terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Elvis Presley - Love Letters From Elvis (1971)

O ano de 1971 foi bastante agitado para Elvis Presley. Começamos o ano brindados com seu melhor disco de estúdio da década de 70, "Elvis Country", e com o excelente filme "That´s The Way It Is", atacando os cinemas em todo os Estados Unidos. No dia 16 de janeiro desse mesmo ano, Elvis recebeu aquele que talvez fosse para ele o prêmio mais significativo de sua carreira, o Jaycees Award (concedido pela Jumior Chamber of Commerce), como um dos dez jovens que mais se destacaram na América. Na ocasião de premiação Elvis recebeu o troféu das mãos de ninguém menos do que George Bush, que anos depois iria se tornar presidente dos EUA. Elvis era tão orgulhoso desse prêmio que o carregou consigo até o final de sua vida. Não era raro Elvis exibir o vistoso objeto em sua suíte de Las Vegas, orgulhosamente colocado em um local de destaque para que todos pudessem vê-lo, ou então mostrá-lo para todos aqueles que encontrava durante as viagens de suas turnês. 1971 foi também um ano de trabalho árduo para o cantor. Para se ter uma idéia da agenda lotada de Elvis, basta dizer que em um curto espaço de tempo ele entrou em estúdio três vezes, para realizar sessões em março, maio e junho.

Como se isso não bastasse Elvis também caiu na estrada e realizou uma puxada maratona de apresentações em várias cidades, sendo que sua turnê em novembro ficou particularmente conhecida pelos fãs pela qualidade dos shows realizados. Mas isso ainda não foi tudo em sua vida artística, pois como sempre fazia nos anos 70, Elvis ainda realizou duas de suas habituais temporadas em Las Vegas. Mesmo esgotado física e emocionalmente, Elvis acabou aceitando a sugestão de Tom Parker para cumprir uma temporada extra em Lake Tahoe. Para Parker era interessante manter Elvis mergulhado numa infinidade de obrigações, pois isso iria manter a mente do cantor ocupada e produtiva. O Coronel, depois de tantos anos ao lado de Elvis, sabia que quando ele ficava muito tempo em ócio, sem ter o que fazer, mergulhava em depressão ou então se metia em alguma confusão tola. Parker sempre dizia o velho ditado inglês para Elvis: "Cabeça vazia, instrumento do diabo!". Além dos desafios impostos, o Coronel obviamente via o elevado potencial comercial do grande número de shows realizados.

Financeiramente 1971 foi um dos melhores anos da carreira de Elvis. Os lucros iriam finalmente equilibrar suas contas pessoais e de sua empresa. Era uma via de mão dupla que deixava todos satisfeitos: Elvis ficava feliz por estar trabalhando com agenda cheia e o Coronel Parker ficava igualmente contente em ver as verdinhas entrando em abundância. Mas se Elvis estava em uma ótima fase profissional, sua vida pessoal não ia pelo mesmo caminho. Apesar de estar se sentindo novamente valorizado e reconhecido como artista nesse período, 1971 não foi só um ano de glórias na vida do Rei do Rock. Esse também foi o ano em que seu relacionamento com Priscilla afundou de vez. Embora Priscilla só tenha pedido o divórcio e se separado do marido em 1972, nessa época ela já tinha chegado à conclusão de que seu casamento estava irremediavelmente arruinado.

Vivendo vidas separadas, Elvis ficava louco se tivesse que ficar mais de uma semana ao lado de sua esposa. Não havia mais carinho ou envolvimento. O que era prazer e alegria para Elvis antes em seu casamento, agora havia se transformado em obrigações, brigas e aborrecimentos. Embora infeliz em sua vida conjugal Elvis não estava disposto a tomar a iniciativa de um rompimento definitivo ou de uma conversa franca que colocasse todos os problemas em panos limpos. Tentava administrar a eterna crise conjugal com Priscilla com atitudes paliativas, viajando muito, dando desculpas para não passar muito tempo ao lado dela e o pior de tudo: procurando em outras mulheres o que não conseguia mais encontrar em sua esposa. Priscilla também resolveu seguir o mesmo caminho e logo estava de romance sério com Mike Stone, seu instrutor de caratê.

Depois de tentar solucionar seus problemas conjugais Priscilla finalmente entendeu que Elvis nunca seria fiel em seu matrimônio, nunca iria se tornar um pai presente e provavelmente nunca iria assumir todas as consequências ruins que invariavelmente surgem em um relacionamento adulto. Elvis ainda queria levar uma vida de mulherengo inconsequente, aprontando nas turnês ao lado de seus amigos. Na visão de Priscilla, Elvis se recusava a deixar sua postura adolescente de ser, uma atitude que diga-se de passagem em nada ajudava no projeto de salvamento de suas vidas em comum. Sem comunicação, com duas pessoas tentando levar vidas tão diferentes, não haveria outro rumo a tomar. O fim era inevitável, pois naquele momento o casamento havia se transformado apenas em uma fachada mesmo, uma paródia infeliz de um sonho não realizado. E tanto Elvis como Priscilla sabiam muito bem disso, embora continuassem a manter as aparências externas. Em conversas mais íntimas com seus amigos mais chegados Elvis revelava extrema decepção, angústia e sentimento de culpa pelo fracasso de seu casamento. Durante anos ele idealizou em Priscilla a mulher perfeita, a jovem correta e linda que iria ficar ao seu lado para sempre.

Durante anos ele preservou Priscilla ao seu lado, em um romance muitas vezes puramente platônico (pelo menos no aspecto sexual), e viu nela um modelo de mulher em que ele poderia confiar: leal, correta e pura. Depois do casamento tudo foi por água abaixo. O que era idealização romântica logo se tornou decepção com a realidade cotidiana de um matrimônio muitas vezes marcado pela indiferença e pela falta de diálogo. Talvez o grande problema para Elvis tenha sido a formulação em sua cabeça dessa imagem irreal de Priscilla por tantos anos. Quando se casou e a realidade bateu à porta, Elvis se sentiu frustrado e decepcionado com o que encontrou. Não poderia ter acontecido diferente, diga-se de passagem.

Sem encontrar aspectos positivos em sua vida pessoal, Elvis se voltou com todas as forças para sua vida profissional. Não que a RCA ajudasse muito nesse campo, pois ocasionado por infelizes escolhas da gravadora, os singles de Elvis testemunharam uma queda nas paradas, tendo sua melhor posição alcançada com "Rag to Riches", um mero e tímido 33º lugar. Lançado em junho de 1971 e sendo um dos discos de estúdio menos conhecidos de Elvis, "Love Letters", seguiu um caminho parecido, pois também não alcançou uma grande repercussão em vendas (33ª posição nos EUA), embora na Inglaterra tenha atingido um excelente 7º lugar. O álbum trazia canções que estavam arquivadas há mais de um ano nos estúdios da RCA em Nashville, pois grande parte desse material havia sido gravado em junho de 1970. De uma certa forma o disco criado por Felton Jarvis foi uma forma de aproveitar todos os "restos" dessas famosas sessões de gravação, com a honrosa exceção da belíssima "Sylvia" que só iria ser lançada no ano seguinte, no disco "Elvis Now". A palavra "restos" deve ser entendida em termos de comparação, pois apesar de "Love Letters" possuir algumas ótimas músicas, se formos compará-lo com "Elvis Country" ou "That´s The Way It Is" chegaremos a conclusão que ele é realmente meio fraquinho em termos de qualidade. Agora, prestem atenção no título do álbum. Quem o comprava esperava ouvir um disco só de baladas de Elvis, mas não se enganem. O repertório se mostra muito mais eclético, pois entre suas faixas podemos facilmente encontrar rocks, country, baladas e até mesmo um gospel! Vai entender a RCA!!!

Love Letters (E. Heyman / V. Young) - Essa linda balada que dá nome ao disco é na verdade uma regravação, visto que, Elvis a havia gravado em 1966. Quando lançada na época alcançou o 19º lugar. Iria ser bastante executada em shows durante o ano de 1976. A versão original de "Love Letters" foi gravada em 1945 e foi composta como tema de um filme estrelado por Joseph Cotten e Jennifer Jones. As duas versões são excelentes, tanto essa como a de 1966. A diferença é que na versão da década de 70 a voz de Elvis está bem mais forte, com entonações diferentes da versão anterior, em que sua voz está bem mais suave, quase murmurando as palavras. Escolha sua favorita!

When I'm Over You (S. Milete) - S. Milete escreveu três músicas que foram gravadas por Elvis em 1970: "When I´m Over You", "It´s Your Baby You Rock It" e finalmente "Life". Essa é a pior das três. A música não decola, tem um ritmo arrastado e definitivamente não deveria ter sido gravada. Vale ressaltar que apesar de não ser boa, a voz de Elvis está impecável e os músicos ótimos. Esse country insosso é um claro sinal de uma situação que já ocorrera na década de 60: falta de material de qualidade. É por essas e outras que digo que esse álbum foi comprometido em termos de qualidade pelo pessoal da RCA.

If I Were You (G. Nelson) - Outro country fraquinho que é burocrático ao extremo e ainda contém uma letra estúpida dizendo: "Se eu fosse você eu sei que que eu me amaria." O autor aqui tentou dar uma de poeta, mas falhou miseravelmente. É interessante notar que materiais fracos como esse foram gravados na mesma sessão em que foram produzidas músicas como "Brigde Over Trouble Water", "You Don´t Have To Say You Love Me", entre outros clássicos! Talvez Elvis ao gravar canções como essa só estivesse tentando agradar a Hill and Range, companhia responsável por fornecer material. Enquanto grandes compositores como John Lennon, Bob Dylan e outros achariam um privilégio em Elvis gravar suas músicas, ele se punha a gravar coisas assim!

Got My Mojo Working / Keep Your Hands Off Of It (P. Faster / E. Presley) - Malicioso e sujo, esse excelente rock, originalmente gravado por Muddy Waters, é na verdade uma Jam Session e claramente não havia sido gravado com intenção de ser lançado oficialmente. Sua versão completa possui mais de 5 minutos, porém foi editada pelo palavreado um tanto inadequado usado por Elvis no começo da canção. Caso excepcional de um feliz casamento entre a música de estúdio e os instrumentos acrescentados por Felton Jarvis posteriormente, que deixaram a música mais cheia. Elvis ainda a mistura em alguns momentos com "Keep Your Hands Off Of It", música que podemos vê-lo ensaiando na Alemanha em 1959, quando ainda estava servindo o exército americano.

Heart Of Rome (Stephens / Blaikley / Howard) - Um dos pontos altos do disco, essa canção possui fabulosa melodia e a voz de Elvis está fantástica. A letra é bem piegas, é verdade, mas tirando esse detalhe é um verdadeiro prazer sem culpas. Claro que é estranho o descendente de escocês Elvis cantando uma música que menciona Roma, mas avaliando a discografia de Elvis ("It´s Now Or Never", "You Don´t Have To Say You Love Me", "Surrender", etc) não é de se surpreender ouvir Elvis se aproximando musicalmente mais uma vez da Itália. Tem uma versão engraçada no bootleg "The Brighest Sar On Sunset Boulevard vol 2" onde Elvis literalmente avacalha a música, metendo palavrões e um grito hilário bem no meio da música. Divertidíssima!!! A versão oficial, por sua vez, foi lançada como lado B de "I´m Leaving", o que como sabemos era sentença de morte para uma música de Elvis na década de 70 e significava chances nulas de entrar para as paradas.

Only Believe
(P. Rader) - Os discos de Elvis são uma verdadeira salada musical de gêneros e refletem seu gosto musical eclético e sua preocupação zero em seguir só um estilo. Eis que depois de balada, countries e rock surge um gospel!!! Lançado no lado B de "Life", para promover o álbum esse gospel ganhou algumas versões ao vivo em 1971 e possui uma melodia meio esquisita, puxando algumas vezes para o Blues, outras vezes para o R&B e ensaiando uma proposital desafinada no seu final. Diferente de tudo que Elvis gravou, mas, na minha opinião um pouco abaixo da média.

This Is Our Dance (L. Reed / G. Stephens) - De longe uma das piores músicas de Elvis na década de 70, ao lado de "Take Good Care of Her". Aqui quase nada se salva, o ritmo é lerdo, a letra chatinha e não achando pouco, Felton Jarvis incluiu desnecessários violinos o que catapultou a música para um baile brega dos anos 40, o que em um disco de Elvis não é muito bom. Se possível pulem essa, pois não acrescenta em nada na discografia de Elvis e baixa consideravelmente o nível do disco.

Cindy, Cindy (Kaye / Weisman / Fuller) - Esse rock não ter sido lançado como single é um crime! Uma pena, pois é um típico rock de Elvis da década de 70 com um solo de arrebentar de James Burton (tem uma versão do "Essential Elvis vol.4" que tem dois solos), a banda detonando e o segredo de todo bom rock: ritmo bom, acelerado e um vocal poderoso do vocalista. Aqui Elvis dá um show. Sua voz ainda estava com a aspereza (no bom sentido) dos anos de 68 e 69. "Cindy, Cindy" já havia sido gravada diversas vezes com nomes e letras diferentes. Ricky Nelson, por exemplo, a gravou sob o nome de "Get Along Home Cindy" em 59 e Teddy Van também a gravou com o título de "Cindy". A letra foi reescrita por Ben Weisman, Florence Kaye e Dollores Fuller, três compositores de Elvis que escreveram para ele bastante na década de 60. De longe a melhor música do disco inteiro.

I'll Never Know (Karget / Wayne / Weisman) - Música escrita por Ben Weisman, que escreveu para Elvis mais de 50 músicas! Essa balada bonitinha lembra muito as musiquinhas inocentes dos filmes dos anos 60. A diferença em relação a essas fica a critério da voz de Elvis, bem mais madura e da instrumentação com violinos. Tudo utilizado por Felton Jarvis, o que não acontecia nas trilhas, que optavam por um arranjo bem básico. Não entra na lista das melhores de Elvis, mas é bem melhor do que outras músicas do disco.

It Ain't Big Thing (But is Crowing) (Merrit / Joy / Hall) - Essa canção é definitivamente, junto com "Just Call Me Lonesome", a música mais fiel ao estilo country gravada por Elvis. O porquê de não ter sido incluída no "Elvis Country" é um mistério. Algumas semanas depois da sessão de gravação em junho de 1970 ela estaria nas paradas na voz de Tex Williams. James Burton aqui capricha nos seu solo. Particularmente acho a música bem chatinha e meio deslocada no álbum.

Life (S. Milete) - Essa canção é única na carreira de Elvis, tanto pelo tema, falando da origem da vida(!), tanto pelo arranjo, que aqui sim ficou de primeira, principalmente na parte final da música, diferente de tudo que você já ouviu na voz de Elvis. Jarvis aqui acertou em cheio. No versos finais, a música acaba revelando ser uma balada. Muito bem escrita é a melhor das três músicas de S. Milete que Elvis gravou em 1970 e fecha o álbum com chave de ouro. Porém o público não aceitou essa simpática alienígena no mundo de Elvis e quando lançada como single para promover o álbum não ultrapassou a medíocre 53º posição, não tendo sido nem lançada na Inglaterra. Uma pena.

Em suma: "Love Letters From Elvis" é um álbum razoável de Elvis, que alterna excelentes momentos com outros bem medíocres e é bem inferior a seus antecessores "Elvis Country" e "That's The Way It Is". Os produtores também tiveram sua parcela de culpa no quase esquecimento desse álbum com o passar dos anos, apesar de sua posição não ter sido ruim, pois lançaram músicas fracas nos singles, deixando de fora pérolas como "Cindy, Cindy". Além disso o seu título dava a entender que era um álbum exclusivo de baladas, quando é um dos mais mistos, em termos de estilos musicais, de toda a carreira de Elvis Presley.

Pablo Aluísio e Victor Alves.

Elvis Presley - I Sing All Kinds

Devo confessar que recebi a notícia sobre esse lançamento sem muito entusiasmo. Não quero com isso afirmar que esse novo CD do selo Follow That Dream seria destituído de valor, nada disso, aliás muito longe desse tipo de afirmação. Recebi sem grande empolgação porque realmente não considero as sessões que Elvis realizou em Nashville em 1971 entre as mais inspiradas de sua carreira. Aliás devo ir além. Considero essas sessões limitadas, restritas e para dar voz aos setores mais críticos um verdadeiro desperdício de tempo por parte de Elvis e seu grupo.

Agora me explico. Esse set list por si só é extremamente limitado e restrito. Ao fazer uma análise sobre o conteúdo dessas sessões chegamos facilmente à conclusão que canções temáticas como as de natureza religiosa ou de temas natalinos por si só já ficariam restritas naqueles grupos que seguissem tal fé religiosa. Para ilustrar o que tento passar ao leitor vou me utilizar de um exemplo simples, para não dizer até mesmo simplório. Em um país essencialmente católico como o nosso o simples fato de algumas canções de Elvis Presley serem catalogadas nesse gênero já era por si limitante, tanto que nenhum de seus álbuns gospel conseguiu sequer ser lançado oficialmente em nosso país durante sua carreira. Não quero com isso desmerecer a importância das faixas religiosas, absolutamente não. Apenas quero ilustrar como, para alguém que procurava se firmar novamente na carreira após um período de crise artística, esse talvez não fosse o momento ideal para dar ao mercado de discos um novo LP com esse tipo de sonoridade. Outro problema se refere ao material natalino. Praticamente poucos países, fora os EUA, cultivam ou levam a sério esse estilo musical. Mesmo assim temos que convir que músicas de natal estavam bem fora de moda nos anos 70, mesmo naquele país.

Gravar músicas natalinas naquela altura era, para ser bem sincero, uma grande perda de tempo e dinheiro que traria muito pouco retorno para Elvis em termos de prestigio artístico. Em resumo, gravar músicas religiosas evangélicas eram limitantes e perder tempo registrando faixas de natal eram acima de tudo se limitar como cantor. Depois dessa rápida exposição sobram apenas um terço das sessões que poderiam ser dedicadas a material realmente relevante. Pouco, muito pouco. E mesmo assim, ao analisarmos essa terça parte final, verificamos facilmente que o resultado final não é muito positivo, que realmente as sessões em seu conjunto deixam muito a desejar. Ao se debruçar sobre o restante do material gravado por Elvis nessa ocasião, não posso deixar de ficar insatisfeito. As canções que compõem a parte, digamos assim, convencional, não temática, passam muito longe de nos presentear com algo que seja classificado como histórico ou lendário e ao invés disso nos deixa um sabor amargo de algo comum, ordinário (não no sentido pejorativo da palavra), vindo de um artista que pode ser denominado sem medo de errar com esses mesmos adjetivos a que citei no começo da frase. Em termos de comparação a situação só se agrava se formos comparar essas sessões de 1971 com as do ano anterior. Nada mesmo foi gravado de forma tão relevante aqui e nem muitos menos temos canções de porte como Bridge Over Troubled Water, a música que definiu de forma tão completa as sessões anteriores. O que nos resta então? Canções medianas e com toques da genialidade de Elvis em um ou outro momento. Talvez o FTD I Sing All Kinds tenha seu valor mais concretizado em seu ineditismo. Mas mesmo pensando sob esse ponto de vista não posso deixar de perceber que um CD apenas para resumir uma sessão que por si só deu origem a discos diversos da carreira de Elvis Presley vem apenas confirmar que em si essa sessão deixa e muito a desejar. Suas qualidades tiveram necessariamente de ser somadas para sustentar um único CD e não diversos específicos a cada álbum que conhecemos de sua discografia oficial. Eis aqui sua fragilidade definida em um fato do qual não podemos ignorar.

De qualquer forma vamos agora produzir pequenas pinceladas sobre cada faixa presente no CD, em nosso já conhecido método de se analisar faixa a faixa todos os registros deixados a nós pelo grande artista que Elvis Presley foi.

BOSOM OF ABRAHAM (William Johnson - George McFadden - Ted Brooks) - O CD abre com essa faixa gospel que foi gravada pela primeira vez pelo grupo The Golden Gate Quartet em 1938. Anos depois ainda ganharia uma releitura pelo mais que obscuro grupo The Trumpeteers no pós guerra. Embora todos saibamos que Elvis era um grande conhecedor da música religiosa norte americana, tanto que possuía vasta coleção desse gênero em sua casa, posso arriscar que sem dúvida o que o levou a gravar essa faixa em 1971 foi a versão produzida pelos Jordanaires em 1954. Esse tipo de conclusão chegamos ao ouvir as três versões originais citadas. Polida ao longo dos anos Bossom Of Abraham foi aos poucos deixando o som mais puro dos spirituals para flertar perigosamente com os novos ritmos que chegavam embalando a sociedade americana nos anos 50. Tanto isso é verdade que seu ritmo em muito lembra os primeiros registros desse novo idioma musical chamado Rock´n´Roll, produzindo uma curiosa aproximação entre o sagrado e o profano, o espiritual e o carnal. Temos aqui o take 4. Praticamente igual a todas as outras que conhecemos. Cercado por um grupo vocal gospel afinadíssimo, com músicos que conheciam muito bem a melodia em si, Elvis não teve muito com o que se preocupar. O take é praticamente perfeito do começo ao fim e poderia ter entrado em qualquer disco oficial de Elvis sem maiores problemas.

I'VE GOT CONFIDENCE (Andrea Crouch) - Andrea Crouch era um popular ministro religioso nas décadas de 1960 e 1970. Era um novo talento, alguém que ainda lutava para abrir caminho em sua trajetória artística, apesar de já naquela altura, 1971, ser bem reconhecido dentro da comunidade religiosa dos EUA. Para quem conhecia música gospel como a palma da mão Elvis logo tomou conhecimento de seus discos religiosos e se tornou grande admirador do trabalho desse pastor negro que, com sua música, deu um novo sopro de vida ao gênero durante aquele período. Era questão apenas de tempo Elvis vir a gravar alguma de suas canções e assim o fez finalmente nessas sessões de Nashville. A música escolhida foi justamente essa, que foi gravada pela primeira vez em 1969 por seu próprio autor. Aqui temos o take 1, a primeira tentativa de Elvis em gravar a canção. Bem mais rápida e acelerada que a versão original ainda temos um Elvis se acostumando com a canção. Mesmo assim podemos perceber que Elvis já a tinha ouvido tantas vezes na voz de Andrea que ela, apesar do compasso diferenciado, estava a poucos minutos de encontrar seu ponto ideal e se chegar ao take oficial.

AN EVENING PRAYER (C.M.Battersby - Charles H.Gabriel) - Depois de I´ve Got Confidence, faixa relativamente recente naquela época, Elvis mergulha fundo na história da música gospel e traz de volta uma canção que foi originalmente escrita em 1911! Esse fato tem explicação e não precisamos retroceder tanto para se saber em que momento essa canção religiosa capturou o gosto musical de Elvis Presley. Certamente a influência vital aqui é a versão do grupo Blackwood Brothers, um dos preferidos de Elvis. Embora músicos e cantores importantes como Jim Reeves e Mahalia Jackson tenham feito grandes gravações dessa música, foi a versão dos Blackwood Brothers que fisgou definitivamente Elvis Presley. Todos sabemos que um dos sonhos de Elvis em seu começo era cantar em um quarteto gospel. Esse sonho foi ainda mais acentuado por esses fantásticos cantores que resolveram se mudar para Memphis em 1950 dando inicio a uma longa e produtiva carreira, deixando profunda influência sobre o próprio som que Elvis iria desenvolver a partir de seu surgimento anos depois. Esse tipo de afirmação é facilmente perceptível logo nas primeiras notas ao piano da canção. O coro invade o ambiente e Elvis assume a música a levando em um ritmo cadenciado e terno para tudo terminar em final apoteótico de vozes em perfeita harmonia. Ao se ouvir esse take, de número 5, podemos facilmente chegar na conclusão que ele é praticamente definitivo.

FOR LOVIN' ME (Gordon Lightfoot) - Canção country que se destacou nas vozes dos componentes do grupo Peter, Paul and Mary nos anos sessenta. Interessante que muitos autores sempre gostam de frisar que nos anos 60 Elvis se isolou do cenário musical ao seu redor e se fechou em um casulo de canções fabricadas determinadas pelos estúdios de cinema. Sem dúvida em parte isso foi um fato verdadeiro. Porém se formos analisar a gravação de canções como essa nos anos 70 vamos perceber que Elvis não estava fora de sintonia com o que acontecia na música americana, apenas estava amordaçado por contratos leoninos a que tinha assinado. Aqui temos a versão que todos já conhecemos, a única novidade mesmo foi a introdução em que o grupo erra e volta para mais uma tentativa. Nesse aspecto acho que a inclusão aqui nesse CD foi puro desperdício.

EARLY MORNING RAIN (Gordon Lightfood) - Sucesso country de Peter, Paul and Mary nos anos 60. A versão oficial de Presley, que foi lançada no LP Elvis Now em 1972, foi gravada no dia 15 de março de 1971 nessas mesmas sessões de Nashville que estamos aqui analisando. Era uma de suas preferidas, estando bastante presente em suas apresentações, principalmente em seus últimos concertos realizados no período entre 1976 e 1977, onde Elvis realmente a cantou regularmente em muitas de suas turnês. Vale lembrar também que ela seria ainda gravada mais uma vez para o "Aloha From Hawaii" em 1973. "Early Morning Rain" é aquele tipo de canção que muito dificilmente você não irá apreciar. A música tem uma boa levada, melodia suave e relaxante e traz Elvis bem inspirado e envolvido. Acredito que mesmo aqueles que torcem o nariz para o gênero country vão apreciar sua melodia. Aqui temos o take 11, sem nenhuma grande diferença significativa em relação à versão oficial que conhecemos - exceto pela ausência de alguns instrumentos de sopro e da falta mais marcante do vocal de apoio.

FOOLS RUSH IN (Rube Bloom / Johnny Mercer) - Uma canção apenas mediana que a despeito de suas duvidosas qualidades melódicas alcançou uma incrível marca de regravações famosas desde que Johnny Mercer a lançou na década de 1930. Entre outros grandes nomes que fizeram suas próprias versões estão os consagrados Glenn Miller e Frank Sinatra. Porém nada dessa longa tradição foi reaproveitada por Elvis pois ele preferiu seguir quase que fielmente os arranjos da versão de Rick Nelson, que foi lançada em 1963 pelo selo Decca. Talvez o fato do guitarrista James Burton ter participado dessa versão de Nelson tenha colaborado decisivamente para a gravação sem grandes novidades por parte de Elvis Presley. Nesse CD temos o take de número 14, o que por si só já é uma surpresa, haja visto que nenhuma mudança significativa existe. Nos admira muito o fato de Elvis levar tantos takes para se chegar em um resultado significativo; como disse antes, a canção é simples, tanto no aspecto de arranjos quanto de vocalização por parte de Elvis Presley. Infelizmente aqui não ouvimos praticamente nada dos bastidores da gravação, sendo o corte mais adequado para um lançamento oficial do que para um CD de takes alternativos como esse.

HELP ME MAKE IT THROUGHT THE NIGHT
(Kris Kristofferson) - Essa canção escrita pelo cantor e ator Kristofferson surgiu nas paradas em 1971 cantada por Joe Simon. Fez um belo sucesso sendo considerada uma boa representante naquela que, para muitos, foi uma época de pleno renascimento do gênero country com cantores de grande expressão como Willie Nelson, Johnny Cash, Wayllon Jennings e Merle Haggard, grupo que ficou conhecido como símbolo do movimento "outlaw". Obviamente que em Nashville Elvis não poderia ficar à margem do que acontecia ao seu redor em termos de movimentos culturais e isso se refletiu muito em sua própria música nesse período. Essa influência é facilmente perceptível quando nos debruçamos sobre o teor das canções que Elvis gravou aqui nessas sessões. Tirando o material temático (gospel e natalino) o que basicamente temos são várias gravações, que se não são assumidamente do gênero country, bebem diretamente de sua fonte. Voltando a canção aqui temos dois takes, os de número seis e sete. O primeiro é uma mera introdução por parte de Elvis que acaba entrando com o vocal no momento errado, se enrola um pouco e apesar da banda seguir em frente logo é interrompida pelo cantor ao perceber suas próprias falhas. O take sete por sua vez já é uma versão completa. Elvis ainda erra levemente em alguns trechos mas no balanço final até que é um bom take, apesar de também ser sem grandes novidades importantes...

IT'S STILL HERE (Hunter) - Canção escrita por Ivory Joe Hunter, grande nome da música negra norte americana, compositor, pianista e consagrado cantor de R&B. A admiração de Elvis pela obra de Hunter não ficou apenas restrita as músicas ("My Wish Came True", "Ain't That Loving You, Baby" e "I Will Be True") que o cantor efetivamente gravou. Foi além. Nos anos 50 Elvis, em raro momento de verdadeiro fã de outro artista, convidou Ivory a Graceland para que ambos se conhecessem e trocassem ideias sobre música em geral. O jantar oferecido por Elvis foi um grande sucesso e Ivory relembraria anos depois do grande anfitrião que o cantor foi naquela ocasião. O ponto alto desse encontro, segundo as lembranças do próprio Ivory, foi cantar junto a Elvis o sucesso "I Almost Lost My Mind", escrito pelo autor e imortalizado em gravação com Pat Boone. Voltando ao CD que estamos analisando, aqui temos o take praticamente único de It´s Still Here. A história da gravação dessa música de Hunter por Elvis já é, de certa forma, bem conhecida pelos fãs do cantor. Aqui temos o astro em raro momento solo ao piano. O momento foi a manhã do dia 19 de fevereiro de 1971 nos estúdios de Nashville. Os músicos presentes a esta sessão lembram que Elvis chegou muito inspirado na manhã deste dia e gravou três canções de uma só vez ao piano, sozinho, sem acompanhamento. O interessante é que o horário preferido de Elvis para gravar era durante as madrugadas adentro e esta gravação, feita logo pela manhã, foi uma verdadeira quebra de seu "Modus Operandi". Aliás a novidade não se restringe apenas ao horário da gravação, mas também pelo fato do Elvis instrumentista aparecer depois de tantos anos esquecido.

I WILL BE TRUE (Hunter) - Essa é a terceira música registrada por Elvis na manhã do dia 19. Como já escrevi antes, essa canção e "It's Still Here" são algumas das versões de Presley para velhas e conhecidas canções do talentoso Ivory Joe Hunter. Aqui podemos notar o grande conhecimento musical de Elvis pois é fato que ele sempre usava desse artifício, ou seja, sempre estava revisionando canções antigas e lhes dando um novo tratamento, tentando trazê-las de volta para que novas gerações tivessem a oportunidade de conhecer toda essa vasta tradição musical. E isso que escrevi está bem nítido no fato de seus arranjos terem sido creditadas inteiramente a Elvis e não a Felton Jarvis, que nesse caso se resumiu a acrescentar overdubs para dar mais consistência ao resultado final. Detalhe curioso: Durante sua execução ouvimos nitidamente, segundo alguns, o som de manuseio de folhas, certamente de partituras e letras presentes na sessão. Mais curioso ainda é o fato de alguns autores creditarem esse pequeno erro de gravação ao próprio Elvis!!! Só não conseguiram mesmo explicar como Elvis, que estava tocando piano com as duas mãos, conseguiu ainda manusear as tais "folhas" ao mesmo tempo!!!

UNTIL IT'S TIME FOR YOU TO GO (Marie) - Essa é uma música que nunca encontrou uma versão ideal na voz de Elvis, opinião que era compartilhada pelo próprio cantor que sempre mostrava insatisfação ao ouvir os diversos takes produzidos em estúdio. Talvez por essa razão a música tenha sido arquivada por um bom tempo pelo produtor Felton Jarvis, pois muito provavelmente ele e Elvis ainda esperavam chegar no chamado "take perfeito", coisa que aliás nunca aconteceu, pois a versão que saiu no LP "Elvis Now" é bem mais fraca que essa versão que ouvimos nesse CD. O mais interessante nesse caso foi que, apesar de não ter ficado boa em estúdio na opinião de Elvis, ele resolveu levá-la para a estrada e a incorporou praticamente em definitivo em seu repertório. Os resultados dessas versões ao vivo foram irregulares, pois como sempre temos bons momentos ao lado de interpretações medíocres de Elvis para essa música. Em vista disso esse recente sucesso na voz de Neil Diamond (pois foi gravada no mesmo ano da versão de Elvis), foi lançado como lado principal de um single em janeiro de 1972, com "We Can Make the Morning" no lado B. O single, feito para divulgar o LP "Elvis Now", não encontrou boa repercussão nas paradas, chegando a um desolador 40º lugar. Nesse CD temos dois takes, de números 5 e 6. Essas são versões de junho e nada trazem de muito relevante. No aspecto fluidez essa versão ganha se comparada a versão oficial pois é sabido que a última é bastante prejudicada em seu andamento. Elvis, mais solto e relaxado, produziu aqui um melhor material. Fora isso, apesar de seus inegáveis méritos, só podemos constatar que mesmo sendo boa ainda certamente não é a ideal, o que confirma que Elvis e Felton tinham mesmo razão nesse ponto pois a versão perfeita jamais foi de encontro a voz do cantor.

IT´S ONLY LOVE (James / Tyrell) - A versão oficial dessa canção foi lançada em setembro de 1971 em um single juntamente com "The Sound of Your Cry" no lado B. As vendas foram desanimadoras, chegando apenas na 51ª posição entre os mais vendidos. Aliás é bom frisar que todos os singles lançados por Elvis em 1971 se deram mal, em maior ou menor grau, nas principais paradas musicais. Isso demonstra claramente como a carreira de Elvis vinha sendo mal administrada. Músicas sem muito apelo comercial eram colocadas em posições de destaque nos singles, que em razão disso não chamavam atenção do público que simplesmente o ignoravam. O excesso de lançamentos também era prejudicial. Em 1971 Elvis lançou um single novo praticamente a cada dois meses. Esses singles e álbuns em demasia (foram dez LPs de Elvis lançados somente entre 1970 e 1971) saturavam completamente o mercado, fazendo com que muitos deles encalhassem nas lojas. Além disso como eram muitos os lançamentos, nenhum deles acabava tendo a publicidade adequada e necessária para que se destacassem nessas mesmas paradas. It´s Only Love é o exemplo perfeito do que estou escrevendo. Essa realmente era a música errada no lugar errado. Não estou querendo com isso dizer que ela seja desprovida de méritos, nada disso, apenas quero deixar claro que jamais deveria ter sido lançada como foi, sendo título de um single de Elvis Presley. O resultado desse erro de estratégia veio em números que apenas demonstrava o grande fracasso de vendas em que o single se tornou. A versão oficial é apenas mediana. Com belo arranjo de cordas, com Burton fazendo pequenos solos ao longo da melodia, a música em si até tem refrão agradável, mas passa longe de ser aquele tipo de música que irá grudar na mente das pessoas, fazendo em consequência a canção se transformar em um hit em potencial. O take presente nesse CD já traz algumas pequenas novidades, nada demais, mas que ao menos devem ser citadas. Os pequenos dedilhados de guitarra ganham mais evidência e o ritmo da canção está mais lento e calmo, ganhando com isso maior qualidade técnica. Elvis também se mostra superior nos vocais, com as palavras cantadas de forma mais suave, trazendo nitidez ao conjunto final. De qualquer forma parece que Elvis sabia que faltava de certa forma pique ao take e talvez por isso resolveu no finalzinho inutilizar totalmente a tentativa ao trocar "it´s Only Love" por "It´s Only Sex", pequeno trocadilho que se torna apenas curioso e que nada acrescenta ao resultado final que ouvimos.

I'M LEAVIN´ (Jarret / Charles) - Dando prosseguimento a análise do FTD I Sing All Kinds abro um espaço para escrever sobre as injustiças que foram cometidas durante a carreira de Elvis. Entre elas temos uma série de canções que jamais tiveram o espaço merecido e foram, de uma forma ou outra, negligenciadas pelos produtores e pelo empresário de Elvis. A lista é enorme, porém se fôssemos eleger uma série candidata a mais injustiçada certamente teríamos I´m Leavin entre elas. Melodia das mais lindas entre todas as que Elvis Presley teve oportunidade de interpretar, foi severamente prejudicada pelas decisões equivocadas tomadas entre aqueles que comandavam os rumos fonográficos da carreira discográfica do Rei do Rock. Lançada sem quase nenhuma publicidade em junho de 1971 a canção foi injustamente ignorada na parada norte-americana, sem conseguir sequer ameaçar os líderes da lista de singles da Billboard, alcançando em seu melhor momento um fraco trigésimo terceiro lugar entre os mais vendidos. Uma lástima, sem dúvida. Pior aconteceu no Brasil onde ela sequer foi lançada, permanecendo inédita durante longos anos, não dando oportunidade ao consumidor nacional de sequer conhecer sua qualidade melódica extrema. Aliás os lançamentos de Elvis no Brasil durante os anos 70 eram mal direcionados, mal administrados e mal conduzidos. Para se ter uma pequena ideia do caos que reinava em nosso país basta apenas citar que apenas um compacto nacional inédito de Elvis foi lançado por aqui em 1971. Se isso era ruim o que dizer do fato de que nenhum de seus álbuns com canções inéditas foi lançado em solo pátrio em 1971? Os únicos LPs a chegarem nas lojas brasileiras foram Almost In Love e That´s The Way It Is, ambos com um ano de atraso!!! Realmente o colecionador da época era solenemente ignorado pelos executivos da RCA Brasil. Antes de me adentrar no take aqui presente nesse CD (o de número 3) quero fazer pequenas pinceladas sobre a versão oficial. A música possui uma levada única na carreira de Elvis. Começa suave, basicamente uma introdução vocal que evoca o lamento pela situação em que o autor se encontra. A letra, simples mas profundamente emocional, retrata a falência de um relacionamento, o ocaso de uma história de amor. Estaria Elvis se antecipando ao que iria acontecer com ele e Priscilla no ano que viria? Não sabemos e ir além disso seria mera especulação, porém a canção e sua letra nos remete exatamente a isso, Elvis realmente estaria cantando sobre um fato que lhe era também essencialmente pessoal: o iminente fim de seu casamento. O take 3 presente aqui nesse lançamento ainda traz um grupo e um cantor tentando achar a sonoridade ideal, o ritmo mais adequado e condizente com a versão que lhes foi passada. Elvis está ainda vacilante em certos pontos, tentando se encaixar totalmente na melodia. A despeito disso a versão é bem correta e está a poucos passos daquilo que conhecemos de sua versão oficial. Sem a menor sombra de dúvidas esse registro é um dos mais relevantes já lançados por essa coleção FTD.

LOVE ME, LOVE THE LIFE I LEAD (Macauley / Greenaway) - Esta música foi gravada em maio de 1971 em Nashville e arquivada pelo produtor Felton Jarvis por longos dois anos. Aliás ela foi a última canção gravada por Elvis nessas exaustivas sessões. De sua safra surgiram discos diversos da carreira de Elvis, entre eles o premiado "He Touched Me" (vencedor do Grammy), o popularesco "Elvis Now" (um de seus discos mais populares no Brasil durante os anos 70) e os equivocados "Elvis Sings the Wonderfull World Of Christmas" (tentativa mal sucedida da RCA de reviver seu clássico disco natalino dos anos 50) e "Elvis" (uma das maiores colchas de retalhos da carreira de Elvis Presley). No meio de tanta diversidade, para não dizer desorganização, essa canção ficou perdida em um limbo até encontrar um papel deveras coadjuvante nesse último LP citado. Afinal essa música possui algo que a destaque no meio de tantas outras que frequentavam o repertório de Elvis por essa época? Alguma característica que a remova do incômodo título de mera figurante, mero "tapa buraco"? No meio de tantos lançamentos a música só poderia ficar perdida mesmo, até porque quem prestaria atenção em seus méritos no meio de tal avalanche de lançamentos? Mas como não estamos mais nos anos 70 podemos analisar tudo com mais calma e ponderação certamente. Particularmente acho a canção em si lindíssima. Obviamente seu arranjo se coloca na média, com belo acompanhamento vocal, boa sonorização e um belo e discreto quarteto de cordas ao fundo. O que mais enobrece esse momento perdido de Elvis sem dúvida é a interpretação do próprio cantor. Vejam como Elvis vai, em poucos segundos, de uma vocalização sóbria e contida para uma explosão emocional logo nos primeiros segundos da canção. Ele facilmente passa de uma postura ressentida para passional ao extremo, seu vocal na versão oficial é simplesmente brilhante, uma verdadeira montanha russa de emoções e posturas conflitantes - não me admira que alguns o tenham como uma pessoa que sofria de transtorno bipolar!!! Maior exemplo de um artista trabalhando com material apenas razoável e o transformando em pequenos momentos de brilhantismo natural. Aqui nesse CD temos o take de número quatro de Love Me, Love The Life I Lead. Primeira constatação: a voz de Elvis e a parte instrumental de seu grupo estão bem mais nítidos e presentes nessa faixa. Fazendo uma analogia visual seria como se alguém tivesse tirado os músicos de dentro de uma caixa e os trazido para mais perto dos equipamentos de gravação. Na versão oficial temos um registro mais apagado pois certamente Felton ao fazer a mixagem com o arranjo orquestral ao fundo teve que contrabalancear os músicos de estúdio com o arranjo que foi gravado posteriormente e nesse processo o som da gravação de Elvis e grupo foi nitidamente ofuscado. Não chega a ser um problema mas tira um pouco do brilho da versão oficial. No aspecto puramente restrito à performance de Elvis notamos que ele ainda tenta encontrar o caminho correto dentro da faixa. Sua tão citada explosão emocional aqui é bem mais contida e menos robusta. Elvis ainda não havia se entregado completamente à interpretação e assim notamos que o "algo mais" ainda não está presente aqui nesse registro. De qualquer forma temos ao menos a gênesis de um pequeno grande momento de Elvis prestes a surgir. Sem dúvida um registro precioso desse CD.

PADRE
(LaRue / Webster / Romans) - A letra de Padre foi escrita por Paul Francis Webster, um famoso compositor que desde a década de 1930 já fazia canções para a grande estrela infantil da época: Shirley Temple. Embora isso o qualificasse como um compositor de estúdios, no auge do Star Sistem, ele aos poucos foi se aproximando de outras importantes vertentes da música daquela época, chegando a compor para nomes consagrados como Duke Ellington. Uma década depois ganharia dois prêmios Oscar por composições escritas especialmente para filmes de Hollywood, sendo duas delas conhecidissimas dos amantes da sétima arte: "Secret Love" que se tornou imortal na voz de Doris Day em 1953 e "Love is a Many-Splendored Thing" do grande clássico romântico "Suplício de uma saudade". Já a parte instrumental dessa música foi composta pelo famoso pianista clássico francês Jacques La Rue. Em vista de tudo isso chegamos facilmente à conclusão que "pedigree" não lhe faltava. A canção que havia se tornado sucesso em 1958 pelo jeito cativou realmente Elvis, tanto que era reconhecidamente uma de suas favoritas. Pode-se inclusive notar a extrema empolgação do cantor na versão oficial que saiu no LP Elvis de 1973, pegando o embalo dessa vez do sucesso da música em plenos anos 70 na voz de Marty Robbins. Embora a versão de Elvis tenha sido gravada no dia 15 de maio de 1971 em Nashville ela só ganhou mercado anos depois quando Jarvis reuniu uma série de canções arquivadas de Presley para compor o já citado álbum, que no fundo não passava de uma grande colcha de retalhos organizada pelo produtor do cantor. A versão que aqui ouvimos nesse CD I Sing All Kinds é a segunda tentativa de Elvis em gravar a música. Padre (take 2) é apenas um embrião do que viria a ser a versão oficial que todos conhecemos. Aqui a música está em um ritmo bem mais cadenciado. Elvis e seu grupo ainda estão um tanto quanto "amarrados", para não dizer tensos e pouco espontâneos. Elvis certamente ainda tenta seguir milimetricamente as notas o que torna a versão demasiadamente mecânica e pouco espontânea, duas características que certamente não existem na versão original cuja maior particularidade é a empolgação incontida e contagiante de sua interpretação.

SEEING IS BELIEVING (West / Spreen) - Sempre achei a versão oficial bem fraca, para dizer a mais pura verdade acho bem equivocado o tom escolhido por Elvis para cantar essa música gospel. Além disso o master escolhido por Jarvis sempre me pareceu gravado às pressas, sem muito rigor técnico. Agora que temos acesso a esse take alternativo desse CD podemos nos concentrar melhor sobre as eventuais falhas da gravação dessa canção. Assim chegamos em Seeing Is Believing (take 7). Interessante. Esse é o que sempre procurei em relação a essa música. Extremamente bem gravada, com o ritmo certo, acompanhamento mais do que correto e o vocal de Elvis que deixa a versão oficial a milhas de distância em termos de qualidade. Chego a me perguntar o que diabos se passava na cabeça de Felton Jarvis para escolher aquela versão fraquíssima do disco oficial? Esse é um dos grandes exemplos de um take alternativo que foi descartado pelo produtor de Elvis por causa de uma escolha bastante infeliz mas que é infinitamente superior ao que chegou ao mercado. E se esse foi um erro de seu produtor logo o cantor sofreria novamente por outro erro e outra decisão errada tomada, mas dessa vez por seu empresário Tom Parker. Foi durante as sessões de Nashville em 1971 que Presley sofreu a primeira baixa significativa em seu grupo de apoio. Essas foram as últimas gravações em que o grupo vocal The Imperials trabalhou ao lado do cantor. Como sempre acontecia na relação "Parker x músicos de Elvis" esses talentosos vocalistas estavam insatisfeitos com o que vinham recebendo do manager de Elvis. Assim como aconteceu com os músicos de Presley nos anos 50 eles também acabaram deixando o cantor por não serem atendidos em suas reivindicações salariais. Nesse aspecto Parker era intransigente e seu lema era simples: "Não estão satisfeitos com o que ganham? Podem ir embora então". E eles foram mesmo. Depois que deixaram o lugar vago, o grupo de JD Sumner assumiu o posto, sendo que anos depois Elvis resolveu ele mesmo formar um grupo vocal ao qual deu o nome de Voice.

A THING CALLED LOVE (Hubbard) - Jerry Reed Hubbard, autor dessa música, é um conhecido cantor veterano de música country nos EUA. Por lá ele desfrutava de grande prestígio desde os anos 60 e quando a versão de Elvis de sua música chegou nas lojas ele estava no auge de sua carreira musical. Para se ter uma idéia foi justamente em 1972 que Jerry venceu o Grammy de Best Male Country Vocal Performance. Jerry Reed era velho conhecido de Elvis. Desde o final dos anos 60 o caminho de ambos havia se cruzado. Em 1967 ele recebeu um telefonema de Felton Jarvis dizendo que Elvis estava muito interessado em gravar algumas de suas canções, entre elas as maravilhosas "Guitar Man," e "U.S. Male". Sem dúvida esse primeiro contato foi extremamente importante para Elvis e Jerry, justamente no momento em que Presley procurava material de qualidade para superar a fase de suas trilhas sonoras sem grande expressão. Mas essa bela parceria não terminaria por ai. Após gravar pela primeira vez "A Thing Called Love" Jerry cedeu os direitos para uma versão de grande sucesso na voz de ninguém menos do que o outsider Johnny Cash. Foi a partir desse momento que Elvis realmente percebeu que poderia gravar ele também mais uma bela versão para a música. Particularmente sempre achei "A Thing Called Love" uma das melhores coisas do álbum gospel He Touched Me e bem ao contrário de Seeing Is Believing sempre achei seu master muito bom, bem acima da média. A canção tem uma melodia relaxante e a vocalização, praticamente sussurrada por Presley e seu grupo vocal, é certamente um dos pontos altos do disco. Uma coisa logo chama atenção nessa música para os mais atentos. Elvis está mergulhado na vocalização ao lado de seu grupo. Ele procura sempre fazer parte do coro vocal e sua voz está no mesmo patamar dos cantores ao seu redor. Para quem sempre almejou fazer parte de um quarteto gospel vocal nada seria mais adequado. Elvis conscientemente e propositalmente se coloca como apenas mais uma voz de apoio. Sempre achei essa característica fascinante nesse registro. O take 1 que encontramos nesse cd nos chama atenção por algumas peculiaridades. A primeira é notar que Elvis já sabia muito bem desde o começo o que procurava fazer nessa gravação. Dessa forma não há nenhuma mudança mais visível entre as duas performances que conhecemos. Elvis está obviamente no controle da situação e podemos sentir nitidamente sua grande satisfação em, afinal de contas, ser apenas mais um dos rapazes de um belo quarteto gospel. Finalmente o velho sonho de infância do astro ganhava ares de realidade, para felicidade de todos os envolvidos.

PUT YOUR HAND IN THE HAND (Gene McLellan) - Quem disse que country canadense não existe ou não tem valor? Pois é, apesar dessa ser uma mistura mais do que implausível, aqui temos Elvis cantando mais uma música que foi grande sucesso na voz da cantora canadense Anne Murray. Ao lado de seu parceiro Gene MacLellan na Capitol Records ela conseguiu fazer uma carreira de sucesso, principalmente durante os anos 70 onde emplacou vários hits, entre eles a nossa tão conhecida "Snowbird", que também havia sido sucesso em sua voz após ser escrita pelo ótimo MacLellan. Apesar de terem legado duas excelentes canções que posteriormente foram gravados por Elvis em estúdio, a dupla chegou ao final após o trágico suicídio de Gene. Não importa, felizmente Elvis teve a chance de produzir esses dois belos registros em sua voz. O cantor entrou decidido a registrar essa canção, que afinal era uma de suas preferidas, e chegou na versão oficial no dia 08 de junho de 1971, nos Estúdios B, da RCA, em Nashville. Esta sessão tem um aspecto histórico que poucos se lembram ou então passam despercebidos quando a analisam: ela foi a última de Elvis Presley em Nashville, a capital mundial da música country. Sem dúvida nesta cidade Elvis gravou algumas das músicas mais populares do século XX. Desde seu primeiro grande sucesso nacional e mundial, passando por muitos de seus mais lembrados e famosos discos, Elvis estava dizendo adeus a cidade onde produziu algumas de suas verdadeiras obras primas. A partir desse momento, Elvis, envolvido em muitos problemas de ordem pessoal e profissional, iria preferir não fazer mais essas viagens a Nashville e iria ficar gravando seus últimos LPs somente em Memphis, seja em estúdios localizados na cidade (como o Stax) ou então em sua própria casa, Graceland. A mais pura verdade era que Elvis não tinha mais paciência para viagens após tantos deslocamentos para a realização de suas turnês e temporadas em Las Vegas. Agora voltando para a análise da gravação do master original de "Put Your Hand in The Hand" logo percebemos que ela não é tecnicamente perfeita, apenas ficando na média. De qualquer forma não deixa de ser um belo momento, apesar de achar que Elvis deveria se envolver um pouco mais. Outro destaque da gravação são os solos de Burton em momentos distintos da faixa (aliás um solo encerra a canção, um fato até mesmo raro na discografia oficial de Elvis). O take um não apresenta maiores novidades. Elvis está mais pontuado na dicção das frases, seguindo mais milimetricamente a ordem da letra original, mas é só. Ganha em tecnicismo porém perde ainda mais em emoção, pois Elvis está visivelmente apenas lendo a letra, sem maiores envolvimentos novamente. Como é apenas uma primeira tentativa Elvis fica mais à vontade no final do registro, que ainda não conta com o característico solo final de Burton da versão oficial que tanto conhecemos. Infelizmente essa é a última música relevante do ponto de vista artístico do CD. A partir desse ponto a qualidade cai assustadoramente. Um exemplo é a faixa que vem logo depois,

JOHNNY B. GOOD (Chuck Berry), uma versão sem nenhum interesse e que só serve para demonstrar como Elvis estava drogado nessa ocasião. Isso é facilmente percebido ao ouvir Elvis totalmente "alto", sem concentração, sem conseguir conectar nenhum nexo em suas ideias em um humor tipicamente artificial e fazendo com que todos os presentes ficassem embaraçados com seu estado mental. Totalmente desnecessário a inclusão desse momento constrangedor no CD. Logo após esse verdadeiro desastre entramos no material natalino. Só posso lamentar ao ouvir essas faixas. Isso é o mais próximo que Elvis chegou nos anos 70 de voltar ao esquema das trilhas sonoras dos anos 60. A analogia é fácil de entender. Aqui temos novamente Elvis sendo levado a gravar, sem a menor vontade, um material totalmente imposto por Parker e RCA. Faixas artificiais feitas com único propósito mercantilista, sem nenhuma preocupação com qualidade ou valor musical. Um material anacrônico, fora de moda, totalmente contrário ao que Elvis vinha tentando mostrar desde seu retorno aos palcos em 1969 e aos belos trabalhos de estúdio que vinha apresentando. O material natalino de 1971 é, e desculpem a minha sinceridade, destituído de qualquer importância musical. Quando chegamos no final do CD temos a sensação de que caímos dentro de mais um daqueles projetos horríveis que Elvis se envolveu na década de 60. São cinco faixas que jogam a qualidade do CD lá para baixo. Se as sessões de 1971 são tão criticadas a razão não é muito complicada de se entender. Essas canções são fraquíssimas, mal gravadas, com Elvis em total controle remoto, desinteressado, rezando para as sessões terminarem logo. Aqui Elvis e banda fracassaram duplamente: primeira artisticamente pois a qualidade desse material natalino é nulo e depois comercialmente pois o disco foi um tremendo, um grande fracasso de vendas, totalmente ignorado pelo público na ocasião de seu lançamento. Um desastre completo.

I´LL BE HOME ON CHRISTMAS DAY (Jarret) é a primeira delas. Ela é um prelúdio até adequado do que seria esse disco de natal de Elvis dos anos 70. Nem há muito o que comentar. A canção é assumidamente tediosa, bocejante e Elvis está desabando de tanto tédio. Na parte final da faixa Elvis erra pavorosamente o arranjo, perdendo o tempo certo da música. Mortificante e aborrecida, para dizer o mínimo, com Elvis tentando disfarçar a falta de envolvimento com malabarismos vocais primários que certamente não irão convencer ou impressionar os ouvintes mais atentos e criteriosos. Em resumo a música é apenas muito chata e enfadonha. O pior vem depois.

HOLLY LEAVES AND CHRISTMAS TREES (West / Spreen) Existe arranjo mais ultrapassado (até mesmo para a época) do que esse escrito para música? Duvido muito. Esses sininhos extremamente bregas e ridículos já estavam fora de moda desde a década de 1940. Que coisa mais fora de propósito. Totalmente embaraçoso, Elvis Presley, após tudo o que passou para ressuscitar sua carreira após 1968 ter que ficar cantando em cima de sininhos de natal. Simplesmente decepcionante e completamente embaraçoso, sem dúvida tudo muito, mas muito, embaraçoso. De fazer corar. Tudo bem que Elvis a gravou como um favor a seu amigo de longa data Red West, mas ele poderia ter muito bem passado sem esse vexame. Vou resumir esse arranjo e essa música com uma palavra simples: patético.

O pouco humor e paciência que você conseguiu reunir para ouvir essas últimas faixas começam a sumir quando as primeiras notas de IF I GET HOME ON CHRISTMAS DAY (Macaulay) começam a soar. Além de ser outra bobagem, que Elvis tenta cantar até o fim de forma profissional, somos levados a ouvir uma rara desafinada do cantor lá no começo da terça parte da canção. Simplesmente horrível. Sério, ao ouvir esse tipo de coisa só posso mesmo me sentir solidário com Elvis. Ficar preso a um material medíocre desses e ainda ter que se envolver com material tão obtuso não deve ter sido fácil para ele. Simplesmente pavoroso. Mas o espanto vem depois, se você é daquelas pessoas que achavam que tudo não poderia piorar vai certamente se surpreender com o que vem depois. Se sininhos já eram ridículos o que achar de uma introdução de caixinha de música? Seria engraçado se não fosse trágico.

IT WONT SEEM LIKE CHRISTMAS (Balthrop) é a pá de cal que faltava para enterrar todo o material ridículo de natal. Que lástima, logo Elvis que havia feito um belo álbum natalino nos anos 50 (Elvis Christmas Album) se afundar num pântano de canções ruins como essa de novo? Elvis lamentou e até mesmo se indispôs com a ideia de Parker e RCA de voltar a gravar músicas de natal mas infelizmente ele perdeu essa parada e... não há o que dizer, afundou mais uma vez em um álbum medíocre.

A última música do CD é uma outra versão de I´LL BE HOME ON CHRISTMAS DAY. Nada a acrescentar. Sendo bem sincero essa parte final desse, que em seu conjunto ainda consegue ser um bom CD do selo FTD, é completamente melancólica e desanimadora. Na minha forma de ver as coisas Ernst deveria ter feito um título exclusivo apenas com essas canções natalinas, assim seria mais fácil ignorar todo o CD ou então tentar descobrir algo de interessante no conjunto da obra, até mesmo porque existem pelo menos dois registros que ainda conseguem prender, mesmo de forma precária, nossa atenção. No álbum oficial "The Wonderfull World of Christmas" pelo menos ainda existe uma canção razoável com vocalização inspirada (O Come, All Ye Faithful) e um excelente blues de Chuck Berry (Merry Christmas Baby). Infelizmente aqui Ernst parece que selecionou apenas as piores para fazer parte do CD. Do jeito que está essa seleção aqui no I Sing All Kinds não há mais salvação. Ponto final. E com essas palavras encerro meu último texto inédito de 2007 e que venha agora 2008, ano que estaremos comemorando nove anos on line! Para celebrar tão importante data iremos trazer ainda mais material inédito e de nossa própria autoria. No mais quero agradecer todos os nossos leitores, que acompanharam nosso trabalho durante esse ano que chega ao fim e desejar um Feliz Natal e um Próspero Ano Novo. Até 2008 e Viva Elvis!

Pablo Aluísio.

segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

Elvis Presley - Elvis Christmas Album (1970)

Muitos fãs de Elvis pensam que esse LP na verdade é apenas uma reedição do clássico "Elvis Christmas Album" de 1957. Ledo engano. Tecnicamente esse disco é na realidade um outro disco, com seleção musical própria e inclusive uma outra capa, muito bem feita por sinal. Elvis Christmas Album 1970 é apenas outro lançamento de um ano completamente produtivo de LPs na carreira de Elvis. Em 1970 foram lançados mais títulos de Elvis Presley nas lojas do que em qualquer outro ano anterior de sua carreira. Se fizermos um pequeno levantamento veremos que havia pelo menos um novo disco de Elvis a cada mês nas lojas. Com tantos LPs sendo lançados ao mesmo tempo a gravadora resolveu inovar. Utilizando de seu selo promocional RCA Camdem, a empresa lançou o Elvis Christmas Album para venda em locais nem sempre utilizados pela indústria fonográfica tais como supermercados, lojas de conveniência, postos de gasolina e até mesmo em bancas de revistas. Assim o Elvis Christmas Album, em preço bem baratinho, podia ser encontrado em vários locais de vendas, bem fora do circuito tradicional, e logo ali, bem a disposição do consumidor norte-americano (infelizmente esse LP tal como muitos outros na discografia de Elvis Presley não foi lançado na época no Brasil).

Isso acabou ocasionando uma coisa interessante. Embora tenha vendido muito o disco não obteve classificação nas principais paradas, isso porque elas só contavam as cópias vendidas nas tradicionais lojas do ramo. Também por causa desse desencontro não se sabe quantas cópias exatamente o disco vendeu, havendo uma grande confusão, ocasionada não só por esses pontos alternativos de vendas mas também pelo próprio fato de que como o LP tinha o mesmo nome do clássico álbum de 1957 muitos de seus números acabaram sendo contabilizados no disco original, causando ainda mais desencontro de informações. De qualquer forma tudo isso é apenas uma questão técnica que só interessou mesmo aos executivos da indústria fonográfica. O fato que não se pode ignorar porém é que seu sucesso acabou levando esses mesmos executivos a exercerem pressão sobre Elvis no ano seguinte para que ele gravasse novo material natalino (algo que ele não queria fazer mas que acabou fazendo, mesmo contra sua própria vontade).

Em termos de seleção musical o Elvis Christmas Album 1970 traz algumas peculiaridades. Ao lado do antigo material do álbum natalino clássico dos anos 50 a gravadora encaixou o single natalino "If Everyday Was Like Christmas" (ótima gravação de Elvis em 1966 que foi desperdiçada em um compacto sem quase nenhuma promoção na década anterior) e "Mama Liked The Roses" (das sessões de janeiro de 1969 no American, uma bela canção que não havia ainda encontrado um lugar de destaque dentro da discografia americana do cantor). Para finalizar e dar uma identidade própria ao disco a gravadora também retirou todo o material gospel que também fazia parte daquele disco natalino original (e que basicamente era formada pelas canções do EP Peace In The ValleY). Como foi um disco bem sucedido comercialmente o "Elvis Christmas Album 1970" ganhou diversas reedições ao longo dos anos, sendo relançado em 1975 e ganhando suas versões digitais em 1987, 1996 e 1999. Em alguns países ele também ganhou novas capas (algumas horrendas) deixando, de uma forma ou outra, sua marca registrada na extensa discografia do cantor.

Elvis Christmas Album (1970)
01. Blue Christmas
02. Silent Night
03. White Christmas
04. Santa Claus is Back in Town
05. Ill Be Home For Christmas
06. If Everyday Was Like Christmas
07. Here Comes Santa Claus
08. Oh Little Town of Bethlehem
09. Santa Bring My Baby Back (To Me)
10. Mama Liked The Roses

Pablo Aluísio.

Elvis Presley - One Night Only!

Depois de se instalar confortavelmente em Las Vegas e conquistar seu espaço, Elvis caiu na estrada. Suas primeiras apresentações fora de Las Vegas foram realizadas em fevereiro e março de 1970 na cidade de Houston. Embora seus seis shows nessa cidade tenham sido um enorme êxito de público e crítica, Elvis ainda demoraria um pouco para se firmar nas turnês que viriam a seguir. Havia uma grande série de problemas a se resolver antes de abraçar completamente a ideia de voltar de vez a estrada, como nos anos 50. Aos poucos porém Elvis foi se firmando, assumindo turnês mais extensas e produtivas. Com o sucesso alcançado em 1970 todos pensavam que Elvis iria arrasar de vez nesse aspecto no ano posterior, mas não foi bem isso que aconteceu. 

Em 1971 Elvis quase não saiu de sua rotina de shows em Las Vegas. Realizou duas temporadas nessa cidade e depois seguiu rumo a Lake Tahoe para realizar uma curta temporada no mesmo estilo de Vegas. Para quem aguardava com ansiedade uma grande turnê nacional (e quem sabe até internacional) essa agenda de shows foi um grande balde de água fria. Já quase no final do ano o Coronel arranjou para Elvis uma série de concertos na costa leste, notadamente pelo Sul e norte do país. Entre os dias 5 a 16 de novembro Elvis cumpriria uma apertada agenda de shows, visitando cidades como Minneapolis, Cleveland, Philadelphia, Baltimore, Houston, Dallas e Boston. Foi justamente nessa última cidade que Elvis realizou a apresentação que seria lançada depois no CD da Madison intitulado One Night Only! Na verdade esse material já era bem conhecido dos fãs, principalmente quando chegou ao mercado dos bootlegs sob o título de The Power Of Shazam! A novidade era que a Madison prometia sensível melhora nos registros, tentando elevar, quando possível, a qualidade sonora da gravação. Embora muitos especialistas concordem que 1971 foi um ano bastante abaixo da média por parte de Elvis (principalmente por causa das criticadas temporadas de Vegas), nesse concerto podemos notar nitidamente que nem tudo o que Elvis realizou foi opaco nesse ano. Diante de um público estimado em 15 mil pessoas Elvis procurou dar o melhor de si e não deixou o tédio se instalar no palco.

O concerto em Boston é uma grata surpresa. Elvis aparece focado, cantando bem e se apresentando profissionalmente. Certamente o fato de ter realizado apenas uma única turnê em 71, com apenas 14 shows, obviamente foi um ponto a favor. O cansaço e a fadiga em nenhum momento se mostram presentes. Até mesmo em músicas que iriam virar piada no palco nos anos seguintes, como Love Me Tender, receberam tratamento digno por parte do cantor aqui. Em termos de performance temos um Elvis acima da média, nada de muito grandioso ou fenomenal, mas bem melhor que suas fracas apresentações que realizou em Vegas por essa época. Além do fato de ter tido uma agenda de shows bem mais humana outro fato deve ter contribuído para essa boa apresentação de Elvis. Mudanças em seu grupo vocal fizeram com que um grupo de que gostava muito, J.D Sumner & The Stamps, pela primeira vez se apresentasse ao seu lado. Certamente diante de vocalistas tão talentosos Elvis não queria fazer feio. E não fez. Ao ouvir o show o ouvinte nitidamente nota o empenho de Elvis em apresentar belas versões de Funny How Time Slips Away (uma canção sempre agradável de se ouvir), You've Lost that Lovin' Feeling (com um trocadilho para o público) e principalmente I’m Leavin’ (seu novo single nas lojas). Essa última canção realmente é o ponto alto do show. Como o vocal está em destaque na gravação podemos notar todas as nuances do trabalho de Elvis. Embora comece a cantar com uma sensível insegurança na letra (a música era uma grande novidade ao vivo para ele), Elvis rapidamente assume o controle e nos presenteia com um ótimo momento. Uma pena que Elvis tenha aos poucos deixado de divulgar suas novas gravações nos shows que viriam, algo que faz de forma fantástica aqui. Aproveitando o embalo de I´m Leavin ainda encaixa na sequência uma belíssima versão de Bridge Over Troubled Water (com direito até a uma reprise inspirada). Essa música, símbolo do filme documentário que realizou no ano anterior, eleva consideravelmente o nível de qualidade do CD.

Tecnicamente Bridge não é impecável (poucas versões ao vivo o são) mas o sentimento está lá, não há como negar. Por fim outro momento digno de nota é a boa apresentação de Suspicious Minds, anos antes de se tornar rotineira e cansativa. Em termos de energia o grande momento do show vem com Proud Mary, que iria se tornar marca registrada em seus futuros shows no Madison Square Garden. A canção está tão frenética que Elvis até mesmo perde um pouco a respiração. Muito provavelmente estava estraçalhando no palco, embora as imagens não tenham chegado até nós. Um aspecto negativo do CD é a versão de How Great Thou Art, que aqui aparece de forma incompleta. Como todos sabemos essa iria ganhar em grandiosidade pelos anos que viriam o que levaria Elvis finalmente a ganhar o Grammy por sua interpretação no álbum ao vivo de Memphis três anos depois. Com o registro incompleto perdemos uma boa oportunidade de conhecer uma das primeiras versões de Elvis para o gospel ao vivo e assim analisar todas as mudanças pelas quais a canção passaria. Enfim, One Night Only é um CD essencial para compreender que em 1971 Elvis realizou bons shows e concertos, embora grande parte do material que tenha nos chegado deixe a impressão do contrário. Talvez a genialidade apresentada em 1969 e principalmente 1970 tenha ofuscado 1971, deixando a impressão que foi um ano sem grandes novidades, com temporadas medíocres em Las Vegas e gravações rotineiras e sem brilho. Mas não é bem por aí. O talento estava lá, apenas não na intensidade dos anos anteriores. Para compreender melhor essa fase nada mais conveniente do que ouvir atentamente One Night Only, que captou mais um concerto impecável de Elvis nos palcos de Boston, mesmo que tudo tenha acontecido em apenas uma noite.

Elvis Presley - One Night Only!
- Selo: Madison - Músicas: Also Sprach Zarathustra That's All Right - I Got A Woman / Amen - Proud Mary - You Don't Have To Say You Love Me - You've Lost That Lovin' Feelin' - Polk Salad Annie - Elvis Walks (‘Coming Home, baby’ instrumental) - Love Me - Heartbreak Hotel - Blue Suede Shoes - One Night - Hound Dog - How Great Thou Art (incomplete) - Introductions - I'm Leavin' - Bridge Over Troubled Water (& reprise) - I Can't Stop Loving You - Love Me Tender - Suspicious Minds - Elvis Talks (instrumental) - Funny How Time Slips Away - Can't Help Falling In Love - Closing Vamp - Data de gravação: 10 de novembro de 1971, Boston, 8:30 da noite.

Pablo Aluisio.

domingo, 15 de fevereiro de 2009

Elvis Presley - Elvis Country (1970)

"Ele não vai durar". Essa foi uma frase dita por um radialista invejoso em 1956 e dirigida na época para um tal de Elvis Presley, mais uma moda passageira. Bom, se esse cara estava vivo em 1970, certamente mordeu a língua, pois 14 anos depois Elvis Presley continuava fazendo sucesso e sendo um dos melhores e mais badalados artistas do mundo. Seu especial na NBC em 1968 foi uma marco e o maior ato de regeneração de uma carreira já visto. Procedido dele veio as sessões de gravação de Memphis em 1969, que entre outras pérolas gerou 4 hits seguidos, incluindo "Suspicious Minds", que alcançou o primeiro lugar, e é considerada por muitos como a melhor música da carreira de Elvis. Como se já não bastasse Elvis Presley bateu ainda todos os recordes em Las Vegas, a cidade mais difícil de ser conquistada por um artista. Esse fato ocorreu em agosto de 1969, com uma série de 57 apresentações, que mostraram um Elvis tão bom quanto em 1956, e quem sabe talvez até melhor, pois era um astro com mais maturidade. Mas isso não era tudo, pois Elvis iria ainda ter novos êxitos de bilheteria nos shows da temporada seguinte nessa mesma cidade em janeiro de 1970.

E como se isso tudo não bastasse ele ainda iria realizar uma série de seis grandes concertos no Houston Astrodome. Pela segunda vez em sua carreira "Elvis Was Back!" (Elvis estava de volta!). Foi nesse espírito de renovação que Elvis entrou em estúdio em junho de 1970 para cumprir seus compromissos com a gravadora RCA Victor. De sua banda de shows só o guitarrista James Burton estava presente. Isso não tira a qualidade desse grupo que tocou com Elvis pois os outros membros da banda eram músicos experientes de estúdio, que não ficavam em nada a dever à TCB Band. Jerry Carrigan, Nobert Putman, David Brigs, Charlie Mc Coy eram alguns dos feras que participaram das gravações desse disco, que meses depois seria batizado de "Elvis Country". Eles eram músicos jovens de Nashville, que também iriam marcar presença nas sessões do ano seguinte, na mesma cidade. Durante esses dias os músicos foram extremamente produtivos pois em poucos dias Elvis e banda conseguiram gravar um número fantástico de novas canções; para se ter uma ideia no total foram registradas mais de 34 músicas!! Foi tanta música que, mesmo dois anos depois das gravações, no LP "Elvis Now", ainda se podia encontrar algumas delas vendo à luz do dia pela primeira vez.

No total essas canções ficaram espalhadas em três álbuns, a saber: "That´s The Way It Is", "Love Letters From Elvis" e "Elvis Country", sendo esse não só o melhor álbum de estúdio de Elvis da década de 70, como também o que se deu melhor nas paradas, alcançando 12º lugar nos Estados Unidos e 6º na Inglaterra. A capa, contendo a primeira foto de Elvis, ainda criança, e a ideia de juntar todas as faixas com segmentos de "I Was Born About Ten Thousand Years Ago" fizeram esse álbum soar bem diferente dos demais de sua carreira. Mas tudo isso aconteceu de forma natural pois Elvis não entrou em estúdio para gravar um álbum country. As músicas simplesmente foram sendo gravadas, sem nenhum álbum temático em mente ou projeto pré determinado. Quem escuta os "Alternate Takes" dessas sessões pode inclusive notar o clima de improviso. Aqui está um breve comentário sobre as músicas desse disco, que acabou se tornando um dos mais importantes da carreira de Elvis Presley:

Snowbird (G. Mac Lellan) - O disco começa com uma música que curiosamente não foi gravada nas sessões de junho de 1970, mas sim nas de setembro desse mesmo ano. Essa belíssima música, que ganhou algumas versões ao vivo em 1971, estava nas paradas na voz da cantora canadense Anne Murray, quando Elvis a gravou. De melodia leve e com uma letra super bonita. Vide os versos: "Então pássaro da neve me leve com você para onde for / Para as terras de brisas gentis / Onde as águas pacíficas correm". O destaque dessa música é a guitarra que não é executada por James Burton, que sequer participou das sessões de setembro e sim de outro músico talentoso, Chip Young.

Tomorrow Never Comes (E. Tubb / J. Bond) - Caso raro em que o arranjo de orquestra fica bem em uma música de Elvis. Ela foi gravada originalmente em 1944 por Ernest Tubb (que na época era promovido pelo Coronel Tom Parker). Elvis estava com ótima voz nessas sessões e isso fica evidente nessa música. Essa maturidade vocal só foi adquirida ao longo dos anos, provavelmente Elvis não teria sucesso se a gravasse nos anos 50, por exemplo. Sua introdução é parecidíssima com a da música "Running Scared" de Roy Orbison. Elvis a cantou em um ensaio em julho de 1970, mas a master ainda é a melhor versão.

FTD The Nashville Marathon - Tomorrow Never Comes (take 2): Gravada originalmente em 1944 por Ernest Tubb, essa canção deve ter sido um difícil desafio vocal para Elvis, principalmente em seu final, que exigia uma entonação de tenor. Como demonstrado neste take Elvis dá conta, e bem, do recado. Nela foram acrescentados pesados metais culminando com um final regido à la orquestra, um pouco exagerado pelo meu gosto. Mas na música como um todo os metais são bem vindos, junto com o acompanhamento dos backing vocals. Esse take é bem parecido com a versão final e demonstra que Elvis segurava uma música dessa magnitude sem a presença de pesadas orquestras (apesar do bom arranjo de orquestra incluído no master). Elvis a tentou informalmente em ensaio de julho de 70. Não ganhou lugar nos shows de Elvis por pura injustiça. Ou talvez por ser muito melodramática. Sua introdução lembra bastante Running Scared de Roy Orbison.

Little Cabin On The Hill (L. Flatt / Bill Monroe) - O autor dessa música também escreveu uma das primeiros canções do rei na época da Sun Records: Blue Moon Of Kentucky. E como a anterior essa também data da década de 40. Talvez a música mais country do álbum inteiro com um ótimo trabalho de gaita por parte de Charlie Mc Coy. Tem um take mais longo disponível no CD "Essential Elvis vol 4".

The Fool (N. Ford) - Uma das melhores músicas do disco, essa música de letra "auto crítica irônica", devia estar na cabeça de Elvis já há um bom tempo, visto que ele a praticou bastante na Alemanha em 1959, só que usando piano na introdução ao invés dos riffs de James Burton, que ficaram bem melhores. Não acho ela muito country, está mais para pop blues. Destaque novamente para a gaita de Charlie McCoy.

Whole Lot-ta Shakin' Goin' On (D. Williams / S. Davis) - Não sei como essa música veio parar nesse álbum, pois de country ela não tem absolutamente nada. É sim, um dos melhores rocks que eu já ouvi na voz de Elvis! Coloca a versão de Jerry Lee Lewis no chinelo, sem dúvida. Isso graças a banda que detona com os vocais furiosos de Elvis berrando nos minutos finais da música - Claro, tudo para compensar a falta de letra. Para quem não entendeu o título de 5 palavras traduz uma só ideia: sexo. Não chega a ser uma daquelas músicas de Elvis como "Baby Let´s Play House" ou "Let Yourself Go" onde a proposta sexual é bem mais explícita, mas a malícia está lá. Uma versão mais longa se encontra no "Essential Elvis vol 4". Essa música fez parte do "Aloha From Hawaii", num medley com "Long Tall Sally". Também foi executada ao vivo em vários outros medleys até 1974. Já havia sido gravada por Elvis em shows em agosto do mesmo ano, em Las Vegas.

Funny How Time Slips Away (Willie Nelson) - O autor dessa música viria, após a morte de Elvis, a ressuscitar "Always on My Mind". Elvis gravou essa música pela primeira vez ao vivo em 1969 e em uma única tentativa a gravou em estúdio no mês de junho de 1970. Muito bonita e aconselhável para relaxar, ela ganhou destaque em muuuitos shows de Elvis até sua morte, destacadamente os do período 1972 / 1976. Aqui na versão master Elvis dá um tratamento em ritmo de blues, contando com um solo simplesmente espetacular de James Burton.

I Really Don't Want To Know
(H. Barnes / D. Robertson) - Don Robertson escreveu várias músicas para Elvis, sendo que entre as que ele gravou estão: "They Remind Me To Much Of You", "There's Always Me", "Starting Today", além de muitas outras. Essa parceria vem de longa data, pois a primeira música de Robertson gravada por Elvis foi "I´m Couting on You", que fez parte do seu primeiro disco. Só que "I Really Don´t Want to Know" não foi escrita especialmente para Elvis e sim para Eddie Arnold que a gravou em 1954, no mesmo ano em que Elvis começou sua carreira. Essa música ganhou ainda algumas versões incompletas ao vivo em 1977 e foi lançada como lado A de um single em 1971 para promover o disco "Elvis Country", porém só alcançando 21º lugar nas paradas.

There Goes My Everything (D. Franzier) - Sincera e particularmente não gosto dessa música. O ritmo é arrastado, apesar da boa letra. Mas isso é questão de gosto. A música é muito bem executada e uma das favoritas de Elvis dentre as que ele gravou nessa sessão em particular. Mas acho que não faria a menor falta na discografia dele. Lançada como lado A na Inglaterra alcançou 6º lugar! Ganhou algumas versões ao vivo em 70 e 71, mas como disse não é das melhores e não vai mudar sua vida. Ganhou uma versão gospel no ano seguinte com a mesma melodia, mas letra diferente chamada "He Is My Everything".

FTD The Impossible Dream - There Goes My Everything é a seguinte. Esse ótimo country (apesar de eu não gostar muito) ganhou poucas versões ao vivo, e sua inclusão faz lógica, pois o Elvis Country havia sido recentemente lançado e sua entrada na lista dos shows era uma forma de divulgar o disco, até mesmo porque uma promoçãozinha não mata ninguém. Foi lançada como single no lado B nos EUA, que sabemos não eram contabilizados nas paradas na época. Foi lado A e 6º lugar na Inglaterra. Muito boa versão ao vivo. Um dos grandes destaques deste CD é a belíssima

It's Your Baby You Rock It (S. Milete) - S. Milete escreveu três músicas para essa sessão sendo "Life" a melhor delas e "When I´m Over You" a pior. Essa fica num meio termo, apesar dos vocais perfeitos de Elvis e um solo muito show de James Burton. Uma das músicas mais country do disco e a única gravada pela primeira vez, as chamadas "Originals".

FTD The Nashville Marathon - It´s Your Baby You Rock It (take 3): A parte country do CD começa bem com essa música bem para cima. Como Life, S. Milete é quem escreveu essa canção, que aparentemente é apenas razoável, porém com Elvis em plena forma vocal junto com a banda, com destaque para James Burton que dá um show! Mostra básica de Elvis em transformar algo normal em uma ótima música. Fez parte do Elvis Country e era a única música realmente nova do disco. Esse take carece um pouco da energia do master, mas é muito bom. Aqui sentimos falta um pouco dos backing vocals femininos, que aqui caíram como uma luva. Porém, em um disco com muitas músicas boas It´s Your Baby não ganhou muita atenção, não sendo muito conhecida e apreciada nem mesmo entre os fãs

Faded Love (B. Willis / J. Willis) - Elvis virou essa música de ponta cabeça, se comparado com a versão original (coisa que ele fazia com bastante frequência), transformando um country puro em um pop rock de primeira, com destaque para dois solos meio estilo blues de James Burton. Quem quiser ter uma noção de como era a versão original ouça a uma mini versão country dessa música no CD "Essential Elvis vol 4", onde ele enquanto espera a chegada da letra de "Faded Love" grava "The Fool".

I Washed My Hands In Muddy Waters (J. Babcock) - Uma das melhores do disco. Novamente um caso de uma música pop rock, que não tem muito a ver com country. Destaque absoluto para a banda, desde James Burton e seus solos até a própria orquestra que ficou ótima nessa música. Basta comparar com a "unddubed version" disponível no "Essential Elvis vol.4". Os caras detonaram nessa música gravada em apenas uma tentativa. Com uma letra diferente falando da história de um cara que se meteu em enrascada e acabou preso. Foi ensaiada nos ensaios de julho, mas nunca teve uma versão ao vivo.

Make The World Go Away (H. Cochran) - Essa música em sua versão original alcançou primeiro lugar em 1965 e a versão de Elvis difere dela, pois aqui a orquestra está presente de forma bem pesada e Elvis a canta de forma bem mais emocionante. Definitivamente uma das músicas que exigiu mais do vocal de Elvis, como ele mesmo admitiu, principalmente em sua parte final. A mais bonita do disco e uma ótima escolha para encerrá-lo. Ganhou versões em 1970 , 1971 e uma em 1973.

FTD The Impossible Dream - Make The World Go Away, também do Elvis Country. Uma das melhores músicas da década para Elvis, havia sido cantada pouquíssimas vezes em 1970 e aqui ganha sua versão ao vivo definitiva. Após essa temporada Elvis a abandonaria de seus shows, só a cantando uma vez mais em agosto de 73.

I Was Born Ten Thousand Years Ago* (Arr. Elvis Presley) - Esta música foi "picotada" entre as faixas do LP. No disco "Elvis Now" ela aparece completa da forma como foi gravada em meados de 1970. A ideia de colocar a canção unindo todas as músicas do disco foi do produtor Felton Jarvis. Isso surgiu porque Elvis sugeriu a ele que colocasse como subtítulo do LP a frase: "I'm 10.000 Years Old" ou "Eu tenho 10 mil anos". Sem dúvida isso retrata a face esotérica do Rei do Rock, que na época estava muito interessado em estudar as religiões orientais, tais como Budismo e Hinduismo, que pregavam a reencarnação da alma até o atingimento do nirvana, fase no qual o espírito não precisaria mais retornar à terra, pois já estava devidamente evoluído. Segundo os cálculos de Elvis, sua primeira reencarnação havia sido há 10.000 anos, o que justificava a frase como subtítulo do disco. Todo esse misticismo acabou chegando ao Brasil e influenciando duas pessoas muito importantes em nossa cultura. Elvis Presley foi um dos maiores ídolos do baiano Raul Seixas. Isso não é segredo pra ninguém, mas, o que pouca gente sabia é que a música "Eu Nasci Há Dez Mil Anos Atrás" - além de um pleonasmo vicioso - é também uma homenagem ao velho Rei do Rock. O som de Raul foi gravado em 1976, seis anos depois de Elvis gravar "I Was Born About Ten Thousand Years Ago". O título é igualzinho e o conteúdo das letras é bem parecido (compare as duas), abordando temas mitológicos, bíblicos e históricos. A versão de Raul é creditada a Raul Seixas e Paulo Coelho e não faz referência nenhuma à música gravada por Elvis, que é de domínio público. Paulo Coelho foi procurado pela redação do programa Fantástico da TV Globo e, por e-mail, admitiu: "Realmente, a letra foi inspirada na música do Elvis. Era uma maneira de Raul prestar sua homenagem ao seu maior ídolo".

Elvis Presley - Elvis Country (1970): Elvis Presley (voz, violão e piano) / James Burton (guitarra) / Chip Young (guitarra) / Charlie Hodge (violão) / Norbert Putnam (baixo) / Jerry Carrigan (percussão e bateria) / Kenneth Buttrey (bateria) / David Briggs (piano) / Joe Moscheo (piano) / Glen Spreen (orgão) / Charlie McCoy (orgão, harmônica e percussão) / Farrel Morris (percussão) / Weldon Myrick (steel guitar) / Bobby Thompson (Banjo) / Buddy Spicher (violino, rabeca) / The Jordanaires (vocais) / The Imperials (vocais) / June Page, Millie Kirkham, Temple Riser e Ginger Holladay (vocais) / Al Pachucki (engenheiro de som) / Arranjado e produzido por Felton Jarvis e Elvis Presley / Data de Gravação: 4 a 8 de junho e 22 de setembro de 1970 nos Estúdios B da RCA em Nashville / Data de Lançamento: janeiro de 1971 / Melhor posição nas charts: #12 (EUA) e #6 (UK).

Pablo Aluísio e Victor Alves.

Elvis Presley - Elvis Studios Highlights 1970

Em junho de 1970 Elvis retornou a Nashville para mais uma maratona de gravações. Assim como havia acontecido no ano anterior no American Studios a intenção era gravar o maior número possível de músicas no menor número de sessões de gravação. Após gravar o conjunto de canções essas seriam selecionadas pela direção da RCA Victor para serem lançadas em singles e álbuns no decorrer dos meses seguintes. A estratégia se mostrara bem sucedida em 1969 e por isso era mais do que óbvio que Elvis repetiria a dose. Porém dessa vez as sessões seriam realizadas em Nashville nos estúdios da gravadora e não mais em Memphis como ocorrera antes. A razão era simples: a estrutura disponível em Nashville era bastante superiora a que Elvis encontrou no American. Essas sessões seriam conhecidas nos anos que viriam como The Nashville Marathon. Essa denominação inclusive seria dada a um dos CDs mais conhecidos do selo FTD.

Elvis ficou tão satisfeito com o resultado de suas apresentações em Las Vegas que resolveu escalar para o estúdio os mesmos músicos de palco que estavam se apresentando ao seu lado. Embora não fosse totalmente contrário a essa visão o produtor Felton Jarvis preferiu porém mesclar um pouco a equipe de apoio convocando músicos experientes de estúdio para também atuar ao lado de Elvis, como por exemplo o baixista Norbert Putnam e o baterista Jerry Carrigan. Ao lado de alguns integrantes da TCB Band como James Burton a equipe finalmente ficou completa. A intenção da RCA era realmente "encher a lata", ou seja, registrar o máximo possível de músicas para que assim Elvis ficasse finalmente livre para se concentrar em suas obrigações na estrada sem se preocupar com os lançamentos de estúdio.

Foi programada uma semana de gravações, a direção da gravadora deixou à disposição de Elvis e banda uma lista com mais de 60 músicas. Dentro do estúdio Elvis foi ouvindo uma a uma as demos para finalmente escolher o material que lhe agradava. Também trouxe sua própria lista de músicas que gostaria de gravar, caso fosse possível em relação aos direitos autorais das mesmas. Em quatro dias de trabalho Elvis conseguiu a proeza de gravar 35 músicas - o equivalente a praticamente 3 novos álbuns e tantos outros singles, que ficariam à inteira disposição dos diretores de estúdio. Um número e uma produção que até hoje espanta principalmente nos dias atuais onde cantores levam meses para gravar um disco com pouco mais de 10 canções.

O resultado tão satisfatório em termos de quantidade de músicas gravadas pode também ser creditado ao próprio produtor Felton Jarvis. Visando facilitar a vida de Elvis dentro dos estúdios ele convocou poucos músicos para atuar ao lado dele no Studio B. Assim Elvis gravou versões cruas das canções, que depois seriam enriquecidas pelo produtor pelo processo de adição de orquestra e vocais secundários. Assim ao lado de Elvis dentro do estúdio da RCA só atuaram mesmo James Burton, Chip Young, Charlie Hodge, Norbert Putnam, Jerry Carrigan, David Briggs e Charlie McCoy. Todos o restante foi gravado depois e acrescentado por Jarvis por overtube. Essa sonoridade mais crua e sem grandes enfeites sonoros é até mesmo preferida por alguns fãs de Elvis que acreditam que dessa forma sua participação fica ainda mais realçada ao invés de encoberta pelo excesso de orquestração das versões oficiais.

Elvis só retornaria aos estúdios novamente nesse ano em setembro. Curiosamente mesmo com grande material deixado por Elvis depois da Nashville Marathon a RCA pretendia realizar uma nova maratona de gravação. Infelizmente Elvis compareceu a apenas um dia dessa sessão arruinando completamente os planos da RCA. O motivo de sua ausência foi uma grave crise ocular que se abateu sobre ele após essa sessão inicial. De qualquer forma a grande quantidade de músicas deixadas por Elvis nas sessões de junho iriam suprir o mercado tranquilamente nos meses seguintes compondo as seleções dos discos That´s The Way It Is, Elvis Country e Love Letters From Elvis. O resultado foi tão bom que mesmo dois anos depois algumas faixas ainda seriam lançadas como Sylvia do disco Elvis Now. Nos anos que viriam Elvis ainda tentaria produzir sessões tão produtivas como essa mas problemas de saúde, pessoais e de agenda tornariam algo assim cada vez mais raro. De qualquer forma a maratona de Nashville provou a grande capacidade de trabalho que o astro tinha, quando presentes as condições ideais.

Pablo Aluísio.

sábado, 14 de fevereiro de 2009

Elvis Presley - That´s The Way It Is (1970)

Em meados de 1970 estourou um debate dentro da MGM sobre os rumos da carreira cinematográfica de Elvis Presley. Ele ainda tinha a obrigação de fazer mais um filme pela empresa. Seria o último que faria para encerrar de vez o contrato que tinha assinado em 1963. Esse tipo de contrato de 7 anos era muito comum naquela época e virou padrão entre os astros de Hollywood. Apesar de ser extremamente vantajoso do ponto de vista comercial, assinar um contrato de longa duração desse tipo fazia com que o artista ficasse inteiramente nas mãos dos executivos dos grandes estúdios de Hollywood. E foi exatamente isso que aconteceu com Elvis. Preso contratualmente com os estúdios, Elvis foi estrelando um filme ruim atrás do outro durante os anos 60. Depois que ele renovou sua vida artística, com sua volta aos palcos em 1969, ficou completamente sem sentido fazer mais uma comédia musical romântica ao velho estilo. Era um total anacronismo retornar àquele ponto.

Sabendo disso alguns executivos da MGM tiveram a ideia de fazer um documentário com Elvis em Las Vegas. Seria um filme que retratasse a volta aos palcos do cantor, que capturasse todo o frenesi em torno de seu retorno e toda a agitação que envolvia seu nome quando ele fazia suas temporadas. Apesar de ter opositores dentro do estúdio, a ideia de Dennis Sanders, o cineasta escalado pela companhia para levar o projeto à frente, deu certo. Para Elvis seria uma ótima oportunidade de encerrar seu contrato. Não havia dúvidas que ele estava na presença de um belo projeto que poderia contribuir muito para essa nova fase que vinha vivendo. Ele não teria que decorar scrips e nem atuar naqueles filmes sem consistência e roteiro. Seria um alívio, além do mais seria uma forma de registrar definitivamente suas apresentações em Las Vegas e enterrar para sempre o velho fantasma de seus filmes medíocres dos anos 60. Tom Diskin, assistente por longos anos do Coronel Tom Parker, resumiu a situação: "Os filmes de Elvis não estavam mais com nada. Eles já não davam mais tanto lucro e a própria RCA já tinha avisado que não iria lançar mais trilhas sonoras depois do grande fracasso de Speedway! Esse disco foi uma bomba para a gravadora, ele não vendeu absolutamente nada, trouxe um tremendo prejuízo!" Como se pode perceber os argumentos a favor da realização do documentário eram imbatíveis.

Depois que a decisão foi finalmente tomada e tudo ficou pronto a equipe partiu para Las Vegas para filmar Elvis em sua terceira temporada na cidade. Eles filmaram Elvis não apenas durante as apresentações, mas também nos bastidores, no camarim, se descontraindo com os caras da máfia de Memphis, enfim a intenção foi realmente capturar todos os mínimos detalhes. Nos shows Elvis procurou dar o melhor de si, realmente empenhado em fazer belas apresentações. O próprio Coronel Tom Parker já tinha lhe avisado sobre a importância desse filme: "Elvis, o filme vai ser o grande veículo de seus concertos, ele será apresentado pelo país afora e irá promover muito suas futuras excursões, faça o melhor essa noite!". Elvis seguiu à risca o conselho. Em todos os concertos procurou cantar de forma impecável, interagir com a plateia, dançar da melhor forma possível, enfim mostrar todo seu grande talento. O resultado final foi ótimo. Todos concordaram que o filme se traduziu em um momento muito feliz na tão desgastada carreira de Elvis nos cinemas. Pela primeira vez em muitos anos Elvis conseguia boas críticas de um filme seu quando foi lançado.

O cantor ficou extremamente orgulhoso do projeto e sentiu que realmente estava no caminho certo novamente. Se o filme gerou debates na MGM o mesmo iria acontecer dentro da RCA com a trilha sonora. Alguns defendiam (entre eles o próprio Felton Jarvis) o lançamento de um disco duplo, trazendo canções gravadas em Nashville e músicas ao vivo tiradas das próprias apresentações de Elvis em Las Vegas. Seria basicamente a mesma ideia do disco "From Memphis to Vegas / From Vegas to Memphis". Material de sobra estava à disposição, alguns executivos da gravadora embarcaram na ideia mas o Coronel Tom Parker colocou tudo abaixo. Na sua visão um álbum duplo poderia representar um risco para as vendas, pois elas poderiam ser prejudicadas pelo preço mais elevado de um disco duplo. Para Parker seria bem mais acessível um disco normal, com um preço mais em conta e menor. Para Parker o preço baixo iria se transformar num incentivo para os fãs comprarem a trilha sonora. Depois que Tom Parker comunicou sua decisão o projeto inicial foi abandonado e Felton Jarvis teve que se arranjar para acomodar tanto material em um espaço tão limitado de um disco simples.

O LP alcançou um grande sucesso no Brasil quando lançado, principalmente por apresentar um dos maiores sucessos do cantor por aqui: "Bridge Over Troubled Water". Nos Estados Unidos o disco foi lançado em novembro de 1970. Foram extraídos dois singles da trilha oficial, o primeiro foi lançado em agosto desse mesmo ano com "I've Lost you / The next Step is Love" e o segundo com "You Don't Have To Say You Love me" e "Patch It Up" alcançando este o nono lugar da parada de singles da revista Billboard em janeiro de 1971. Sem sombra de dúvida é um excelente disco, que retrata um dos períodos mais produtivos de toda a carreira de Presley, onde ele voltava a ocupar a posição de destaque na música mundial a que seu talento tinha direito. Estas são as canções que fazem parte do disco "That's the Way it is" (LSP 4445) :

I JUST CAN'T HELP BELIEVEN (Mann / Well) - Abrindo o disco temos esta que é uma das mais belas baladas cantadas pelo cantor em sua carreira. No filme Elvis aparece extremamente preocupado em não esquecer sua letra durante o concerto! Discretamente ele leva até o palco um papelzinho com o início da canção como precaução. No final tudo ocorre bem e Presley nos brinda com mais outro grande momento de sua carreira. A canção na realidade era do repertório do cantor B.J. Thomas, bastante popular nos EUA na época. Uma das peculiaridades que mais nos chama a atenção é o contraponto entre um começo de canção suave, onde ele é praticamente acompanhando apenas por uma suave bateria e pontuais intervenções da orquestra e o final, bem mais, digamos, "Las Vegas", onde a orquestra assume o controle da canção, fazendo com que ela vá aos poucos crescendo em termos de grandiosidade instrumental. Se formos analisar bem, esse tipo de arranjo (muito característico de músicas como "Bridge Over Troubled Water") sempre está, de uma forma ou outra, presente nas canções de Elvis dos anos 70. Porém o interessante de "I Just Can't Help Believen" é que esse domínio total da orquestra, que todos acabam esperando acontecer, nunca consegue chegar a uma apoteose total, como ocorre com outras músicas do período. Para surpresa de muitos que já conhecem todos os clichês de arranjo dos cassinos de Nevada, a parte final da música acaba sendo um retorno à simplicidade de arranjo inicial o que não deixa de ser uma grata surpresa!

TWENTY DAYS AND TWENTY NIGHTS (Weisman / Westlake) - Balada romântica muito bem arranjada pelo produtor Felton Jarvis. Ela marca o início dos trabalhos de gravação do cantor em Nashville em 4 de Junho de 1970. Estas sessões são consideradas das mais produtivas de sua carreira, resultando em mais de trinta músicas gravadas! Todas elas foram lançadas posteriormente nos discos "Elvis Country" , "Love Letters" e "That's The Way It Is". Uma das coisas mais interessantes sobre essa música, que fala sobre solidão e arrependimento, é o salto de qualidade do compositor Ben Weisman. Autor de algumas das mais bobas, maçantes e infantis canções da fase de Elvis em Hollywood, Ben se supera de forma surpreendente e escreve finalmente um tema de relevância, adulto, falando de dramas reais, de pessoas reais, tudo com muita sobriedade e maturidade. Nada mais longe das bobagens que ele costumava escrever para Elvis em suas piores trilhas sonoras. Talvez a má qualidade desse material nem tenha sido sua culpa, talvez os próprios argumentos ridículos de alguns filmes de Elvis o tenha levado a escrever tantas bobagens, mas o que é importante destacar mesmo é que dessa vez ele finalmente apresentou um material digno e à altura de um astro como Elvis gravar. Em resumo: ótima canção, belíssimo arranjo e o mais importante de tudo, uma letra relevante com uma mensagem realmente importante a se passar adiante.

HOW THE WEB WAS WOVEN (Westlake / Most) - Aqui Clive Westlake, que assina a música anterior ao lado de Ben Weisman, emplaca mais um tema para o disco. Infelizmente Elvis Presley ainda não tinha, mesmo durante os anos 70, plena liberdade na escolha da seleção musical dos discos que gravaria. Havia toda uma série de interesses comerciais envolvidos nas gravações do cantor! Para se ter uma ideia do que acontecia basta citar que, antes de chegar a ele todas as músicas, era feita uma criteriosa seleção pelas editoras musicais, pelos executivos pela RCA e pelo Coronel Parker e só depois de passar por toda essa gente era que as demos finalmente chegavam nas mãos de Elvis em estúdio. Toda essa pré-seleção limitava muito sua escolha de repertório pois a liberdade de seleção por parte de Elvis ficava totalmente restringida dentro do que havia sido aprovado antes pela equipe responsável por sua carreira. Só depois de todo esse processo era que Elvis escolhia as músicas que finalmente gravaria. A maioria dessas demos eram trazidas de Nova Iorque e eram produzidas principalmente pelo produtor Phil Spector, que sempre arranjava um jeito de colocar seus protegidos ou canções que lhe trariam algum tipo de retorno financeiro na seleção final que chegaria a Elvis. Esse é o caso de Westlake, que aqui comparece com uma composição que de certo modo não acompanha o alto nível do restante do disco. Essa canção é sui generis por vários motivos. A primeira coisa que nos chama atenção é seu arranjo, que foge um pouco dos excessos orquestrais típicos de Vegas. Apesar de não ter grandes méritos musicais, temos que ao menos reconhecer que ela não deixa de ser razoavelmente bem executada. A letra, curiosamente, pode ser vista até mesmo como uma paródia da teia de interesses em que Elvis estava envolvido na gravação de seus discos, mas é claro que isso é apenas uma grande licença poética que estou tomando. Foi gravada no segundo dia de gravação da chamada "Maratona em Nashville".

PATCH IT UP (Rabbit / Bourke) - A pergunta pertinente nos dias de hoje sobre essa canção é se ela é apenas um embuste completo ou se ainda existe algum tipo de qualidade melódica em sua fraca estrutura rítmica e em sua péssima letra? Será que o Coronel Parker realmente um dia acreditou que canções tão fracas como essa iriam trazer algum tipo de retorno artístico para Elvis Presley?! Logo ele que gravou alguns dos maiores clássicos da história do Rock'n'Roll !!! SInceramente, Patch It Up não conseguem se impor em nenhum momento. Seu único mérito talvez seja a boa performance que trazia para Elvis nos palcos e só. Nem vou perder tempo analisando seus escassos méritos, apenas quero deixar claro que novamente uma canção menor foi desperdiçada em single, pois ela foi lançada como lado B do compacto "You Don't Have To Say You Love Me". Duas versões foram lançadas na época, a de estúdio saiu no já citado single e a versão ao vivo acabou indo parar na trilha sonora e sinceramente nada acrescentou para a melhora da qualidade artística desse lançamento. Desperdício total de tempo e dinheiro, não só por parte de Elvis e sua banda mas também de quem ouviu a música depois.

MARY IN THE MORNING (Cymball / Lemball) - Sucesso do cantor Al Martino em 1967. Aparece numa cena muito divertida em que Elvis, durante um ensaio, brinca de jogar água em alguns dos membros da famosa "Máfia de Memphis", o grupo que acompanhava o cantor e que servia como guarda-costas; na realidade eles eram os "amigos assalariados de Elvis". A versão oficial e final de "Mary in the Morning" foi gravada no dia 5 de Junho de 1970. Em 2003, na ocasião de lançamento de seu disco de estréia, a filha de Elvis, Lisa Marie Presley, confidenciou que adora "Mary in the Morning". Segundo ela, essas canções de Elvis que não eram grandes sucessos, considerados os verdadeiros "Lados B" da carreira do pai, a fazem lembrar de sua infância passada ao lado do Rei do Rock. E finalizou, dizendo que ama as "músicas tristes de Elvis". Certamente Lisa tem toda razão!

YOU DON'T HAVE TO SAY YOU LOVE ME (Wickham / Napier / Bell / Donaggio / Pallavicini) - Originalmente lançada com grande sucesso pelo cantor italiano Pino Donaggio com o título original de "Io Che Non Vivo Senza Te" em 1964 pelo selo Odeon. O cantor inglês Dusty Springfield em 1966 fez a primeira versão em língua inglesa, versão esta lançada pelo selo Philips. A versão de Presley é mais uma representante da feliz fusão de Elvis com a música da Itália como "It's Now or Never","No More" e "Surrender". O astro era fã do cantor Mario Lanza, o que talvez explique esta aproximação com este tipo de canção. De qualquer forma, apesar de todo esse importante histórico, não consigo deixar de ficar decepcionado com a má qualidade da gravação. A master mais parece um ensaio descompromissado de tão mal gravada. Certamente Elvis não está em um bom momento, na realidade é fácil perceber que ele na realidade está se comportando como se estivesse em um ensaio, nada mais do que isso. Porém o produtor Felton Jarvis resolveu escolher esse take como o master oficial o que deixou todos surpresos mesmo. Repare como até a vocalização de Elvis está ruim pois ele está com a boca excessivamente salivada, coisa que nenhum artista de seu nível deixaria passar em uma gravação oficial. Alguns autores até mesmo chegam a afirmar que ele estaria com um chiclete na boca na hora da gravação! Particularmente não acredito nisso, não vamos chegar a tanto. Apenas é uma versão abaixo da média. Se alguém errou aqui não foi Elvis mas sim Felton Jarvis que a escolheu para compor o disco oficial. Péssima escolha.

YOU' LOST THAT LOVING FEELING
(Mann / Well) - E por falar em Phil Spector, aqui está uma de suas maiores obras primas. Embora apenas conste nos créditos a autoria do casal Barry Man e Cinthia Weil, a composição também contou com a mão certeira do produtor Phil Spector que, na época, primeira metade dos anos 1960, já era considerado um dos maiores produtores do mundo, tanto que ficou conhecido no meio como "Wall of Sound". Embora esse casal tenha composto várias músicas em mais de quatro décadas de carreira, é inegável que essa foi a maior canção escrita pela dupla, tanto que ela é considerada até hoje como uma das músicas mais executadas da história. Segundo algumas fontes a demo da canção teria chegado nas mãos de Elvis já no começo de 1964.

Infelizmente ela não se enquadrava dentro do padrão do que Elvis vinha produzindo na época (as trilhas sonoras de filmes) e por isso ela foi deixada de lado pelos produtores ligados aos estúdios de cinema. Em vista disso a música acabou indo parar nas mãos da dupla "The Righteous Brothers", sendo lançada pouco depois. O resultado? Primeiro lugar na Billboard, milhões de cópias vendidas e sucesso mundial. A ironia de tudo isso é que enquanto a canção explodia e virava um megahit, os singles de Elvis, trazendo músicas de seus filmes em Hollywood, patinavam nas paradas! Antes de Elvis gravar sua versão ao vivo em disco, com cinco anos de atraso, é bom deixar claro, a cantora Dionne Warwick lançava uma versão bem popular também que chegou ao 16º lugar nas paradas. Realmente é uma pena que Elvis a tenha desperdiçado no momento certo de gravá-la, ainda em 63 ou 64, pois se a tivesse gravado nesse período, teria certamente alcançado um êxito muito maior do que seus intérpretes originais. Apesar de tudo isso temos que reconhecer que a versão de Elvis é fantástica! A sua versão não fica nada a dever a original que foi produzida por Phil Spector, que iria produzir nesse mesmo ano de 1970 o disco "Let It Be" dos Beatles. Antes tarde do que nunca.

A versão presente neste disco é a mesma do filme e foi gravada em Vegas no dia 12 de Agosto de 1970. Curiosidades: Phil Spector sempre foi um grande amigo de Doc Pomus, autor muito presente na obra de Elvis nos anos 60 e foi principalmente através dele que começou a produzir muitas das demos que seriam utilizados por Elvis nesse período. Outro fato curioso: infelizmente foi também Phil Spector que acabou apresentando Mike Stone a Elvis Presley que, impressionado por sua técnica nas artes marciais, também o apresentou a Priscilla Presley. O resto da história já conhecemos e sabemos que ela não terminou muito bem.

I' VE LOST YOU (Howard / Blaikley) - Belo momento do disco. Essa famosa dupla britânica de compositores, Ken Howard e Alain Blaikley, foi uma das mais populares durante os anos 60 e 70, tendo escrito temas para grandes astros da época como The Honeycomb e Peter Frampton. Quando escreveram I've Lost You eles jamais pensaram que Elvis gravaria uma versão dessa canção. Aliás a música chegou nas mãos de Elvis meio por acaso, quando um engenheiro de som a tocou de forma acidental durante as gravações em Nashville. Elvis se interessou e pediu que ele a tocasse novamente. O que aconteceu depois não é nenhuma novidade. A música virou título do primeiro single de Elvis composto com músicas desta trilha. A versão do disco foi gravada ao vivo e a que saiu em compacto é gravada em estúdio. A melhor sem dúvida é a do disco pois conta com a energia da plateia, o que dá um sabor especial à canção. A versão de estúdio foi gravada no dia 4 de Junho de 1970 em Nashville a a versão ao vivo foi gravada em Las Vegas no dia 11 de Agosto.

JUST PRETEND (Fletcher / Flett) - Elvis era um artista extremamente produtivo. Basta apenas darmos uma olhada na grande quantidade de canções que ele gravou em sua longa carreira. Com tanto material novo invadindo o mercado de uma só vez não haveria como evitar que certas injustiças fossem cometidas. Uma delas se chama "Just Pretend". Essa música é uma das mais bonitas gravadas por Elvis. Com vocalização sóbria e pleno domínio durante as gravações Elvis legou para a posteridade uma de suas maiores pérolas musicais, daquelas que ainda merecem ser redescobertas. Usada timidamente tanto no filme como na trilha sonora, "Just Pretend" merece novas e atentas audições! Com melodia e letra acima da média, a canção que fala sobre reconciliação e reencontro, sem sombra de dúvidas vai encontrar eco nos corações mais sensíveis. Ela guarda várias semelhanças de arranjo com outro momento precioso desse disco, "Bridge Over Troubled Water". Não poderia ser diferente pois ambas foram gravadas quase no mesmo dia e local, uma no dia 05 de junho de 1970 a outra um dia depois no mesmo estúdio, em Nashville. Nessa semana realmente Elvis estava extremamente inspirado para cantar belas e ternas canções de amor acompanhadas de belíssimos arranjos de teclados. O veredito final não poderia ser diferente pois essa é uma balada romântica sensível que foi injustamente subestimada na época, não tendo alcançado a devida repercussão que merecia. De qualquer forma nunca é tarde para se reparar uma injustiça, que tal ouvir "Just Pretend" hoje à noite? Certamente você terá uma grata surpresa!

STRANGER IN THE CROWD (Winfield Scott) - Se "Just Pretend" e "Bridge Over Troubled Water" são músicas embasadas nos arranjos de piano, aqui o que se destaca mesmo é o pleno domínio dos arranjos de cordas e de instrumentos percussivos. A mais acústica música do disco não chega ao ponto de ser um dos destaques da trilha, sendo considerada apenas um complemento ao conjunto. Apesar disso, de ser uma mera coadjuvante, não podemos deixar de colocar em destaque seus méritos como a vocalização inspirada de Elvis e o belo solo de guitarra de James Burton, bem diferente do que ele costumava fazer em estúdio. Winfield Scott, autor dessa música, compôs várias canções dos filmes de Elvis nos anos 60. Ele esteve muito presente nessa fase e foi dele a descoberta de uma das maiores surpresas em termos de gravações perdidas de Elvis. Quase que por acaso ele acabou descobrindo o tape inédito de "I'm Roustabout", canção que havia sido originalmente composta para ser o tema principal do filme "Roustabout" (O carrossel de emoções, 1964). Assim que soube o que tinha em mãos entrou em contato com Ernst Jorgensen que não perdeu tempo em anunciar para o mundo que pela primeira vez em muitos anos havia sido descoberta uma nova música na voz de Elvis, até então totalmente inédita. A descoberta acabou sendo definida por Joe Di Muro, executivo da RCA / BMG, como a "mais inacreditável da música moderna"!

THE NEXT STEP IS LOVE (Evans / Barnes) - Quando Elvis resolveu retomar o rumo de sua carreira e deixar Hollywood para trás ele procurou encontrar inspiração e renovação em um novo grupo de compositores. Paul Evans, cantor, compositor e famoso produtor certamente se encaixava nesse novo perfil que Elvis tanto procurava. Antes de compor "The Next Step is Love", Evans já era muito conhecido nos EUA por causa de suas músicas românticas, doces e ternas, que fizeram muito sucesso principalmente na primeira metade dos anos 60 como, por exemplo, "Too Make You Feel My Love", "When" e principalmente "Roses are Red (My Love)", seu grande sucesso que chegou ao primeiro lugar nas paradas. Além disso ainda escreveu novas versões para o clássico sacro "Amazing Grace". Compositor de mão cheia foi ainda gravado por Pat Boone, La Vern Baker e Bobby Vinton. Pena que não tenha tido uma parceria de maior duração ao lado de Elvis, pois na visão estreita de Tom Parker ele ainda era considerado um compositor muito "caro"!!! De qualquer maneira a música acabou sendo lançada como Lado B do Single "I've Lost You". No filme Elvis aparece ouvindo e dando sua aprovação final ao resultado da gravação desta canção. É uma bela música sem dúvida, porém perde em comparação com alguns clássicos presentes neste disco. Foi gravada no dia 7 de Junho de 1970.

BRIDGE OVER TROUBLED WATER (Paul Simon) - Essa é uma das maiores canções populares já escritas. Gravada originalmente no final dos anos 60 e lançada em janeiro de 1970 no disco de mesmo nome da dupla Simon e Garfunkel a música logo virou símbolo de uma era e colecionou prêmios em sua vitoriosa trajetória: "Gravação do ano", "Álbum do ano", "Melhor canção escrita do ano" e outros. Além da aclamação da crítica o público também não deixou por menos colocando a música por seis semanas seguidas no topo da parada norte americana. Tanto sucesso não poderia passar despercebido por Elvis Presley. Ele amou a música desde a primeira vez que a ouviu e foi um dos primeiros intérpretes a gravar uma versão, apenas seis meses depois que ela foi lançada originalmente pela famosa dupla dos anos 70. Elvis não perderia a chance de fazer sua versão pessoal de uma canção tão significativa. Logo ele, que estava empenhado em renovar seu repertório e produzir material relevante e de importância, bem longe de seu passado recente de trilhas sonoras medíocres. Antenado no que estava acontecendo musicalmente ao seu redor, Elvis logo providenciou seu próprio registro da canção.

Quando foi informado da data das sessões de gravação em junho daquele mesmo ano ele logo entrou em contato com seu produtor Felton Jarvis e pediu que ele providenciasse logo a liberação da música pois ele já tinha inclusive feito alguns ensaios com sua banda na estrada e estava procurando achar o tom certo para sua versão. Elvis sabia que seu estilo vocal em pouco se aproximava da linha folk universitária de seus autores originais. Ele procurou adaptar a canção ao seu próprio estilo, deixando a simplicidade da versão original de lado e investindo em algo mais grandioso com presença marcante de orquestra (arranjo inexistente dentro da versão original da dupla Simon e Garfunkel). Isso também se justificava porque Elvis pretendia utilizá-la durante seus concertos e não havia como ele, sendo um barítono, fazer uma versão que se aproximasse da vocalização simplória de Paul Simon e seu companheiro de dupla. Alguns ajustes teriam que ser feitos e isso traria todas as características que fariam essa canção única dentro da vasta discografia de Elvis.

Esse tipo de material era o que ele iria procurar cada vez mais durante os anos 70. Canções que representassem de alguma forma um novo desafio, um novo pico a alcançar. Certamente os rocks que tanto caracterizaram sua carreira, ao ponto de receber o título de Rei do Rock, não mais significavam um grande desafio a ser superado em 1970. Elvis procurava algo mais, algo que demonstrassem a todos seu grande talento vocal, que deixasse claro para quem ouvisse seus discos ou assistisse seus shows que ele era, acima de qualquer coisa, um grande cantor, nada mais do que isso. Elvis procurava antes de qualquer coisa ser reconhecido por seus colegas profissionais, pela crítica especializada e principalmente por seu público que manteve-se fiel a ele, mesmo na pior fase de sua carreira nos anos 60. O saldo final é conhecido de todos: a canção é considerada uma das maiores interpretações de toda a carreira de Elvis Presley! A versão do Rei para o sucesso imortal da dupla "Simon e Garfunkel" emociona até hoje. Como toque final foram acrescentadas palmas para se dar a impressão que ela foi gravada ao vivo, porém esta é a versão de estúdio e não a versão que aparece no filme (e que também é ótima). Só foi lançada da forma como foi gravada muitos anos depois na caixa de CDs "Walk a mile in my Shoes" com nova mixagem e mostrando toda a extensão de sua beleza. "Bridge Over Troubled Water", sem a menor sombra de dúvida, é um dos maiores marcos da carreira de Elvis Presley.

Elvis Presley - That´s The Way It Is (1970): RCA Studio B, Nashville: Elvis Presley (vocal) / James Burton (guitarra) (baixo) / Ronnie Tutt (bateria) / Chip Young (guitarra) / Bob Lanning (bateria) / Charlie Hodge (violão e voz) / Glen Hardin(piano) / The Imperials (vocais) / The Sweet Inspirations (vocais) / Millie Kirkham (vocais) / John Wilkinson (guitarra) / Norbert Putnam (baixo) / Jerry Carrigan (bateria) / David Briggs (piano) / Charlie McCoy (orgão e Harmônica) (Banjo) / Harold Bradley (guitarra) / The Jordanaires (vocais) / Farrel Morris (percussão) / Bobby Morris e sua Orquestra / Produzido por Felton Jarvis / Arranjado por Felton Jarvis, Elvis Presley, Glen D. Hardin, Cam Mullins, David Briggs, Bergen White, Norbert Putnam / Ficha Técnica / International Hotel Showroom, Las Vegas: Elvis Presley (vocal e violão) / James Burton (guitarra) / Jerry Scheff (baixo) / Ronnie Tutt (bateria) / Charlie Hodge (violão e voz) / Glen Hardin(piano) / John Wilkinson (guitarra) / The Imperials (vocais) / The Sweet Inspirations (vocais) / Joe Guercio e sua Orquestra. That's The Way It Is: Gravado no RCA's Studios B, Nashville e Showroom do International Hotel, Las Vegas / Data de Gravação: 4 a 8 de junho e 11 a 13 de agosto de 1970 / Data de Lançamento: novembro de 1970 / Melhor posição nas charts:#21 (EUA) e #12 (UK).

Pablo Aluísio.