Os críticos nunca estiveram ao lado de Elvis Presley. Essa afirmação jogada assim ao vácuo das indagações pode parecer sem propósito. Será?
Talvez o grande problema Elvis x críticos seja simplesmente o fato de que ele nunca se prendeu a um estilo: gravava os blues, da sua maneira sui generis, que ele tanto amava, os countries que o remetiam ao universo fosforescente dos festivais itinerantes de música do Tennessee e as baladonas pop de qualquer época que ouvia quando era criança. Tudo isso mostra que o afamado Rei do Rock era antes de tudo Rei do Pop. Sim, Rei do Pop porque sempre houve lugar na sua personalidade de grande intérprete e produtor (Sim! ele produzia seus discos) para todos os estilos de música, do gospel ao blues, do country a baladas de qualquer lugar do mundo.
Nos anos 50, Elvis não podia ter o apoio da crítica musical porque quem escrevia sobre música, na época, eram pessoas que tinham como referências musicais Nat “King” Cole, Sinatra e Bing Crosby; ou seja, pessoas que não podiam entender o porquê de um garoto branco de 19 anos, ainda por cima sulista, cantar blues. Sendo assim, os críticos não poderiam avaliar o trabalho de Presley como grande estilizador do blues urbano e do country, ou seja, o criador do que se convencionou chamar de rockabilly: ouça That’s All Right de 1954.
Nos anos 60 Elvis inicia bem a década com um de seus LP's mais consistentes, Elvis is Back e um LP só de gospel, His Hand In Mine, ambos de 1960. Mas essa década também traz o estigma da linha de produção filme/long play e aí temos o primeiro grande erro de sua carreira, pois por volta de 1964 ele já não consegue emplacar músicas direto no top 10 da Billboard e nem no equivalente britânico. Motivos: falta de tempo para se apresentar ao vivo (últimos dois shows em 1961 ), e principalmente esgotamento psicológico e artístico ao se ver preso a um contrato de quase 10 anos que lhe obrigava a estrelar uma média de 3 filmes por ano seguidos de trilhas sonoras medíocres. Elvis sempre gravou o que queria, só que na década de 60, sugado ao máximo para fazer os filmecos de Hollywood (com raras exceções) e uma trilha por filme de mais ou menos dez músicas compostas e produzidas por produtores musicais de Hollywood, mesmo para ele seria difícil transformar uma música medíocre em um grande sucesso baseado apenas na sua enorme popularidade.
Os críticos que cresceram ao som do rock dos anos 50, que faziam a cabeça com Beatles, Stones e Dylan, no meio dos anos 60, esperavam que ele sempre fizesse algo como Blue Suede Shoes e Elvis, não podendo desenvolver de forma total seu amadurecimento artístico, conforme razões já mencionadas, estava de novo na mira dos críticos.
Em 1966 ele entra no estúdio para gravar algo que realmente queria fazer, um novo álbum gospel, How Great Thou Art (ganhador de um Grammy em 1967), e também aproveita para gravar algumas músicas que não fossem trilhas, mas que irremediavelmente entrariam em algum disco de filme para completar o que foi convencionado pela gravadora como tamanho padrão. Estas músicas foram: Down in The Alley (blues), Love Letters (clássico de Victor Young) e Tomorrow is a Long Time (de Bob Dylan). Em 1967, Presley iria continuar sua reaproximação com suas raízes através de blues singles como Guitar Man, U.S. Male, Hi Heel Sneakers. Estes singles foram ignorados pelo grande público simplesmente porque a RCA (gravadora de Elvis) achava mais rentável investir nas trilhas que bem ou mal eram o grande veículo para o seu trabalho. Mas como “água mole em pedra dura ...” Elvis conseguiu sua salvação em 1968 com um especial para a televisão que além de mostrar todo seu vigor como intérprete através de canções novas como If I Can Dream o colocava novamente como uns do maiores performers de palco dos EUA.
Em 1969, finalmente termina o suplício/contrato com Hollywood. Elvis inicia uma sessão de gravação em janeiro que se estende até fevereiro (no American Sound Studios of Memphis). Nesta sessão ele grava mais de 30 músicas, constando entre estas alguns dos maiores sucessos de sua carreira como Suspicious Minds e o grande LP From Elvis in Memphis. Elvis praticamente estabelece nesta sessão um novo conceito musical tão versátil quanto seu próprio estilo de cantar, algo que pode ser definido como Som Total; o melhor de tudo é que agora o seu contato com o público iria ser ao vivo; de 1969 a 1977 ele iria cruzar os EUA em tours de costa a costa. Será que agora os críticos teriam razão para malhar Elvis ?
No início, de 69 à 73, sua relação com os críticos foi amistosa, algumas vezes elogiosa ao ponto de parecer tietagem. Mas como tudo que é bom dura pouco... Aconteceu que dois probleminhas passaram a interferir na sua vida profissional: seu divórcio e, principalmente, o abuso de drogas.
Na década de 70, Presley estava trabalhando no palco e no estúdio todas as suas personas enquanto intérprete. Talvez a sessão de gravação que melhor represente seu trabalho na década de 70 seja a de junho de 1970, em Nashville. Para se ter uma idéia, nesta sessão ele repetiu a qualidade que marcou seus trabalhos nos anos 50, nas sessões de Elvis is Back e as de From Elvis in Memphis. Mais uma vez ele gravou cerca de 30 canções que iam do blues de Got my Mojo Working, clássico gravado por Muddy Watters, countries vigorosos como I Really Don’t Want to Know, o gospel Where Did They Go, Lord? e o pop Bridge Over Troubled Water.
Elvis entra de novo na mira dos críticos a partir de 74 por estar muito mais interessado em gravar baladas que melhor exteriorizavam seus conflitos pessoais; por isso mesmo os críticos o detonam: afinal ele não era o grande Rei do Rock? Onde está o rock na suas apresentações e gravações deste período? Outro ataque sempre colocado pelos críticos era sua aparência física que não lembrava mais o símbolo sexual que ele fora.
Elvis não deixou de fazer rocks, só que este tipo de música nunca foi o ponto focal da sua vida, apesar da imprensa sempre esperar que ele fizesse rock. Ele tinha amadurecido e sua música também, e quanto à questão da aparência, é tão irrelevante que dá vontade de rir. Se ele estava inchado por causa do abuso de drogas, o problema era só dele; e vale lembrar que se os críticos estavam interessados na sua aparência, os fãs e qualquer amante do bom pop/rock estavam interessados na sua música. Vinte anos depois de sua morte ele ainda é lembrado por ela.
Texto publicado no site EPHP
Compilação: Pablo Aluísio.
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