No caso a RCA quis aproveitar restos de trilhas sonoras que tinham ficado para trás. Não significa que fossem canções ruins, nada disso. Era tudo apenas um reflexo da bagunça e falta de organização que imperava em algumas gravações realizadas por Presley na década de 1960. Veja o caso das faixas "Yellow Rose Of Texas / The Eyes Of Texas" e "Do The Vega". Duas que deveriam ter sido lançadas na trilha sonora do filme "Viva Las Vegas". Como o álbum desse filme nunca foi lançado (não me pergunte o porquê, já que ninguém sabe como isso foi acontecer) elas ficaram perdidas por anos e anos. Para que não fossem completamente desperdiçadas resolveu-se colocar tudo nesse título, sem muito critério visível para isso. Outro fato que chama a atenção é o pequeno número de músicas e a curta duração do disco. São apenas nove faixas (quando o mínimo da época eram dez!) e apenas 20 minutos de duração. Já que era baratinho, então que não se gastasse muito em sua elaboração. Absurdo? Talvez. São regras de mercado apenas.
O vinil original desse álbum hoje alcança um bom preço no mercado de colecionadores, principalmente nos Estados Unidos e Europa, onde ele não foi sequer lançado em vários países. Como não vendeu muitas cópias acabou virando um item raro, de difícil acesso. O curioso é que a falta de cuidado no lançamento do disco acabou indiretamente contribuindo para essa valorização. A direção de arte é interessante, com Elvis usando uma roupa de faroeste de seu filme "Flaming Star", outra película que teve péssima organização dentro da discografia do cantor. Na verdade duas empresas que estavam patrocinando o programa de Elvis na NBC investiram como forma de promoção no álbum. A primeira foi a própria NBC, canal de TV onde o programa seria exibido. A outra foi a marca de máquinas de costura Singer, que havia investido na produção com direito a ter seus comerciais vinculados no espaço publicitário durante a exibição da volta de Elvis aos palcos. Os executivos dessas empresas entraram em contato com a RCA e chegaram na conclusão que um novo álbum no mercado iria esquentar e reacender o interesse em Elvis, preparando o terreno para a exibição do especial. Foi uma ideia que deu certo apenas em termos, já que não houve muita repercussão. Algumas poucas resenhas pequenas nas publicações especializadas e vendas modestas não era bem o que todos esperavam. De uma maneira ou outra acabou fazendo parte da discografia oficial de Elvis Presley e por isso merece a menção. Vamos tecer alguns comentários sobre cada faixa a seguir.
Flaming Star (Wayne / Edwards) - Essa composição vem bem de acordo com o que Elvis vinha produzindo em sua fase Hollywoodiana. Não chegaria a dizer que se trata de uma grande faixa, mas é inegavelmente bem produzida. Na verdade é uma música composta com um objetivo bem específico: funcionar como tema principal do filme de mesmo nome. Curiosamente as duas versões definitivas de "Flaming Star" (a que saiu em vinil na época e a outra utilizada especialmente para o filme) foram gravadas após as demais canções da trilha sonora estarem prontas há um bom tempo. Dois meses após gravar praticamente todas as canções que fariam parte do filme, Elvis teve que retornar ao estúdio para registrar essas duas, tudo porque os produtores resolveram mudar o título da produção que deixou de se chamar "Black Star" para ser denominada de "Flaming Star" por ser mais comercialmente atraente. Além disso em tempos de tensão racial (Os Estados Unidos passavam pelo problema dos direitos civis com as populações negras) era mais prudente evitar qualquer tipo de desconforto com a palavra "Black" (até porque o personagem de Elvis era um mestiço entre brancos e nativos americanos). No final a mudança foi sensata. No Brasil o filme também recebeu um título forte, que soava muito bem nas marquises de cinema: "Estrela de Fogo".
Wonderful World (Fletcher / Flatt) - Essa música também foi extraída de uma trilha sonora, no caso do filme "Live A Little, Love A Little" (Viva um Pouquinho, Ame um Pouquinho, no Brasil). Ela aparecia logo na primeira cena, durante os letreiros de apresentação, com Elvis dirigindo perigosamente seu bugre amarelo. Hoje a canção soará bem datada por causa de seu arranjo bem cafona, parecendo que Elvis está sendo acompanhado por uma bandinha de circo ou parque de diversões do interior. Curiosamente a música foi deixada de lado pela RCA Victor por anos e anos. Pelo visto os produtores da gravadora não ficaram muito empolgados pelo resultado final e não investiram muito nela, não procuraram trabalhar comercialmente melhor com seu potencial. A tentativa de soar nostálgico, saudosista e ao mesmo tempo meio moderninho (como o próprio filme queria) não deu lá muito certo, temos que admitir.
Night Life (Giant / Baum / Kaye) - Mais uma que estava perdida dentro da discografia de Elvis. É a tal coisa, a RCA vasculhou velhos arquivos, tirou poeira das fitas esquecidas e literalmente salvou do esquecimento completo algumas faixas que tinham sido esnobadas, mas que juntas até que poderiam servir para vender algumas cópias avulsas, usando o nome mágico do ponto de vista comercial de Elvis. "Night Life" é muito curta, que termina quase em um susto. Em sua defesa temos que admitir que tem um bom arranjo e uma boa pegada. A guitarra estridente ao fundo agrada. Elvis não se esforça muito, é verdade, mas no fundo essa é uma questão menor. A música originalmente foi gravada para fazer parte da trilha sonora de "Viva Las Vegas" (Amor a toda velocidade, no Brasil), porém acabou arquivada sem muita explicação por parte do produtor. Acredito que nem o próprio Elvis se lembrava dela quando finalmente a faixa ganhou o mercado nesse LP. Se fosse defini-la de forma sucinta diria que é um bom roquinho para alegrar o ambiente.
All I Needed Was The Rain (Weisman / Wayne) - Esse blues fez parte do pacote de músicas que acompanharam o filme "Stay Away, Joe" (Joe é Muito Vivo, no Brasil). Esse foi um filme bem gaiato, completamente singular dentro da filmografia do cantor. Só quem assistiu a essa película saberá do que estou dizendo. O roteiro é uma bagunça completa, quase uma brincadeira nonsense. Elvis, extremamente bronzeado, parece interpretar um sujeito que está mais em busca da próxima zueira do que qualquer outra coisa. O enredo é praticamente inexistente e há várias cenas ao estilo pastelão. O interessante é que Elvis viu seu cômico personagem como uma oportunidade de fazer algo diferente em Hollwyood. Imaginem só como andava feia a coisa para ele por essa época. No filme Elvis a canta quando está na pior, ao relento, curtindo uma fossa. Trocando em miúdos, a música é boa, mas a cena, tal como todo o filme, não passa de uma bobagem sem tamanho.
Too Much Monkey Business (Chuck Berry) - Até hoje fico chocado com a falta de cuidado por parte da RCA Victor em relação a essa gravação. Uma das melhores de Elvis durante os anos 1960 não teve qualquer tipo de repercussão maior, até porque a gravadora de Elvis simplesmente lavou as mãos e não se esforçou em divulgá-la nas rádios na época. Negligência pura e simples, para desgosto do fã de Elvis que implorava por material de qualidade. Muitas pessoas reclamavam que não havia boas músicas do cantor, mas a verdade é que havia sim, certamente elas existiam, só que não eram promovidas e nem popularizadas, caindo rapidamente no esquecimento (isso quando chegavam a ser pelo menos conhecidas). De falha em falha, exatamente nesse tipo de situação, é que podemos entender como a carreira de Elvis entrou em um buraco negro! Mesmo quando havia boas faixas, músicas excelentes registradas em estúdio, a gravadora de Presley absurdamente não parecia disposta a fazer nada por elas. Uma lástima.
Yellow Rose Of Texas / The Eyes Of Texas (Tradicional) - Fez parte da trilha sonora do filme "Viva Las Vegas" (Amor a toda velocidade, no Brasil). Em cena Elvis a usa para tirar um bando de beberrões de um cassino com o objetivo de localizar a linda professora de natação que conhecera um dia antes (e que ao contrário do que ele pensava não era uma dançarina profissional dos inúmeros hotéis da cidade do pecado). O medley une duas populares canções tradicionais do grande estado do Texas. Como se sabe os texanos são bem ciosos de suas origens e sua cultura, chegando ao ponto de criar uma identidade própria, nem sempre ligada ao restante da nação. É costume dizer o ditado entre eles de que primeiramente são texanos e só depois americanos. Mexer com algo assim poderia ser um vespeiro, mas o diretor soube contornar isso tudo, jamais indo para o lado do deboche ou escárnio. O personagem de Elvis até mesmo se mostra muito respeitoso com o estado da rosa amarela - e não poderia deixar de ser se ele não quisesse entrar numa tremenda confusão com os nacionalistas e orgulhosos texanos.
She's A Machine (Joy Byers) - Até que para uma música de trilha sonora dos anos 1960 não chega a aborrecer. Não é desastrosa e nem passa vergonha alheia. A letra é estúpida, como de praxe, mas a linha de melodia com suas "paradinhas" tem uma sonoridade que agrada. Hoje em dia seria considerada machista, mas naqueles tempos tudo era encarado com mais bom humor. Pena que qualquer tipo de pretensão de fazer o mínimo de sucesso nas paradas afundou tal como o personagem mergulhador de Elvis no filme. Aliás, vamos ser sinceros? A película "Easy Come, Easy Go" (Meu Tesouro é Você, no Brasil) é um tremendo abacaxi, uma ofensa para quem gosta de cinema de verdade. Com inúmeras cenas chatas debaixo da água marcou uma triste despedida de Elvis da Paramount Pictures, um estúdio que fez o possível para caprichar em suas produções. Quando a concorrente MGM começou a realizar musicais B com Elvis sem qualquer cuidado técnico, os executivos da Paramount resolveram também chutar o balde da boa qualidade. Só podemos lamentar nessa altura do campeonato.
Do The Vega (Giant / Baum / Kaye) - Outra que ficou anos e anos comendo poeira nos prédios de arquivos da RCA Victor em Nashville. Gravada para fazer parte da trilha de "Viva Las Vegas" foi colocada para escanteio quando a gravadora decidiu cancelar a edição do álbum com as músicas do filme! Esse cancelamento foi um dos maiores absurdos da discografia de Elvis, só comparado mesmo a outro cancelamento ridículo, dessa vez com a trilha do documentário "Elvis on Tour" na década de 1970. Dois grandes momentos de Elvis no cinema que simplesmente não tiveram trilhas lançadas no formato clássico, o álbum LP! Absurdo completo e irrestrito. Como se pode perceber os executivos da RCA não eram as pessoas mais inteligentes, brilhantes e espertas do mundo! Talvez se Elvis tivesse dado no pé da RCA em meados dos anos 1960 sua carreira tivesse trilhado um rumo melhor em termos de organização nos lançamentos!
Tiger Man (Lewis / Burns) - Tiger Man aqui foi usada para promover o programa de televisão NBC TV Special. A versão da edição original desse disco trazia a versão gravada ao vivo no palco da NBC em Burbank. Era uma tremenda novidade na época e por essa razão impulsionou as vendas do disco como um todo. Afinal os fãs e colecionadores queriam dar uma conferida na faixa para ter uma ideia melhor do que viria pela frente. "Tiger Man" é uma grande música, sobre isso não tenho considerações a fazer. O problema ao meu ver é que a edição do disco não caprichou muito na qualidade sonora da faixa. Canções assim, gravadas ao vivo, são problemáticas, precisam passar por um tratamento sonoro antes de cair no mercado. Infelizmente os engenheiros de som da gravadora não se preocuparam sobre isso e então a canção saiu com uma qualidade sofrível - agravada ainda mais pelo formato vinil! De qualquer maneira se fosse necessário eleger um momento que valesse por todo o disco certamente essa versão de "Tiger Man" seria a escolhida.
Elvis Sings Flaming Star (1968) - Ficha técnica: Elvis Presley (vocal) / Scotty Moore (guitarra) / Grady Martin (guitarra) / Jerry Kennedy (guitarra) / Bob Moore (baixo) / Murrey "Buddy" Harman (bateria) / D.J. Fontana (bateria) / Frank Carlson (bateria) / Homer "Boots" Randolph (sax) / David Briggs (piano) / Henry Slaughter (órgão) / Peter Drake (steel guitar) / Rufus Long (sax) / The Imperials (vocais) / The Jordanaires (vocais) / Millie Kirkham (vocais) / Red West (vocais de apoio) / Produzido por Steve Sholes, Chet Atkins, Felton Jarvis, George Stoll / Local de gravação: RCA Studio B, Nashville, Tennessee - Western Recorders, Los Angeles - NBC, Dressing Room, Burbank, California - Radio Recorders, West Hollywood, Californ ia / Data de Lançamento: outubro de 1968 / Melhor Posição nas paradas: 2 (Inglaterra).
Pablo Aluísio.
Elvis Presley
ResponderExcluirElvis Sings Flaming Star
Pablo Aluísio.
Too Much Monkey Business ficou, pra mim, como um música da década de "70, talvez por ter muita semelhança com os estilo das musicas do Moody Blue.
ResponderExcluirClássico de Chuck Berry. Ótima performance de Elvis. Só que a RCA não deu bola. No Brasil muita gente só conheceu essa música na caixa vermelha. Para entender como a música era desconhecida até mesmo dos fãs.
ResponderExcluirSobre o filme Flamming Star, pra mim, o Elvis, nunca esteve, nem nunca estaria, melhor ator que nesse filme. Ele pegou o lugar do Marlon Brando e fez muito bonito.
ResponderExcluirAté hoje não sei como o Marlon Brando deixou escapar esse filme. Logo ele que tinha grande afeição pela causa dos nativos americanos...
ResponderExcluirPois é, isso foi uma pena.
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