quinta-feira, 18 de novembro de 2021

A Salvação

Uma das maiores queixas dos fãs de filmes de faroeste ultimamente é a escassez de bons títulos do gênero na atualidade. Bem, eis aqui uma sugestão que vai agradar a muitos. Trata-se de um western chamado "The Salvation". No século XIX um imigrante escandinavo chamado Jon Jensen (Mads Mikkelsen) finalmente parte para reencontrar sua família. Há sete anos ele deixou sua Dinamarca natal para tentar uma nova vida na América. Lá ele conseguiu progredir ao lado do irmão em um rancho no meio do deserto do Arizona. Agora se sentindo mais seguro ele vai até uma estação de trem para recepcionar sua esposa e o pequeno filho, nessa que será a sua nova terra. No caminho de volta da estação Jon e sua família pegam uma diligência onde para sua infelicidade também viaja Paul Delarue (Michael Raymond-James). Ele é um criminoso que acabou de sair da prisão. Também é irmão de Henry Delarue (Jeffrey Dean Morgan), um ex-Coronel do Exéricito americano que agora ganha a vida como pistoleiro de uma grande empresa que deseja comprar todas as terras da região. Para que os produtores vendam seus ranchos ele implanta um sistema de terror para com os moradores do pequeno vilarejo. Pois bem, Paul Delarue acaba imobilizando Jensen na viagem pois fica interessado em sua esposa. Ele então mata o pequeno filho de apenas dez anos de Jensen e depois estupra sua mulher. Confiando que nada lhe acontecerá ele segue em frente na sua vida de crimes. Jensen porém não está disposto a deixar tudo isso barato e o mata em uma emboscada. Isso obviamente coloca sua cabeça à prêmio. Jensen não está disposto a recuar e decide lutar até o fim para que a justiça finalmente prevaleça.

O roteiro segue o tema básico da vingança pessoal. Isso, apesar de estar um pouco saturado, acaba funcionando muito bem no filme. O roteiro é bem arquitetado e no final todas as peças se encaixam perfeitamente. O filme apresenta também uma boa produção, mas certamente o seu grande atrativo é o elenco. Quem gosta de séries então vai gostar ainda mais. O protagonista é interpretado pelo ator Mads Mikkelsen, que dá vida ao Dr. Hannibal Lecter da série "Hannibal". Ele é um sujeito honesto e íntegro que no fundo quer apenas levar sua vida em frente, criando seu filho, vivendo ao lado da esposa amada. Ele sonha com um futuro baseado no trabalho e na dignidade, mas como alcançar isso em uma terra sem lei, dominada por facínoras sem escrúpulos? O vilão - um dos mais odiosos dos últimos tempos - é interpretado por Jeffrey Dean Morgan da série "The Walking Dead". O sujeito é completamente desprezível. O roteiro insinua que no passado ele teria sido um bom homem, mas que teria sido destruído interiormente após passar longos anos na cavalaria, matando índios nas reservas do velho oeste. Por fim outro grande destaque vem com a presença da elogiada Eva Green, a Vanessa Ives de "Penny Dreadful". Sua personagem teve a língua cortada por selvagens e ela não tem nenhuma fala no filme. Muda, se expressa apenas com olhares e expressões faciais. Excelente atuação. Em suma é isso. Não deixe de assistir a esse faroeste contemporâneo, um filme acima da média que seguramente se tornará um bom programa para o fim de sua noite.

A Salvação (The Salvation, Estados Unidos, 2014) Direção: Kristian Levring / Roteiro: Anders Thomas Jensen, Kristian Levring / Elenco: Mads Mikkelsen, Eva Green, Jeffrey Dean Morgan, Michael Raymond-James, Eric Cantona / Sinopse: Jon Jensen (Mads Mikkelsen) é um imigrante estrangeiro que tenta vencer na vida em um rancho nos Estados Unidos. Depois de sete anos ele finalmente consegue trazer para a América sua esposa e seu pequeno filho. Durante a viagem numa diligência eles caem nas mãos de um bandido que acaba de sair da prisão. Ele domina Jensen, mata seu filho e estupra sua esposa. Depois é morto quando finalmente Jensen o reencontra. O assassinato enfurece seu irmão, Henry Delarue (Jeffrey Dean Morgan), que promete caçar e liquidar com Jensen, dando origem a um jogo de vida e morte entre eles.

Pablo Aluísio. 

quarta-feira, 17 de novembro de 2021

Céu Azul

Outro bom filme que levanta questões interessantes sobre o papel da mulher dentro da sociedade é esse drama "Céu Azul". O enredo se passa durante o começo dos anos 60. Carly Marshall (Jessica Lange) é a esposa de um militar que não consegue expressar seus sentimentos. Tudo parece bem ruim para o marido Hank (Tommy Lee Jones). Seu casamento é bem frustrante e as constantes mudanças de cidade causadas pelas transferências dele só pioram a situação. Como se isso não fosse ruim o bastante, ela se sente infeliz em seu íntimo pois é uma mulher criativa, com um forte senso de liberdade, que é sempre oprimida por causa da personalidade pouco cativante de seu esposo. Em um ambiente assim ela não consegue se sentir plenamente realizada, muito pelo contrário. Vivendo para manter as aparências ela intimamente cultiva uma melancolia sempre presente, algo que poucos conseguem enxergar debaixo daquela fachada de esposa "feliz". 

Assim o roteiro explora esse lado pouco conhecido da vida de muitas mulheres mundo afora que acabam encontrando em seus casamentos não a felicidade ou a realização emocional, mas sim muitas obrigações, deveres e até mesmo opressão. Nesse quadro o verdadeiro amor acaba sendo soterrado pela servidão do cotidiano, do dia a dia massacrante. O fato curioso é que a opressão social não parte apenas do marido, mas da sociedade em geral também, com seus valores morais travestidos de pura hipocrisia. Nesse processo as mulheres acabam se tornando profundamente infelizes com suas vidas. Como não poderia deixar de ser o destaque desse filme vai todo para a atriz Jessica Lange. Ela encontrou um presente nesse texto e não deixou por menos, realizando uma das melhores atuações de toda a sua carreira. Um momento realmente magistral que lhe valeu uma série de premiações e indicações em diversos festivais de cinema. E o Oscar que ela levou para casa foi mais do que merecido.

Céu Azul (Blue Sky, Estados Unidos, 1994) Direção: Tony Richardson / Roteiro: Rama Laurie Stagner / Elenco: Jessica Lange, Tommy Lee Jones, Powers Boothe  / Sinopse: A vida de um casal infeliz, tentando superar todas as adversidades. Filme vencedor do Oscar e do Globo de Ouro na categoria de Melhor Atriz (Jessica Lange). Também indicado ao Screen Actors Guild Awards na mesma categoria. 

Pablo Aluísio.

Adoráveis Mulheres

Não importa a época histórica, as mulheres sempre amadurecem emocionalmente muito mais cedo do que os homens. Faz parte da natureza humana. Enquanto os garotos ainda estão envolvidos em brincadeiras infantis, as meninas já começam a se interessar romanticamente por outros rapazes, estimulando muito cedo em suas vidas uma personalidade romântica e sensitiva, mesmo que muitas vezes isso surja apenas dentro da mente delas, de forma bem reservada e íntima. Uma prova disso temos aqui nesse "Little Women". O roteiro foi baseado em um clássico da literatura americana escrito pela autora Louisa May Alcott. O que trouxe longevidade para esse texto foi sua sensibilidade em captar parte do universo feminino para suas páginas. Embora muitos não percebam isso, o fato é que o mundo das mulheres, mesmo das adolescentes, é muito mais rico em nuances sentimentais do que se imagina. As jovens, mesmo em tenra idade, já estão prontas para o amor e as emoções que envolvem esse precioso sentimento humano. 

Além disso o coração da mulher sempre guarda pequenos e grandes mistérios em seu interior. Para explorar esse aspecto da vida delas a história mostra a vida de um grupo de irmãs em um tempo particularmente complicado da história americana, quando a nação ficou dividida pela guerra civil. É um filme feito para elas, especialmente realizado para o público feminino. Também é bastante indicado para você assistir ao lado da namorada pois o roteiro levanta questões interessantes que certamente darão origem a um bom bate papo depois da exibição. Afinal de contas nada é mais estimulante e prazeroso do que a companhia de mulheres inteligentes e cultas que saibam manter uma excelente conversação sobre artes em geral. Assim o filme servirá como estimulante para bons momentos ao lado da pessoa amada. 

Adoráveis Mulheres (Little Women, Estados Unidos, 1994) Direção: Gillian Armstrong / Roteiro: Robin Swicord, baseado na novela escrita por Louisa May Alcott / Elenco: Susan Sarandon, Winona Ryder, Kirsten Dunst, Claire Danes, Christian Bale, Eric Stoltz, Gabriel Byrne  / Sinopse: O filme mostra a história atemporal de um grupo de mulheres em busca da felicidade e do amor,  Filme indicado ao Oscar nas categorias de Melhor Atriz (Winona Ryder), Melhor Figurino e Melhor Música (Thomas Newman) 

Pablo Aluísio.

terça-feira, 16 de novembro de 2021

Caminhando nas Nuvens

Romance estrelado pelo ator Keanu Reeves. Ele interpreta Paul Sutton, um militar americano que resolve ajudar uma jovem mexicana que descobre estar grávida. Abandonada pelo pai da criança, Sutton resolve dar algum tipo de apoio, de alguma forma a ela, se fazendo passar até mesmo por seu marido, embora ambos não sejam casados realmente. A boa direção de arte, fotografia e reconstituição histórica são as grandes qualidades dessa produção. Tudo se passa como se fosse um sonho romântico idealizado. A despeito disso, de ser um bonito filme nesses aspectos, achei o roteiro destituído de um conteúdo melhor. A jovem mexicana Victoria Aragon (Aitana Sánchez-Gijón) tem tanto medo de contar ao seu pai que irá se tornar uma mãe solteira que resolve pedir ajuda ao americano, para que ele se passe por seu futuro marido. 

O grande destaque assim acaba indo parar nas mãos do veterano Anthony Quinn como Don Pedro Aragon, o pai de Victoria. Um homem expansivo, de temperamento forte, que defende seus ideais de moralidade a ferro e fogo. Seria insuportável para ele saber que sua filha teria sido abandonada ao ficar grávida. O diretor mexicano Alfonso Arau assim quis fazer uma alegoria dos aspectos religiosos e culturais de seu povo. Conseguiu apenas realizar um filme esteticamente belo e por vezes açucarado em demasia. Seu filme anterior, "Como Água Para Chocolate" foi mais bem sucedido nesse aspecto. De uma forma ou outra o filme conseguiu vencer um Globo de Ouro na categoria de Melhor Trilha Sonora (Maurice Jarre), o que convenhamos foi um feito e tanto para um romance tão mediano como esse. 

Caminhando nas Nuvens (A Walk in the Clouds, Estados unidos, México, 1996) Direção: Alfonso Arau / Roteiro: Robert Mark Kamen, Mark Miller/ Elenco: Keanu Reeves, Aitana Sánchez-Gijón, Anthony Quinn  / Sinopse: O filme conta a história de um jovem, seus amores, sentimentos e dores em um universo de realismo fantástico. 

Pablo Aluísio.

Emma

Adaptação do famoso livro de Jane Austen. Na Inglaterra do século XIX a jovem Emma Woodhouse (Gwyneth Paltrow) acaba se tornando a verdadeira casamenteira de seu círculo social. Ela sempre acerta em aproximar pessoas que ela vê que darão certo em relacionamentos. Ao mesmo tempo em que parece ser certeira nessas escolhas ela mesma não consegue encontrar ninguém ideal para namorar. Como cupido Emma só parece dar certo para os outros. Isso dura até o dia em que se apaixona por um amigo de seu pai, um homem que reúne todas as qualidades que ela sempre procurou em um par. E agora, Emma conseguirá fazer dar certo o relacionamento mais importante de sua vida? 

Esse filme é muito bom, valorizado bastante por uma Gwyneth Paltrow ainda bem jovem e encantadora. Nos países de língua inglesa como Estados Unidos e Inglaterra o livro "Emma" é leitura obrigatória e agrada principalmente aos adolescentes por causa de seu tema, que não importa ser passado na era vitoriana, já que certas coisas nunca mudam, mesmo com o passar dos anos. De todas as adaptações que já foram feitas do romance de Austen (e elas foram muitas, chegando até mesmo a virar série) essa aqui sempre foi a que mais me agradou. Tem uma leveza e uma direção de arte de extremo bom gosto que combinam perfeitamente com a proposta do livro. Ainda não assistiu? Corra para conhecer. 

Emma (Emma, Estados Unidos, Inglaterra, 1996) Direção: Douglas McGrath / Roteiro: Douglas McGrath, baseado no romance escrito por Jane Austen / Elenco: Gwyneth Paltrow, James Cosmo, Greta Scacchi  / Sinopse: O filme conta a história de Emma e os problemas que ela acaba causando por sua mania de agir como cupido. Filme premiado com o Oscar na categoria de Melhor Música Original (Rachel Portman). Também indicado na categoria de Melhor Figurino (Ruth Myers).

Pablo Aluísio.

segunda-feira, 15 de novembro de 2021

O Mistério de Silver Lake

O filme conta a história de um jovem de Los Angeles que está perdido na vida. Ele está desempregado, sendo despejado de seu pequeno apartamento em Los Angeles e seu carro está sendo retomado pelo banco por falta de pagamento. Só que nada disso parece ser muito importante para ele. Sua mente vai para outro caminho. Um dia ele vê uma bela garota loira nadando em um piscina e cria uma verdadeira obsessão por ela. Após poucas palavras trocadas, cria um tipo de paixão platônica pela garota, algo que parece piorar depois que ela se muda e ele fica literalmente desesperado em sua busca. Ele quer saber para onde ela foi, com quem anda, etc. E Los Angeles assim se torna o cenário dessa busca um tanto sem sentido.

Não espere por um roteiro convencional. Nessa sua jornada em busca do "amor de sua vida" ele encontra figuras bizarras como um autor de fanzines muito loucos e um seguidor de uma estranha seita que prega o ebterro de seus membros como se fazia no Egito Antigo, Em meu ponto de vista fizeram um filme longo, longo demais para não aborrecer. Também faltou humor. Na tentativa de fazer algo cult a coisa toda, muitas vezes, se tornou chata e cansativa. Salva o elenco que tem nomes interessantes, com destaque para o casal protagonista. Você conhece o Andrew Garfield  dos filmes do Homem-Aranha e a  Riley Keough é a talentosa neta do Elvis Presley, com uma carreira no cinema que já pode ser considerada bem interessante. O filme é isso então. Meio estranho, bizarro, mas acima de tudo uma espécie de declaração de amor para a cidade de Los Angeles.

O Mistério de Silver Lake (Under the Silver Lake, Estados Unidos, 2018) Direção: David Robert Mitchell / Roteiro: David Robert Mitchell / Elenco: Andrew Garfield, Riley Keough, Topher Grace / Sinopse: Jovem moerador de Los Angeles se apaixona loucamente por uma garota que vê numa piscina, numa noite de luar. Quando ela se muda ele parte em busca dela, para descobrir o que aconteceu. Ele cria uma verdadeira obsessão pela jovem.

Pablo Aluísio.

Backdraft - Cortina de Fogo

Backdraft é um termo técnico em inglês que retrata um evento físico que ocorre quando se abre uma porta de um ambiente que esteja pegando fogo. Ao entrar em contato com o oxigênio do exterior o fogo ganha uma dimensão ainda maior, se avolumando em imensas labaredas, resultando tudo em uma grande explosão. É algo até comum de acontecer e nem precisa esclarecer que também é uma situação de extremo perigo para os bombeiros. O roteiro desse filme aliás explora justamente o universo desses bombeiros, ao mostrar a vida de dois irmãos de Chicago que entram na corporação da cidade. Eles também possuem suas diferenças, mas precisam superá-las ao trabalharem juntos no mesmo esquadrão. Considero um dos melhores filmes já realizados sobre bombeiros até hoje. Além da boa trama em si, o filme ainda apresenta ótimas sequências de ação, principalmente no combate a incêndios por toda a cidade. 

É curioso que tenha anos depois inspirado a realização de uma série popular nos EUA chamada "Chicago Fire" que também vai pelo mesmo caminho. Por fim "Backdraft" ainda traz Robert De Niro no elenco, fazendo um tipo de papel que ele acabou se acostumando bem, a de coadjuvante de luxo. È interessante perceber que De Niro em determinado momento de sua carreira preferiu deixar de lado a responsabilidade de estrelar grandes produções, com alto risco, para se acomodar em personagens coadjuvantes de produções menores, onde o risco de sair arranhado caso o filme não fizesse o devido sucesso, era bem menor. De uma maneira ou outra esse filme merece a recomendação por ser bem realizado e por ter uma trama interessante. Além disso, por incrível que pareça, não ficou datado, servindo ainda hoje como uma boa diversão. Filme indicado ao Oscar nas categorias de Melhores Efeitos Especiais, Melhores Efeitos Sonoros e Melhor Som. Indicado ao BAFTA Awards na categoria de Melhores Efeitos Visuais. Também indicado ao MTV Movie Awards nas categorias de Melhor Filme e Melhor Sequência de Ação. 

Backdraft - Cortina de Fogo (Backdraft, Estados Unidos, 1991) Direção: Ron Howard / Roteiro: Gregory Widen / Elenco: Kurt Russell, William Baldwin, Robert De Niro / Sinopse: O filme conta a história de um grupo de bombeiros que precisa sobreviver a cada chamada de emergência, com destaque para os novatos que precisam aprender os segredos da profissão com os bombeiros mais velhos e mais experientes no combate ao fogo. 

 Pablo Aluísio.

domingo, 14 de novembro de 2021

Elvis Presley - Elvis as Recorded at Madison Square Garden (1972)

Elvis Presley - Elvis as Recorded at Madison Square Garden (1972) - Esse disco foi gravado em Nova Iorque e lançado o mais rapidamente possível. A RCA Victor queria aproveitar toda a agitação dos concertos de Elvis na cidade para transformar o LP em um sucesso de vendas. Realmente o disco se saiu bem, vendendo muito durante os dois meses seguintes. Foi o primeiro álbum da discografia de Elvis que se propunha a trazer um show ao vivo praticamente na íntegra. Não eram apenas gravações ao vivo esporádicas como havia acontecido nos discos anteriores. Nem era uma seleção de canções gravadas em temporadas de Las Vegas. Era um novo modelo de álbum vivo, algo que a gravadora queria explorar dali para frente (esse mesmo modelo se repetiria no "Aloha From Hawaii" e no disco gravado em Memphis em 1974).

O problema desse disco em minha opinião não tem nada a ver com sua existência em si, mas sim pelo fato de que para ele ser lançado a RCA Victor teve que desistir de lançar um disco com a trilha sonora do filme "Elvis On Tour". Os executivos acreditavam que o lançamento de dois discos tão parecidos entre si poderia fazer com que um deles fracassasse nas lojas, ou pior do que isso, que ambos vendessem mal. Uma preocupação que hoje em dia soa estranha para o fã, uma vez que todos os anos são lançados dezenas de CDs de Elvis. Era uma outra época, uma outra mentalidade. Para a RCA era importante manter o prestígio de Elvis em alta, vendendo muitos discos, para que todos ainda o vissem como um campeão de vendas. Hoje em dia, do ponto de vista atual, isso obviamente já não tem a menor importância. Seria bem melhor ter também um álbum oficial do "Elvis On Tour". Pena que isso não aconteceu.

ALSO SPRACH ZARATHUSTRA (Richard Strauss) - Composição clássica do grande maestro e músico Richard Strauss. Tornou-se mundialmente conhecida como tema do filme 2001 - Uma Odisséia no espaço do diretor Stanley Kubrick. Elvis adorava ficção cientifica e resolveu que ela seria usada no começo de seus shows. A primeira versão arranjada por Felton Jarvis copiava o estilo das discoteques dos anos 70. Elvis detestou e resolveu usar o arranjo clássico normal. Sem dúvida se tornou uma abertura à altura do Rei do Rock. Curiosidade: Zarathustra é uma antiga divindade dos persas.

THAT'S ALL RIGHT (Arthur Grudup) - Elvis começa a cantar no show por esse essa canção que foi começo a tudo, "That's All Right". Aqui o pique de ser a primeira canção da apresentação (logo após os acordes de "Also Sprach Zarathustra") a salvou da banalidade. Ótima performance embalada por arranjos novos, com muita energia e vibração. Para realmente levantar o público.

PROUD MARY (John Forgety) - Eu gosto bastante da versão de "Proud Mary" para esse álbum. A música em si não era mais novidade para os fãs de Elvis, já que havia sido lançada no repertório do disco "On Stage - February 1970". A diferença básica entre as duas versões era que a do álbum gravado em Las Vegas apresentava uma performance mais técnica, bem tocada, por Elvis e banda. Aqui no show do Madison Square Garden a música é apresentada mais no calor do momento, na vibração do público. Não é tecnicamente tão perfeita, mas tem um ótimo pique, uma energia que poucas vezes foi repetida por Elvis.

NEVER BEEN TO SPAIN (Hoyt Axton) - A primeira vez que ouvi esse álbum fiquei realmente impressionado como Elvis conseguia ir da fúria roqueira aos momentos mais intimistas, em questão de segundos! No palco Elvis era realmente magistral nesse aspecto. Um exemplo vem do blues "Never Been To Spain". Ele havia acabado de balançar o Madison Square Garden com a vibração e a empolgação de "Proud Mary" e então recebidos os aplausos emendou com essa excelente canção blueseira. Elvis, um fruto cultural do vale do Delta do Mississippi, tinha plena familiaridade com esse tipo de sonoridade. Afinal ele foi criado bem ali e em Memphis acabou tendo ainda mais contato com esse estilo musical puramente americano, forjado nas plantações de algodão do sul. Era um branco com negritude cultural correndo em suas veias. Outro ponto importante a se dizer sobre "Spain" era que essa era efetivamente a primeira vez que essa música pintava em um disco oficial de Elvis. Ela era assim uma das "inéditas" do álbum, um canção não gravada por Mr. Presley em estúdio antes. Para o fã que havia ido na loja de discos em 1972 era uma novidade e tanto! A outra ótima notícia era que, tecnicamente, essa faixa se mostrava, desde os primeiros acordes, como uma das mais perfeitas gravações do concerto - chego inclusive a dizer que ela tinha mesmo as qualidades, as matizes, de uma gravação em estúdio, de tão perfeita que saiu. Elvis e banda, entrosados e afinadíssimos, tiveram uma performance simplesmente impecável, uma obra prima ao vivo. Para essa performance "live" eu realmente tiro o meu chapéu. E para quem gosta dos solos de James Burton, aqui ele foi de fato excepcional. A TCB Band atingiu em 1972 um amadurecimento e um primor técnico que poucas vezes seria repetido ao longo dos anos. O que dizer? Eles foram perfeitos.

YOU DON'T HAVE TO SAY YOU LOVE ME (Donnagio / Pallavicini / Bell / Wickham) - Depois desse grande momento Elvis entra direto em "You Don't Have To Say You Love Me". Já escrevi antes e repito, essa bela música italiana, lançada originalmente no álbum "That´s The Way It Is" não teve uma boa versão de estúdio lançada. Complicado entender o que os executivos da RCA Victor tinham na cabeça, mas o fato é que eles escolheram o take errado como master, para ser lançado no disco oficial. Não era bem aquela versão em particular a ser escolhida. Curiosamente no Madison Square Garden Elvis voltou a ela. Não entendo a razão. Essa gravação de Elvis nunca foi um hit em sua voz. Ele poderia ter escolhida outras faixas mais representativas e populares. De qualquer maneira essa versão ao vivo consegue ser bem superior à que ouvimos no disco gravado em Las Vegas em 1970. Ela tem mais fluidez, mais qualidade musical. No comecinho Elvis ainda parece um pouco tímido, porém conforme a música vai avançando ele vai soltando a voz e quando chega no momento final apoteótico, Elvis consegue alcançar todas as notas necessárias sem problemas. Aplausos mais do que merecidos.

YOU´VE LOST THAT LOVIN´ FEELIN´(Mann / Well) - Outro momento do álbum que considero muito bom é essa versão de "You've Lost That Lovin' Feelin'". Em relação a essa canção minha opinião continua a mesma: a melhor versão é realmente a do LP "That´s The Way It Is". Simplesmente irretocável. Essa versão do Madison Square Garden porém tem um outro pique, um outro sentimento. O público de Nova Iorque era bem diferente do público em Las Vegas. Enquanto que em Nevada Elvis se apresentava para uma plateia bem mais comportada, aqui na chamada "Big Apple" as coisas eram diferentes. Havia mais troca, mais intensidade entre Elvis e seus fãs. Isso acabou se refletindo nessa versão, muito embora seja ainda inferior ao que ouvimos no disco de 1970.

POLK SALAD ANNIE (Tony Joe White) - E dentre tantas versões de "Polk Salad Annie" que Elvis gravou ao longo dos anos 70 gosto particularmente muito dessa! Ela tem uma vibração poucas vezes ouvida. Sem maiores delongas Elvis vai direto na veia, deixa para lá a introdução falada e explicativa e pula logo para o puro ritmo. Problemas de microfonia foram captados pelos equipamentos da RCA, mas nem isso atrapalha o excelente resultado. Obviamente o público de Nova Iorque não deve ter entendido bulhufas da letra, afinal quando foi que aqueles nova-iorquinos de terno e gravata estiveram nos pântanos da Louisiana, não é mesmo? Embora Elvis tenha ficado claramente inspirado nessa performance, não podemos deixar de poupar elogios para o barbudo baixista Jerry Scheff. Quando esteve com os Doors, o próprio Jim Morrison teve dúvidas se aquele cara esquisito com óculos fundo de garrafa fazia rock de verdade! Bastou poucas sessões em Los Angeles para que ele se convencesse de que Jerry era mesmo um grande músico com seu instrumento. Aqui no Madison está outra prova de seu talento, pois "Polk" tinha excelentes solos de baixo, onde Scheff podia ter a oportunidade de mostrar o quanto era fera também no palco! Nesse momento do show ele foi de fato a grande estrela! Quem diria...

LOVE ME (Jerry Leiber / Mike Stoller) - "Love Me" do disco "Elvis" de 1956 só não foi mais desprezada por Elvis porque afinal de contas seu sabor mais ao estilo country music se adequava mais ao direcionamento que Elvis vinha tomando em seus shows. Mesmo assim essa versão live não conseguiu ter nem dois minutos de duração!

ALL SHOOK UP (Blackwell / Presley) - Realmente, se formos pensar no pior lado desse grande show da carreira de Elvis Presley vamos perceber que todas as antigas músicas de sua fase mais roqueira, justamente nos anos 50 quando ele foi chamado de "O Rei do Rock", foram negligenciadas nesse palco. A versão de "All Shook Up" não tem nem 1 minuto de duração! Que lástima! Essa música foi sem dúvida um dos grandes hits de Elvis em 1957. Uma canção essencial, que ganhou discos de ouro e platina. Como é possível Elvis apresentar um número tão medíocre para um clássico tão importante? Lamentável em todos os aspectos.

HEARTBREAK HOTEL (Axton/Presley) - "Heartbreak Hotel" me soa bem melhor. Aliás sempre gostei bastante desse novo arranjo dos anos 70. Embora a versão de estúdio dos anos 50 seja excepcional, era mesmo de se esperar que sua sonoridade um tanto sombria fosse deixada de lado nesse momento.

TEDDY BEAR (Mann/Lowe) / DON'T BE CRUEL (Presley/Blackwell) - Elvis não deu muita bola para seus antigos rocks nesse concerto. Melhor se saiu (mas apenas um pouquinho melhor) com o medley "Teddy Bear / Don't Be Cruel", Aqui Elvis demonstrou um pouco mais de foco - porém nada muito digno de nota. Ele parecia mesmo incomodado de trazer de volta esses "Oldies", as velharias de um passado remoto.

LOVE ME TENDER (Presley/Matson) - A versão ao vivo de Elvis para seu grande clássico "Love Me Tender" nesse show realizado no Madison Square Garden é inegavelmente fraca. Apenas um minuto e trinta segundos de performance. Nada muito inspirador. Na verdade Elvis sempre transparecia um certo desleixo no que se referia ao seu repertório mais antigo, dos anos 50. Ele parecia ter pouco apreço por esses grandes sucessos do começo de sua carreira. Qual seria a razão? Complicado descobrir. Um pista porém pode ser encontrada numa frase que ele disse nos anos 70, ao afirmar que não queria ser um cantor de 40 anos rebolando ao som de "Hound Dog"!

THE IMPOSSIBLE DREAM (Darion/Leight) - Uma das melhores razões para se comprar o disco na época era a inclusão de "The Impossible Dream" na lista das músicas desse álbum. Era uma música inédita dentro da discografia de Elvis, nunca antes lançada, nem em versão de estúdio, nem ao vivo. O colecionador simplesmente batia os olhos nessa faixa e levava o LP para casa. Era uma nova versão de um sucesso mais recente (do ano de 1968) na voz do cantor Andy Williams. Elvis dizia que era um "country dos bons". Sua versão, apesar de ser "live", é muito boa. Concentrada, bem executada, caprichada. Elvis sabia que a música iria aparecer pela primeira vez em um de seus discos oficiais e por isso deu o melhor de si. Uma performance realmente muito acima da média, elevando a qualidade do disco como um todo.

HOUND DOG (Leiber/Stoller) - Cantar velhos hits já não empolgavam Elvis. Provavelmente ele entendia que isso significava que ele não havia avançado musicalmente em sua carreira, vivendo apenas dos velhos sucessos do passado. E por falar em "Hound Dog", essa também foi cantada nesse show. Outra versão de pouco mais de 1 minuto de duração. Outra que ele não levou nada à sério. Provavelmente só entrou na seleção de repertório do show para relembrar aos nova-iorquinos de onde ele vinha, de seu passado glorioso nos primeiros dias do rock ´n´ roll americano.

SUSPICIOUS MINDS (Mark James) - Outro sucesso que martelou Elvis foi "Suspicious Minds". Quando Elvis voltou aos palcos em 1969, em suas temporadas de Las Vegas, ele a usou bastante em seu repertório. Era algo bem fácil de explicar. A música tinha se tornando seu maior sucesso mais recente, chegando ao primeiro lugar da Billboard, algo que não acontecia desde 1962! Assim Elvis jamais poderia ignorar tamanho sucesso. Nos primeiros shows daquele ano a performance de Elvis estava em alta. Ele estava realmente empolgado com a música, porém os anos se passaram e o entusiasmo decaiu. Nesse show no Madison Square Garden ainda temos uma boa apresentação de "Suspicious Minds", afinal Elvis a estava cantando pela primeira vez em Nova Iorque. Porém essa também foi uma das últimas grandes interpretações dele. Dentro de poucos anos Elvis foi tirando a canção de seu repertório, até que ela se tornou apenas esporádica em seus concertos. Chegou uma hora em que ele realmente cansou dela.

FOR THE GOOD TIMES (Kris Kristofferson) - De inédito mesmo o disco trazia "For The Good Times". Elvis não a tinha gravado em estúdio, estava apresentando pela primeira vez em Nova Iorque (e em um álbum de sua discografia oficial), por isso era um bom motivo para se comprar o LP na época. Imagine você sendo um fã de Elvis, entrando numa loja de discos, pegando esse vinil nas mãos e percebendo que havia ali uma música de Elvis que você nunca tinha ouvido antes. Certamente compraria o disco. Por isso também esse álbum foi um dos mais vendidos durante os anos 70. Além de ser o registro de um show marcante em sua carreira, ainda trazia como bônus músicas inéditas em sua discografia. Duas ótimas razões para comprar o disco.

AMERICAN TRILOGY (Adaptado por Mickey Newbury) - Já a aclamada "American Trilogy" surgia pela primeira vez em um disco de Elvis Presley. Em minha opinião a melhor versão ainda seria lançada, seria a do "Aloha From Hawaii", um ano depois. Essa versão do Madison Square Garden tem seus méritos, porém também não a acho muito bem executada. Essa canção aliás quebrou um pouco o ritmo do show, que vinha em um ritmo rápido, de pura energia. Já Trilogy pedia por outra postura, algo reflexivo, diria até épico. O público em Nova Iorque, muito cosmopolita, não comprou bem a ideia de uma canção histórica que louvava os ideais do sul confederado na guerra civil. Era algo tão distante da realidade daquele público como a Lua!

FUNNY HOW TIME SLIPS AWAY (Willie Nelson) - O country "Funny How Time Slips Away" certamente teve uma melhor receptividade. É fácil de entender isso. Sem o background histórico e o peso de tentar ser épico de "American Trilogy", essa canção era bem mais leve, soft, evocando aquela imagem do lirismo do caipira apaixonado do interior dos Estados Unidos. Uma figura mais agradável do que a de um soldado confederado com seu uniforme cinza e rifle da música "American Trilogy", que aliás deveria ter sido tirada por Elvis da seleção musical desse concerto. Essa "Funny" já tinha sido lançada antes no "Elvis Country" por isso também não era novidade, pelo menos em sua versão "Studio".

I CAN'T STOP LOVING YOU (Don Gibson) - "I Can't Stop Loving You" também entrou na seleção musical desse show. Um registro tão country assim certamente não iria fazer a cabeça do público de Nova Iorque, o mais cosmopolita dos Estados Unidos. Mesmo assim todos aplaudiram respeitosamente. Elvis parece ter percebido no palco que a canção não empolgou muito os ouvintes, por isso a encurtou, para uma versão rápida de pouco mais de dois minutos. Faltou mesmo alguém para dar um toque para Elvis, para não incluir a faixa na apresentação. Não iria funcionar mesmo, em nenhuma hipótese. Aquilo era encarado em Nova Iorque como música de caipira.

CAN'T HELP FALLING IN LOVE (Peretti/Creatore/Weiss) - Existem aqueles sucessos que obrigam o cantor a interpretar a mesma música show após show, sem interrupções. Isso claramente causa um desgaste psicológico em quem canta. Não é fácil ficar cantando a mesma música anos a fio. E quando se escolhe o tema para ser o final dos concertos a coisa piora ainda mais. "Can't Help Falling In Love" foi escolhida para encerrar os shows de Elvis. Isso significa que ele a cantou milhares de vezes durante os anos 70. Conforme o tempo foi passando a pressa foi estragando a linda melodia da gravação original. No palco Elvis mostrava certa impaciência com ela, como se quisesse encerrar mais um show (algo até bem compreensivo). Por essa razão não considero essa uma grande performance. Segue basicamente a ansiedade de todas as demais versões desse período.

Elvis Presley - Elvis as Recorded at Madison Square Garden (1972): Elvis Presley (voz e violão) / James Burton (guitarra) / John Wilknson (guitarra) / Charlie Hodge (violão e vocais) / Jerry Scheff (baixo) / Ronnie Tutt (bateria) / Glen Hardin (piano) / J.D.Summer and the Stamps (vocais) / The Sweet Inspirations (vocais) / Kathy Westmoreland (vocais) / Joe Guercio Orquestra / Harry Jenkins e Joan Deary (produção e arranjo) / Data de Gravação: 10 de junho de 1972 / Local de Gravação: Madison Square Garden, Nova Iorque / Data de Lançamento: junho de 1972 / Melhor posição nas charts: #11 (EUA) e #3 (UK)

Pablo Aluísio.