terça-feira, 10 de março de 2009

Elvis Presley - Southern Nights

Em 1975 Elvis Presley completou quarenta anos de idade. Apesar de ser algo normal e natural para qualquer ser humano, Elvis encarou a nova idade como uma grande tragédia em sua vida. Nos dias de hoje fica até mesmo difícil entender como alguém ficaria tão abalado apenas pelo fato de superar a barreira dos quarenta, mas para Elvis esse fato só significava uma coisa: ele estava ficando velho! Velho demais para sobreviver como artista! Não importava o fato de existirem muitos ídolos numa faixa etária maior do que essa, como o próprio Frank Sinatra, nem importava a famosa frase de que "a vida começa aos quarenta", isso não tinha importância para ele. Para Elvis Presley completar 40 anos era traumatizante, o simples fato de romper a linha dos 40 já era demais para ele! Como ele se veria agora?

Como um dos maiores símbolos jovens da história da cultura pop iria agora encarar essa maturidade inegável? Pelo jeito, nada bem. Elvis encarou a chegada de seu 40º aniversário da pior maneira possível. Trancou-se em casa, ficou deprimido e abatido, se recusou a atender telefonemas no dia 8 de janeiro e evitou a todo custo aparecer em público. Além disso se convenceu que estava com o rosto envelhecido demais, implicando totalmente com as características bolsas de envelhecimento abaixo de seus olhos (coisa que logo procurou corrigir fazendo uma cirurgia plástica em poucos meses). Nesse dia Elvis não parou de se lastimar com seus amigos mais próximos e de se olhar no espelho, "Imagine, 40 anos! Estou acabado! Não sou mais um garoto!" ficava repetindo insistentemente o cantor pelos corredores de Graceland. Em sua cabeça isso significa que seus fãs iriam deixá-lo pois ninguém seria mais admirador de um velho astro idoso! Elvis ficou tão abalado que não conseguia mais pensar em nada, estava sempre perguntando aos seus amigos: "Será que os fãs ainda vão gostar de mim quando eu estiver velho?!". Para Red West desabafou: "Red, estou acabado! Não consigo mais me imaginar como um ídolo de ninguém. Estou próximo do fim!".

Red West relembrou anos depois: "Depois de um tempo aquele dramalhão de Elvis começou a encher o saco! Quando mais falávamos para ele não se preocupar, mais ele se lastimava! Definitivamente foi uma chatice sem tamanho ficar ao lado dele em seu 40º aniversário!" Apesar de todos deixarem claro que essa preocupação não tinha sentido, Elvis não se convencia do contrário. Quando se defrontava com esse tipo de situação Elvis se isolava, trancava-se em casa e se recusava a ver pessoas estranhas ao seu círculo íntimo. E foi o que fez. No dia de 8 de janeiro, enquanto os fãs de todo o mundo lhe mandavam cartões e mensagens de congratulações, Elvis se fechava mais ainda, em total reclusão. Ele havia se convencido que completar 40 anos era uma verdadeira desgraça na sua vida pessoal e ponto final, ninguém nesse mundo iria convencê-lo do contrário. Quem não queria nem saber dessa bobagem toda era o Coronel Parker. De seu escritório ele já tinha planejado todos os shows de Elvis em sua próxima turnê. Quarentão ou não, Tom Parker não queria nem saber, Elvis teria que sair de Graceland para uma série de apresentações. O fato era que nem Elvis poderia viver trancado em casa, se corroendo por ter feito 40 anos, para Parker ele logo teria que colocar o pé na estrada novamente para cumprir seus contratos. Ultimamente Elvis vinha cada vez mais se queixando das longas viagens, do desconforto de viver de cidade em cidade, de ter que se apresentar em um ou dois shows diários. Elvis sentia-se esgotado após tantos anos de concertos.

Ele chegou inclusive, em muitas ocasiões, a deixar claro que aquele tipo de vida já não lhe trazia mais grande prazer e que já pensava em um futuro próximo ir diminuindo o ritmo de trabalho. Em vista dessas reclamações e do fato dele estar deprimido por ter feito 40 anos, o Coronel Parker acabou cedendo um pouco e seguindo o conselho de Joe Esposito resolveu agendar uma série de shows no Sul mesmo, pois além das cidades serem relativamente próximas de Memphis, Elvis não teria que se esforçar demais pois aquele também era o reduto mais fiel de seus fãs. Diante dessas pessoas Elvis seria sempre bem recebido, seja qual fosse sua atual condição de saúde ou de estado de espírito. Elvis estaria em casa, ou pelo menos perto de casa, ali no quintal de Memphis. E foi justamente nessa primeira turnê como quarentão que esse CD foi gravado. Embora Elvis estivesse passando por um momento ruim (pelo menos na sua forma de ver), o cantor procurou apresentar belos concertos e ampliou consideravelmente o leque de opções de seu repertório, atendendo inclusive aos reclamos de críticos e músicos que lamentavam cada vez mais a falta de uma maior renovação nas canções apresentadas ao vivo. Realmente, desde a ótima temporada de agosto de 1970, onde muita coisa nova foi acrescentada aos concertos, pouca coisa mudara em mais de 4 anos de shows ininterruptos. Já era hora mesmo de promover algumas mudanças, mesmo que fossem tímidas. De qualquer maneira, toda e qualquer nova música adicionada aos concertos já era um sopro de ar fresco em suas rotineiras apresentações. E assim, depois de cumprir uma temporada em Las Vegas, Elvis caiu na estrada para realizar mais uma turnê de primavera. Apesar de tudo, dos 40 anos, das lamúrias, das choradeiras, das lengalengas do cantor e da extensa agenda de compromissos, essas apresentações até que ocorreram numa calma muito bem-vinda para o quarentão Elvis Presley. O CD traz canções gravadas nas cidades de Atlanta, Huntsville, Mobile, Houston, Jackson, Memphis, Lake Charles e Macon.

O conceito de Southern Nights (em português, "noites sulistas") nasceu da necessidade por parte de Ernst Jorgensen em lançar todos os bons momentos de Elvis durante esses concertos realizados na primeira metade de 1975. O próprio Ernst justificou o lançamento de mais esse título inédito afirmando em entrevista: "Nosso objetivo no selo FTD é realmente lançar soundboards que cubram efetivamente todo o período de shows realizados por Elvis entre 1969 e 1977. Nossa intenção é que todas as temporadas em Las Vegas e todas as principais excursões venham a ser representadas nesse selo com pelo menos um título. Em alguns casos realmente basta o lançamento de apenas um CD que traga registros desses períodos. Existem temporadas e excursões realizadas por Elvis em que ele pouco inovou em seu repertório básico, sem grandes novidades. Porém existem também períodos ricos em novas canções, versões fabulosas ou pequenos grandes momentos de Elvis que merecem ser lançados! Quando lançamos Dixieland Rocks percebemos que estávamos na presença de um momento muito fértil e próspero da carreira de Elvis e sentimos a necessidade de voltar à essa fase para realmente não deixar nada de importante para trás. Essas excursões, realizadas na primavera de 1975, nos chamam atenção por sua rica diversidade. Para se ter uma idéia o repertório básico utilizado por Elvis nesses concertos consistia em mais de 40 músicas! Mesmo tendo lançado "Dixieland Rocks" com o que consideramos o melhor, sentimos que muita coisa de ótima qualidade ficou realmente de fora. Daí nasceu a idéia de lançarmos Southern Nights."

Seguindo essa linha de raciocínio, Ernst resolveu fazer uma verdadeira nova "coletânea" das duas primeiras excursões de Elvis em 1975. Retirando faixas de um ou outro concerto, Ernst foi completando o trabalho iniciado com "Dixieland Rocks" do mesmo selo FTD. Embora seja uma interessante ideia de resgate, esse tipo de lançamento também traz certos problemas como a diversidade de qualidade sonora e técnica entre as versões, que embora unidas aqui, foram gravadas em momentos e ocasiões diferentes. Isso se torna bem mais nítido quando ouvimos a montanha russa da seleção musical de "Southern Nights". Em um mesmo CD ouvimos registros com alto nível sonoro, outros apenas razoáveis e finalmente aqueles bem abaixo da crítica. De qualquer forma não há ainda como lançar todos esses shows diferentes na íntegra. Além de ser comercialmente inviável os lançamentos se tornariam excessivamente repetidos, pois apesar de toda a diversidade de repertório nessa primavera de 1975, os concertos de maneira geral pouco se diferenciavam entre si. A ideia de uma coletânea de temporadas e excursões realmente parece ser o único caminho viável para um selo como o FTD. No vácuo desse tipo de lançamento é que se constrói todo o mundo paralelo dos Bootlegs, com vasto material lançado todos os anos, trazendo aí sim, muitas vezes, os concertos na íntegra. Mas essa é uma outra história que ainda iremos tratar em futuros artigos. Vamos nos concentrar agora no CD Southern Nights, ótimo lançamento do selo FTD.

O CD começa com quatro versões retiradas das apresentações que Elvis realizou em Atlanta entre o final de abril e começo de maio de 1975. Do show do dia 30 de abril Ernst resolveu aproveitar That's All Right, It's Now Or Never e Help Me. Já do concerto realizado no dia 2 de maio foi acrescentada a canção Steamroller Blues. Se Nashville pode ser considerada a capital cultural do sul dos EUA, Atlanta, na Georgia, é a verdadeira potência econômica da região. Sua importância é tamanha para a economia daqueles Estados que ela é considerada a verdadeira força motriz do Sul. Não poderia ser diferente, pois essa cidade abriga a sede de algumas das maiores multinacionais do mundo, como por exemplo, a própria Coca-Cola. Tal polo comercial e financeiro nunca poderia ser ignorado pelo Coronel Tom Parker, até porque ele sempre considerava os shows de Elvis nessa cidade os mais importantes nessas turnês pelo Sul. A repercussão dos concertos em Atlanta seria sentida em todos os demais shows. Um concerto ruim em Atlanta significava um certo risco para o resto da turnê, pois um erro de Elvis nos palcos dessa cidade seria comentado e conhecido em todos os lugares e cidades sulistas. Por outro lado boas apresentações por parte de Elvis aqui sempre iriam gerar a repercussão oposta, ou seja, muita publicidade positiva nas cidades que ele visitaria depois. Se havia uma cidade vital nessas turnês de Elvis por todos esses Estados do sul, essa cidade se chamava Atlanta. O que Elvis faria ou deixaria de fazer em seus concertos em Atlanta iriam repercutir em todos os rincões do velho Sul norte-americano. Infelizmente, apesar de toda essa importância, Ernst Jorgensen não procurou destacar muito esses concertos. Ao invés de trazer mais faixas gravadas em Atlanta ele preferiu prestigiar as apresentações de Elvis em Huntsville nesse CD. De qualquer forma, mesmo com poucas versões presentes podemos ao menos ter uma idéia mais precisa de como Elvis estava nesses shows.

Os primeiros acordes de That's All Right são ouvidos e logo podemos perceber que, se levarmos essa versão como paradigma da apresentação, podemos facilmente chegar à conclusão de que Elvis estava bem nesses shows, principalmente porque esse CD nos traz sua voz com bastante nitidez e clareza. O arranjo é tradicional e sem surpresas. Já It's Now Or Never traz algumas novidades. A primeira coisa que notamos com facilidade é a mudança de sua velocidade normal e de sua linha melódica, fazendo com que ela fique bem mais lenta e terna. Um de seus maiores hits, "It's Now Or Never" seria cada vez mais presente em seu repertório nos anos finais, inclusive contando com os solos do vocalista Sherril Nielsen. E por falar nele, Help Me do disco "Promised Land", vem logo a seguir. Aqui temos um dueto entre Elvis e Nielsen. A combinação é interessante, pois sendo um barítono, Elvis se encaixa perfeitamente num "duelo" de vozes com seu colega de palco. Porém, se ficarmos atentos, vamos chegar facilmente à conclusão de que os melhores momentos da canção são justamente aqueles em que Elvis aparece sozinho ao microfone. Sua voz se sobressai com maior destaque e podemos nitidamente perceber que sua sensibilidade está realmente à flor da pele! De qualquer maneira não podemos deixar de reconhecer que essa é, sem dúvida, uma versão de alto nível. Infelizmente a parte "Atlanta" do CD conta com pouquíssimos registros nesse CD. Steamroller Blues, canção gravada dois dias depois, vem para encerrar a participação de Elvis na cidade da Georgia. Essa faixa é extremamente bem executada, com Elvis e banda totalmente entrosados. Segue muito de perto da versão do disco "Aloha From Hawaii", exceto com alguns solos mais destacados de piano e baixo. Mesmo assim não é algo que fuja muito do que já estamos acostumados a ouvir nas outras versões desse blues.

Depois de encerrar as quatro músicas gravadas em Atlanta o CD apresenta, de forma dispersa, vários momentos diversos de apresentações diferentes. Infelizmente Ernst as embaralhou completamente e para seguir uma certa lógica vou ignorar a ordem das canções do CD para organizá-las de acordo com o local e a data em que foram gravadas. Pura questão de organização. Vamos agora analisar as canções que foram gravadas em Macon no mesmo Estado da Georgia. Tenho certeza que você agora se lembrou do famoso verso de introdução de "I washed my hands in muddy water" que diz: "I was born in Macon, Georgia / They kept my daddy over in Macon jail...". Lembrou? Pois bem, continuemos, vamos seguir em frente com a análise. A versão Promised Land desse CD vem para confirmar um fato que se repete em vários outros shows de Elvis Presley nos anos 70. Embora essa canção de Chuck Berry tenha se traduzido em um dos maiores momentos da carreira de Elvis em estúdio naquela década, com uma versão fantástica e impecável, notamos que, com raríssimas exceções, as versões ao vivo desse rock sofrem de praticamente o mesmo mal: a falta de pique, garra e envolvimento por parte de Elvis ao cantá-la! Aqui o cantor se arrasta, não consegue entrar em sincronia com a banda e coloca seu vocal no controle remoto. Uma pena. A forma como foi gravada também não ajuda em nada, pois os teclados estão em primeiro plano, sendo que eles apenas são partes periféricas da canção e não deveriam ser expostos de forma tão destacada, superando e abafando até mesmo o resto da banda. Esse erro técnico no momento da gravação é facilmente explicado pois esse é um registro semiprofissional, sem os cuidados necessários e balanceamento correto entre os vocais e demais instrumentos.

Em decorrência disso notamos outro grande problema ao ouvir a versão: a orquestra simplesmente desapareceu na mixagem final! Para quem não gosta dos arranjos de metais isso pode até soar como um aspecto positivo, mas a descaracteriza como ela foi realmente pensada pelos arranjadores que estavam envolvidos na carreira de Elvis na época. Como nota favorável temos apenas a presença bem marcante dos solos de guitarra, que ao contrário dos metais, não desaparecem e cumprem excelente papel. Infelizmente James Burton também não está muito empolgado e sua participação soa burocrática. Não o culpo, se Elvis não se envolve em nenhum trecho da canção, por que ele se empenharia? Essa versão foi gravada no show realizado em Macon, Georgia, no dia 24 de abril. A outra canção presente nesse CD do mesmo show, Big Boss Man, parece confirmar que Elvis estava realmente pouco empolgado, embora nessa segunda canção ele esteja bem mais ligado na canção. O problema de faixas como Big Boss Man e Promised Land era que Elvis simplesmente não levava mais a sério esse tipo de música. Geralmente elas eram usadas apenas para evitar que o show caísse na monotonia. Uma forma de despertar e balançar o público para evitar que a apresentação ficasse muito parada. Acredito que se Elvis apenas fosse cantar o que lhe agradava nessa fase de sua vida ele certamente iria interpretar uma balada atrás da outra durante os shows, coisa que afinal de contas acabou fazendo em sua carreira dentro dos estúdios no final de sua vida. E por falar em baladas românticas, melancólicas e tristes, a retenção do show em Macon acontece justamente com It's Midnight. Aqui Elvis parece confirmar a tese de que ele realmente não estava mais preocupado em fazer boas versões de seus rocks mais conhecidos mas até que se empenhava, e muito, em disponibilizar belas versões de suas baladas românticas. Mesmo fora de seu ritmo normal, mesmo estando acelerada, "It's Midnight" mostra um Elvis finalmente envolvido na interpretação. Ao contrário das canções anteriores do mesmo show em Macon, aqui Elvis se mostra presente e não apenas cumprindo tabela. Embora seja outro erro técnico de gravação, a marcante presença da vocalização feminina, outra vez em primeiro plano, valoriza o belo vocal de Kathy Westmoreland. Belíssima voz e maravilhoso complemento a essa bela canção da fase final de Elvis.

Grande parte desse CD foi gravado em uma cidade de porte médio do sul, chamada Huntsville, localizada no norte do Alabama e bem na fronteira do Estado com o vizinho Tennessee, em cinco diferentes concertos realizados por Elvis nessa turnê. Essas apresentações nos dão uma idéia do ritmo acelerado e da estafante rotina de shows a que Elvis era submetido. Em apenas três dias ele subiu ao palco cinco vezes, sendo o primeiro show feito no dia 30, e mais quatro apresentações nos dois dias seguintes, sendo realizados dois concertos por dia, com Elvis se apresentando às duas e meia da tarde e depois subindo novamente ao palco para mais um show noturno às oito e trinta da noite. Todas essas apresentações foram realizados no mesmo local, o Von Braun Civic Center com capacidade para oito mil pessoas (o nome do ginásio se explica, pois a cidade sempre teve um passado muito ligado ao projeto espacial dos EUA). Aqui também temos uma ideia de como funcionava a mentalidade circense do empresário de Elvis, Tom Parker. Quando chegavam em uma cidade como essa, Tom Parker e seu assistente pessoal ficavam de olho, acompanhando o ritmo das vendas de ingressos. Se o show fosse esgotado e ainda houvesse público suficiente para uma nova apresentação o Coronel Parker não perdia tempo! Ora, se ainda havia público interessado em ver Elvis ao vivo não havia tempo (e dinheiro) a perder, o Coronel sempre arranjava um jeito. Ele logo providenciava uma maneira de não deixar a oportunidade de lucrar ainda mais passar por suas mãos. O plano inicial era de Elvis realizar apenas três shows noturnos na cidade. Porém como a procura de ingressos foi muito grande, o Coronel logo marcou mais duas apresentações no turno da tarde! Isso causava um sério problema para Elvis, porque assim ele praticamente ficava sem dormir, pois era justamente nesse horário vespertino que ele costumava dormir e descansar entre as apresentações. Mas para Tom Parker isso não tinha nenhuma importância, ele rapidamente marcava os shows e colocava suas velhas táticas de promoção em ação. Sua forma de vender os shows de Elvis não tinha mudado nada em mais de vinte anos ao lado do cantor.

O mais incrível é saber que a velha tática de promoção de Parker ainda se revelava eficaz nessas ocasiões. Basta ver o sucesso de público desses shows. Nada mudava e o empresário de Elvis sempre repetia a mesma estratégia, cidade após cidade. O Coronel alugava horários nas rádios locais para tocar exclusivamente músicas de Elvis, espalhava posters e até mesmo balões pela cidade, e anunciava seu show até mesmo em carros com alto falantes pela cidade e arredores. Se houvesse um circo na cidade o Coronel não perdia tempo e logo contratava uns malabaristas para promover o show de Elvis nas principais vias da cidade. Era uma loucura que sempre funcionava. O importante mesmo era faturar em cima do interesse de uma apresentação de um grande astro como Elvis Presley numa cidade como Huntsville, que muitas vezes ficava fora do circuito de concertos de grandes artistas da época. Talvez essa fosse realmente uma coisa correta que o Coronel fazia, levar Elvis para lugares que muitas vezes eram ignorados por outros astros. Levar o artista aonde o povo está! De qualquer forma esse tipo de atitude empresarial de Tom Parker se revelou acertada, pelo menos nessa ocasião. Vamos agora analisar as canções desses shows. O primeiro concerto em Huntsville foi realizado na noite do dia 30 de maio, mas infelizmente nada dessa apresentação inicial foi aproveitada no CD. Em compensação o segundo concerto foi muito bem explorada por Ernst Jorgensen. Desse show, realizado na tarde do dia posterior, foram retirados as seguintes músicas: Trouble, T-R-O-U-B-L-E, Hawaiian Wedding Song, Blue Suede Shoes e For The Good Times. Na primeira faixa desse show vespertino que ouvimos aqui, Elvis começa fazendo uma introdução da canção T-R-O-U-B-L-E: "We have a new record out, ladys and gentlemen, that has been out 2 or 3 weeks now, that’s called, T.R.O.U.B.L.E." mas logo muda de caminho e começa uma pequena versão de Trouble, velho sucesso de seu filme King Creole. Essa micro versão dura menos do que um minuto e nem deveria ter sido creditada na lista das músicas do CD.

Elvis logo a encerra de forma repentina (muito provavelmente por não se lembrar mais de sua letra) e começa finalmente a apresentar T-R-O-U-B-L-E, carro chefe de seu último disco, "Elvis Today". Embora comece bem a canção, lá pelo meio da canção surge um problema muito freqüente para Elvis em concertos dos anos finais de sua carreira, o esquecimento ou confusão nas letras. Aqui Elvis se enrola, ri, fica um pouco confuso mas resolve seguir adiante, aos trancos e barrancos! De qualquer forma, depois desse pequeno deslize (e outros erros que surgem no decorrer da faixa), Elvis se recupera bem e leva a canção de forma correta até o final, que também é bem interessante e foge um pouco da master oficial que conhecemos de estúdio. É uma versão apenas razoável e demonstra que apesar de sofrer às vezes com o esquecimento das letras, Elvis poderia se recuperar facilmente e disponibilizar material com certa qualidade quando se esforçava para isso. Pelo menos aqui ele está muito melhor do que na versão de Promised Land que já ouvimos (outro carro chefe presente nesse CD). A agradável Hawaiian Wedding Song surge logo a seguir e aqui Elvis apresenta uma bela versão, correta e sem máculas. Ele se desculpa com a plateia, que pede Blue Hawaii, e sai pela tangente apresentando essa canção do mesmo filme e com uma letra bem mais fácil para ele se recordar. Infelizmente ela é seguida de mais uma versão medíocre de Blue Suede Shoes dos anos 70. Novamente temos uma versão que dura pouco mais de um minuto, com Elvis não a levando a sério em nenhum momento e que, como já escrevi antes, só servia mesmo para acordar a plateia e chamar a atenção de todos que aquele que estava ali no palco era o mesmo Rei do Rock que virou a cultura mundial de ponta cabeça durante os anos 50. A canção é isso, um mero (e bem burocrático) memorando!

O melhor momento desse primeiro show em Huntsville vem com For The Good Times. Essa versão, além de ser bem rara, ainda traz um belo momento de Elvis, com vocalização sóbria e equilibrada e com um entrosamento quase perfeito com seu grupo. Sua semelhança e fidelidade de execução realmente é espantosa, pois está bem próxima da versão oficial. Elvis está sutil, concentrado e empenhando em fazer uma bela versão. O resultado não poderia ser outro: o melhor registro do CD até esse momento. Embora esse show da tarde seja bem na média, com poucos momentos realmente interessantes e que saiam do comum, ele ainda é considerado o melhor feito por Elvis naqueles três dias estacionado em Huntsville. Depois do primeiro contato com o público Elvis foi perdendo gradualmente o interesse nos shows seguintes, tanto que apenas duas canções do show noturno foram aproveitadas nesse CD. A primeira é I Can't Stop Loving You. Embora alguns tenham tratado essa versão com adjetivos exagerados como "maravilhosa" e "poderosa", temos que cair na real e chegar a conclusão que ela está bem na média de todas as outras versões que Elvis produziu dessa música. Aliás ela já estava totalmente saturada por essa época, tanto que Elvis a descartaria rapidamente a partir desse momento, talvez por não aguentar mais cantá-la em outras e repetidas vezes! Razoável, bem executada, tecnicamente boa, porém banal e rotineira.

Isso definitivamente não é o que acontece com I'm Leavin'. Que música maravilhosa, fantástica e bela! Essa canção é tão bonita que ainda me lembro da primeira vez que a ouvi, lá nos distantes anos 80! Definitivamente um das mais belas harmonias já cantadas por Elvis Presley. O registro dessa versão ao vivo é precioso por inúmeros motivos. O primeiro deles é o fato de Elvis quase nunca a apresentar em seus shows! Uma canção tão fantástica deveria ter sido mais explorada por Elvis em seus concertos ao vivo, mas nunca ganhou um papel de maior destaque ou se firmou em seu repertório de forma definitiva. Só podemos lamentar esse fato. Outro fator que torna essa versão especial é sua qualidade técnica. Podemos ouvir com certa nitidez todos os instrumentos, a orquestra, a banda TCB (com destaque especial para a bateria) e o vocal de apoio. Não é uma maravilha, até porque se trata de um soundboard, porém estamos bem próximos de uma qualidade técnica de alto nível sonoro. Por fim, o último fator que a torna especial é a própria interpretação de Elvis durante sua apresentação. Bem distante de sua postura de desinteresse e tédio que o acometia quando cantava seus antigos rocks, aqui Elvis se entrega totalmente ao lirismo ímpar da música. O resultado final é brilhante e a faixa é a melhor, sem nenhuma sombra de dúvidas, de todo o CD. Embora o restante do material de Huntsville não traga mais nada de novo e nem remotamente tão interessante como "I'm Leavin'", podemos ainda destacar algumas versões interessantes.

Release Me gravada na tarde do dia 1º de junho é uma delas. Embora não fosse nenhuma novidade, ainda era uma estranha no ninho no repertório de Elvis nesse ano de 1975. Aqui Elvis desacelera a velocidade normal da canção, o que a prejudica, pois seu ritmo correto, que foi utilizado na versão master do disco "On Stage", é muito mais satisfatório. A sensação que Elvis passa aqui é de estar com pouca vontade de levar em frente e terminar a música. Vale como registro. A outra canção retirada desse mesmo show da tarde é o clássico Heartbreak Hotel. Aqui Elvis repete o velho erro que quase sempre o acometia quando apresentava seus velhos sucessos dos anos 50. Ele se mostra pouco interessado, pouco envolvido, quase como se estivesse segurando o riso e na parte da execução se limita a murmurar preguiçosamente a letra. Elvis deveria ter mudado um pouco esse tipo de postura, não só em respeito ao seu público, como também ao seu passado, pois se não fossem todos esses clássicos ele certamente não estaria ali fazendo mais um show com lotação esgotada. De qualquer maneira o ponto positivo desse penúltimo show de Elvis em Huntsville é que ele apresenta uma boa sonoridade. Tecnicamente perfeita não é, nenhum CD ao vivo do selo FTD é perfeito no aspecto puramente de qualidade sonora, mas podemos perceber que pelo menos esse concerto em particular foi suficientemente bem registrado. Por fim chegamos nas três últimas canções retiradas das apresentações realizadas por Elvis nessa cidade, a saber: Polk Salad Annie, I'll Remember You e Little Darlin'.

Antes de iniciar Polk Salad Annie Elvis começa a canção Burning Love, porém a interrompe logo nos primeiros versos. A situação fica um pouco embaraçosa, principalmente depois que ele tenta se lembrar da letra e não consegue. Então sua vocalista começa a lhe passar a letra do primeiro verso, Elvis se enche um pouco daquela coisa toda e parte logo para Polk Salad Annie. Aqui podemos perceber que Elvis, depois de cinco shows seguidos, já estava um pouco de saco cheio. Ele nem insiste em tentar terminar (ou melhor dizendo começar) Burning Love, ele simplesmente a descarta! Aliás verdade seja dita, Burning Love nunca foi parte de sua lista de músicas preferidas, tanto que ele foi praticamente levado a gravá-la em estúdio e depois que ela se tornou um grande hit ele se viu na obrigação de apresentá-la nos concertos, mas quase sempre sem muito envolvimento e emoção. A versão de Polk Salad Annie desse último concerto em Huntsville é muito boa e interessante. Percebe-se claramente que Elvis se empenha em cantar direito, até mesmo para acabar com a má impressão deixada pelo fiasco de "Burning Love". Como as versões dessa época Elvis não apresentam a introdução falada e parte logo para a segunda parte da canção. Enfim, mais uma versão de "Polk Salad Annie" para a sua coleção das milhares de outras. O destaque maior fica mesmo com a participação da banda TCB e principalmente pelos solos do baixista Jerry Scheff (que chegou a tocar com os Doors em seu último disco, "L.A. Woman").

I'll Remember You, conhecida canção de seu show Aloha From Hawaii (como ele mesmo deixa claro no começo da execução) aparece de psraquedas no show. Essa música nem sempre foi muito utilizada por Elvis, porém as versões Off Aloha que conhecemos sempre mantiveram um nível satisfatório, tanto nos aspectos puramente técnicos como também de interpretação por parte de Elvis, sem dúvida era uma melodia que muito lhe agradava, tanto que sempre procurava apresentar belas versões para seu público. A última canção retirada dos shows em Huntsville é Little Darlin'. Essa canção era nova no repertório de Elvis e foi incluída por ser um símbolo dos anos dourados. Aqui Elvis certamente se posicionava como um artista nostálgico e o alvo era certo quando apresentava músicas como essa: seus antigos fãs dos anos 50. O mais interessante de quase todas as versões dessa canção é que Elvis quase nunca a levava muito à sério, sempre rindo ou tentando conter o riso, além disso ele sempre aproveitava a deixa para tirar uma onda em cima do arranjo "bons tempos" da famosa baladinha. Depois disso Ernst resolveu acrescentar as despedidas finais de Elvis para o público em Huntsville. O cantor agradece e é muito celebrado pelo público. Infelizmente um dos grandes pecados desse CD é justamente a desorganização em que as faixas foram colocadas, misturando canções gravadas em shows e apresentações diferentes! Deveria ter sido respeitado a ordem cronológica dos concertos, porém Ernst escolheu o caminho mais fácil de juntar tudo num só balaio para causar a falsa impressão de se estar ouvindo um show completo e não uma coletânea de momentos diversos de turnês específicas. De qualquer forma essa canção encerra a parte Huntsville do CD. São ao total doze canções retiradas desses quatro shows (lembrando que o CD não traz nenhuma faixa da estreia de Elvis nessa cidade).

Para quem quiser conhecer um pouco melhor esses concertos aconselho adquirir o Bootleg Huntsville'75 USA. Depois de explorar bem os shows realizados em Atlanta, Macon e principalmente Huntsville (que formam o esqueleto básico desse CD), Ernst Jorgensen resolveu completar o CD pincelando pequenos momentos de outras apresentações. De seu show em Mobile, por exemplo, Ernst resgatou uma versão de Bridge Over Troubled Water. Embora muito distante das versões da segunda temporada de 1970, consideradas as melhores de toda sua carreira, essa faixa é certamente razoavelmente bem executada e traz um Elvis inspirado em certos momentos. A velocidade da canção está bem fora de seu ritmo normal e apresenta oscilações rítmicas que soam, às vezes, desconfortáveis. Além disso ela não é tão bem gravada como tantas outras que conhecemos. Por outro lado Elvis parece estar envolvido, apesar de se segurar em alguns momentos para não forçar a voz. Apesar de todos esses pequenos problemas a versão ainda consegue se manter em um nível um pouco acima da média.

Do concerto realizado em Memphis no dia 10 de junho de 1975, Ernst resgata uma boa versão de Fairytale. Qualquer canção que fugisse do velho repertório cansado de Elvis por essa época era muito bem-vinda. Essa canção foi incluída para promover o último disco de Elvis, "Elvis Today" ("Elvis today, yesterday...however...tomorrow..." como brinca o cantor antes de começar a faixa). Aqui também notamos a guinada de direção que Elvis, de certo modo, promoveu em sua carreira de estúdio. Saem os rocks (tão presentes nos anos 50), as músicas pops (tão presentes nas trilhas sonoras) e entra as baladas e o country! Obviamente que em uma turnê no sul dos EUA Elvis tinha que caprichar nesse ritmo tipicamente regional, fato confirmado com Jambalaya gravada na pequena Lake Charles no dia 2 de maio! Aliás a inclusão de Jambalaya era muito oportuna, visto que ele estava na Louisiana, Estado vital na história de Hank Williams, cantor e mito do gênero gountry, morto precocemente. Pena que a versão dure pouco mais de trinta segundos!

A última versão pincelada de outros shows para completar o CD é Help Me Make it Throught The Night. Ela vem apenas para confirmar o que escrevi antes, da preferência visível demonstrada por Elvis pelas baladas countrys. A música tinha sido lançada três anos antes no disco "Elvis Now" e nunca conseguiu se firmar com maior frequência dentro do repertório de Elvis. A versão em estúdio deixa um pouco a desejar e essa versão ao vivo também. Apesar de ser bem raro para o fã médio ter essa música gravada nos palcos, percebemos nitidamente que ela é apenas razoável, sem grandes destaques. Elvis, apesar de rir um pouco no começo da execução, procura ser profissional no resto da faixa e a canta de forma correta. O fato é que podemos perceber que essa canção não funcionava muito bem ao vivo, pois era de levada mais intimista e calma, pouco apropriada para grandes concertos. De uma forma ou outra ela seria descartada pouco depois.

Conclusão final: Aconselho esse título especialmente para os fãs dos anos 70. Depois do Aloha From Hawaii Elvis entrou em uma etapa de sua carreira artística caracterizada por uma rotina, muitas vezes cansativa e tediosa, de shows ao vivo. Nenhuma dessas temporadas em Las Vegas ou turnês pelos EUA representavam mais qualquer tipo de desafio para Elvis Presley, porém mesmo estando de certo modo preso dentro dessa situação de muitos shows e pouca renovação musical, ele ainda se empenhava em fazer boas apresentações e concertos, como esses que ouvimos aqui. Obviamente todos esses registros foram selecionados a dedo por Ernst Jorgensen, certamente eles nos trazem apenas o que de melhor Elvis apresentou para seu público, mas isso já é suficiente para termos uma ideia de sua vida artística no período. Para quem quiser se aprofundar nessas apresentações o melhor caminho a seguir mesmo é o dos lançamentos não oficiais, os conhecidos Bootlegs, tanto soundboards (gravados diretamente da mesa de som usada nos concertos) como audiences (gravados pelos próprios fãs que assistiram ao show, diretamente da plateia), porém como já escrevi aqui antes, essa é uma outra história... Até a próxima, prezado leitor.

Pablo Aluísio.

Um comentário:

  1. Avaliação:
    Produção: ★★★
    Arranjos: ★★★
    Letras: ★★★
    Direção de Arte: ★★★
    Cotação Geral: ★★★
    Nota Geral: 7.9

    Cotações:
    ★★★★★ Excelente
    ★★★★ Muito Bom
    ★★★ Bom
    ★★ Regular
    ★ Ruim

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