinava muito mais com o estilo de Las Vegas. Afinal de contas ele certamente sabia que poderia contar com essa música para levantar o público durante os shows.

Walk a Mile In My Shoes (Joe South) - Certa vez Elvis declarou: "Antes de criticar os outros, meu caro, se coloque no lugar deles!". A essência da letra dessa música é justamente essa. Coloque-se no lugar do outro, lute suas batalhas, vejas as dificuldades que cada um enfrenta na sua própria pele. Criticar é fácil, viver os problemas alheios, não! Elvis foi tão criticado ao longo dos anos 60 que ele sabia muito bem o que essa mensagem significava. "Caminhe uma milha em meus sapatos", ou seja, fique no meu lugar, veja como é difícil andar nessa jornada, como a vida definitivamente não é nada fácil para ninguém. Em um trecho a letra é clara sobre isso ao dizer: "Viva um pouco no meu lugar, antes de abusar, criticar e acusar, viva um pouco no meu lugar". Aliás se formos analisar bem a letra foi a chave, o fator determinante, que fez Elvis gravar essa canção. Elvis estava farto, cansado, exausto de ser tão criticado depois de tantos anos. Em termos puramente musicais "Walk A Mile In My Shoes" não havia se destacado antes de Elvis gravar a sua própria versão. A canção foi lançada de forma bem obscura como Lado B de um single do cantor e compositor Joe South. O compacto, um tanto precário, quase uma produção independente, foi lançado como sendo do grupo "Joe South and the Believers". Na realidade não era bem uma banda, um novo conjunto vocal country, mas sim um arranjo envolvendo Joe South, seu irmão Tommy e sua cunhada. Eles se reuniram em Atlanta, juntaram uns trocados, fizeram uma gravação praticamente amadora em um estúdio da cidade e mandaram prensar 500 cópias. Tinham a esperança de vender pelo menos umas 300 cópias para lucrar algum dinheiro, e isso era tudo. Acontece que a música acabou chegando até Elvis (não me perguntem como!) e assim o astro a cantou ao vivo em Las Vegas. Quando o álbum "On Stage" chegou nas lojas Joe South pulou de alegria obviamente. Depois de Elvis colocar sua voz em sua criação finalmente Joe conseguiu lançar um single profissional que, pasmem, acabou fazendo um bom sucesso na parada country do cinturão bíblico do sul dos Estados Unidos. Sua sorte havia finalmente mudado!

Let It Be Me (Curtis / Delanoë / Bécaud) - Bom, dando sequência na análise das canções que fizeram parte do álbum "On Stage" chegamos nesse verdadeiro clássico, "Let It Be Me". A primeira vez que ouvi essa música não foi na voz de Elvis Presley. Na verdade ela já havia feito muito sucesso antes na interpretação do grupo "The Everly Brothers". Essa versão - a primeira em língua inglesa - havia sido lançada pelos irmãos em 1960, alcançando um grande sucesso nas paradas, em especial da Billboard Hot 100. É curioso que esse sucesso chegou talvez tarde demais para eles. Já havia uma grande tensão entre os dois e a canção acabou sendo um de seus últimos sucessos juntos. Curiosamente alguns meses atrás assisti a uma entrevista com Paul McCartney afirmando que o estilo vocal do Everly Brothers havia se tornado a grande influência para os Beatles em seus primeiros discos. De fato, basta ouvir álbuns como "Please Please Me" ou "With The Beatles" para comprovar bem isso. Além da influência vocal havia também os arranjos, baseados principalmente na dobradinha voz e violão, que os Beatles também procuraram seguir, principalmente nas canções mais lentas, ternas, com letras que falavam de amor, romance e paixão. Não há como negar, os Beatles deveram muito em termos de influência musical a essa dupla americana. De qualquer maneira apesar da inegável importância da versão dos irmãos Everly, o fato é que a versão original não era deles. A primeira gravação dessa canção foi lançada na França com o título de "Je t'appartiens" na voz do cantor Gilbert Bécaud. Isso abre um fato histórico interessante. Elvis teria conhecido a música através do single dos Everly Brothers ou tinha gostado dela por causa da versão original, quando ainda estava servindo o exército americano na Europa? Como se sabe Elvis adorava música francesa e chegou a visitar Paris em uma viagem de férias enquanto estava em solo europeu. Anos depois, consultando a discografia particular de Elvis em Graceland, descobriu-se que ele tinha tanto o compacto americano dos Everly Brothers como o álbum de Gilbert Bécaud. Na dúvida sobre qual gravação era a sua preferida uma coisa é certa: quando apareceu a oportunidade Elvis não deixou passar em branco e resolveu também gravar sua versão em forma de homenagem para essa grande canção, que em suas mãos ganhou um arranjo rico, com muita orquestra, bem diferente das versões originais que primavam pela suavidade e simplicidade harmônica.

Elvis Presley - Elvis On Stage, February, 1970 (1970) - Data de Gravação: Agosto de 1969 - fevereiro de 1970 / Local de Gravação: Las Vegas, Nevada / Produtor: Felton Jarvis, Glen D. Hardin, Glenn Spreen, Bergen White, Elvis Presley / Músicos: Elvis Presley (vocais, violão), James Burton (guitarra), Jerry Scheff (baixo), John Wilkinson (guitarra), Bob Lanning (bateria), Ronnie Tutt (bateria), Charlie Hodge (violão), Glen Hardin (piano), Larry Muhoberac (Piano, órgão), The Imperials (vocais), The Sweet Inspirations (vocais), Millie Kirkham (vocais), Bobby Morris e Orquestra. / Data de Lançamento: Junho de 1970 / Melhor Posição nas paradas: #13 (Estados Unidos) #2 (Inglaterra).

Pablo Aluísio.