sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Morte em Andrômeda

Cap. 1 - A Viagem Sem Fim
O universo não é um lugar agradável para se estar. Na verdade é um ambiente hostil para a vida humana. Estamos em 3973. O ser humano finalmente conseguiu romper as barreiras que o deixavam preso na Via Láctea, a galáxia que é nosso lar. Agora uma nave denominada Station Eagle 183 finalmente conseguiu entrar em nossa galáxia vizinha, a espetacular Andrômeda! Foi uma viagem cósmica construída sobre muito sofrimento. Várias missões fracassaram. Centenas de astronautas morreram. Apenas a cosmologia e a física avançada conseguiram romper as barreiras do tempo e espaço.

A Station Eagle 183 é uma dádiva da tecnologia humana. Uma nave com 240 metros de comprimento e 90 metros de largura. Nela viaja apenas 5 tripulantes. O capitão Andrew Sizemore é o comandante da missão. Piloto de carreira. A primeira tenente Monroe é sua imediata. Some-se a isso o engenheiro Rick Sladd e a médica Lorelay Smith. O cientista Robert Calister é o encarregado científico da expedição. Poucas pessoas, alguns mais observadores poderiam dizer. Na verdade eles estão amparados por milhares de pessoas na Terra. São apenas seres humanos avançados que executam a missão em nome e supervisionada por milhares na base.

Uma viagem como essa é extremamente cansativa e coloca o ser humano no limite. Há perda de massa muscular, capacidade motora e desgaste psicológico extremo. Experimente ficar confinado dentro de uma nave, por mais espaçosa que ela seja, por dez anos. É enlouquecedor! Apenas os mais fortes suportariam algo assim. É realmente se doar por uma causa, dar uma vida para realizar algo que ficará pela história. Só que naquele momento, depois de tantos anos, só existia mesmo a exaustão psicológica da viagem. Todos os tripulantes estavam no limite. Alguns deles transformaram as marcas psicológicas em marcas físicas. O capitão, outrora um homem alto e forte, havia ganho muito peso e estava com os cabelos completamente brancos. Síndrome de Maria Antonieta. Ele passou por tantas pressões, por tantos momentos ruins e de frustração, que agora era apenas uma sombra do homem que um dia fora.

Robert Calister já era um homem velho quando a missão começou. Agora sofria de fortes dores na coluna. Ele era um sujeito sagaz e astuto, mas as dores físicas o tinham colocado à nocaute. Na verdade o que aconteceu foi que um gatilho psicológico foi acionado depois de alguns anos de viagem. O que havia começado com ares de heroísmo e frenesi na mídia, logo caiu no desinteresse popular. A missão seguia seus passos, mas o público na Terra não se interessava mais pelos resultados. Eles agora eram ignorados pela grande mídia na Terra. Dizia-se que tinham entrado em uma missão sem fim. Muitos inclusive nem acreditavam que estavam mesmo no espaço. A desinformação corria solto. E com tanta coisa negativa a tripulação acabou perdendo o entusiasmo, o vigor jovial. Estavam todos pra baixo, corroídos por viverem tanto tempo dentro de uma nave. O ser humano definitivamente não nasceu para esse tipo de situação. 

A missão tinha como objetivo principal explorar alguns planetas situados em zonas habitáveis de suas estrelas. Claro que uma galáxia como aquela tinha milhares de estrelas, sendo que algumas delas apresentavam planetas. Poderia haver vida neles? E se houvesse vida, como ela seria? Baseada em Carbono como em nosso planeta? Na Terra a base havia traçado um protocolo a se seguir, onde a expedição teria que orbitar pelo menos 5 exoplanetas bem promissores. A tripulação naquela altura já havia estudado tudo sobre eles, então agora era apenas uma questão de chegar em seu destino inicial. O que poderia haver de tão espetacular a se descobrir naquela região remota do universo? 

Cap. 2 - O Planeta de Prata
Relatório espacial Sxh - Ps0148934-HD 6114. O texto a seguir é verídico, com testemunhas assinadas por toda a tripulação da nave Eagle. O comandante da nave desceu até o planeta HD 6114-b, situado no sistema planetário que circula a estrela HD 6114, da galáxia de Andrômeda. Tal planeta recebeu vulgarmente o nome de Planeta de Prata por causa da grande incidência desse metal em sua base territorial.

Visualmente temos uma belo planeta visto de sua órbita, com uma coloração realmente linda ao depararmos com a luz de sua estrela incidente. Não há sinal de vida ou água liquida no planeta, apesar de sua temperatura ser considerada amena (algo em torno de 25 graus Celsius). O planeta apresenta cor cinza, muito em decorrência de suas enormes jazidas de prata. O comandante desceu ao solo sozinho, reforçado com pouca segurança pessoal a não ser uma pequena arma de laser.

Não tirou seu capacete por questões de segurança. Há alta concentração de elementos químicos pesados em sua atmosfera, portante apesar de ser um planeta em zona habitável não parece haver possibilidade de vida tal como a conhecemos. Há mares e lagos de prata derretidos, o que não deixa de ser algo incomum que vai até mesmo contra as leis da física que rege o universo. Como isso seria possível? Pergunta que segue sem respostas.

O comandante esteve à beira de um desses lagos prateados. E logo a seguir transcreveremos suas falas transmitidas por rádio até nosso espaçonave: "Trata-se de algo que nunca tinha visto. A Prata se encontra em estado semi líquido. Não é líquido que se coloque nas mãos e que venha a escorrer entre os dedos. Está mais para algo pastoso, como se fosse um creme com muita densidade. Visualmente é algo excepcionalmente belo, a visão mais bela que já vi em toda a minha vida!"

E segue a transcrição: "Estou aqui parado olhando toda essa imensidão de prata semi derretida. O chão na beira do lago é firme, sem sinais de vida marinha... Nenhuma concha ou algo semelhante... Algum ser vivo poderia viver em um lago de prata como esse? Penso ser impossível... mas espere... estou reconhecendo ondas, como se algo nadasse embaixo desse lago de prata... Meu Deus!..."

Depois de mais ou menos três minutos em silêncio o comandante finalmente respondeu: "Eu não estou louco... eu não estou louco... mas vou reportar o que estou vendo senhores... É uma criatura que poderia dizer ser uma figura feminina, com longos cabelos platinados e seios firmes.. só que ao invés de pernas temos longas nadadeiras.. Eu sei que vou passar como um homem louco, mas vou dizer mesmo assim... São sereias nesse lago de Prata! Meu Deus... Meus Deus... O que posso fazer? Vou imediatamente para a nave..."

Depois dessa transmissão as comunicações foram cortadas, nenhum sinal de rádio do comandante. Sensores indicam que ele foi atacado de forma violenta a 10 metros da nave. Criaturas que parecem saídas do lago de prata, rastejando rapidamente em sua direção, em terra firme. Não houve tempo de entrar na nave. O comandante foi atacado. As tais sereias de prata o atacaram com garras poderosas. Suas mãos foram tomadas de grandes garras.. Sua roupa de astronauta foi rasgada... E sua carne foi devorada enquanto as sereias voltavam para o lago de prata. Confirmamos vida extraterrestre hostil no planeta de Prata - Repetindo, confirmamos vida hostil e desconhecida no planeta HD 6114-b, vulgo Planeta de Prata. Esperamos por novas ordens. Câmbio desligo!". 

Cap. 3 - Fúria
A tenente Judy Monroe ficou furiosa com a morte do comandante da nave. Não apenas por ter sido trágico e colocado ela no comando da missão, mas também porque ela queria matá-lo com requintes de crueldade. Durante alguns anos da viagem o comandante a assediou sexualmente. E isso a enfurecia. A rebaixava como mulher e como profissional. Ela queria ter sua chance de vingança contra aquele bastardo, machista e escroto. Em seu diário pessoal de viagem ele gravou o seguinte desabafo:

"Maldito miserável! Que mil maldições o levem direto para as profundezas do inferno! Desgraçado maldito, cão maldito! Eu queria te matar maldito, esse direito era meu. Queria enfiar uma faca na sua barriga, ver o sangue escorrendo por sua boca imunda, queria derramar ácido dentro de seu cérebro aberto! Maldito! Maldito! Que mil maldições recaíam sobre você e todos os malditos que formam sua família. Que apodreça para sempre nos confins do inferno, que beije o piso das fossas infernais! Uma pena que jamais terei a oportunidade de cuspir em sua cova pois nem cova você terá no espaço. Eu vou te jogar no espaço junto com o lixo da nave... ah se vou!".

Só que esse prazer sórdido a tenente não teria. Não havia corpo para ser jogado no espaço. O comandante foi trucidado por organismos daquele planeta de prata. Claro que não eram sereias como ele havia comunicado. Na verdade seu cérebro já não funcionava direito na hora do ataque, fruto provavelmente de algum gás alucinógeno que entrou em seu sistema de respiração. Poderia haver algum problema no capacete. Como não havia como conferir tudo, pois o comandante havia sido arrastado pelas criaturas daquele estranho planeta tudo havia sido deixado de lado. O relatório de certa maneira ficaria inconclusivo.

So que navegar era preciso, viver não era preciso. Pelo menos em relação àquela nave espacial viajando pela galáxia de Andrômeda. A tenente, agora comandante da Eagle, abortou qualquer outra descida naquele planeta. A nave havia ficado com apenas 4 tripulantes agora. Situação complicada. Por controle remoto ela trouxe de volta a espaçonave pequena que havia levado o comandante até aquele planeta. Assim que ela foi acoplada a Eagle saiu de sua órbita. O destino agora seria o planeta mais escuro do universo. Apesar de não haver luz de sua estrela em sua atmosfera, ele ainda estava em zona habitável de seu sistema estelar. Era um dos destinos da expedição desde o começo.

E o planeta de prata? A tenente Judy Monroe ao lado de seu oficial de ciências concluiu que aquele planeta apresentava vida. Sua natureza era desconhecida. Eram criaturas que agiam como predadores e que habitavam as águas de prata derretida de seus mares e oceanos. Não eram sereias como o comandante havia descrito. Na verdade a atmosfera corrosiva do planeta continha algum gás desconhecido que causava alucinações nos seres humanos. O traje especial não protegia contra esse gás. Por isso o comandante morreu pensando estar sendo levado por sereias. Havia seres ali, mas definitivamente não eram sereias. Eram criaturas que podiam atacar, matar e comer um ser humano.

Qualquer outra expedição que fosse enviada para aquele planeta teria que descer em seu solo fortemente armados. E isso era tudo o que havia para reportar. Sem o corpo do comandante não havia como tirar maiores conclusões. Deixando o planeta de prata para trás a Eagle seguiria em frente em sua missão espacial programada para durar cinco anos em Andrômeda, a nossa galáxia vizinha.

Cap. 4 - A obra-prima do universo
Morrer no espaço é bom. Imagine o cosmos com toda a sua imensidão absurda e saber que nada nesse vazio imenso vive. O que pode ser considerado vida? Não há vida inteligente como a que conhecemos, essa é a verdade realmente. Não existe, o que existe são seres unicelulares, ou muito simples. Que vivem em fossas de água em planetas distantes, inóspitos. Universo, o grande vazio. O que me faz pensar que realmente não deve haver uma inteligência por trás dessa criação, porque se houvesse, haveria inúmeras civilizações pelo espaço e isso simplesmente não há. O ser humano parece ser a única vida inteligente, solitária, suprema do universo, nada parece ter alguma semelhança conosco. 

E assim, as viagens espaciais a longo dos anos se transformaram em grandes e infinitas viagens vazias, nesse deserto entre estrelas. Onde nada parece prosperar, onde nada parece viver, apenas o vazio imenso de estrelas quando rodeadas por planetas isentos de vida, lugares sem objetivos. Lugares totalmente remotos. E nada condizentes com a vida humana. E assim segue o homem na busca de estrelas, em busca de um espelho, em busca de algum ser que lhe seja parecido, mas que no final da estrada nunca parece ser encontrado. 

O que será da humanidade? Das estrelas? Do Sol? Que nem é uma grande esteira em termos de cosmos, mas que é a nossa Estrela. A estrela Sol vai explodir, vai entrar em supernova. E nada vai existir além dela. O nosso planeta vai ser pulverizado por chamas. Tudo o que nós conhecemos, todos os lugares que vivemos. Todas as regiões do Globo vão desaparecer em questão de segundos. A humanidade está fadada a ser destruída, a não ser que fuja para as estrelas, e isso vai ser algo bem complicado de se realizar, porque as distancias do espaço são abissais ao ser humano. O homem é um ser ridículo perto do universo. Um grãozinho de Areia numa praia distante, selvagem, em termos cósmicos, alguma coisa infinitamente medíocre. A não ser o fato de que ele pensa. Tem consciência de si mesmo, algo que os nem os mais enormes planetas e estrelas do universo possuem. Uma vez que são meros astros inertes e sem vida. A esterilidade parece ser a regra nesse universo sem fim. E o ser humano tem vida. Somos a obra-prima do universo.

Pablo Aluísio.

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