segunda-feira, 6 de junho de 2011

Paulo e Tecla

Paulo e Tecla
Uma das figuras mais interessantes do cristianismo primitivo foi Tecla (ou Thecla). Hoje em dia praticamente tudo o que sabemos sobre ela veio de textos apócrifos. Embora muitos historiadores a considerem uma figura histórica que realmente existiu e andou ao lado de Paulo, o fato é que ela foi completamente ignorada pelos evangelhos oficiais. Mas afinal, quem foi Tecla? Antigos historiadores afirmam que no começo do cristianismo a presença de Tecla foi tão importante que ela chegou a ser venerada como uma verdadeira santa da Igreja que nascia naquele momento. Os textos mais antigos sobre sua vida ao lado do apóstolo Paulo datam do ano de 170. Eles foram escritos para comunidades cristãs que a cultuavam nesse mesmo período, em vastas regiões que iam da Grécia até o Egito, onde era extremamente popular. Até mesmo em algumas Igrejas medievais espanholas existem representações de Tecla, mostrando que seu culto chegou também em distantes regiões da Europa.

Por que Tecla foi literalmente banida então dos atos dos apóstolos se ela foi tão importante no começo da evangelização dos povos do Oriente próximo e Europa? Para alguns teólogos a presença de Tecla se tornou incômoda para a Igreja porque ele foi a mais forte representante de um tipo de filosofia religiosa conhecida como Ascetismo. O termo vem do grego original que serviu de fonte para a palavra latina ascese. Essa foi uma linha de pensamento que pregava a renúncia ao prazer carnal ou a outras formas de satisfação pessoal como base para o crescimento espiritual do cristão. O próprio Paulo pregou em suas cartas o celibato como forma de se enriquecer da graça de Deus. O próprio Jesus era visto como um exemplo de vida celibatário. Essa doutrina e linha de pensamento daria origem ao celibato entre o clero católico, onde padres e demais membros da Igreja não poderiam se casar ou ter esposas. E o que isso tinha a ver com Tecla? Muito simples, basta saber mais sobre a vida dessa mulher para entender bem a ligação.

Tecla começou a se interessar pelas pregações de Paulo porque esse afirmava que as pessoas castas e virgens, que não praticavam o sexo, seriam levadas ao céu por suas virtudes terrenas de renúncia ao prazer e à luxúria. Nos atos de Paulo e Tecla (um evangelho apócrifo), o apóstolo Paulo não coloca o celibato apenas como uma escolha (tal como conhecemos no novo testamento), mas como uma condição especial para se conseguir a ressurreição em Cristo. Em suas pregações Paulo coloca muita ênfase no celibato, a ponto de converter completamente Tecla. Ela era uma jovem virgem que havia sido prometida em casamento a um rico homem chamado Thamires. Ao ouvir o que Paulo pregava Tecla então resolveu se dedicar a um celibato absoluto em sua vida, o que obviamente enfureceu seu futuro marido. Ele a denunciou a um tribunal de costumes e assim Tecla foi condenada à morte por quebrar uma lei extremamente importante para aquela comunidade (que afirmava que mulheres prometidas em casamento não poderiam quebrar o juramento de se casarem após firmarem compromisso).

No dia de sua execução Tecla foi amarrada para ser queimada viva em praça pública, mas começou a chover torrencialmente, apagando as chamas. Isso foi então encarado como o primeiro milagre da vida de Tecla que sobreviveu pela intervenção direta de Deus. Ela então conseguiu fugir e se uniu novamente a Paulo em suas jornadas missionárias. Foram então para a Síria. Lá outro homem se apaixonou por ela. Novamente foi recusado e ele a fez pagar caro pela rejeição. Tecla foi presa e enviada para a arena onde deveriam ser morta, devorada por leões. Quando todos esperavam por sua morte certa, devorada por aquelas feras africanas, algo surpreendente aconteceu. As fêmeas a protegeram da morte. Mais do que isso as leoas se curvaram em sua direção, como se a estivesse louvando. Isso causou grande comoção entre o público presente e ela sobreviveu novamente à morte certa.

Tecla ainda sobreviveria a uma nova tentativa de execução. Ela foi colocada em um tanque com tubarões na Ásia Menor. Mas uma nova tempestade chegou e os animais foram mortos misteriosamente. Nesse mesmo dia Tecla resolveu se batizar. Paulo havia recusado lhe dar o batismo dizendo que ela ainda não estaria pronta, mas Tecla recusou seu ponto de vista. Assim, mais tarde naquele mesmo dia, ela resolveu se auto batizar. Para muitos historiadores esse trecho valeu a Tecla a retirada de sua história da bíblia pois os antigos teólogos, entre eles Terturiano, não admitiam que uma mulher pudesse se auto batizar daquela forma. Outro fato que levou a retirada dos atos de Paulo e Tecla da bíblia oficial foi a desconfiança de que os textos eram meras falsificações. Os organizadores da Bíblia oficial até entendiam que ela poderia ter sido uma figura histórica real, mas as estórias pareciam fantasiosas demais para serem levadas à sério. Hoje em dia a figura histórica de Tecla é bem polêmica. Alguns especialistas dizem que ela teria sido a primeira feminista do cristianismo. Para outros tudo não passaria de mera ficção. Uma mulher que pregava a palavra de Deus, que batizava e protagonizava inúmeros milagres definitivamente não era algo comum. Era sim algo muito revolucionário para aqueles tempos antigos.

Pablo Aluísio.

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