quinta-feira, 27 de fevereiro de 2020

As Vidas de Marilyn Monroe - Parte 20

Conforme ia ficando cada vez mais popular e famosa, mais Marilyn Monroe ia criando problemas dentro e fora dos estúdios. Assim que conhecia um jornalista que poderia lhe ajudar com alguma divulgação, reportagem ou até quem sabe uma capa de revista, Marilyn o levava para conhecer o rancho onde supostamente seu pai vivia! Ela dizia que ele não queria vê-la mais, que fosse embora dali. Era uma encenação! Tudo era feito como uma forma de ganhar a pena ou a gratidão do jornalista que estivesse ao seu lado. Assim Marilyn sempre acabava ganhando mais publicidade grátis. A tática da "garotinha órfã e indesejada" lhe rendeu muito em termos de divulgação nas principais revistas de moda e cinema da época.

Quando começaram as filmagens de "Bus Stop" (Nunca Fui Santa, no Brasil) Marilyn avisou ao estúdio que estaria acompanhada da instrutora de atuação Paula Strasberg. Ela era esposa do grande Lee Strasberg, fundador do Actors Studio. Inicialmente Paula iria ajudar Marilyn a melhorar suas atuações, mas logo descobriu-se que ela na verdade era uma espécie de assistente pessoal de Marilyn. Andando com uma bolsa cheia de remédios ao lado, estava sempre se trancando com Marilyn em seu camarim. Os diretores logo descobriram que teriam problemas com ela. Paula estava sempre vestida de preto, suando muito (pois era muito obesa), criando dificuldades ainda maiores para os filmes. Suas instruções de atuação eram exageradas, demoradas e geralmente atrasavam ainda mais o cronograma de filmagens.

Paula também passou a desempenhar um papel bem estranho dentro dos estúdios. Antes de Marilyn entrar no set de filmagens ela mandava Paula fazer uma lista das pessoas que estavam lá. Essa lista então era mostrada para Marilyn e ela mandava algumas pessoas irem embora antes que começasse a trabalhar. Marilyn começou a implicar com técnicos, roteiristas e operadores de câmera. Assim quando Marilyn mandava eles embora do filme criava-se um problema extra para a produtora Fox que tinha que arranjar substitutos, e isso bem no meio das filmagens. Também começou a criar problemas com as atrizes com quem trabalhava. Certo dia ao entrar no estúdio se deparou com a atriz Hope Lange usando a mesma cor de cabelo dela. Isso bastou para Marilyn se retirar e avisar ao estúdio que não voltaria a atuar até que Lange escurecesse seus cabelos! O mesmo aconteceu com Cyd Charisse, cuja demissão Marilyn exigiu justamente pelo mesmo motivo.

Marilyn também começou a piorar seus atrasos. Se antes ela chegava duas, três horas atrasada para atuar, agora ela nem mais aparecia no estúdio. Geralmente dizia que estava doente, mas era tudo mentira. O excesso de pílulas estava destruindo sua capacidade de memorizar as falas, além de a torná-la incapaz de se levantar pela manhã para trabalhar. Isso levou com que a Fox contratasse uma pessoa apenas para bater na sua porta no dia seguinte, a tirar da cama, dar um banho e colocá-la em condições de aparecer na frente de uma câmera. A Fox também decidiu que a equipe de maquiagem deveria ir para a casa de Marilyn, para maquiá-la lá, já que a atriz levava horas para aparecer no departamento de maquiagem. O drama da Fox é que não podia demiti-la pois Marilyn significava muitos milhões de dólares na bilheteria - na verdade ela tinha se tornado em pouco tempo a estrela mais lucrativa de todo o estúdio. Uma verdadeira mina de ouro!

O período em que estudou no Actors Studio também colaborou para que Marilyn criasse ainda mais problemas. Ela havia aprendido lá que o elenco sempre tinha que discutir aspectos de roteiro e direção. Assim qualquer cena - até mesmo as mais banais - levavam horas para ficarem prontas, pois antes Marilyn tinha que discutir com roteiristas a razão daquela sequência existir. Era exaustivo e cansativo para todos. Ela também chegou na conclusão de que todos os membros das filmagens de que iria participar tinham que passar por seu crivo antes. Seus contratos com a Fox iriam trazer cláusulas de que Marilyn escolheria a dedo todos os profissionais que iriam trabalhar ao seu lado. E que tinha direito de demiti-los quando bem quisesse. Em certos aspectos ela iria ter o mesmo poder que um produtor executivo, algo até então inédito em Hollywood. Nas palavras da atriz ela nunca mais queria ser manipulada pelos estúdios.

Pablo Aluísio.

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2020

As Vidas de Marilyn Monroe - Parte 19

Marilyn Monroe teve muitos relacionamentos amorosos em sua vida. Vários deles foram intensos, frutos de grandes paixões, mas ao mesmo tempo eram fugazes demais. A personalidade de Marilyn parecia ter essa característica: ela se apaixonava perdidamente, em paixões fulminantes, porém assim que começava a se relacionar com seu novo companheiro ia perdendo gradualmente o interesse por ele. Marilyn tinha tendência a desenvolver paixões platônicas e como todos sabemos essas sempre se transformavam em fumaça quando eram realizadas no mundo real. Essa forma de viver acompanhou Marilyn por toda a sua vida e não era restrita aos seus namorados, mas também aos seus maridos.

Marilyn não foi apaixonada pelo primeiro marido,  James Dougherty. Esse seu primeiro casamento foi arranjado por sua mãe adotiva. Ela não queria mais Marilyn em casa e fez de tudo para que ela se casasse com aquele rapaz simpático da vizinhança. Ele era marinheiro e assim durante uma viagem em 1946 recebeu um telegrama de Marilyn pedindo o divórcio. Ela nunca chegou realmente a gostar dele, em nenhum nível. Em 1954 ela se casou com o jogador de beisebol Joe DiMaggio. Foi outro casamento sem paixão. Joe era muito mais apaixonado por ela do que Marilyn poderia imaginar. Ela, por sua vez, parecia mais interessada na publicidade que aquele casamento iria trazer para sua carreira. Da parte dela houve quase nenhuma paixão ou sentimento verdadeiro. O relacionamento chegou ao fim após Joe agredir Marilyn durante uma discussão acalorada. Com seu jeito italiano, estilo dominador, não conseguia conviver com o sucesso dela, com seu jeito de ser independente. Foi demais para o machão com sangue latino. Ao longo dos anos, mesmo após a separação, Joe DiMaggio iria se comportar como um cachorrinho em busca de atenção de sua antiga dona. Só que Marilyn após o fim do casamento só queria dar ao ex-marido uma amizade até sincera, mas ao mesmo tempo distante.

Uma das grandes paixões platônicas de Marilyn Monroe se deu com o escritor Arthur Miller. Em uma época em que Marilyn lutava desesperadamente para adquirir cultura, lendo livros e estudando, Miller representava um ideal de homem culto e respeitado que ela almejava conquistar. Naquela altura de sua vida Marilyn já tinha se cansado dos galãs apaixonados por si mesmos que lotavam os estúdios de Hollywood. Beleza física já não era tão importante para ela. Assim Monroe mudou seus paradigmas e começou a se interessar por homens intelectuais, que pudessem trazer algo de novo para sua vida. Um deles foi seu próprio professor de música na Fox. Um sujeito elegante, com educação primorosa e cultura erudita. Marilyn ficou loucamente apaixonada por ele, mas não foi correspondida. Ele já era casado naquela altura e não queria jogar tudo fora em prol de uma aventura ao lado da atriz.

Isso devastou Marilyn e ela cultivou uma paixão platônica em relação a ele que durou anos e anos. Pela primeira vez em sua vida Marilyn começou a correr atrás de um homem, que ela considerava perfeito, ao invés de ser cortejada e seduzida. O fato de Marilyn ter que ir atrás dele, de sua paixão, ao invés de ficar esperando o tal sujeito se jogar aos seu pés, fez com que ela ficasse ainda mais apaixonada - loucamente apaixonada. Mesmo com todos os esforços realmente não deu em nada e Marilyn experimentou uma das grandes desilusões amorosas de sua vida.

Já com Arthur Miller as coisas foram diferentes. O escritor acabou se apaixonando por Marilyn, colocando fim em seu casamento, jogando seu juízo pela janela. O caso entre Monroe e Miller porém não acabou bem. Ela inicialmente parecia muito apaixonada por ele, a ponto de colocar um retrato do escritor ao lado de sua cama. Ela amava a cultura do marido e seu estilo intelectual, mas não demorou muito para tudo ruir. Miller, compreensivelmente, tinha hábitos moderados, típicos de um escritor. Isso significava que passava horas em seu escritório, escrevendo seus romances e peças em sua velha máquina de escrever. Assim Marilyn começou a se sentir sozinha. Pior do que isso, começou a achar o marido um chato. Em pouco tempo ela começou a desenvolver uma antipatia nada saudável por ele. O divórcio não demorou e ganhou tintas públicas quando ela começou a tomar atitudes humilhantes para com ele, inclusive nos sets de filmagens. O sonho, a paixão, estava novamente morta na vida de Marilyn Monroe. Para muitos autores e biógrafos, o fato inegável é que uma das maiores divas do cinema, talvez o maior símbolo sexual do século XX, a rainha da beleza de sua época, a mulher que ditava moda, acabou tendo uma vida amorosa bem infeliz. Uma grande ironia do destino.

Pablo Aluísio.

As Vidas de Marilyn Monroe - Parte 18

Um aspecto que poucos fãs de Marilyn Monroe conheciam na época em que ela fazia sucesso no cinema era que na intimidade dos sets de filmagens Marilyn demonstrava ter verdadeiro pavor de entrar em cena. Isso se tornou um verdadeiro martírio para praticamente todos os diretores que trabalharam ao seu lado. Chegar na hora das filmagens, declamar seu texto sem erros, atuar bem - esses pontos, essenciais para qualquer ator ou atriz, eram barreiras imensas para Marilyn.

Marilyn nunca chegava na hora certa. Todos os cineastas sabiam disso. Billy Wilder foi informado sobre os problemas de Marilyn, mas não chegou a perceber o tamanho do problema. Anos depois de ter trabalhado ao seu lado, Wilder confessou em uma entrevista: "As filmagens eram marcadas para começarem às nove da manhã, mas Marilyn aparecia no set às duas da tarde! Era um tormento. Geralmente eu usava as manhãs para gravar todas as cenas em que ela não estava. Mas isso ainda era insuficiente. Assim comecei a gravar com os atores que contracenariam com ela. Apenas closes de seus rostos falando suas falas! Lá pela tarde Marilyn finalmente aparecia no set. Ela não parecia ter decorado nenhuma linha de suas falas! Insegura, geralmente se trancava no trailer! Olha, era um verdadeiro inferno!"

Até diretores que eram reconhecidamente ótimos cavalheiros perderam a paciência com Marilyn. Um deles foi Laurence Olivier. Quando Marilyn foi para a Inglaterra para trabalhar ao seu lado em um novo filme ele mal sabia os problemas que o esperavam. Novamente Monroe voltou ao seu habitual. Não aparecia na hora certa, mostrava muitos problemas para memorizar suas falas - alguns diziam que os problemas vinham do fato dela tomar muitas pílulas que embaralhavam sua mente - e ataques de raiva e fúria na frente da equipe técnica. Depois de mais um atraso de quatro horas, o antes polido e educado Olivier explodiu, gritando com Marilyn, dizendo: "Você não tem o menor senso de profissionalismo?" - disse exacerbado,  ao que Marilyn respondeu, também gritando: "Vá se danar! Se você não me pedir desculpas na próxima meia hora vou pensar seriamente em pegar o primeiro avião de volta aos Estados Unidos!".

Alarmado e preocupado em perder milhões caso o filme não fosse feito, Laurence engoliu todo o seu orgulho pessoal e pediu desculpas a Marilyn. Depois chegou até mesmo a elogiar a atriz publicamente: "Trabalhar com Marilyn não foi fácil. Depois de cada cena eu pensava que ela havia atuado muito mal, mas quando assistia as gravações via que ela havia se saído melhor do que todos os demais atores do elenco! A câmera amava Marilyn!". O auge dos problemas de Marilyn levaria ela a ser demitida pela Fox naquele que seria seu último filme, uma comédia romântica rodada ao lado de Dean Martin. A produção, cara e problemática, ficou inacabada pois Marilyn não conseguia mais sequer chegar no estúdio para fazer suas cenas. Sem outra opção os executivos da Fox a demitiram. Claro, foi um grande escândalo em Hollywood. A mais popular estrela do mundo sendo demitida não era algo que se via todos os dias. A nota triste é que Marilyn nunca mais faria um filme depois disso pois em poucos meses ela morreria em circunstâncias até hoje nebulosas.

Pablo Aluísio.

terça-feira, 25 de fevereiro de 2020

As Vidas de Marilyn Monroe - Parte 17

No começo da década de 1960 o cantor Frank Sinatra comprou um hotel em Lake Tahoe. Essa pelo menos era a informação oficial que passava para a imprensa. Boatos em Hollywood porém diziam que o hotel na verdade pertencia ao chefão mafioso Sam Giancana. Sinatra na verdade seria apenas seu testa de ferro. O objetivo era transformar Lake Tahoe numa segunda Las Vegas, que inclusive era também quase toda da máfia italiana. De uma maneira ou outra Frank Sinatra ficaria anos se apresentando ali, tudo na tentativa de transformar o lugar em uma estação de turismo de sucesso. Até Elvis Presley cantaria no hotel alguns anos depois.

De uma maneira ou outra o hotel de Sinatra acabou se tornando um dos lugares preferidos de Marilyn Monroe. Sempre que ela terminava um filme ia embora de Los Angeles e ficava semanas ali hospedada. Durante as tardes jogava no cassino, nas noites desfrutava dos shows que eram realizados. Usando de sua influência no mundo artístico Frank Sinatra levou muitos astros de Hollywood para se hospedarem por lá. Era algo que trazia publicidade grátis para seu grande hotel.

Quem ficou furioso com essas viagens de Marilyn Monroe foi seu ex-marido Joe DiMaggio. Durante anos ele considerou Sinatra como seu amigo pessoal. Não apenas pelas origens - eles eram de família de imigrantes italianos - mas também pelo fato dele ser considerado um bom amigo de sua esposa. Só que os anos passaram e Joe descobriu que Sinatra também tinha interesses amorosos com Marilyn. Como se isso tudo não bastasse para acabar com qualquer amizade, Joe ficou sabendo por fofocas que Sinatra estava dando drogas para Marilyn em Lake Tahoe. Achou que isso era ruim? Joe também ficou sabendo que numa dessas ocasiões Frank Sinatra havia dado drogas a Marilyn para ela participar de uma orgia. Era o fim da picada. Joe queria matar Frank Sinatra.

Se era verdade ou não, era complicado saber. Porém que houve abusos de drogas por Marilyn Monroe em Lake Tahoe isso era confirmado por várias pessoas que também estavam hospedadas no hotel de Sinatra. Muitos lembram da atriz completamente desnorteada no piscina ou no restaurante do hotel, sempre parecendo estar bêbada ou drogada. E pensar que Marilyn ia para lá para supostamente descansar e relaxar do stress das filmagens de suas produções em Los Angeles. Outro ponto que magoava bastante Joe DiMaggio era saber que aquele era um reduto de mafiosos, de pessoas ligadas ao crime organizado. Marilyn jamais havia se envolvido com esse tipo de gente antes. Era algo ruim e perigoso para sua ex-esposa. Porém como o casamento havia acabado ele já não tinha mais o que fazer a não ser lamentar bastante tudo o que estava acontecendo.

Pablo Aluísio.

As Vidas de Marilyn Monroe - Parte 16

"Quanto Mais Quente Melhor" é considerado por muitos críticos de cinema como a melhor comédia já feita por Hollywood. É incrível que o filme tenha dado tão certo, uma vez que suas filmagens se deram em meio ao caos. O diretor Billy Wilder diria depois que nunca havia sofrido tanto para concluir um filme. Marilyn Monroe bateu todos os recordes de problemas que poderia se imaginar. Ela atrasava suas cenas, não decorava as falas e geralmente chegava atrasada por 3, 4 horas nos estúdios. Era um completo caos.

Ao mesmo tempo a estrela colecionou atritos e brigas com o resto do elenco ao ponto de Tony Curtis soltar uma frase infeliz para a imprensa. Ele declarou que beijar Marilyn era a mesma coisa que beijar Hitler! Muitos anos depois em seu livro de memórias o ator se diria completamente arrependido do que havia dito, porém justificava seu comentário mordaz dizendo que estava na época completamente farto de Marilyn e sua falta de profissionalismo. Numa das cenas, irritada com Curtis, ela teria inclusive jogado um copo de vinho em sua cara, o que era completamente impensável para uma atriz de seu porte. E isso tudo era apenas a ponta do iceberg.

O único que manteve a paciência, servindo como um pacificador durante as filmagens foi Jack Lemmon. Ele tinha mesmo essa personalidade amigável e bonachona, o que ajudou a aliviar o clima de tensão durante a produção do filme. Geralmente bem no meio de um bate boca ou de um quebra pau ele sentava-se tranquilamente ao piano do estúdio e começava a tocar, sem preocupação com as cadeiras que voavam ao seu redor. Era um sujeito completamente boa praça e gente fina, não importando o que acontecesse.

E o filme se tornou um clássico absoluto, apesar de tudo. Billy Wilder diria que não conseguia entender. Marilyn Monroe poderia ser considerada a pior profissional que ele já tinha trabalhado, mas ao mesmo tempo quando as cenas eram reveladas ela parecia perfeita na tela de cinema. Melhor do que seus dois parceiros de filme, melhor do que qualquer um. Era pura mágica na opinião de Wilder. Como uma pessoa tão neurótica, caótica e estranha como Marilyn conseguia parecer tão perfeita nos filmes? O velho Billy morreu sem saber dar a resposta. Apenas constatava que isso acontecia mesmo, sem a menor dúvida. Um mistério dos deuses da sétima arte.

Pablo Aluísio. 

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2020

Crônicas de Marlon Brando - Parte 20

O sucesso de "A Streetcar Named Desire" abriu as portas do cinema para Marlon Brando. O roteiro escrito em cima da peça de Tennessee Williams  foi um dos mais elogiados pela crítica na época. A produção recebeu uma enxurrada de indicações, principalmente no Oscar e no Globo de Ouro. Para o Oscar o filme foi nomeado aos prêmios de Melhor Filme, Ator (Brando), Direção, Roteiro, Fotografia, Figurino e Trilha Sonora, se saindo vencedor nas categorias de Melhor Atriz (Vivien Leigh), Ator Coadjuvante (Karl Malden), Atriz Codjuvante (Kim Hunter) e direção de arte.

No Globo de Ouro outra consagração com mais três importantes indicações. A fita também logo se tornou um grande sucesso de bilheteria. Algo grandioso estava surgindo na sétima arte mas Brando parecia não se importar, transparecendo um claro ar blasé sobre tudo o que estava acontecendo ao seu redor.

Embora tenha sido proibido de se manifestar publicamente o fato é que o ator estava furioso com os cortes que a Warner Bros havia feito para que a produção não fosse qualificada numa faixa etária mais elevada - o que no final das contas significaria perda considerável de receitas nas bilheterias. Ele só descobriu os cortes ao assistir o filme pela primeira vez no cinema. Sentiu falta de inúmeras cenas e ficou muito desapontado com isso. Na visão de Brando a simples questão comercial jamais poderia servir de desculpa para a mutilação de uma obra de arte. Pelo visto o idealismo de Brando ainda não havia sido colocado à prova pelas regras do jogo da indústria do cinema. Em Hollywood o lucro estava bem acima da arte.

Marlon Brando havia sido indicado ao Oscar de Melhor Ator e decidiu que se vencesse iria ler uma carta de desagravo pelos cortes que o filme havia sofrido. No final ele não venceu o prêmio o que foi um alívio para a Warner. Curiosamente a grande maioria das cenas cortadas do filme jamais apareceram. De fato o enredo original mostrava personagens bem mais doentios e neuróticos do que aquilo que se vê na versão oficial. Isso porém jamais tirou os méritos da produção que até hoje é considerada um dos grandes clássicos da história do cinema americano. No final das contas Brando só estava mesmo sendo Brando, um gênio da arte dramática que era muito complicado de se lidar nos bastidores.

Pablo Aluísio

domingo, 23 de fevereiro de 2020

Crônicas de Marlon Brando - Parte 19

Como já era previsto Marlon Brando venceu o Oscar de Melhor Ator por sua atuação em "O Poderoso Chefão". E também como alguns esperavam Brando resolveu recusar o prêmio. Ele enviou uma atriz vestida de nativa americana (em figurinos pouco convincentes) para realizar um discurso de protesto sobre a forma como o cinema americano tratava os índios nas telas. A coisa toda pegou muito mal. Vários diretores, produtores e atores acharam a encenação um grande desrespeito. John Wayne liderou os que consideraram aquilo uma hipocrisia sem tamanho por parte de Brando. O ator republicano e conservador disparou em uma entrevista: "Brando deveria ter vergonha! Ele deveria homenagear os soldados americanos que morreram na colonização do velho oeste, isso sim!".

Longe da polêmica Brando procurou por novos projetos. Ele não queria o Oscar e isso não tinha volta. O que ele queria agora ela realizar mais um bom filme para consolidar a retomada em sua carreira. Inicialmente Brando desejou se afastar de Hollywood. Ele ficara enojado pela reação de alguns membros da Academia por causa do Oscar rejeitado e resolveu que seu próximo filme seria realizado na Europa. "Hollywood me despreza e eu a desprezo. É um lugar cheio de cretinos, não quero me misturar com esse tipo de gente!" - afirmou a um jornal de Los Angeles. Foi justamente nesse momento de intenso tiroteio e troca de farpas entre Brando a indústria americana de cinema que surgiu em suas mãos o roteiro de um filme chamado "Ultimo tango a Paris".

O roteiro era de Bernardo Bertolucci, que também iria dirigir o filme. Brando gostou muito do fato de que aquele script era um roteiro em aberto, que iria ser basicamente desenvolvido durante as filmagens, contando com a colaboração do elenco em sua construção. Imediatamente Brando convidou o cineasta italiano para vir em sua casa, para um jantar onde poderiam discutir a participação do ator naquele projeto. Assim que Bertolucci chegou em sua casa, Brando expôs seu ponto de vista. "Estou cansado de trabalhar com diretores burros e tiranos! Eu quero fazer o seu filme, mas também quero liberdade total e completa! Eu quero atuar sem amarras, sem marcações, até mesmo sem diálogos previamente escritos. Eu quero criar um personagem que seja uma mistura, metade com minha alma, metade como mera ficção!".

Bertolucci achou maravilhosa a proposta. Era justamente o que ele procurava e não poderia haver ator mais indicado para o papel, já que Brando era considerado um gênio da atuação. O ator também sugeriu que o diretor ficasse longe de grandes estrelas para escolher a atriz que iria contracenar com ele. "São todas umas idiotas estúpidas!" - resumiu Brando. Seguindo os conselhos de Brando, o diretor acabou escolhendo a jovem e inexperiente Maria Schneider, escolha que agradou ao ator. Marlon havia dito a Bernardo Bertolucci: "Escolha a atriz mais inexperiente que encontrar nos testes, prefira uma quase amadora. Vai ajudar bastante no filme". Com tudo acertado Brando fez as malas e deixou a cidade em direção a Paris. Uma obra prima estava prestes a ser filmada.

Pablo Aluísio.

Crônicas de Marlon Brando - Parte 18

Depois da fortuna recebida pela filme "Superman", Marlon Brando pensou em se aposentar. Dizia ele que já havia feito tudo o que um ator poderia fazer em Hollywood. Já havia subido os degraus do sucesso de público e crítica, assim como caído nas fossas do fracasso comercial. Não havia mais nada na indústria cinematográfica americana que o convenceria a sair de seu retiro em sua querida ilha Tetiaroa, localizada na distante Polinésia Francesa. Brando dizia que assim que seu avião pousava em Los Angeles sua pressão aumentava imediatamente. Era um reflexo do stress e da tensão que vivia quando chegava nos Estados Unidos. Já na sua ilha particular ele conseguia relaxar e ser feliz.

Só que foi a própria ilha que o fez retornar ao cinema. Brando havia gasto muito dinheiro na construção de um hotel e um resort turístico. Assim que tudo estava terminado, um furacão passou e destruiu com tudo. Todo o investimento foi perdido. Brando ficou sem recursos para seguir em frente com seus sonhos paradisíacos. Assim precisou telefonar para seu agente em Hollywood para avisar que ele aceitasse ofertas de trabalho, que ele ainda estaria no jogo, pronto para atuar. Seus planos de aposentadoria foram deixados de lado. Ele ainda precisava ganhar dinheiro para levantar tudo de novo em Tetiaroa. 

Uma vez a cada quatro ou cinco meses Brando voltava para os Estados Unidos. Recebia os roteiros de propostas de novos filmes e avaliava se algum lhe interessava. Eram pilhas e pilhas de roteiros ruins, muitos deles eram apenas variações do seu personagem mafioso de "O Poderoso Chefão". Marlon Brando não tinha a menor intenção de fazer um filme sobre gangsters novamente. Era muito limitado e sem imaginação, em sua opinião. Como um ator que sempre primou por apenas trabalhar naquilo que interessava, ele não estava mais disposto a encarar produções apenas por motivos puramente comerciais. 

Demorou quase um ano até que viesse a surgir algo que valesse a pena. O diretor Francis Ford Coppola, com quem Brando havia trabalhado em "O Poderoso Chefão" lhe telefonou numa manhã. Disse que tinha um papel em mãos em que apenas ele, Marlon Brando, poderia atuar. Era uma adaptação de um livro de autoria do escritor Joseph Conrad chamado "Heart of Darkness", lançado em 1902. Brando conhecia o trabalho original. Esse livro quase virou filme nas mãos de Orson Welles nos anos 1950. Só que Coppola queria adaptar tudo para uma realidade passada na Guerra do Vietnã. O nome do personagem de Brando seria Walter E. Kurtz, um Coronel americano que havia enlouquecido nas selvas do continente asiático. Coppola chamaria o filme de "Apocalypse Now". Tudo parecia estar no lugar certo. Brando praticamente aceitou na mesma hora o convite. Aquele sim era um projeto que valia a pena se envolver. 

Pablo Aluísio

sábado, 22 de fevereiro de 2020

Crônicas de Marlon Brando - Parte 17

Em 1977 a Warner Bros convidou Marlon Brando para participar da primeira grande adaptação do personagem dos quadrinhos Superman para o cinema. O estúdio queria Brando para interpretar Jor-El, o pai do super-herói em Kripton, um planeta com uma civilização altamente avançada que vivia seus últimos dias de existência. No começo Brando hesitou já que era algo completamente fora dos padrões para sua carreira. Ele ficou semanas pensando se iria ou não aceitar o convite.

A Warner porém parecia decidida a contratar o grande Marlon Brando para o filme. A razão era simples de entender. O estúdio queria trazer publicidade e prestigio para essa produção e nada melhor do que ter um gênio da atuação, um mito da história do cinema, em um papel coadjuvante, mas central da história. No final o estúdio deu uma proposta irrecusável, um cachê de 3.7 milhões de dólares por apenas 20 dias de trabalho. Era algo inédito na época, uma soma fabulosa que acabou convencendo o ator a entrar no elenco. Anos depois o próprio Brando explicou que havia deixado o receio de lado muito antes, quando grandes nomes como Glenn Ford e Gene Hackman também foram contratados. Curiosamente o papel de Superman foi dado a um ator que embora talentoso ainda era considerado um novato no meio de tantos astros de Hollywood, Christopher Reeve.

Para consolidar a contratação Brando mandou inserir em seu contrato uma cláusula de que receberia mais um percentual caso sua imagem fosse utilizada em continuações do filme (algo que no final das contas lhe renderia 5 milhões de dólares por seu trabalho). Ele queria esse dinheiro para investir em sua ilha particular, que estava enfrentando problemas após um furacão passar por lá, destruindo completamente o hotel que Brando havia construído no local.

O curioso é que essa seria a primeira vez em sua longa carreira que Brando iria desempenhar um personagem saído diretamente dos quadrinhos. Para se sair bem ele mandou dois assistentes em uma loja especializada em gibis de Los Angeles. Brando mandou que fossem compradas todas as edições de Superman do estabelecimento. E assim foi feito seu "laboratório" para atuar. Durante duas semanas Brando leu tudo o que lhe caiu em mãos sobre o personagem. Ele percebeu que o pai kriptoniano do Superman surgia quase sempre nos quadrinhos como um fantasma, uma sombra do passado que se comunicava com seu filho através da fortaleza da solidão. Assim, por conta própria, Brando pintou seus cabelos, se tornando completamente brancos, para lhe dar a imagem de um homem do passado, um ancestral do super-herói. Anos depois Brando confessaria que no final de tudo havia gostado bastante do filme e ficado orgulhoso por ter dado tanta dignidade em cena para Jor-El.

Pablo Aluísio.

Crônicas de Marlon Brando - Parte 16

O livro "The Godfather" (O Poderoso Chefão) de Mario Puzo ficou por mais de 60 semanas na lista dos mais vendidos do The New York Times. Era um sucesso absoluto, um best-seller. Em 1971 o produtor Robert Evans, da Paramount Pictures, negociou os direitos de adaptação para o cinema do romance com o próprio escritor. Após as negociações concluídas o estúdio foi atrás de um diretor. A escolha recaiu em Francis Ford Coppola que apesar de não ter nenhum grande sucesso no currículo, tinha boa fama de ser um verdadeiro artesão da sétima arte. Além disso ele tinha origem ítalo-americana, um dos requisitos que a Paramount considerava ser primordial para para uma boa adaptação.

A primeira questão que surgiu veio da escalação de um bom elenco. Coppola queria Ernest Borgnine ou Rod Steiger para o papel principal, a do patriarca Don Vito Corleone. O produtor Bob Evans não achava nenhuma das escolhas a adequada. Para ele Borgnine não tinha a imagem e nem a personalidade ideal para encarnar um tipo tão marcante. Faltava um certo ar de autoridade para o ator. Além disso quem iria associar o bondoso Ernest com um chefe da máfia siciliana? Já Steiger também não iria servir pois ele já havia interpretado outro gangster famoso, Al Capone. Evans não queria que o público associasse Capone com Corleone. "Eram personagens bem diferentes" - na opinião do experiente produtor. Quem acabou colocando fim à dúvida foi o próprio autor Mario Puzo. Ele telefonou para Coppola e lhe disse: "Só existe um ator para interpretar Vito Corleone no cinema e o seu nome é Marlon Brando!".

A Paramount não gostou da sugestão. Brando tinha um histórico de problemas com o estúdio. Ele havia criado muitos problemas no passado. Era considerado um ator genioso, explosivo, complicado de se lidar. A Paramount iria investir milhões de dólares em um filme estrelado por Marlon Brando novamente? Ninguém queria saber disso na diretoria. Outro problema segundo os executivos da Paramount vinha da própria idade de Marlon Brando. Na época ele tinha 47 anos e Vito Corleone, o personagem, já havia passado dos 60. Tudo bem, uma maquiagem bem feita poderia superar isso, mas como alguém poderia esquecer que Brando vinha de uma década de fracassos de bilheteria? Será que ele ainda tinha força para atrair o público para os cinemas? Em uma tensa reunião na Paramount o diretor Coppola ficou horas tentando convencer os executivos a contratarem Brando. Foi uma luta.

E qual era a posição de Brando sobre tudo o que estava acontecendo? Para falar a verdade o ator não parecia muito preocupado. Ele não tinha lido o livro de Mario Puzo e parecia indiferente ao projeto do filme, ao contrário de seus colegas de profissão, que estavam tentando de tudo para entrar no elenco do filme. Duas coisas porém fizeram Brando mudar de ideia. A primeira é que ele precisava urgentemente de dinheiro. Os diversos processos que tinha enfrentado em relação a divórcios e guardas de seus filhos o fez gastar verdadeiras fortunas com advogados. Ele estava na pior, financeiramente falando. A outra questão que fez Brando começar a brigar pelo papel era o fato do ator estar desesperado por um sucesso. Todos diziam que "O Poderoso Chefão" seria um grande campeão de bilheteria, justamente o que Brando procurava. Além disso sua carreira precisava muito de um impacto. Tudo certo, só havia mais um problema a superar: a Paramount exigiu que Marlon realizasse um teste. Algo que ele não fazia desde os anos 40. Era um tipo de humilhação para um ator tão consagrado como ele, era coisa de iniciantes. No fundo a Paramount queria testar mesmo era a personalidade do ator. Será que ele toparia fazer algo assim? Estaria mais humilde do que no passado? Brando engoliu seu orgulho pessoal, sua vaidade e topou fazer o tal teste em sua casa em Mulholland Drive. Se esse era o preço a se pagar para estar no filme, Brando estava disposto a encarar o primeiro teste em sua carreira nos últimos 30 anos!

Pablo Aluísio.

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2020

Os Pássaros

Segue sendo ainda nos dias de hoje um dos filmes mais populares da carreira do mestre do suspense Alfred Hitchcock, sendo inclusive reprisado constantemente pelos canais de TV a cabo em todo mundo. Isso demonstra bem como o filme ainda é apreciado pelo público, inclusive pelas novas gerações. A protagonista da história se chama Melanie Daniels (Tippi Hedren). Ela é uma mulher fina e elegante, que decide ir até uma pequena cidade do norte da Califórnia para encontrar seu namorado. O que parecia ser uma viagem de rotina ou puro prazer, logo se torna um pesadelo quando pássaros de todos os tipos e tamanhos começam a atacar no local, sem qualquer motivo aparente. Ela e os moradores da cidade tentam sobreviver de todas as formas àquele inexplicável ataque da natureza.

Agora o curioso de tudo é saber que essa história toda, que algumas vezes pode parecer irreal para determinados espectadores, aconteceu mesmo, de fato! "Os Pássaros" foi baseado em fatos reais ocorridos numa cidade do litoral da Califórnia durante a década de 1940. Até hoje os biólogos não sabem explicar com certeza científica absoluta o que levou essas aves a atacarem seres humanos com tanta fúria. Para Alfred Hitchcock porém o que lhe importava nem era a explicação do evento propriamente dito, mas sim as diversas maneiras que ele iria arrancar suspense e terror desas situações. Para quem apreciava tanto enredos estranhos e bizarros, esses fatos que deram origem ao filme eram um prato cheio para o diretor.

Porém naquela época havia um problema: como tornar os ataques dos pássaros plenamente convincentes? Já que os especialistas em efeitos visuais nunca tinham feito nada parecido com aquilo antes no cinema. Indo ao limite, Alfred Hitchcock então decidiu que apenas com o uso de aves reais as cenas iriam se tornar plenamente realistas. E assim foi feito, a produção utilizou aves marinhas da costa da Califórnia nas cenas de ação. Claro que isso criou situações complicadas, para o elenco e principalmente para a atriz Tippi Hedren, que nesse ponto acabou tendo que enfrentar o tipo mais visceral de papel já presente em um filme de Hitchcock. Dizem as más línguas também que o diretor ficou apaixonado por ela e não sendo correspondido, acabou jogando as aves em cima de sua atriz principal! Claro, algumas aves empalhadas e mecânicas também foram utilizadas, mas em menor número que as reais. A maioria das cenas foram feitas com bichos de verdade. Seria uma vingança de Hitchcock contra sua estrela? Verdade ou mentira? Nunca saberemos ao certo. De qualquer modo não deixou de ser algo bem peculiar do humor negro que Alfred Hitchcock sempre cultivava.

Depois das complicadas filmagens, veio então o sucesso de público tão esperado. Desde seu lançamento "Os Pássaros" se tornou um dos grandes sucessos de bilheteria do diretor. Por todo o mundo o tema do roteiro se tornou um imã para a plateia. Aliás em termos de sucesso comercial o filme rivalizou com o maior hit de Hitchcock, o clássico "Psicose", lançado três anos antes. Some-se a isso as deliciosas histórias de bastidores e você certamente terá um dos mais marcantes momentos da carreira de seu criador. Vários livros e até filmes já enfocaram as manias que Hitchcock teve nas filmagens de "The Birds". Anos depois a atriz diria que inicialmente ele a convenceu que não haveria aves de verdade, apenas efeitos com bichos mecânicos. Só depois no set de filmagens é que ela descobriu como o filme seria feito de verdade! Com bichos reais, dando picadas nela! Não se admire da "grande interpretação" de Tippi Hedren nas cenas pois no fundo ela está apavorada de verdade com os métodos de seu diretor! Com tantos fatos e factoides não foi à toa que "Os Pássaros" se tornou esse ícone da cultura pop em todo o mundo.

Os Pássaros (The Birds, Estados Unidos, 1963) Estúdio: Universal Pictures / Direção: Alfred Hitchcock / Roteiro: Daphne Du Maurier, Evan Hunter / Elenco: Tippi Hedren, Suzanne Pleshette, Rod Taylor / Sinopse: Durante um passeio numa cidade do litoral da Califórnia uma mulher chamada Melanie Daniels (Tippi Hedren) é atacada por pássaros de todos os tipos e tamanhos. A cidade também entra em pânico com o estranho fenômeno da natureza. Filme indicado ao Oscar na categoria Melhores Efeitos Especiais. Vencedor do Globo de Ouro na categoria Melhor Revelação Feminina (Tippi Hedren).

Pablo Aluísio.

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2020

Disque M Para Matar

Esse filme é outro clássico do mestre do suspense Alfred Hitchcock. Ele criou um excelente clima com um enredo relativamente até bem simples. Na trama temos a figura de Margot Mary Wendice (Grace Kelly). Ela é uma jovem esposa que começa a se decepcionar com seu casamento. A rotina e o tédio acabam destruindo suas esperanças de viver um matrimônio feliz. Após longos anos de união, ela começa a ter um caso amoroso extraconjugal com um grande amor de seu passado, o escritor de romances policiais Mark Halliday (Robert Cummings). Ambos estão muito apaixonados e começam a trocar cartas de amor. Eventualmente uma delas vai parar nas mãos do marido traído, Tony (Ray Milland).

Fingindo não saber de absolutamente nada, ele então planeja uma forma de matar a esposa infiel para de quebra se tornar o único herdeiro de sua fortuna. Para colocar em prática sua artimanha criminosa, resolve chantagear um antigo colega de universidade, Swan (Anthony Dawson), que agora vive de explorar mulheres idosas, ricas e solitárias. Enquanto se garante com um álibi, em um evento social, seu comparsa deve entrar em sua casa para asfixiar sua esposa, tentando passar a ideia de que tudo foi apenas um roubo mal sucedido. No começo tudo ocorre bem até que algo acaba não saindo como havia sido inicialmente planejado.

Que Alfred Hitchcock foi um dos grandes gênios do cinema ninguém mais duvida. O diretor tinha um talento incomum para contar enredos sórdidos de uma maneira toda especial. Na superfície, seus personagens viviam em uma espécie de conto de fadas moderno, onde todos eram ricos, felizes e bonitos. Por debaixo dessa aparente normalidade se escondia os mais terríveis sentimentos mesquinhos. Veja o caso do casal formado por Mary (Kelly) e Tony (Milland). Ela é uma bem sucedida mulher, loira e linda, que não desperta suspeitas. Todos pensam ser a esposa ideal. Ele é um ex-tenista, agora aposentado, que se diz muito feliz em se dedicar completamente à esposa e seus caprichos. Um casal realmente perfeito a admirável. Isso é o que a sociedade pensa ser a verdade.

Por debaixo de tudo se esconde uma mulher infeliz com seu casamento de fachada, a ponto de nutrir um amor secreto e inconfessável. Na verdade ela não sente nenhum carinho ou afeição pelo marido e morre mesmo de amores por um antigo amor, um escritor de tramas policiais. Como não pode assumir esse seu sentimento proibido publicamente, começa a ter encontros escondidos com o amante. O marido, que sempre aparentou ser um homem muito educado e fino, um verdadeiro gentleman, acaba descobrindo a traição de sua jovem esposa, mas ao invés de se divorciar em um escandaloso rompimento perante a sociedade ele resolve ir por um caminho mais sutil e... fatal. Ele entra em contato com um antigo conhecido da universidade, um sujeito que não conseguiu se dar bem na vida, vivendo de pequenos e grandes golpes, explorando mulheres velhas e ricas. Um verdadeiro escroque.

A intenção é clara, o sujeito deve matar sua esposa infiel, em sua própria casa, enquanto ele, o marido, surge numa festa, na frente de todos, o que o livraria de uma eventual acusação de tê-la matado. Para atrair ela até um quarto escuro de sua casa, onde o assassino cometerá o crime, Tony usa o telefone. Assim que Margot o atender deverá ser assassinada. Aqui Hitchcock expõe todos os detalhes do plano e depois dos acontecimentos que vão surgindo em decorrência de vários imprevistos. O personagem Tony (Ray Milland) é extremamente inteligente e consegue armar contra todos, inclusive enganando os experientes inspetores da polícia. Tudo acaba caminhando muito bem, mesmo que por linhas tortas, até um pequeno, quase invisível detalhe, colocar tudo a perder. Esse roteiro pode ser descrito como um intrigado caso criminal, baseado muitas vezes em um tipo de suspense mais intelectual, apelando quase sempre para a perspicácia do espectador, que deve ficar bem atento para não perder nenhum detalhe. Nesse aspecto é certamente um dos grandes filmes da carreira do mestre. É um clássico absoluto do suspense na história da sétima arte.

Disque M Para Matar (Dial M for Murder, Estados Unidos, 1954) Estúdio: Warner Bros / Direção: Alfred Hitchcock /Roteiro: Frederick Knott / Elenco: Grace Kelly, Ray Milland, Robert Cummings, John Williams, Anthony Dawson / Sinopse: Marido planeja matar a esposa infiel contando com a colaboração de um amigo. Tudo é minuciosamente planejado. Porém dar certo como previsto já seria uma outra história completamente diferente. Filme indicado ao BAFTA Awards na categoria de Melhor Atriz (Grace Kelly).

Pablo Aluísio. 

O Terceiro Tiro

“O Terceiro Tiro” é um filme bem diferente da carreira do diretor Alfred Hitchcock. A impressão que o espectador tem ao assistir a essa produção é a de que o cineasta estava acima de tudo se divertindo muito, o que não é de se admirar uma vez que o enredo – em tom de humor negro – brincava o tempo todo com uma situação bem inusitada e bizarra. O título original do filme, “The Trouble with Harry” (O Problema com Harry), era bem mais explicativo do que o equivocado nome nacional que o distribuidor brasileiro arranjou. Provavelmente acreditaram que ninguém iria assistir ao filme, caso seu título fosse uma tradução literal. Bobagem, o nome de Alfred Hitchcock já garantia o  interesse dos cinéfilos em qualquer parte do mundo. No Brasil não seria diferente.

Pois bem, e qual seria esse problema com Harry? E afinal, quem diabos era Harry?! Ora, Harry era um cadáver abandonado em um bosque. Isso mesmo que você leu. O roteiro se baseava justamente nisso. Um corpo era encontrado sucessivamente por várias pessoas em ocasiões diferentes e todas elas procuravam esconder o fato dos demais. Isso porque nenhum deles tinha exatamente certeza sobre as circunstâncias da morte de Harry e algumas até pensavam ter alguma culpa no cartório sobre isso. Achou tudo muito bizarro? Estranho? Claro que sim. O roteiro brinca de forma até mórbida com a inusitada situação. Quem teria matado Harry? O que levou ele a esse trágico fim? E quem seria o verdadeiro assassino?

Harry acaba sendo encontrado por um garotinho, por sua mãe, pela ex-esposa, por uma jovem e até por um capitão. Todos eles lidando com a situação de uma forma até inesperada, alguns com até uma certa indiferença ao fato do morto estar ali estendido no chão entre as folhas do bosque. O roteiro dessa maneira arma toda uma situação de puro humor negro para divertir o espectador. O velho Hitchcock costumava dizer que “O Terceiro Tiro” era um de seus filmes preferidos. Ele atribuía isso ao fato do argumento ser muito diferente de suas outras produções, com acentuado clima de morbidez cômica, por mais estranho que isso pudesse parecer. Some-se a isso a bela fotografia de Vermont, um dos lugares mais bonitos e pacatos dos EUA e você terá o clima perfeito.

Além de Alfred Hitchcock na direção, outro fato que chama a atenção no filme é a presença da jovem atriz Shirley MacLaine no elenco. Poucos lembram disso, mas esse foi seu primeiro filme! Jovem e bonita, ela interpretava Jennifer Rogers, uma das pessoas que também se deparavam com Harry na floresta! Naquela época ela já demonstrava todo o seu carisma que iria ajudá-la a construir uma das mais marcantes carreiras da história do cinema americano. Enfim, “O Terceiro Tiro” é indicado para os que desejam conhecer um outro lado do mestre do suspense. Seu humor definitivamente não era convencional e nem normal, mas certamente poderia ser considerado bem divertido. Que tal rir um pouco com Alfred Hitchcock?

O Terceiro Tiro (The Trouble with Harry, Estados Unidos, 1955) Direção: Alfred Hitchcock / Roteiro: John Michael Hayes, baseado no livro de Jack Trevor Story / Elenco: Shirley MacLaine, Edmund Gwenn, John Forsythe, Mildred Natwick / Sinopse: O corpo de um sujeito chamado Harry é encontrado em um bosque por várias pessoas. Todas elas o conheciam, mas ninguém queria se comprometer com aquela bizarra descoberta. Todas acabam pensando ter algo a ver com sua morte. Filme vencedor do Globo de Ouro na categoria de Melhor Revelação Feminina (Shirley MacLaine). Também indicado ao BAFTA Awards na categoria de Melhor Filme e Melhor Atriz (Shirley MacLaine).

Pablo Aluísio 

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2020

A Tortura do Silêncio

Outro grande clássico do mestre do suspense Alfred Hitchcock. Aqui o diretor decidiu lidar com um tema controverso, um dogma da igreja católica, o segredo da confissão. Na trama esse aspecto é muito bem explorado. Inesperadamente o empregado de uma paróquia resolve se confessar ao padre Michael Logan (Montgomery Clift) revelando que acabara de assassinar um advogado após um assalto mal sucedido. Para isso ele tinha até mesmo usado a própria batina do religioso, que havia sido roubada de seus aposentos. Como fruto de confissão, Logan agora não poderia mais contar a verdade para a polícia. O pior de tudo é que o inspetor Larrue (Karl Malden) começa a desconfiar que o próprio padre foi de fato autor do crime, afinal todas as pistas parecem apontar para seu lado, inclusive um complicado relacionamento dele com a bela Ruth Grandfort (Anne Baxter), uma mulher casada que estava sendo chantageada pelo mesmo advogado que foi morto. E agora, conseguirá o Padre Logan provar sua inocência sem romper seu juramento de nunca revelar as confissões de seus fiéis?

Provavelmente um dos mais bem elaborados filmes do mestre Alfred Hitchcock. Aqui ele coloca vários dogmas da fé católica na berlinda, ao mostrar um padre que não pode romper o segredo da confissão ao mesmo tempo em que tenta provar sua inocência em razão de um crime que nunca cometeu. Outro ponto interessante é a forma como Hitchcock lida com o celibato dos padres. Logan tem um amor em seu passado, quando era apenas um jovem prestes a ir para a guerra, justamente uma mulher casada que mesmo após tantos anos não consegue esquecer. A montagem do quebra-cabeças acaba levando o padre, um homem de grande fibra moral, ao desprezo público. Todos o consideram culpado, apenas pelo fato de ser um homem religioso que se encontrava com um antigo amor. Será que ele não merecia nem ao menos um voto de confiança? Como pode um homem tão bom e íntegro ser desacreditado assim, praticamente da noite para o dia?

O papel do torturado e existencial Padre Logan se mostra ideal para Montgomery Clift. A fragilidade física do ator, aliada a uma grande fibra espiritual, se mostra perfeita para a proposta do enredo. Há uma cena em que Hitchcock faz um paralelo muito perspicaz sobre o verdadeiro calvário que seu personagem passa. Enquanto ele anda a esmo, na rua, em profundo conflito interior por tudo o que passa, surge em primeiro plano, no alto de uma igreja, uma imagem de Cristo e os soldados romanos durante sua penosa caminhada rumo ao calvário. Um efeito até mesmo simples, mas muito significativo do mestre do suspense. A imagem funciona assim como uma materialização de tudo aquilo que o pobre padre passa naquele momento. A vivência mais plena do que é ser cristão de verdade. A acusação infundada, o abandono por parte de seus próprios fiéis, o escárnio público e a condenação sem provas consistentes.

Por falar no diretor, ele é a primeira pessoa que surge em cena, no alto de uma grande escadaria logo na abertura do filme. Hitchcock sempre fazia essas pequenas aparições em suas produções e aqui o momento é mais do que divertido. Por trás da diversão também havia um aspecto sério a se considerar. A impressão que passa é que o cineasta tentava exorcizar mais um de seus conflitos internos com o filme. Como se sabe Hitchcock tinha uma relação de amor e ódio em relação ao catolicismo, algo que aqui ele acaba passando para a tela. Ao mesmo tempo em que martiriza seu personagem principal, o padre, também o enche de muita dignidade e honestidade. O transforma em um santo perseguido. Uma cristalina imagem do que ele próprio sentia em relação à Igreja de Roma. Assim fica a recomendação desse grande trabalho do genial diretor. Fé, conflito espiritual, tentação, injustiça, mentira e hipocrisia formam o núcleo de uma trama simplesmente brilhante. Assista e entenda porque Hitchcock foi um dos maiores gênios da história do cinema.

A Tortura do Silêncio (I Confess, Estados Unidos, 1953) Estúdio: Warner Bros / Direção: Alfred Hitchcock / Roteiro: George Tabori, William Archibald / Elenco: Montgomery Clift, Anne Baxter, Karl Malden / Sinopse: Jovem padre passa a ser o principal suspeito de um crime de assassinato. Ele é inocente e sabe quem foi o verdadeiro culpado, mas não pode contar para os policiais pois esse segredo lhe foi passado em confissão, ao qual ele tem que manter sigilo por causa de um dogma de fé da igreja católica. Filme indicado no Cannes Film Festival na categoria de Melhor Direção (Alfred Hitchcock).

Pablo Aluísio. 

Assim Estava Escrito

Infelizmente o ator Kirk Douglas faleceu ontem, aos 103 anos de idade. Ele está sendo relembrado por diversos órgãos de imprensa no mundo todo. Muitos se lembram de filmes como "Spartacus", etc. No meu caso vou citar esse excelente "The Bad and the Beautiful" que considero o melhor filme de sua longa e produtiva carreira. Lançado em 1952 o filme era ao mesmo tempo uma homenagem ao cinema e uma visão crítica e mordaz da indústria cinematográfica como um todo. Na trama o ator interpretava um produtor ganancioso chamado Jonathan Shields. Quando o filme começa encontramos o personagem Harry Pebbel (Walter Pidgeon), um dono de estúdio de cinema em Hollywood, reunindo em seu escritório três grandes nomes da indústria: a estrela Georgia Lorrison (Lana Turner), o roteirista James Lee Bartlow (Dick Powell) e o diretor Fred Amiel (Barry Sullivan). Ele quer que os três aceitem o convite do produtor Jonathan Shields para trabalharem em um novo filme. A partir daí todos eles começam a relembrar fatos que viveram no passado ao lado de Shields. Na maioria dos casos, lembranças bem dolorosas.

O roteiro do filme é um primor. Tudo se desenvolve nos bastidores da história do cinema. No filme o astro Kirk Douglas interpreta esse ótimo personagem, cheio de nuances psicológicas, um produtor de Hollywood que no passado deixou marcas negativas em diversas pessoas que trabalharam e se relacionaram com ele. Ele conseguiu construir do nada um estúdio de cinema e aos poucos foi colecionando sucessos de bilheteria. O começo foi modesto. Shields precisou produzir filmes baratos, produções B de terror. Quando conheceu o jovem e promissor diretor Fred Amiel (Barry Sullivan), que desejava adaptar um livro clássico da literatura para as telas,  percebeu que sua sorte poderia mudar. Porém sua deslealdade com todos os que trabalharam ao seu lado começou a ficar cada vez mais evidente com o passar dos anos.

Shields tinha um talento natural para descobrir futuros profissionais brilhantes, assim ele também apostou suas fichas numa jovem atriz, com pouca experiência e baixa auto estima, a loira Georgia Lorrison (Turner). Filha de um ex-astro do passado, ela não conseguia superar seus problemas emocionais. Afundada no alcoolismo por causa das frustrações na carreira ela foi finalmente resgatada da sarjeta por Shields. Por fim o mesmo produtor percebeu que o futuro do cinema vinha da contratação de bons escritores para roteirizar os filmes. Por isso também contratou o romancista James Lee Bartlow (Powell) para trabalhar ao seu lado. Só que não demorou muito para que ele também fosse passado para trás pelo produtor, aqui visto como um sujeito bem dúbio, amigo na frente das pessoas, jogando contra elas nas suas costas. Todas essas pessoas deveriam ter laços eternos de gratidão com Shields, mas isso não acontece porque o produtor mais cedo ou mais tarde acabou decepcionando todos ao seu redor com suas atitudes.

O personagem interpretado por Kirk Douglas é um papel maravilhoso para qualquer ator, porque é real, tem sentimentos mesquinhos e não vacila em trair as pessoas caso entenda que isso seja necessário. Ao mesmo tempo possui um inegável talento para convencer a todos, mesmo quando foram magoados por ele no passado. O roteiro desse filme é realmente brilhante porque toda a história de Shields é narrada em flashback enquanto seus antigos desafetos são reunidos na sala de um dono de estúdio que quer convencê-los a trabalharem com o produtor novamente.

Esse filme foi um projeto bem pessoal de Kirk Douglas que conseguiu mostrar os bastidores do mundo do cinema como nunca antes visto. Ele chamou o talentoso cineasta Vincente Minnelli para dirigir e isso trouxe um grande impacto na tela. Fugindo de enquadramentos convencionais, Minnelli criou uma obra imortal. O elenco também está todo em estado de graça. Lana Turner tem uma de suas melhores interpretações: a de uma linda atriz que por baixo de toda a imagem glamorosa escondia uma mulher muito frágil emocionalmente falando. As semelhanças com Marilyn Monroe chegam a ser óbvias. Kirk Douglas dá vida ao produtor Shields, uma verdadeira força da natureza, egoísta e egocêntrico em certos momentos, amigo e fiel em outras situações. Um verdadeiro camaleão.

Curiosamente no meio de tantos talentos quem acabou levando o Oscar foi a atriz Gloria Grahame. Ela interpreta a esposa de um escritor contratado por Shields para ser o novo roteirista de seu estúdio. Uma beldade do sul, ela fica deslumbrada e magnetizada pela vida de luxo e riqueza de Hollywood e acaba sendo manipulada por Shields para seus interesses pessoais, o que acaba resultando em uma grande tragédia. Enfim, "Assim Estava Escrito" é realmente uma obra prima do cinema clássico americano. Um filme fantástico que é principalmente indicado para os cinéfilos em geral, para as pessoas que amam a sétima arte e sua história. É seguramente um dos melhores autorretratos já feitos por uma Hollywood em seus tempos de glória e auge.

Assim Estava Escrito (The Bad and the Beautiful, Estados Unidos, 1952) Estúdio: Metro-Goldwyn-Mayer (MGM) / Direção: Vincente Minnelli / Roteiro: Charles Schnee, George Bradshaw / Elenco: Lana Turner, Kirk Douglas, Walter Pidgeon, Dick Powell, Gloria Grahame, Gilbert Roland / Sinopse: O filme conta a história de um poderoso e desleal produtor de Hollywood. Um homem que não pensava duas vezes antes de passar para trás pessoas que lhe ajudaram no passado. Filme indicado ao Oscar na categoria de Melhor Ator (Kirk Douglas). Vencedor do Oscar nas categorias de Melhor Atriz Coadjuvante (Gloria Grahame), Melhor Roteiro (Charles Schnee), Melhor Fotografia (Robert Surtees), Melhor Direção de Arte (Cedric Gibbons, Edward C. Carfagno) e Melhor Figurino (Helen Rose). Também indicado ao BAFTA Awards na categoria de Melhor Filme.

Pablo Aluísio.

terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

Gigantes em Luta

Terceira e última parceria entre os grandes astros do faroeste americano John Wayne e Kirk Douglas. No filme Wayne interpreta Taw Jackson que resolve se unir ao pistoleiro e ladrão Lomax (Kirk Douglas) para colocar em prática um plano mais do que ousado: roubar um carregamento de ouro no valor de 500 mil dólares. O grande desafio deles será, além de enfrentar a forte segurança que acompanha a fortuna, conseguir vencer a própria carroça que transporta o ouro, pois essa é fortemente armada com um potente metralhadora, além de ser blindada, se tornando praticamente inexpugnável. “Gigantes em Luta” é um western de pura ação, com muitas cenas de lutas, batalhas e tiroteios. Durante as filmagens Kirk Douglas teve uma surpresa que o impactou. John Wayne havia perdido o pulmão em uma complicada operação, três anos antes, na sua luta pessoal contra o câncer. 

Assim o veterano ator estava bem debilitado fisicamente, precisando recorrer regularmente a uma bolsa de oxigênio para dar conta das complicadas filmagens, que lhe exigiam muito do ponto de vista físico. Mesmo assim ele trabalhou com empenho, sem reclamar. Vendo aquela obstinação do colega, Kirk ficou emocionado, como bem revelou em uma entrevista anos depois. Ele tinha que dar o melhor de si nas filmagens ao mesmo tempo em que se preocupava com John Wayne nas cenas mais exigentes e perigosas.

Além do ótimo elenco o filme também apresentava uma produção muito boa, até acima da média. Uma das “estrelas” do filme era a própria carroça blindada que levava o carregamento de ouro, chamada “War Wagon”. Durante anos ela foi exposta no parque temático da Universal ao lado de vários outros artefatos famosos de filmes clássicos. O curioso é que a “War Wagon” era na realidade feita de madeira pintada para parecer aço e ferro. Um truque de Hollywood. Com o uso de efeitos sonoros para recriar o som característico dos metais, completou-se a ilusão de que se estava na presença de uma carroça realmente blindada. Ninguém na época desconfiou de nada.

O diretor de “Gigantes em Luta” foi Burt Kennedy, que se deu tão bem com o astro John Wayne que esse o trouxe de volta para dirigir “Chacais do Oeste” cinco anos depois. O diferencial é que Kennedy sempre procurava respeitar os limites que a saúde de John Wayne exigia. Assim ele procurava filmar as cenas com o ator de forma concentrada, para evitar deixar John Wayne esperando por longas horas para entrar em cena. Também sempre deixava o ator à vontade, sem aquele clima de tensão no set, algo bem típico de Hollywood. O resultado de tudo é mais um belo western na filmografia de John Wayne, aqui ao lado de outro mito do cinema americano, Kirk Douglas. Simplesmente imperdível para os fãs do gênero.

Gigantes em Luta (The War Wagon, Estados Unidos, 1967) Direção: Burt Kennedy / Roteiro: Clair Huffaker, baseado em sua novela, The War Wagon / Elenco: John Wayne, Kirk Douglas, Howard Keel, Robert Walker Jr, Keenan Wynn / Sinopse:  Dois aventureiros se unem no velho oeste para roubar uma carroça blindada que transporta um grande carregamento de ouro no valor de 500 mil dólares. Filme premiado pelo Western Heritage Awards na categoria de Melhor Direção.

Pablo Aluísio. 

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2020

A Um Passo da Morte

Esse é um clássico do western americano estrelado pelo astro Kirk Douglas. Na história Johnny Hawks (Kirk Douglas) lidera uma caravana de pioneiros no meio de um território indígena. Embora pacificadas, as tribos do local vivem em tensão com os brancos por causa de minas de ouro recentemente descobertas. Um dos membros da caravana, Wes Todd (Walter Matthau), está particularmente interessado em descobrir o exato local dessas ricas minas. Para isso usará de todos os meios para ter em mãos a localização dessa imensa riqueza mineral. Claro, isso vai criar todos os tipos de disputas e problemas dentro da caravana. Além da ameaça dos nativos, ainda há a ganância dos demais pioneiros.

"A Um Passo da Morte" é uma produção de encher os olhos do espectador. O filme foi todo rodado na maravilhosa reserva natural de Bend, no Estado norte-americano do Oregon. Isso trouxe ao filme uma das mais belas fotografias que já vi em um faroeste dos anos 50. Rios de águas límpidas, montanhas e muito verde desfilam pela tela como um verdadeiro brinde aos espectadores. Junte-se a isso um bom roteiro, socialmente consciente, mostrando o profundo respeito dos índios em relação às riquezas naturais da região e você terá um belo western como resultado final.

O filme é curto, menos de 80 minutos, mas muito eficiente. Um dos destaques é a ótima cena de ataque dos guerreiros Sioux contra o forte do exército americano. Usando de cavalos, flechas e lanças de fogo, os indígenas demonstram ter bastante conhecimento de táticas de guerra e combate. Afinal de contas eram povos guerreiros. A cena é excepcionalmente bem filmada e o próprio forte construído na locação impressiona pelo tamanho e realismo. Certamente não foi uma produção barata, o que era bem do feitio do astro Kirk Douglas que sempre procurou o melhor em termos de produção para seus filmes. Aqui obviamente não seria diferente.

Curiosamente o filme foi dirigido pelo húngaro André de Toth, um cineasta versátil que se saía bem dirigindo os mais diversos tipos de filmes, de faroestes a dramas, passando por alguns clássicos do terror (como "Museu de Cera" ao lado do amigo Vincent Price). Dizem que foi escolhido pelo próprio Kirk Douglas, já que ele tinha também a intenção de dirigir algumas partes do filme, sempre dando opinião no roteiro, etc. Isso levou alguns a afirmarem que o filme foi co-dirigido por Douglas, embora ele não tenha sido creditado na direção. Em conclusão recomendo bastante esse excelente western bucólico, com lindas locações naturais, um belo romance ao fundo e muitas cenas de ação e conflitos. Está mais do que recomendado.

A Um Passo da Morte (The Indian Fighter, Estados Unidos, 1955) Direção: André de Toth / Roteiro: Frank Davis, Robert L. Richards / Elenco: Kirk Douglas, Walter Matthau, Elsa Martinelli, Lon Chaney Jr / Sinopse: Johnny Hawks (Kirk Douglas) lidera uma caravana de pioneiros no meio de um território indígena. Assim que a jornada começa um dos integrantes afirma que está particularmente interessado na localização de minas de ouro na região, criando conflitos, despertando a ambição e ganância dos demais viajantes e pioneiros.

Pablo Aluísio. 

Face a Face com o Diabo

Faroeste estrelado por Jeffrey Hunter. Na história um casal decide deixar New Orleans para ir embora rumo ao velho oeste. Uma mina de ouro muito promissora espera por eles. Após extrair o valioso metal, acabam sendo alvos de um bando de criminosos mexicanos que armam um cerco a eles. O marido reage ao ataque, usando inclusive bananas de dinamite, mas elas acabam causando um desmoronamento de rochas da encosta. Ele assim fica preso sob pedras e objetos que caíram da montanha. Sua esposa então parte em busca de ajuda numa pequena cidade cheia de ladrões e traficantes de armas. É justamente lá que encontra Joe Collins (Jeffrey Hunter) e suplica por sua ajuda, para que salve seu esposo da morte certa no deserto. Esse western spaghetti é bem interessante por vários aspectos. O principal deles é a presença do ator americano Jeffrey Hunter. 

Depois de um começo muito promissor em Hollywood, onde chegou a interpretar até mesmo Jesus Cristo no clássico "Rei dos Reis", sua carreira entrou em declínio. Depois de alguns fracassos Hunter resolveu mudar de ares, indo até a Europa onde estrelou esse faroeste italiano. Seu personagem, Joe Collins, é um ex-oficial da cavalaria americana que agora vive em uma cidade infestada de criminosos. Expulso do exército ele vaga sem rumo, alcoólatra e sujo. Para sobreviver acaba até mesmo traficando armas para um bandoleiro mexicano assassino chamado "Chato", conhecido por invadir e saquear vilas indefesas, matando mulheres e crianças pelo caminho, ou seja, alguém muito longe da imagem de mocinho dos filmes de western.

Mesmo assim, com esse histórico nada promissor, ele resolve ajudar essa jovem mulher que está desesperada em busca de ajuda após o marido ficar soterrado no alto das montanhas. Collins então forma um bando para ir com ele até lá, salvar o sujeito. Nesse grupo há todos os tipos de escória que você possa imaginar. Há um cafetão sem qualquer escrúpulo, um falso padre que na verdade rouba viajantes e um famigerado traficantes de armas. O resultado, embora longe do memorável, me agradou bastante. Jeffrey Hunter, por exemplo, se despiu de sua imagem de galã americano e surge na tela envelhecido, rústico e excessivamente bronzeado (no mal sentido da palavra, nada estético, queimado mesmo do sol do deserto). Com uma linguagem bem de acordo com o estilo do western spaghetti, esse filme no final de tudo acaba se revelando uma excelente diversão.

Face a Face com o Diabo (Joe... Cercati Un Posto Per Morire!,  Itália, 1968) Estúdio: Aico Films, Atlantis Film / Direção: Giuliano Carnimeo / Roteiro: Lamberto Benvenuti / Elenco: Jeffrey Hunter, Pascale Petit, Giovanni Pallavicino / Sinopse: Jovem pistoleiro ajuda um casal que foi roubado por um bando de ladrões mexicanos do deserto. Eles querem todo o ouro de uma mina explorada pela esposa e seu marido.

Pablo Aluísio.

domingo, 16 de fevereiro de 2020

A Conquista do Oeste

Quando a Metro anunciou "A Conquista do Oeste" o estúdio deixou claro suas intenções: realizar o filme definitivo sobre a expansão da civilização norte-americana em direção ao oeste selvagem.  Para isso não mediu esforços colocando à disposição do filme tudo o que estúdio tinha de mais importante na época. Atores, diretores, roteiristas, tudo do bom e do melhor foi direcionado para esse projeto. Os grandes nomes do western foram contratados. John Wayne e James Stewart logo assinaram para participarem do elenco. Os diretores consagrados John Ford e George Marshall também entraram no projeto sem receios. Era uma grande equipe reunida. Além do capital humano a Metro resolveu investir em um novo formato de exibição onde três telas enormes projetavam cenas do filme. A técnica conhecida como Cinerama visava proporcionar ao espectador uma sensação única de imersão dentro do filme. Para isso há uso de longas tomadas abertas, tudo para dar a sensação ao público de que realmente está lá, no velho oeste. Era claramente uma tentativa da Metro em barrar o avanço da televisão que naquele ano havia tirado uma grande parte da bilheteria dos filmes. Assim "A Conquista do Oeste" chegava para marcar a história do cinema... bom, pelo menos essa era a intenção.

Realmente é uma produção de encher os olhos, com três diretores e um elenco fenomenal. O resultado de tanto pretensão porém ficou pelo meio do caminho. "A Conquista do Oeste" passa longe de ser o filme definitivo do western americano. Na realidade é uma produção muito megalomaníaca que a despeito dos grandes nomes envolvidos não passa de uma fita convencional, pouco memorável. O problema é definitivamente de seu roteiro. São vários episódios com linhas narrativas que as ligam numa unidade, mas nenhuma delas é bem desenvolvida. Tudo soa bem superficial.

O grande elenco também é outro problema. Apesar dos mitos envolvidos nenhum deles tem oportunidade de disponibilizar um bom trabalho, realmente marcante. John Wayne, por exemplo, só tem praticamente duas cenas sem maior importância. Ele interpreta o famoso general Sherman, mas isso faz pouca diferença pois tão rápido como aparece, desaparece do filme, deixando desolados seus fãs que esperavam por algo mais substancioso. James Stewart tem um papel um pouquinho melhor, de um pioneiro que vive nas montanhas, mas é outro grande nome que também é desperdiçado. A única que faz parte de todos os segmentos é a personagem de Debbie Reynolds, porém ela não é uma figura de ponta no mundo do faroeste. Quem não gosta dela certamente não se importará com sua personagem. Assim, em conclusão, podemos definir "A Conquista do Oeste" como um filme grande, mas não um grande filme. Faltou um melhor equilíbrio.

A Conquista do Oeste  (How the West Was Won, Estados Unidos, 1962)  Direção: John Ford ("The Civil War") / Henry Hathaway ("The Rivers", "The Plains", "The Outlaws") / George Marshall ("The Railroad") / Roteiro: James R. Webb, John Gay / Elenco: Debbie Reynolds, James Stewart, Lee J. Cobb, Henry Fonda, Carolyn Jones, Karl Malden, Gregory Peck, George Peppard, Richard Widmark, Eli Wallach, John Wayne / Sinopse: A saga de uma família de pioneiros cujos descendentes participarão dos grandes eventos que marcaram a história do oeste americano.Filme vencedor do Oscar nas categorias de Melhor Roteiro (James R. Webb), Melhor Som (Franklin Milton) e Melhor Edição (Harold F. Kress).

Pablo Aluísio. 

O Intrépido General Custer

Cinebiografia romanceada do General George Armstrong Custer (Errol Flynn) e sua sétima cavalaria. A tropa ficou muito famosa na história norte-americana por causa de suas lutas contra tribos hostis lideradas pelo chefe Sioux Touro Sentado. O clímax do filme acontece justamente na batalha de Little Big Horn quando os soldados americanos enfrentaram de forma decisiva, em campo aberto, as hordas indígenas. Quando resolvi assistir esse filme fui com o pensamento de que veria uma produção muito bem realizada, historicamente incorreta, mas que no final das contas tinha tudo para ser um bom western de entretenimento estrelado pelo ídolo Errol Flynn. Acertei bem no alvo! 

O título em inglês é uma expressão popular no exército que se refere aos soldados mortos em serviço, no campo de batalha - uniformizados, com suas botas! (They Died with Their Boots On). Pois bem, a primeira parte do filme é um tanto romanceada além do que seria razoável, inclusive com toques de humor em excesso, algo que eu realmente não esperava nesse tipo de produção. Essa parte inicial tem muito mais a ver com o estilo bonachão de Errol Flynn do que com a biografia do general Custer, que era um sujeito sisudo e de poucas palavras na vida real (ao contrário da caracterização de Flynn, sempre sorridente e soltando piadas).

Já dos sessenta minutos em diante o filme cresce muito (são duas horas e meia de duração). Isso acontece porque o lado mais romanceado do filme é deixado de lado para que o roteiro desenvolva os eventos que aconteceram com o General e seus soldados. A partir desse momento do filme Custer se torna um general e vai para o oeste lutar nas chamadas guerras indígenas. O filme aqui se torna mais sério, com roteiro muito bem estruturado e com um final muito bem realizado, inclusive do ponto de vista histórico (os tropeços em termos de história ocorrem quase todos na primeira parte do filme). O elenco de apoio traz a simpática Olivia de Havilland fazendo mais uma vez o interesse romântico de Flynn. Charley Grapewin surge no papel de "California Joe", um dos melhores personagens do filme, aqui na pele de um excepcional ator, ótimo mesmo. De resto o filme faz jus à fama do diretor Raoul Walsh, sempre muito competente. Se não é fiel do ponto de vista histórico, pelo menos serve, ainda nos dias de hoje, como um competente veículo de diversão para o espectador.

O Intrépido General Custer (They Died with Their Boots On, EUA, 1941) Direção: Raoul Walsh / Roteiro: Wally Kline, Eneas MacKenzie / Elenco Errol Flynn, Olivia de Havilland, Arthur Kennedy / Sinopse: Cinebiografia romanceada do General George Armstrong Custer (Errol Flynn) e sua sétima cavalaria. Militar famoso desde os tempos da guerra civil ele liderou uma série de ataques contra índios rebeldes em territórios distantes do velho oeste e acabou tendo um final trágico.

Pablo Aluísio.

sábado, 15 de fevereiro de 2020

Oscar 2020 - Vencedores


Parasita
Acabou se tornando o grande vencedor da noite, para surpresa de muitos. Claro, todo mundo esperava que levasse o Oscar de Melhor Filme Estrangeiro. Era um franco favorito. Porém o filme foi além, venceu também na categoria de Melhor Filme. Dois prêmios importantes. Foi a primeira vez que isso aconteceu na história. Penso que foi um erro. Acabou tornando as categorias redundantes. E foi um exagero, apesar dos méritos cinematográficos dessa obra coreana. E não parou por ai, o filme foi generosamente premiado por Melhor Direção (para Bong Joon Ho) e Melhor Roteiro Original (Bong Joon Ho e Jin Won Han). Enfim levou estatuetas importantes e fez história.

Coringa
Foi o filme que mais levou indicações, porém no final das contas provou-se mais uma vez que a Academia tem dificuldades em premiar nas melhores categorias filmes que sejam baseados em quadrinhos. É um velho preconceito. De qualquer maneira ganhou o Oscar de Melhor Ator para Joaquin Phoenix. Era o mais favorito de todos os favoritos. Ninguém ficou surpreso e foi mais do que merecido. Esnobado nas demais categorias importantes acabou levando ainda o Oscar de Melhor Trilha Sonora Original para Hildur Guðnadóttir. Outro prêmio merecido.

Era Uma Vez em... Hollywood
A viagem de ácido de Tarantino aos anos 60 merecia melhor sorte em minha opinião. Porém levantou uma estatueta importante, a de Melhor Ator Coadjuvante para Brad Pitt. Essa foi uma categoria acirrada, concorrida, apenas com grandes nomes. Pitt acabou vencendo pela simpatia e pelo conjunto de sua filmografia. É um ator que vem tentando melhorar a cada ano. Merece reconhecimento por isso. O outro prêmio dado a esse filme foi bem merecido, o de Melhor Design de Produção (para Barbara Ling e Nancy Haigh). Antigamente essa categoria era chamada de Direção de Arte. Recriar todo aquele clima dos anos 60, com carros, cenários, roupas de época, realmente não era uma tarefa fácil. O filme de Tarantino conseguiu isso, nos levando diretamente para aquela década.

Judy: Muito Além do Arco-Íris
Essa cinebiografia dos últimos anos de vida da atriz e cantora Judy Garland acabou sendo premiada numa categoria bem importante, a de Melhor Atriz para Renée Zellweger. Foi um belo trabalho. Ela captou mesmo a vulnerabilidade daquela mulher em decadência artística e pessoal. A Zellweger tem aquela sensibilidade própria para captar pessoas assim. Seu prêmio é dito como seu renascimento em Hollywood. Mas será mesmo? Mickey Rourke também recebeu um prêmio justamente nessa vibe, mas depois de algum tempo voltou a sumir. Espero que isso não aconteça com a Renée Zellweger.

História de um Casamento

Outro filme que de certa forma ficou no meio do caminho. Mesmo assim levou o honroso Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante para a veterana Laura Dern. Ela interpretou a advogada da esposa, no meio daquela guerra que sempre surge após o divórcio. Havia alguma esperança para Scarlett Johansson e Adam Driver que fizeram um grande trabalho de atuação. Porém eles não venceram, o que de certa maneira foi uma injustiça também já que esse filme é um daqueles que valorizam acima de tudo o trabalho dos atores.

1917
O favoritismo que o filme ganhou ao vencer o Globo de Ouro não se concretizou nessa noite. Assim o filme acabou só vencendo em categorias técnicas. Entre elas a mais importante foi a de Melhor Direção de Fotografia, com o veterano Roger Deakins. Fora isso o filme só venceu em Melhor Mixagem de Som e Melhores Efeitos Visuais. A categoria do som foi muito merecido. Os técnicos do filme colocaram microfones nas roupas dos atores para captar tudo, seus passos, o som ambiente, etc. Já de Melhores Efeitos Visuais foi uma surpresa, já que todos os efeitos fazem parte do filme e estão tão centradas na narrativa que pouca gente percebeu sua importância.

Adoráveis Mulheres
Um filme excelente, muito agradável de assistir, que merecia mais no Oscar. Acabou levando um Oscar óbvio de Melhor Figurino (para a estilista Jacqueline Durran). Recriar todos aqueles vestidos antigos, não é algo simples de se fazer. Para ser o mais realista possível ela consultou documentos no Museu de Londres, foi atrás de gravuras e desenhos de moda da época e conseguiu um efeito maravilhoso. Filmes de época precisam se esmerar mesmo nesse tipo de categoria. O Oscar foi mais do que justo.

Jojo Rabbit
O diferente "Jojo Rabbit" foi premiado por Melhor Roteiro Adaptado (Taika Waititi). Fiquei surpreso, apesar das boas ideias dessa adaptação. Realmente algumas vezes é complicado transportar todo um universo imaginário para a tela e ter sucesso nesse processo. Algumas ideias dão certo no papel, mas sua execução acaba se tornando problemática quando vira cinema. O roteirista desse filme conseguiu superar esse tipo de barreira.

Ford vs Ferrari
Mais um excelente filme que também só venceu em categorias técnicas. Levou o Oscar de Melhor Edição (Andrew Buckland e Michael McCusker) e Melhor Edição de Som (Donald Sylvester). Fazer funcionar na tela de cinema uma corrida em alta velocidade exige também uma edição primorosa, para colocar todos os detalhes dos carros e da pista em celuloide. Aqui não houve maiores controvérsias. E no caso do som, segue o mesmo parâmetro. Afinal carros fazem barulho e o som dos motores possantes devem ter um efeito catalisador no público. É gerar emoção através do que se ouve.

Toy Story 4
Venceu o Oscar de Melhor Animação do ano, dado para os produtores do filme, Josh Cooley, Mark Nielsen e Jonas Rivera. Muita gente não gostou. Além de ser um filme número 4 de uma franquia já até bem antiga, a opinião maioritária foi que os demais concorrentes eram bem melhores. Na minha opinião esse filme ganhou porque investiu fundo na emoção, no sentimento familiar das pessoas. Acabou atingindo o coração dos membros da Academia.

Rocketman
Merecia maior reconhecimento por parte da Academia. Porém acabou vencendo um Oscar importante, o de Melhor Música, para "I'm Gonna Love Me Again". Foi uma forma de reconhecer a importância da obra e da carreira de Elton John. Ele que mesmo sendo um superstar tanto trabalhou em trilhas sonoras para filmes ao longo dos anos merecia essa homenagem. Seu parceiro de tantos anos na composição, o ótimo Bernie Taupin, também foi agraciado. Palmas para eles.

O Escândalo
Esnobado nas categorias mais importantes. Acabou levando o Oscar de Melhor Maquiagem e Penteados (para o trio Kazu Hiro, Anne Morgan e Vivian Baker). Na minha opinião aqui aconteceu algo curioso. Claro que a maquiagem do filme foi muito bem feita, mas o resultado ficou esquisito. As atrizes perderam aspectos de suas faces originais, criando no espectador um sentimento estranho, como se elas fossem bonecas de plástico do tipo Barbie. Eu achei que foi algo desnecessário. Preferia lidar com a beleza natural de todas essas mulheres.

Indústria Americana
O filme venceu na categoria de Melhor Documentário. Era o favorito, então a categoria foi sem maiores surpresas. Muita gente falou do documentário brasileiro "Democracia em Vertigem", mas esse não tinha chances. Na bolsa de aposta de Londres ele estava em último lugar. Também não ajudaram as críticas afirmando que o filme era pura propaganda política de um partido brasileiro. A desonestidade intelectual de seu roteiro também foi um ponto negativo. Esse é um ponto de vista que concordo. Propagandas políticas, com roteiros que distorcem a realidade dos fatos históricos, não merecem mesmo vencer prêmios importantes como o Oscar. Deixem isso apenas para obras de arte puramente cinematográficas. O Brasil merece seu Oscar, mas que ele venha por um filme digno.

Pablo Aluísio.

Medo Profundo 2

O primeiro filme custou pouco e faturou muito bem, rompendo a marca dos 100 milhões de dólares nas bilheterias. Para um pequeno filme de terror e suspense com tubarões estava bom demais! Assim o estúdio se apressou para lançar mais um filme. Menos de dois anos depois do primeiro, já chegava aos cinemas essa sequência. A fórmula segue basicamente a mesma. Garotas bonitas que se metem em problemas quando decidem mergulhar em águas perigosas. O diferencial é que no primeiro filme eram duas jovens, agora são quatro (mais comida para os predadores). Outra mudança foi que o mergulho agora é dentro de uma caverna no México. No lugar há ruínas de um antigo templo Maia. As relíquias arqueológicas estão submersas. Mergulho em cavernas é considerado extremamente perigoso, mas as meninas não pensam sobre isso e vão em busca de aventuras. Claro, tudo vai dar muito errado, ainda mais ao descobrirem que o lugar está infestado de tubarões brancos, cegos, das profundezas. Altamente vorazes, eles começam a perseguir as moças com fúria.

Esse diretor inglês chamado Johannes Roberts tem se especializado em filmes como esse. Ele não apenas dirigiu o primeiro "Medo Profundo", como também um bom filme de terror ao velho estilo, o interessante "Do Outro Lado da Porta". Outro filme dele que gostei foi "Os Estranhos: Caçada Noturna". Ele é bom nesse nicho. E pensar que um de seus primeiros filmes foi o trash  "A Fúria de Simuroc", onde uma ave gigante atacava uma pobre família. Pelo visto ele melhorou muito desde então. Enfim, fica aqui a dica desse segundo filme. Assim como o primeiro, esse também me agradou bastante.

Medo Profundo 2: O Segundo Ataque (47 Meters Down: Uncaged, Estados Unidos, 2019) Direção: Johannes Roberts / Roteiro: Ernest Riera, Johannes Roberts / Elenco: Sophie Nélisse, Corinne Foxx, Brianne Tju / Sinopse: Quatro garotas americanas são atacadas por tubarões gigantes dentro de uma caverna no México. No lugar há diversas ruínas de um secular templo da civilização perdida Maia.

Pablo Aluísio. 

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2020

Joias Brutas

Adam Sandler assinou com a Netflix para atuar em quatro filmes na plataforma. Os primeiros filmes não fugiram muito do que ele está acostumado a fazer no cinema. Esse "Joias Brutas", por outro lado, se diferencia de tudo o que ele já fez em sua carreira. Passa longe de ser uma comédia e traz a melhor atuação de Sandler em toda a sua longa filmografia. É sintomático que por anos o nome de Adam Sandler tenha sido associado a filmes ruins. E ele de fato abusou muito nesse requisito, atuando em coisas medonhas. Porém temos aqui uma pequena redenção pessoal, mostrando que ele de fato sabe atuar bem. Sandler não apenas dá conta do seu personagem, como surpreende em seu trabalho como ator.

Aqui nesse filme ele interpreta um vendedor de joias em Nova Iorque. Howard Ratner (Adam Sandler) é uma espécie de borrão de um tipo de comerciante judeu muito popular na cidade. O sujeito parece também apresentar todos os defeitos possíveis em um homem de sua idade. É basicamente um enrolão e um enrolado. Enrolão porque vai enrolando seus credores - alguns deles bem perigosos - até os limites da insanidade. Ele deve muito e para muita gente, mas sempre tem uma desculpinha para se safar. E nesse processo ele também se torna um enrolado, tentando fazer um negócio para cobrir outro, enquanto vai se perdendo nas inúmeras confusões em que se enfia. Chega a ser engraçado, mas naquela situação em que se dá um sorriso nervoso.

E essa sucessão de problemas também vai para sua vida pessoal. Ele tem uma amante fixa, que mantém em um apartamento, tudo bancado por ele. E tudo isso feito debaixo do nariz da esposa e filhos. Ele definitivamente tem pouco ou nenhum caráter. Porém de todos os seus pecados o pior é o vício em apostas. Completamente descontrolado, ele aposta valores altos em jogos da NBA. E isso vai fazendo com que todos percam a paciência com ele. Inclusive esse caminho vai levá-lo a um beco sem saída. O filme é tenso, mantém um nervosismo próprio durante toda a história. A ansiedade e o nervosismo do protagonista passa para o roteiro e isso faz um diferencial e tanto. A edição é ágil, indo para um lugar, para o outro, sem parar. É a própria vida do personagem principal. E a explosão de violência na cena final é o clímax que já era esperado após tanta tensão. Eu nunca pensei que iria escrever isso, mas em muitos momentos o Adam Sandler me lembrou o Al Pacino em seus bons momentos. Quem diria que algo assim um dia iria acontecer? Enfim, um filme muito bom. Bem trabalhado, bem roteirizado, com excelentes atuações. Entra no rol das melhores coisas já produzidas pela Netflix.

Joias Brutas (Uncut Gems, Estados Unidos, 2019) Direção: Benny Safdie, Josh Safdie / Roteiro: Ronald Bronstein, Josh Safdie / Elenco: Adam Sandler, Julia Fox, Idina Menzel / Sinopse: O filme conta a história de um vendedor judeu de joias de Nova Iorque. Sua vida e seus negócios são completamente caóticos. Filme premiado pelo Film Independent Spirit Awards, na categoria de Melhor Ator (Adam Sandler) e Melhor Direção.

Pablo Aluísio.