quarta-feira, 6 de abril de 2011

Friedrich Nietzsche: Humano, demasiado humano

A vida para Friedrich Nietzsche (1844 - 1900) não foi nada fácil. Aclamado como um dos maiores filósofos da história após sua morte, o autor teve uma vida trágica e breve. Extremamente inteligente e culto, Nietzsche não tinha uma vida social. Na realidade sentia-se bastante deslocado na presença de muitas pessoas. Não gostava muito de gente como confessou certa vez. Preferia a solidão, onde podia desenvolver melhor suas ideias. Leitor voraz, não deixava passar nenhum livro em suas mãos sem antes dar uma conferida sobre do que se tratava, mesmo que o assunto não fosse de seu grande interesse. Quando tentou se aproximar de alguém, de seu ídolo musical, Wagner, o achou um sujeito muito banal, decepcionante até. Sua convivência com o famoso compositor lhe renderia uma frase bastante conhecida. Ao resumir o antigo ídolo (pois passou a achar essa coisa de ter ídolos muito banal) disse que ele era simplesmente "humano, demasiado humano..."

Não cabe aqui nesse enxuto texto tratar ou analisar a essência de sua obra (que considero de grande relevância) mas sim trazer um pouco do ser humano por trás das letras. Afinal de contas Friedrich Nietzsche não foi apenas um nome na capa de seus livros mas um homem comum que viveu e sofreu em sua vida, tal como todos nós.

Nietzsche nasceu numa família tradicionalmente religiosa. Sua linhagem era de grandes pastores, homens que entregaram sua alma a Deus. O próprio Nietzsche porém não se sentia à vontade nesse papel, até porque ele tinha sérias dúvidas sobre a existência de uma entidade divina, criadora do céu e da Terra. Vendo as injustiças do mundo e as barbaridades que eram cometidas em seu Nome, ele acabou desenvolvendo um ceticismo natural que iria se refletir em seus livros de filosofia. Isso daria origem a uma de suas frases mais citadas e conhecidas, a de que "Deus estava Morto!". Assim Friedrich Nietzsche desenvolveu uma obra de complexo teor filosófico, mas que tinha como uma de suas bases a crueza do mundo real, e não aquilo que ele considerava puro fruto da imaginação humana. Deuses e criaturas espirituais eram incabíveis em sua análise do mundo e da sociedade. Claro que tal postura e ponto de vista traria grande desgosto em seu seio familiar. Para fugir dessa pressão e sentimento de desilusão, o jovem Nietzsche resolveu adotar uma vida errante, vivendo aqui e acolá, em quartos baratos, sempre solitário, não procurando criar laços sentimentais e de amizade com quem quer que seja.

Embora se sentisse livre, esse tipo de vida também cobrou seu preço. Nietzsche gostava de frequentar tabernas e também prostíbulos. Naquela época não havia consciência de preservação em relação a doenças venéreas e numa dessas idas a lugares como esse o escritor acabou contraindo a terrível sífilis, uma doença infecciosa sexualmente transmissível. Sem cura e tratamento eficaz naqueles tempos ela iria destruir aos poucos o grande pensador. Em seu estágio final a infecção se espalha para o cérebro, o sistema nervoso, o coração, a pele e os ossos, transformando seu portador em uma sombra do que um dia foi. A razão, tão importante para o pensamento e a obra de Friedrich Nietzsche, foi sumindo aos poucos. Ele passou a apresentar sinais de desequilibro mental, falando com animais irracionais e tendo arroubos de megalomania, algo que jamais havia feito parte de sua equilibrada personalidade antes.

Durante uma caminhada viu um cavalo puxando uma carroça e caiu em brandos, abraçando o pobre animal, afirmando que sentia sua dor! Depois fez um irritado discurso a transeuntes afirmando que havia escrito os maiores livros de filosofia de todos os tempos mas que ninguém dava a menor importância para eles - e que naquela altura de sua vida estava cansado de dar pérolas aos porcos alemães. Após ter mais crises como essas foi finalmente levado a um hospital onde ficou claro que estava perdendo o controle de sua racionalidade. A sífilis finalmente havia destruído seu sistema nervoso central. Ele passaria dez anos de sua vida completamente fora da realidade até morrer de forma completamente inglória, na miséria, vivendo de favor na casa de sua irmã que não pensou duas vezes antes de adulterar muitos de seus escritos, colocando conceitos que jamais tinham sido pensados por ele, como a de uma raça superior e ariana - ideias que seriam incorporadas pelo regime nazista anos depois.

Friedrich Nietzsche morreu pobre, ignorado e foi enterrado em uma cova rasa, quase como se fora um indigente ou mendigo. O tempo porém traria reconhecimento. Embora em vida nunca tivesse sido reconhecido seus livros aos poucos foram sendo redescobertos nos meios acadêmicos. Poucos anos depois de sua morte sua obra começou a despertar interesse dos grandes pensadores alemães, servindo inclusive de referência para obras ainda mais complexas. Nietzsche acabou alcançando o patamar de grande mestre e um revolucionário dentro da filosofia. Conceitos seus entraram no dia a dia dos grandes filósofos e ele finalmente foi chamado de grande pensador - algo que nunca foi feito em vida. O tempo fatalmente lhe fez justiça, ainda que tardia.

O melhor da obra de Nietzsche:
Assim Falou Zaratustra (1883)
Para Além do Bem e do Mal (1886)
Genealogia da Moral (1887)
O Anticristo (1895)

Pablo Aluísio.

3 comentários:

  1. Pablo:

    Quando eu li o Anticristo eu tive uma grata surpresa: ninguém é mais cristão que o Nietzsche. Por mais incrivel e paradoxal que isso lhe pareca. Se você ainda não leu, leia; nem que for por curiiosidade.

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  2. Sim, sob um certo ponto de vista você tem mesmo razão. A própria frase "Deus está morto" pode revelar isso pois em sua ótica Nietzsche estaria revelando que Deus estava morto sim, mas no coração dos homens.

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  3. É isso e o Anticristo ao qual o Nietzsche se refere no respectivo livro é na verdade, segundo a sua visão, o Paulo, que por diversos motivos teria adulterado completamente a palavra e, consequentemente, a filosofia de Jesus. Não e dificil acreditar nisso pelo que veríamos do Cristianismo no futuro e, principalmente, na idade média.

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