domingo, 3 de fevereiro de 2013

Cada Um Vive Como Quer

Caso raro de título nacional que se encaixa muito bem na trama do filme. “Cada Um Vive Como Quer” é justamente o espírito desse argumento muito interessante onde acompanhamos o dia a dia de Bob (Jack Nicholson), um trabalhador comum dos campos de extração de petróleo no interior dos EUA. Ele não gosta do emprego mas segue em frente pois afinal é um trabalho para se viver. Nas horas de folga vai ao boliche com seus colegas de trabalho. Bebe e se diverte. Também mantém um relacionamento com Rayette (Karen Black), uma garçonete sem educação que fala pelos cotovelos – geralmente besteiras. Mesmo assim tenta manter esse namoro que obviamente não vai a lugar nenhum. O que parece ser o retrato de vida de um típico operário americano muda de foco quando Bob sabe através de sua irmã que seu pai que mora em outro estado sofreu dois derrames e se encontra impossibilitado de falar e expressar qualquer emoção. Chocado ele resolve fazer uma visita ao velho. Lá chegando o seu passado finalmente se revela. Bob (Nicholson) não é apenas um operário qualquer mas sim um sujeito talentoso que teve uma das melhores educações do ramo musical clássico. Embora seja um instrumentista raro e de habilidade ímpar ele não soube lidar com a pressão da profissão e resolveu largar tudo, vivendo da maneira como achava melhor.

“Cada Um Vive Como Quer” é um ótimo momento da filmografia do ator Jack Nicholson. O considero um dos três maiores atores vivos ao lado de Al Pacino e Robert De Niro. Aqui Jack está brilhante como um homem que larga tudo para viver da forma que bem entende, mesmo que para isso subestime seu talento e sua virtuosidade no piano clássico. Podendo lutar por um lugar em qualquer orquestra do país ele resolve trilhar outro caminho, exercendo profissões que geralmente são ocupadas por trabalhadores sem educação ou qualificação profissional. Vira um homem comum, vivendo uma vida comum. Seu retorno a casa de seu pai é o grande catarse do roteiro pois lá ele reencontra todos os familiares e amigos que fizeram parte de sua vida, professores de música, intelectuais e escritores, um ambiente completamente diferente do que vive no momento, pois seu círculo de amigos é formado basicamente por membros iletrados do operariado. Até sua nova namorada, uma garçonete histriônica, não parece se encaixar em nada no ambiente culto em que cresceu. Desse choque de realidades nasce o conflito interno do personagem. Jack demonstra isso de forma brilhante em sua caracterização. Sempre beirando a depressão, indeciso sobre suas próprias escolhas na vida, ele hesita bastante antes de seguir em frente. A cena final é sintomática nesse aspecto quando Bob simplesmente resolve dar mais uma guinada nos rumos de sua vida.  A indicação ao Oscar de Melhor Ator para Jack Nicholson foi mais do que merecida (ele perderia o prêmio para George C. Scott nesse ano). O estilo e o desenvolvimento do enredo pode ser até mesmo considerado cru, se comparado com o cinema atual, mas isso em nenhum momento desmerece ou diminui o ótimo roteiro que Bob Rafelson soube tão bem lapidar. Outro destaque é a ótima trilha sonora com muito country e música clássica (uma mistura bem incomum). Enfim, ótimo drama sobre o cotidiano ordinário e as lutas internas travadas por um homem comum que busca um rumo definitivo em sua vida.

Cada Um Vive Como Quer (Five Easy Pieces, Estados Unidos, 1970) Direção: Bob Rafelson / Roteiro: Bob Rafelson, Carole Eastman, Carole Eastman / Elenco: Jack Nicholson, Karen Black, Billy Green Bush / Sinopse: Bob é um operário da indústria petrolífera que esconde em seu passado uma realidade que em nada lembra sua atual situação econômica e social. Indicado aos Oscars de Melhor Filme, Melhor Ator (Jack Nicholson), Melhor Atriz Coadjuvante (Karen Black) e Melhor Roteiro Original.

Pablo Aluísio.

2 comentários:

  1. Pablo:
    Me desculpe o fora do tópico mas ontem re-assisti o Cães de Aluguel do Quentin Tarantino e me lembrei do nosso colóquio sobre o racismo velado do Tarantino em Django. Por favor assista, ou re-assista, o Cães de Aluguel e veja se percebe modo Tarantinesco de ver os negros.
    Em tempo: eu não sou negro nem ativista da causa negra, se trata somente de coerência.


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  2. Faz muito tempo que vi Cães de Aluguel. Quando tiver a oportunidade irei assistir novamente. Abraços, Pablo Aluísio.

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