Quem é fã da velha geração sabe que até alguns anos atrás a única oportunidade de se ouvir Elvis ao vivo era através de seus discos oficiais que eram lançados comercialmente no Brasil. Numa época em que não havia internet o fã ficava restrito ao que era disponibilizado pela gravadora nas lojas. Muitas vezes o disco era lançado na época e nunca mais relançado deixando todos os fãs com as mãos abanando. Isso aconteceu com muitos LPs de Elvis. A grande maioria de seus títulos oficiais só foram lançados nos anos 60 e 70 e nunca mais chegaram nas lojas comuns. Esse infelizmente foi o destino de grande parte de seus discos dos anos 70. Para o fã brasileiro da era pré internet a única chance de se chegar a ouvir um disco oficial nessa situação era ter a sorte de encontrá-lo perdido em algum sebo ou então comprá-lo de outro colecionador. Além do preço exorbitante tínhamos de conviver com o mal estado desses discos, fruto natural de anos e anos de uso pelos seus antigos donos. Porém houve honrosas exceções nesse estado de coisas.
Em 1986 a RCA Brasil, em um raro gesto de generosidade, lançou o LP "On Stage - February 1970" nas lojas! Nem é preciso dizer que tal lançamento foi um verdadeiro choque para os fãs brasileiros. Não era todo dia que se conseguia encontrar nas lojas de vinis um LP oficial de Elvis dos anos 70, tinindo de novo. Todos estavam acostumados apenas com a velhas e cansadas coletâneas como "Disco de Ouro" e outros derivativos, sem nada de atraente para o colecionador desse cantor. O evento foi tão marcante que até hoje me lembro da primeira vez que ouvi o On Stage. Foi um marco. Apenas dez músicas gravadas ao vivo em Las Vegas na segunda temporada do astro. Elvis demonstrava grande poder vocal, pleno domínio de palco, ótima interatividade com os fãs e um repertório novo e contagiante. Embora fosse um jovem fã dos anos 80 penso que essa também foi a sensação dos fãs que o ouviram pela primeira vez nos anos 70. Hoje com a popularização da internet e com a proliferação e divulgação sem limites de seus discos, uma sensação como essa que senti nos anos 80 soa banal e fora de contexto para o fã jovem atual, porém de certa forma me sinto privilegiado de ter vivenciado algo assim.
Sempre considerei "On Stage" um dos trabalhos mais coesos da carreira de Elvis. Tal como foi concebido o disco é redondo e flui com extrema naturalidade, embora saibamos que ele é fruto de montagem, inclusive de apresentações diferentes do cantor. Sempre o terei entre os meus preferidos, fazendo eternamente parte da minha lista dos melhores registros de Elvis ao vivo em sua carreira. Pois bem, 21 anos depois de ouvir pela primeira vez o "On Stage" chegou em minhas mãos o CD bootleg "Closing Night - February 1970". O contexto obviamente é completamente diverso. O que antes era raro e complicado de se encontrar hoje está ao alcance da mão (ou melhor dizendo, do mouse) de qualquer garoto pré-adolescente. Basta um click e o CD está disponível para ouvir por qualquer pessoa. Embora ainda hoje tenhamos colecionadores que primem pelo material original (ou seja, aquele que compra o CD pela mesma net e espera pela chegada em sua casa do produto) chegaremos em breve ao estado em que não se necessitará mais de um suporte material para a música, que simplesmente viajará pelo espaço virtual sem qualquer tipo de limitação, algo completamente fora de imaginação para um garoto dos anos 80 que tinha a audácia de tentar colecionar a discografia de Elvis naquela época.
Porém como tudo na vida temos também o lado negativo. Não existe mais a sensação de descoberta que tive ao ouvir pela primeira vez o "On Stage", embora ao ouvir o bootleg em questão tenha constatado que o brilhantismo de Elvis no palco ainda está lá, sem nenhum sinal de ofuscamento, mesmo após anos e anos de repetição. Isso era mais do que óbvio. As três primeiras temporadas de Elvis em Las Vegas (a primeira em 1969 e as duas de 1970) são fantásticas. Embora Elvis tenha feito alguns shows abaixo da média nessa última, em todos os registros das demais apresentações sempre escutei um cantor no auge, focado nos concertos, cantando de forma impecável, apresentações dignas de seu mito. Os diversos problemas de sua vida pessoal ainda não tinham adentrado no palco. Elvis esbanjava versatilidade, disposição e interesse. O repertório era novo e empolgante e o astro dava o melhor de si. São momentos majestosos. Por essa razão Closing Night - February 1970 é extremamente necessário ao fã do cantor. Não há versões medíocres aqui. O CD pode ser dividido em três partes:
A primeira traz o show do dia 23 de fevereiro de 1970. A segunda parte traz parte dos ensaios realizados por Elvis no dia 18 desse mesmo mês e por fim a terceira e última parte traz a entrevista coletiva dada por Elvis antes de seu primeiro concerto em Houston no Texas. O concerto do dia 23 é tecnicamente excelente. Três ótimas versões abrem o show: All Shook Up, I Got a Woman e Long Tall Sally. O primeiro grande destaque dessa primeira parte vem logo a seguir: Elvis apresenta uma ótima versão ao vivo de Don´t Cry Daddy. A execução é bem mais rápida que sua versão de estúdio o que acaba trazendo maior leveza ao conjunto. Não há dúvidas que tudo se traduz em um ótimo momento. Outra versão digna de nota é a de Kentucky Rain. É outra representante ao vivo de um dos melhores registros em estúdio da carreira de Elvis. Embora a música pudesse trazer problemas em sua execução ao vivo para Elvis e banda, eles se saem extremamente bem no saldo final, o que demonstrava o grande apuro técnico da TCB Band naquele momento.
O concerto segue sem grandes sobressaltos e surpresas. Elvis está bem em praticamente todas as faixas. Brinca um pouco na doce Sweet Caroline, apresenta uma ótima Polk Salad Annie (novidade e grande sucesso da temporada) e generosamente vai ai piano cantar um medley delicioso de Blueberry Hill / Lawdy Miss Clawdy (onde Elvis tenta de forma divertida e desastrada tocar Blueberry Hill até o fim e desiste logo, emendando para uma boa versão de Lawdy, Miss Clawdy). Como se não bastasse até traz uma homenagem ao seu grande hit do passado, It´s Now Or Never (aqui com arranjo bem mais simples e eficaz do que as posteriores que contariam com as péssimas introduções vocais de Sherril Nielsen). De quebra Elvis ainda se arrisca a tirar algumas notas de sua guitarra elétrica na faixa One Night. A parte do show se encerra com competentes versões de Suspicious Minds (muitos anos antes de cair na mesmice) e Can´t Help Falling In Love (com sua linda melodia de sempre). A segunda parte do CD traz algumas curiosidades interessantes.
A primeira delas é a versão de Walk A Mile In My Shoes do dia 18. A principal curiosidade dessa versão é o momento em que Elvis perde o fio da meada da música e passa batido na sua parte. Depois disso ele até ameaça perder o controle e cair na risada mas se recupera bem e termina a canção sem maiores imprevistos. Na parte de ensaios ouvimos duas versões da marcante The Wonder Of You. Na primeira tentativa Elvis erra a letra e se diverte. Mesmo com esse ligeiro contratempo não há como negar a grandiosidade dessa canção, uma das mais vibrantes e robustas do repertório de Presley. No segundo registro banda e vocais tentam se encontrar nos ensaios, Elvis comparece com seu tradicional talento. Embora incompleta podemos ouvir com clareza a famosa apoteose final, marca registrada da música. A terceira e última parte do CD traz partes da entrevista que Elvis concedeu momentos antes da série de seis concertos que realizou em Houston. Embora interessante fica um pouco fora do contexto, mesmo que o show tenha ocorrido em cima da temporada de Vegas. Ficaria melhor situada em um CD sobre Houston mas enfim... Elvis se mostra simpático, comenta amenidades, fala se seus anos na Sun e faz sua parte na promoção dos concertos - que seriam grandes sucessos de bilheteria, abrindo as portas para suas futuras turnês pelo país nos anos 70. Enfim, o CD Closing Night - February 1970 é extremamente recomendado. Com ele o legado do antigo vinil On Stage - February 1970 está bem preservado e representado.
Elvis Presley - Closing Night - February 1970: Selo: Madison - Músicas: All Shook Up - I Got a Woman - Long Tall Sally - Don´t Cry Daddy - Hound Dog - Love Me Tender - Kentucky Rain - Let It Be Me - I Can´t Stop Loving You - CC Rider - Sweet Caroline - Polk Salad Annie - Intrumental Intermezzo - Introductions Of Vocalists, Band Orchestra - Blueberry Hill / Lawdy Miss Clawdy - Heartbreak Hotel - One Night - It´s Now Or Never - Suspicious Minds - Can´t Help Falling in Love - 1970 Bonus Tracks: Walk a Mile In My Shoes - The Wonder Of You - The Wonder Of You - Press Conference Houston, Texas. Data de gravação: 23 de fevereiro de 1970, Las Vegas.
Pablo Aluísio.
Avaliação:
ResponderExcluirProdução: ★★★
Arranjos: ★★★
Letras: ★★★
Direção de Arte: ★★★
Cotação Geral: ★★★
Nota Geral: 7.7
Cotações:
★★★★★ Excelente
★★★★ Muito Bom
★★★ Bom
★★ Regular
★ Ruim
Pablo, duas coisas:
ResponderExcluir1 - Eu não sabia que havia algum show mais fracos no final da temporada de 1970, conforme você escreve, justamente a temporada em que foram tiradas as musica do Elvis e Assim.
2 - Você também não gostava da participação solo absurda e intrometida do Sherril Nielsen nos shows do Elvis?
Normal de acontecer por causa do cansaço pois eram muitos shows em curto espaço de tempo.
ResponderExcluirNas primeiras audições ainda dava para ouvir, depois ficaram muito irritantes...
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