quarta-feira, 2 de fevereiro de 2005

Elvis Presley - I Got a Woman / I'm Counting On You

Elvis Presley - I Got a Woman / I'm Counting On You
Mais um single extraído do álbum "Elvis Presley" de 1956. A RCA Victor não estava deixando barato, tentando fazer com que as músicas desse disco rendessem o máximo possível. Queriam recuperar o dinheiro investido na contratação de Elvis na Sun Records da maneira mais rápida possível. Não era para tanto, gato apressado come peixe cru. Elvis iria se tornar o artista mais lucrativo da história da gravadora nos anos seguintes. Era apenas uma questão de esperar e trabalhar bem seu potencial dentro do estúdio. Pois bem, esse single trazia como Lado A o clássico de Ray Charles, "I Got a Woman", uma música com ritmo gospel e letra das mais profanas. Uma curtição dele com os fundamentalistas religiosos. Elvis ignorou isso e a gravou, apenas porque gostava muito da canção. 

E há um aspecto nisso que não podemos ignorar. Ray Charles não gostava de Elvis. Chegou ao ponto de ofender ele em uma entrevista, dizendo sem meias palavras que Elvis era um vagabundo e que não queria ter nenhum contato com ele. Aquela velha coisa de ladrão da música negra, algo que iria atravessar Elvis e seu valor como artista por anos a fio. Ele sempre seria acusado disso. O velho estava com a alma envenenada em direção a Elvis. Fico até surpreso com o fato de Ray Charles ter dado autorização para que Elvis gravasse sua criação, afinal ele não tinha nenhuma simpatia com o jovem cantor de Memphis. Elvis, por sua vez, nunca respondeu as ofensas, preferindo o silêncio. Aliás nem mesmo se sabe se ele chegou a tomar conhecimento disso. Ao contrário, iria gravar outras músicas de Ray Charles nos anos seguintes e tornaria "I Got a Woman" uma música fixa em seu repertório de shows durante os anos 70. Eram águas passadas. 

Elvis Presley - I Got a Woman / I'm Counting On You (1956)
Lado A: I Got a Woman
Lado B: I'm Counting On You 
Produção: Steve Sholes
Selo: RCA Victor

Pablo Aluísio. 

Elvis Presley - Blue Suede Shoes / Tutti Frutti

Elvis Presley - Blue Suede Shoes / Tutti Frutti
Claro que esse single traz dois dos maiores clássicos do rock em seu surgimento. Só que temos que colocar tudo sob uma perspectiva dentro da discografia americana. Nos Estados Unidos esse compacto não teve todo o impacto que alcançou nos demais países do mundo. Na América do Norte ele foi visto apenas como um single promocional do álbum "Elvis Presley" de 1956. As duas músicas assim foram encaradas como meras reprises do material que já tinha sido lançado no disco original, no LP. 

A RCA Victor nem se esforçou muito em promover o pequeno compacto. Por essa razão o compacto nem se destacou tanto assim nas paradas de vendas norte-americanas. Foi um vinil considerado secundário no mercado, apenas para promover o disco completo. Já no resto do mundo foi aquele estouro de vendas. Duas das canções de rock mais fortes do repertório de Elvis fizeram com que o single vendesse milhões de cópias na Europa e no Japão! Até mesmo no Brasil o disquinho foi lançado ainda em uma versão de compacto 78 rotações, porque a indústria brasileira ainda estava um pouco fora de rota do que se fazia lá fora, ainda era tecnologicamente atrasada. Inclusive em nosso país o grande hit foi o lado B com "Tutti Frutti". Chegou a tocar muito nas rádios fluminenses e de São Paulo. Era o puro rock que os brasileiros começavam a conhecer. Os jovens adoraram e os mais velhos acharam uma barulheira! 

De qualquer forma esse single é sem dúvida um marco na discografia de Elvis. A RCA por sua vez lançou basicamente duas versões, uma apenas com uma capa genérica da RCA, branca, cortada no meio para destacar o selo do single, sem firulas e com preço promocional e outra mais bem trabalhada, trazendo a mesma direção de arte da capa do primeiro LP de Elvis na gravaora. Essa era um pouco mais cara nas lojas de discos. Item de colecionador, sem sombra de dúvidas. 

Elvis Presley - Blue Suede Shoes / Tutti Frutti (1956)
Lado A: Blue Suede Shoes
Lado B: Tutti Frutti
Produção: Steve Sholes
Selo: RCA Victor

Pablo Aluísio. 

terça-feira, 1 de fevereiro de 2005

Elvis Presley - O Primeiro Álbum

Hoje andei ouvindo novamente o primeiro álbum de Elvis Presley. Fazia tempo que tinha parado para ouvir com maior atenção. É curioso. Remoendo minhas velhas lembranças me recordo que comprei o segundo disco antes desse, o que me levou a ter uma impressão de que o primeiro álbum de Elvis era bem menos rico musicalmente do que o segundo. De certa maneira isso é uma verdade já que as sessões que deram origem a "Elvis" (1956) contaram com mais recursos, mais músicos, mais instrumentos, enfim, mais capricho. Além disso não podemos esquecer que o First Album contava com várias canções dos tempos da Sun Records e essa gravadora, como bem sabemos, era uma pequena empresa, quase fundo de quintal. Recursos tecnológicos e produção requintada realmente não eram bem com eles (pobre Sam Phillips!).

Pois bem. O disco abre com "Blue Suede Shoes" que é definitivamente um dos maiores clássicos da história do Rock mundial. É interessante que li muitas e muitas vezes certos jornalistas dizendo que Carl Perkins, autor da música, era o predestinado para seguir o sucesso de Elvis. Um acidente o tirou de cena e abriu caminho para que Elvis se tornasse quem foi! Será mesmo? Olhando para trás, hoje mais maduro, não posso deixar de pensar que esse pensamento é de uma bobagem sem tamanho. Quem em sã consciência realmente criou tamanha abobrinha que perdurou por anos e anos a fio em revistas e livros? Santa bobagem, Batman. Mas enfim.... são clichês do jornalismo. Confesso aqui publicamente que nunca gostei muito de "I'm Counting on You" do Don Robertson. Ele era genial em músicas românticas, mas aqui Elvis não chegou a uma gravação irrepreensível. Ficou algo pelo meio do caminho. Talvez sua simplicidade seja um pouco demais da conta.

"I Got A Woman" é aquela música profana que Ray Charles criou em cima de uma linha de melodia gospel. Ele sabia o que fazia. Bem no meio do sul racista e evangélico ele ousou criar algo tão fora dos padrões como essa música. Se já era herege no piano de Charles imaginem o choque que causou na voz de Elvis Presley com toda aquele gingado considerado indecente pelos puritanos. Era certamente uma coisa do capeta encarnado. Depois dela vem "One-Sided Love Affair" do Bill Campbell. Certamente é o primeiro belo arranjo do álbum, uma harmonia maravilhosa entre o vocal inconfundível de Elvis, piano, bateria e demais instrumentos. Estão numa sincronia ímpar. Provavelmente seja a melhor gravação em termos técnicos de todo o álbum, só perdendo talvez nesse quesito para "I'm Gonna Sit Right Down and Cry (Over You)", sim, aquela música que os Beatles tentaram copiar sem sucesso em seu programa de rádio na BBC. Se nem os Beatles conseguiram recriar essa sonoridade imaginem o nível que a música como um todo apresenta. Obra prima.

Já a dobradinha "I Love You Because" e "Just Because" nunca fez muito minha cabeça. A primeira é muito, digamos, melancólica (de um jeito ruim de ser). Falta também um melhor equilíbrio entre vocal e instrumentos de apoio. Elvis está muito à frente o que sempre me intrigou pois ele ao longo da carreira sempre fez questão que sua voz fosse encoberta pelo seu grupo musical (opinião aliás com a qual o Coronel Parker não concordava). A segunda é um skiffle. Até aí nada demais. O problema é que os ingleses acabaram com o tempo se tornando os mestres desse ritmo. Como Elvis não era inglês... Deixemos isso de lado. "Tutti Frutti" talvez seja uma das músicas de Elvis mais conhecidas no Brasil, mas nos Estados Unidos e no resto do mundo ela é mais associada a Little Richard que a compôs e a gravou originalmente. Certa vez Elvis se referiu ao rock como "chiclete". Provavelmente estava lembrando dessa gravação. Maledicências à parte, não há como negar, a gravação de Pelvis é um dos pontos altos do álbum. Só ele tinha essa capacidade de mastigar e engolir a letra de uma música como ouvimos aqui. A cultura adolescente surgiu assim, em gravações como essa, não se engane.

Por fim, não podemos deixar de mencionar a clássica "Blue Moon". Poucos sabem, mas esse take quase foi jogado na lata de lixo da Sun Records porque afinal de contas Elvis esqueceu a letra bem no meio da sessão. Sam Phillips porém viu mais a frente. Ele percebeu que havia uma grande linha melódica ali - e Steve Sholes, produtor de Elvis na RCA Victor também percebeu a mesma coisa. Resultado? Ela foi encaixada no disco. Tinha tudo para ser um take alternativo descartado, acabou virando um clássico absoluto! Nada mal. Então é isso. Nada como ouvir de novo um disco que mudou a história da música para sempre. Ainda acho que o álbum seja esquelético em suas propostas sonoras?! Tudo depende do ponto de vista usado, meu caro, realmente tudo depende...

Pablo Aluísio.

Elvis Presley - Elvis Presley

Esse foi o primeiro álbum do Elvis. Era um garotão contratado pela RCA Victor. Iria dar certo? Bem, era uma aposta da gravadora naquele momento. Claro que eu reconheço o grande valor histórico desse disco, mas curiosamente não é o meu preferido do cantor nosa nos 50. Esse posto vai para o segundo LP dele, lançado nesse mesmo ano. Eu considero o segundo melhor do que esse primeiro. Não o comprei em vinil nos anos 80, como tantos outros discos do Elvis. Só vim adquiri-lo mesmo já no formato CD quando foi lançado aqui em versão nacional (bons tempos quando isso acontecia nos anos 90).

E quais são os destaques desse álbum? As minhas faixas preferidas fogem um pouco do óbvio. "Blue Suede Shoes" e "Tutti Frutti" foram os grande hits, mas vamos deixar elas um pouco de lado. Eu gosto muito de "I'm Gonna Sit Right Down and Cry (Over You)" e "One-Sided Love Affair" em que Elvis explorou todos os seus dotes musicais. "I Got A Woman" é um clássico e "Money Honey" é uma grande faixa de rock. Porém a grande música foi herdada dos tempos da Sun Records. Se trata de "Blue Moon", uma gravação atemporal, ainda hoje muito relevante, mesmo em filmes e coletâneas mais modernas. Enfim é isso. O jovem Elvis ainda era um pouco cru, mas o talento estava lá, a ser lapidado. E logo ele deixaria de ser apenas um nome potencial para ser um grande nome da história da música internacional.

Elvis Presley - Elvis Presley (1956)
Blue Suede Shoes
I'm Counting on You
I Got A Woman
One-Sided Love Affair
I Love You Because
Just Because
Tutti Frutti
Trying to Get to You
I'm Gonna Sit Right Down and Cry (Over You)
I'll Never Let You Go (Lil' Darlin')
Blue Moon
Money Honey

Pablo Aluísio.

terça-feira, 25 de janeiro de 2005

Elvis Presley - The Wonder Of You

Elvis Presley - The Wonder Of You: Elvis With The Royal Philarmonic Orchestra
Esse é o CD do momento em termos de Elvis Presley. Primeiro lugar entre os mais vendidos na Inglaterra, trazendo mais um recorde para a carreira de Elvis. Diante disso vamos tecer alguns comentários sobre esse título nesse primeiro texto que será seguido por outros em breve. A priori eu sou aquele tipo de fã que aprecia os arranjos originais dos discos oficiais de Elvis. Esse sistema de trazer um novo arranjo modernizado não me agrada muito. Mesmo assim vou deixar esse tipo de opinião de lado para analisar o CD de forma mais isenta.

01. A Big Hunk o' Love (Aaron Schroeder / Sid Wyche) - A primeira faixa é o rock "A Big Hunk O' Love". Essa canção foi gravada pouco antes de Elvis seguir rumo à Alemanha para o serviço militar. Essa sessão é até hoje uma das mais celebradas em termos de Rock ´n´ Roll de toda a carreira de Elvis Presley. Foi o auge de sua fase rocker. Seu arranjo original é perfeito pois o rock americano dos anos 50 combinava perfeitamente com esse tipo de sonoridade mais crua e direta. O rock em suas origens era visceral e simples, por isso muitas vezes era considerado selvagem demais pelos padrões musicais dos anos 50. Caberia mesmo um arranjo orquestral por parte de uma filarmônica nesse tipo de música? Pessoalmente acredito que não, porém como essa é a proposta do CD, vamos lá... Particularmente gostei da introdução, com uma belo arranjo de cordas, sendo seguido por um piano ao estilo Fats Domino. Também houve acertos ao colocar a filarmônica em segundo plano, nunca atropelando o vocal de Elvis. O destaque ao piano "anos 50" por toda a canção foi algo que eles não poderiam ignorar. A única coisa que não gostei muito foi a introdução de um coro vocal feminino ao fundo. Não combinou muito bem, devo confessar. No mais a palavra que mais destacaria aqui é diversão. Ficou divertido. A original porém segue sendo insuperável.

02. I've Got a Thing About You Baby (Tony Joe White) - A base de baixo que abre essa nova "I've Got A Thing About You Baby" me lembrou imediatamente de "Baby I Don´t Care" da trilha sonora de "Jailhouse Rock". Claro que foi proposital. Esse novo arranjo porém não me agradou muito e em minha opinião foi o mais fraco de todo o CD. Há uma levada para cima, um clima de comercial de margarina que pouco tem a ver com a proposta da gravação original. Ok, quiseram deixar o clima em alto astral, alegre acima de tudo, porém não combinou. O som Stax foi removido para debaixo do tapete. O uso da percussão mais em destaque também me soou bem desconfortável. Prestem atenção no que vou escrever: esse tipo de arranjo estará completamente ultrapassado dentro de poucos anos enquanto o original gravado por Elvis nos anos 70 seguirá imbatível a atemporal. Efeitos sonoros plásticos demais não resistem ao teste do tempo.

03. Suspicious Minds (Mark James) - Dando continuidade na análise das faixas do novo CD "The Wonder Of You" vamos falar um pouco agora dessa nova versão de "Suspicious Minds". Bom, quando esse título foi anunciado os produtores do projeto disseram que a gravadora iria priorizar as canções menos conhecidas de Elvis, os chamados "Lados B". Ótima iniciativa já que Elvis tem músicas maravilhosas que são completamente desconhecidas do ouvinte ocasional de sua obra. Pois bem, apesar disso os velhos medalhões da discografia de Elvis não poderiam ficar de fora. São os impulsionadoras de vendas e não podem ser ignorados. É o caso do sucesso imortal "Suspicious Minds". Aqui criaram uma introdução intimista, mas preservaram o dedilhado original (pois seria impossível removê-lo). Assim nessa nova versão convivem o novo e o velho arranjo. Em determinados momentos fiquei com a impressão ruim que há duas vitrolas tocando ao mesmo tempo, uma com o single "Suspicious Minds" e outra executando algum disco de música clássica. Ficou estranho! Isso definitivamente não é bom, provando que o novo arranjo orquestral não combinou muito bem com a boa e velha gravação. Na verdade fizeram apenas uma intervenção sonora sem muito resultado prático. Não me convenceu em nenhum momento.

04. Don't (Leiber / Stoller) - Uma das melhores coisas desse CD é esse belíssimo arranjo que foi criado para "Don´t", outra balada gravada na sessão de despedida de Elvis antes de ir para a Alemanha servir o exército americano. Devo dizer que ficou muito bom, mas com alguns probleminhas. O novo coro feminino ficou muito incisivo em minha opinião. A original era mais sutil e delicada. Curiosamente o trabalho dos Jordanaires foi preservado. A razão é fácil de entender. Nos anos 50 uma das principais características das gravações de Elvis era a presença desse ótimo quarteto vocal. Retirá-los era, além de tecnicamente muito complicado, pois suas vozes foram gravadas no mesmo canal da voz principal (a de Elvis) como também tiraria seu sabor nostálgico, o que em canções como essa é praticamente tudo.

05. I Just Can't Help Believin' (Mann / Well) - Escrevi recentemente sobre "I Just Can't Help Believin'" em outro artigo. Acho uma música romântica maravilhosa, standart, que jamais teve o reconhecimento merecido. Entre tantas versões existentes os produtores acertaram em usar a master ao vivo que foi lançada no disco original da trilha "That´s The Way It Is". Isso trouxe alguns problemas, pois canções ao vivo nem sempre são tecnicamente perfeitas, principalmente no fator tempo, mas os ingleses fizeram um belo trabalho, consertando sutilmente seus pequenos erros. E assim como aconteceu com "Suspicious Minds" resolveram preservar parte do arranjo original - principalmente no arranjo de metais de Las Vegas. O vocal feminino foi modificado, o que não me deixou plenamente satisfeito, pois as cantores de palco de Elvis eram extremamente talentosas. Em termos gerais gostei desse novo arranjo, pois preservou o que era possível da bela gravação de 1970. De qualquer forma, apesar dessas nuances, esse momento é certamente um ponto positivo nesse novo CD.

06. Just Pretend (Guy Fletcher / Douglas Flett) - A nova versão de "Just Pretend" seguiu basicamente as linhas básicas da gravação original. A diferença principal é que um fundo incidental, muito discreto e elegante, foi adicionado. Um violão muito sensível, em dedilhado quase inaudível, também foi um belo acréscimo. De maneira em geral considerei essa uma das melhores versões desse novo CD, basicamente por ter sido bem respeitosa em relação ao que ouvimos no álbum "That´s The Way It Is". Isso prova que Felton Jarvis fez realmente um grande trabalho em 1970, sem necessidade de muitas mudanças agora.

07. Love Letters (Edward Heyman / Victor Young) - "Love Letters" que vem logo a seguir, por outro lado, já sofreu maiores modificações. Curiosamente já li muitos textos afirmando que os arranjos desse álbum de Elvis ficaram terrivelmente datados com os anos - será mesmo? Os produtores desse CD certamente trocaram a orquestra original pela Filarmônica britânica - saem os antigos instrumentos e entram os novos. Porém se formos pensar bem a linha base de melodia segue sendo a mesma, apenas com um arranjo mais bem elaborado, mais sutil e elegante. Curiosamente os produtores também resolveram adicionar um novo grupo feminino em destaque, eliminando a participação original das vocalistas de Elvis. Ficou bom, tenho que admitir.

08. Amazing Grace (John Newton) - O tradicional gospel "Amazing Grace" sempre foi um dos preferidos de Elvis. Ele tinha grande reverência por essa música. Aqui eu notei que foi escrito um belo arranjo de introdução, mas penso que a transição para a versão original de Elvis se fez de forma muito abrupta, quase um susto! Os produtores deveriam seguir por uma transição menos impactante, afinal essa é uma canção reflexiva, de teor religioso, quase uma oração! De qualquer maneira a decisão de manter o grupo vocal que gravou ao lado de Elvis foi acertada - ao que parece se tornou impossível separar os vocais de Elvis dos de seus grupos de apoio. Melhor para o ouvinte, que assim toma maior contato, mesmo que indiretamente, com a gravação do álbum "He Touched Me". Certas gravações são mesmo para sempre!

09. Starting Today (Don Robertson) - "Something for Everybody" de 1961 é um dos mais belos trabalhos da discografia de Elvis Presley. Sempre achei um disco que foi muito subestimado, nunca ganhando o devido reconhecimento. Por essa época Elvis havia adotado um estilo vocal muito suave e terno que deu uma beleza incomum a todas as canções desse disco. Aqui os produtores resolveram resgatar a bela balada "Starting Today". Eu sempre vou preferir a versão original, em todos os aspectos, porém não deixarei de elogiar essa nova versão. Conseguiram o ideal: manter a beleza original acrescentando um arranjo que serve basicamente para realçar a beleza da melodia. Um ponto positivo desse CD, sem dúvida.

10. Kentucky Rain (Eddie Rabbitt) - "Kentucky Rain" nunca foi das minhas canções preferidas de Elvis. Seu arranjo original nunca foi muito bem realizado. Aqui nessa nova orquestração a música certamente ganhou mais consistência. O curioso é que esse feeling instrumental me soou tão anos 80! Não sei se todos perceberam isso, mas esses novos instrumentos poderiam muito bem estar em qualquer álbum de uma daquelas bandas de um sucesso só, que se tornaram tão comuns naquela década. Melhorou, certamente melhorou, mas com esse estilo 80´s, tudo me pareceu também um pouco datado. Arranjaram espaço até para uma bateria eletrônica... quem diria.

11. Memories (Davis / Strange) - "Memories" vem logo a seguir. Essa canção foi gravada especialmente por Elvis para seu especial de TV no canal NBC, conhecido como "Comeback Special". Em minha visão essa música já ganhou sua orquestração definitiva, que foi justamente a da gravação original. Não precisava fazer mais nada. Os produtores desse novo CD provavelmente pensaram dessa mesma forma pois apesar de toda a instrumentação ter sido substituída, tudo no final das contas ficou igual. Assim a palavra chave aqui é desnecessária. Não há necessidade nenhuma de tirar os músicos originais para colocar novos músicos executando praticamente o mesmo arranjo de 1968. Completamente desnecessário.

12. Let It Be Me (Curtis / Pierre) - Como sabemos a versão original de "Let It Be Me" do álbum "On Stage" foi gravada ao vivo. Penso que tentar colocar novos arranjos em versões ao vivo é um erro e tanto, pois não se trata apenas da performance do vocalista, mas também da sua banda, todos absorvendo as energias do público. Até mesmo os pequenos erros contam a favor em se tratando de gravações ao vivo. É tudo um grande complexo de fatores. Assim os produtores aqui erraram feio. Isolaram a voz de Elvis da reação do público, de seu grupo de apoio e com isso tiraram a alma dessa faixa. Era preciso fazer algo assim? Não, não era. Além disso se equivocaram com alguns instrumentos, como por exemplo, essa maldita bateria eletrônica dos anos 80 (que aqui volta a assombrar). O que Elvis e sua música tem a ver com os plastificados anos 80? Nada, absolutamente nada. Prefira a versão original do disco ao vivo gravado em Las Vegas e nada mais.

13. Always on My Mind (Mark James / Wayne Carson / Johnny Christopher) - Já "Always on My Mind" até que ficou bonita. Gostei da introdução mais bem trabalhada, parecendo até uma pequena canção de ninar. Apesar dos bons arranjos dessa nova instrumentação o problema se repete. Os produtores ficaram com receio de modificar muito a versão original que é, queiram ou não, um standart da música popular americana. Optando novamente pelo "novo, mas igual", seguiram basicamente as diretrizes da gravação original de Elvis, até mesmo nas linhas de acompanhamento e nos instrumentos de destaque. As únicas modificações aliás foram mesmo na introdução (bonita, repito) e nas linhas finais, que a despeito dos violinos bem executados, continuam na mesma levada do single de 1972. Dois pequenos detalhes que não justificam a existência dessa nova versão.

14. The Wonder of You (Baker Knight) - Pois bem, finalizando a análise das canções desse novo CD de Elvis Presley vou tecer os últimos comentários sobre essas novas versões. O CD oficial, na versão comercial simples, termina com duas faixas. A penúltima é "The Wonder of You", A versão original, gravada ao vivo, foi lançada no disco "On Stage - February 1970". Como eu já escrevi antes essa situação de remodelar versões gravadas no palco sempre me soou bem equivocada. Quando se isola o vocal do cantor, retirando da faixa os demais membros da banda e a reação do público, muita coisa se perde. É um processo de perda, impossível negar. De todas essas novas versões remodeladas essa nova de "The Wonder of You" foi uma das que mais me desagradaram. O som saiu excessivamente metálico da nova sala de edição. A música que tinha um arranjo opulento, forte, grandioso, perdeu grande parte de sua força. Embora, como em todas as demais versões, essa seja também seja creditada com a participação da Royal Philharmonic Orchestra, o fato inegável é que poucos instrumentos foram acrescentados. Tudo me pareceu bem errado, da primeira à última nota. Definitivamente não gostei.

15. Just Pretend (Guy Fletcher / Douglas Flett) - O CD, em sua edição standart, se encerra com mais uma versão moderna de "Just Pretend". Dessa vez temos um dueto com a cantora Helene Fischer. Ela canta bem, em um estilo country Nashville que muito provavelmente Elvis apreciaria. Desde "Duets" com Frank Sinatra, essa fórmula tem dado muito certo. Geralmente são essas faixas de duetos que conseguem espaço nas rádios, trazendo de novo esses grandes cantores de volta às paradas. De maneira em geral, apesar de achar duas versões de Just Pretend em um mesmo CD, algo meio excessivo, até que me agradei. Não é algo para bater palmas ou ficar admirado, mas não aborrece. No mínimo é curioso e agradável.

Bonus Songs - Além da edição standart o CD também ganhou outra edição de luxo intitulada "Deluxe version". Essa saiu apenas nos Estados Unidos e Europa e traz mais duas outras faixas como bonus songs: "You Don't Have to Say You Love Me" e "You Gave Me a Mountain". A primeira foi lançada originalmente no excelente disco "That´s The Way It Is", fechando o lado A do antigo vinil. Já a segunda é a nossa velha e boa versão retirada do disco "Aloha From Hawaii". Para o fã veterano não há grandes novidades. Já para os que estão chegando agora, na condição de marinheiros de primeira viagem, nunca é demais a inclusão de grandes músicas como essas, pois certamente vão despertar a atenção deles, que assim irão em busca do material original, girando a roda de renovação de fãs na nova geração.

Pablo Aluísio.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2005

Elvis Presley - Moody Blue (1977)

Esse foi o último disco lançado por Elvis. Era 1977 e o cantor já caminhava para seu trágico fim. Por isso quando ele morreu, em agosto daquele ano, os que foram nas lojas de discos para comprar algo dele, encontraram justamente esse álbum nas prateleiras. Por essa razão o sucesso foi enorme. Ao lado de "Elvis in Concert" e "Aloha From Hawaii" acabou se tornando um dos LPs mais vendidos do cantor naqueles distantes anos 1970. E isso acabou sendo muito bom. Eu considero um álbum de boa qualidade, com uma precisa seleção de faixas, todas no geral bem gravadas. O fã ou admirador eventual que levou esse vinil para casa em 1977 não ficou decepcionado. Pelo contrário.

São apenas dez faixas. Por essa época a RCA Victor raramente lançava discos de Elvis com mais de dez músicas. O tempo dos LPs com doze ou até quatorze canções tinha ficado no passado distante. Acontece que Elvis já não tinha mais o mesmo número de músicas gravadas em estúdio esperando por lançamento. Com a raridade de material a gravadora foi dosando melhor o número de músicas em cada vinil novo lançado.

A linda "Unchained Melody" abria o disco. Não poderia haver melhor apresentação. Era uma música gravada ao vivo, em 24 de abril de 1977 , A cena foi gravada para o especial "Elvis in Concert" e se tornou um dos melhores momentos daquele especial de TV. Elvis, sentado ao piano, fazia uma performance memorável desse clássico. O interessante é que o cantor já estava com um visual modificado pelos problemas que ele vinha enfrentando. Isso chocou algumas pessoas na época. Porém nada disso tirou o brilho desse momento especial. Um fato curioso é que desde os anos 1960 a RCA vinha sugerindo a gravação desse sucesso, mas Elvis sempre a deixava de lado. E de fato ele nunca a gravou em estúdio, preferindo trazer sua versão inédita diretamente no palco. Ficou especial, um momento realmente memorável de sua carreira.

"Little Darlin'" era outro clássico. Outra que foi gravada ao vivo e nunca em estúdio. Ao contrário de "Unchained Melody" que exigia uma concentração fora do comum para Elvis, aqui tudo soava bem relaxante e divertido. O próprio Elvis nunca levou essa música muito à sério, preferindo deixá-la mais no modo "puro relaxamento". Curiosamente ela foi gravada no mesmo concerto em que Elvis sentou ao piano para cantar "Unchained Melody", no dia 24 de abril de 1977. Ele parecia bem inspirado nesse dia. A RCA então aproveitou para gravar material para seus discos, uma vez que Elvis já não entrava mais em estúdio como antigamente. Aquelas maratonas de gravações, quando Elvis conseguia gravar vinte, trinta músicas em poucos dias, jã não existiam mais. A realidade de Elvis tinha mudado, para algo completamente diferente. Assim não era raro agora a RCA gravar seus shows, para aproveitar alguns momentos. Afinal a máquina de lucros em torno do cantor não poderia parar nunca!

Eu considero esse álbum de Elvis bem mais para cima do que o anterior. Aqui há um considerável número de músicas mais alegres e movimentadas. O resultado desse conjunto se traduz em um disco mais agradável de se ouvir, sem ter a melancolia do "Elvis Presley From Boulevard", considerado por muitos como um disco pesado, de complicada audição. Um bom exemplo de que "Moody Blue" tem um astral melhor vem de músicas como "Way Down". Gravada em Graceland, essa música tem uma linha de baixo bem marcante. É um country rock de qualidade. A RCA Victor viu potencial e lançou a canção em single, com destaque. Acabou chegando em primeiro lugar na parada country, um ótimo retorno comercial para a carreira de Elvis.

E por falar em country music... "If You Love Me (Let Me Know)" era a melhore representante do estilo dentro do disco. Essa faixa foi gravada ao vivo no show do dia 26 de abril de 1977. Inicialmente a gravadora não pensou em utilizar a faixa em um álbum oficial de Elvis, mas pesquisando no material gravado pela RCA que estava arquivado em Nashville, material obtido nas turnês de Elvis, o produtor Felton Jarvis resolveu selecionar esse momento para compor o disco "Moody Blue", até porque o LP necessitava de dez a doze faixas e Jarvis não tinha material suficiente de estúdio para isso. Em razão dessa escassez, o álbum acabou saindo misto, com músicas gravadas em estúdio (entenda-se a sala das selvas em Graceland) e músicas gravadas ao vivo. Antes a RCA priorizava a separação das duas coisas. Ou o disco vinha apenas com gravações de estúdio ou totalmente Live, ao vivo. Na falta de maior número de faixas disponíveis, o jeito foi apelar para uma fórmula mais diversificada, o que resultou nesse disco em que se misturava as duas opções de gravação.

E a falta de material novo era tão grande que a RCA resolveu usar a mesma versão de "Let Me Be There" que já tinha sido lançada antes no disco ao vivo "Elvis Recorded Live on Stage in Memphis". Isso nunca tinha acontecido antes dentro de um disco oficial de Elvis! E o mais curioso de tudo é que a RCA Victor promoveu o álbum como o "novo disco de inéditas de Elvis Presley". Bom, como se pode perceber, nem todas as faixas eram realmente inéditas. Essa aqui, por exemplo, já era bem conhecida dos colecionadores. Gravada em Memphis no concerto que o cantor realizou em 20 de março de 1974, já era bem conhecida dos fãs. A boa performance de Elvis, por outro lado, até justificava uma nova audição. Apenas penso que a RCA poderia ter pincelado algo realmente inédito pois a gravadora havia gravado pelo menos dois concertos em Memphis. Por que não trouxeram alguma gravação do outro show? Complicado entender.

A faixa título do disco, a boa ""Moody Blue", foi gravada em Graceland no dia 4 de fevereiro. Essa foi a sessão que Elvis interrompeu quando chegou algumas motos novas que ele tinha comprado. É a tal coisa, gravar em casa, apesar de todo o esforço do produtor Felton Jarvis em fazer tudo da forma mais profissional possível, tinha seus problemas. Uma delas era a distração por parte de Elvis. Ele sempre estava interrompendo as gravações por um motivo ou outro. Quando as motos novas chegaram em Graceland Elvis perdeu o interesse pelas músicas que estava gravando. Ele preferiu ir conferir suas novas máquinas. E como ele adorava motos, a coisa só piorou. De qualquer maneira essa canção até que foi bem gravada. Com ritmo agradável, alegre, tem um sabor de nostalgia dos anos 1970. Repare bem no arranjo das guitarras. Poucas coisas poderiam ser mais característicos daquela época do que isso. Um bom momento de um disco que foi gravado com muitas distrações por parte do cantor, mas que no final até que funcionou bem. 

"Pledging My Love" tem uma história estranha. Seu autor Ferdinand Washington afirmou que a canção foi composta no meio de uma crise suicida. Ele estava muito abalado com o fim de um relacionamento e decidiu colocar uma bala em seu revólver. Com uma garrafa de whisky na sua frente, ele começou a brincar de roleta russa, apertando o gatilho com a arma apontada para sua cabeça. Para sua sorte sobreviveu ao jogo mortal. Depois, já meio embriagado, deu os últimos retoques nessa canção, que é bem convencional, bem de acordo com o estilo country mais clássico dos anos 50, sem qualquer referência em sua letra sobre suicídio ou temas mais sombrios. Para falar a verdade a canção é até bem agradável de se ouvir, com um bonito arranjo, embora o tema da letra fale de desilusões amorosas.

Essa música foi lançada originalmente em Dezembro de 1954 pelo cantor Johnny Ace no finado selo Duke Records, um dos milhares de selos fonográficos ao estilo Sun Records que surgiram nos Estados Unidos naquela fase de popularização de gravações por pequenos estúdios. O próprio Elvis Presley foi fruto desse processo todo. Qualquer produtor musical com um pouquinho de investimento conseguia comprar uma mesa de gravação e saía gravando artistas locais. Quem sabe ele tirava a sorte e grande e conseguia um sucesso de vendas, fabricando os próprios singles por conta própria. Outro aspecto curioso é que o cantor Johnny Ace morreu em um acidente envolvendo armas de fogo, completando um ciclo meio macabro envolvendo essa música.

"She Thinks I Still Care" foi gravada por Elvis na sala das selvas em Graceland no dia 2 de fevereiro de 1976. Curiosamente em um tempo em que Elvis ia perdendo o interesse nas gravações de seus próprios discos ele abriu uma exceção em tudo e resolveu gravar duas versões diferentes dessa faixa, o que demonstrava acima de tudo que ele realmente gostava mesmo da música. A primeira versão foi bem ao estilo country de Nashville e essa versão foi a que acabou sendo escolhida para fazer parte da seleção musical do disco oficial. É uma boa versão, mas não é a minha preferida.

A melhor versão de "She Thinks I Still Care" foi aquela com estilo blues. Essa segunda versão ficou anos desconhecida dos fãs de Elvis Presley. Nunca foi lançada em sua vida e só depois de décadas é que chegou ao mercado. A forma mais simples de encontrá-la dentro da vasta coleção de discos lançados de Elvis é comprando o box "Walk a Mile in My Shoes: The Essential '70s Masters". Ela está no "Disc four: Studio Highlights 1971–1976", creditada como "unreleased alternate take". Na verdade não é apenas um take nunca lançado, mas uma versão completa, perfeita e com ótimo estilo. Em minha opinião bem melhor do que a versão original. Deveriam ter lançado no álbum de 1977, ou pelo menos como single. Arquivar uma gravação tão boa, por tantos anos, foi realmente um pecado.

"He'll Have to Go" foi gravada em Graceland, na sala das selvas, no dia 31 de outubro. É uma daquelas faixas que não fizeram sucesso na época, sendo apenas uma boa balada usada para completar o álbum. Gosto da letra, bem cinematográfica, retratando um momento complicado de um relacionamento que ficou no passado. Versos que mais parecem ter saído de um roteiro, como nos trechos em que Elvis canta: "Coloque seus doces lábios um pouco mais perto do telefone / Basta fingir que estamos juntos sozinhos / Diga ao homem para abaixar o som da jukebox / Você pode dizer ao seu amigo que está com você, que ele vai ter que ir embora". Elvis que dava longos telefonemas para sua ex-esposa Priscilla, pode ter facilmente se identificado com essa letra.

Embora a expressão "amigo" seja usado na letra, o que temos aqui é outra situação. O autor tenta convencer sua amada do passado a dispensar seu amante, para que eles possam voltar a ficar juntos. É um homem magoado pedindo para a mulher que ama que mande embora seu amante de ocasião. No caso o tal "amigo" seria nada mais, nada menos, do que Mike Stone, o amante de Priscilla, o homem que a fez deixar Elvis para ir morar com ele na Califórnia. O pior de tudo é saber que no fundo Priscilla ignorou o recado indireto que Elvis lhe mandava através dessa música para continuar ao lado de Mike. Ela não o deixou ir embora, como a canção sutilmente lhe sugeria.

"It's Easy for You" também não fez sucesso, mas tinha igualmente algo a dizer em sua letra. Aqui os papéis se invertem. É a história de um homem que largou sua esposa e seus filhos para ficar com uma amante. Só que o tempo passou e ela o largou. E agora esse homem se vê completamente abandonado, tanto por sua ex-esposa e família, como pela mulher que virou sua cabeça, fazendo com que ele jogasse fora seu casamento. Um tipo de situação até bem comum, se formos pensar bem. Praticamente todo mundo conhece uma história como essa envolvendo parentes, conhecidos ou amigos. Geralmente inclusive envolvendo homens mais velhos com mulheres mais jovens. E depois que a amante se vai o homem lhe diz que para ela é fácil fazer isso. Já ele pagou um preço alto demais pelo que fez.

A letra é de arrependimento e também de revolta. Um recado para a "outra". Aqui penso que Elvis se identificou de uma maneira diferente. Embora a música se refira a uma mulher específica, Elvis estaria colocando do outro lado todas as mulheres que ele se relacionou quando estava casado com Priscilla. É um reconhecimento de culpa, já que Elvis realmente traiu Priscilla com inúmeras mulheres, principalmente quando estava em Las Vegas fazendo suas temporadas na chamada "cidade do pecado". Ele pagou para ver e acabou se dando mal, já que a esposa o traiu também, dando o troco na mesma moeda.

Pablo Aluísio.

domingo, 23 de janeiro de 2005

Elvis Presley - From Elvis Presley Boulevard, Memphis, Tennessee (1976)

Esse álbum foi gravado em circunstâncias únicas na carreira de Elvis. Há tempos ele vinha ausente dos estúdios. A RCA Victor vinha sucessivamente marcando datas para Elvis comparecer em estúdio na cidade de Nashville, porém ele sempre desmarcava na última hora, alegando uma desculpa qualquer. O problema é que a RCA precisava colocar no mercado algum disco novo de Elvis com músicas inéditas. A fórmula de se lançar discos ao vivo já havia se esgotado, já não vendia mais tanto como antes. Ele tinha que voltar para novas gravações. O produtor Felton Jarvis então encontrou uma saída inusitada. Já que Maomé não iria à montanha, que a montanha fosse até Maomé. Assim uma unidade móvel de gravação foi levada até Graceland. Inicialmente o produtor pensou em realizar as sessões na quadra de raquetebol, mas a acústica não favorecia em nada, apesar do ambiente ser amplo, onde todo o grupo poderia ser alojado. Assim que desistiu ele foi em busca de outro lugar na mansão. Pensou em gravar na sala de estar, mas também não daria muito certo, não era o lugar ideal.

A solução foi encontrada na chamada "Sala das Selvas". O nome desse ambiente era bem propício. Elvis havia adquirido todos aqueles móveis após seu pai Vernon comentar um dia que havia visto a mobília mais feia de sua vida numa loja de Memphis. Um monte de cadeiras e sofás que tentavam imitar o estilo tropical, mas com resultados sofríveis. Algo de muito mau gosto. Era tudo muito brega na opinião de Vernon. Isso acendeu uma luzinha na cabeça de Elvis. Ele que não perdia uma piada e estava sempre mostrando um humor à toda prova decidiu ir até a loja e comprar todos aqueles móveis feios. Colocou tudo na sala de TV de Graceland e passou a chamar o lugar de "A Sala das Selvas". Aquela imitação falsa de ambientação da Polinésia não passava mesmo de uma grande brincadeira por parte de Elvis, imaginem vocês! E foi nesse lugar de móveis com gosto bem duvidoso que Felton Jarvis decidiu colocar todo o equipamento de gravação da RCA Victor.

Porém isso seria apenas o começo dos problemas que viriam. Após tanto esforço o produtor Felton Jarvis descobriu que mesmo estando todos em Memphis não seria tão fácil assim colocar Elvis na frente de um microfone para gravar músicas novas. Ele geralmente descia as escadas, dava uma olhada nos equipamentos montados na Sala das Selvas e voltava a se desculpar, dizendo que sua garganta não estava boa, que sua voz não estava em um dia bom e por aí vai. Era sempre a mesma coisa, com Elvis dizendo a Jarvis que "Amanhã seria um dia melhor" ou então que "Amanhã a gente começa a gravar". Só que esse dia parecia nunca chegar. Realmente Elvis não parecia ter nenhum ânimo para gravar algo novo. Até mesmo a chegada de novas motos que ele havia comprado era desculpa para não gravar nada. O pobre Jarvis já estava com a paciência acabando!

Gosto bastante de "For The Heart". É um country alta astral, algo que contrasta positivamente com as demais músicas, todas mais na linha melancólica. Essa canção foi composta por Dennis Linde. Ele já havia criado um dos grandes sucessos de Elvis nos anos 70, a ótima "Burning Love". Por isso acabou sendo natural para Elvis gravar essa faixa.

Durante um tempo a RCA Victor pensou em colocar essa canção como Lado A do single extraído desse álbum, mas na última hora a deslocaram para o Lado B, colocando "Hurt" como a faixa pincipal do compacto. A letra é simples. Sentimento country por excelência. O que se sobressai mesmo é o ritmo, bem agradável.

"Danny Boy" é uma música histórica. Faz parte da tradição, da cultura irlandesa. Por isso alguns historiadores de arte afirmam que sua origem segue sendo desconhecida. Claro, algumas versões mais recentes foram gravadas, porém todas elas partindo de uma fonte centenária desconhecida. Um dos primeiros registros dentro da indústria musical veio do começo do século XX, mais precisamente de 1910. Essa veterana gravação foi assinada por Frederic E. Weatherly, Muito em voga entre imigrantes irlandeses que moravam nos Estados Unidos, acabou entrando também dentro da cultura do país que se tornava o seu novo lar.

Elvis gostava muito da música. Já no final dos anos 50 houve algumas gravações informais com ele. Elvis estava na Alemanha, cumprindo serviço militar. Por isso arriscou algumas notas ao piano. Ficou muito bom., Se você tiver interesse em ouvir esse registro procure pelo CD do selo FTD intitulado "In a Private Moment". Outra dica é ouvir o CD "Tucson 76" que traz uma rara versão ao vivo da música. Acredito inclusive que Elvis deveria ter explorado mais a canção em seus concertos. Pena que isso efetivamente não aconteceu. O público certamente teria apreciado essas inspiradas performances do cantor.

Esse disco tem uma sonoridade bonita. Muitos aproveitaram para criticar o álbum por ele ter sido gravado em Graceland, na sala das selvas, mas discordo desse tipo de ponto de vista. Penso que gravar em casa trouxe uma certa paz de espírito para Elvis. Ele se sentiu confortável e tranquilo e isso resultou em boas faixas para o disco. "Blue Eyes Crying In The Rain" me passa exatamente esse tipo de sensação. Ao ouvir a canção podemos perceber que Elvis estava completamente à vontade.

É uma canção antiga, gravada por Hank Williams, muito embora ele não a tivesse composto. Quem a gravou pela primeira vez foi o cantor country Roy Acuff. Ele era natural de Maynardville, Tennessee, uma cidade relativamente próxima de Memphis. Assim era algo muito próximo de Elvis Presley. O single original chegou nas lojas e começou a tocar nas rádios em 1951. Na época Elvis tinha apenas 16 anos e era apenas um colegial. Porém ele apreciou batante a canção. Por isso a gravou em Graceland décadas depois. É interessante saber que essa canção quase foi gravada nas sessões de "Elvis is Back!" de 1960. Ele fez parte da lista de músicas sugeridas a Elvis naquele momento. O cantor porém não chegou nem a ensaiar a melodia com sua banda.

"Hurt" foi a principal faixa desse álbum. Foi lançada como lado A do único single extraído do disco e virou a "música de trabalho" para promover o LP durante os concertos de Elvis realizados em 1976. Um crítico de Nova Ioirque comentando sobre o "From Elvis Presley Boulevard" chegou a escrever em sua coluna que estava surpreso, pois Elvis estava próximo de virar um cantor de ópera. Apesar da fina ironia seu comentário não estava mesmo muito longe da verdade. Em seus anos finais Elvis passou a adotar um tom mais forte nas músicas, mostrando todo o seu potencial vocal. Devo dizer inclusive que essa foi uma das grandes gravações de Elvis em seus anos finais. Ele foi perfeito na sala das selvas.

"Hurt" foi originalmente lançada em 1954. A primeira gravação foi de Roy Hamilton, talentoso cantor negro que começou sua carreira no estilo gospel. Só depois de alguns anos é que ele finalmente começou a gravar R&B e soul. É interessante notar que por essa época de sua vida Elvis estava com várias músicas de Roy na sua mente. Tanto que iria gravar ainda "Unchained Melody", que Hamilton também havia gravado anos antes. Sua gravação resultou numa belíssima versão dessa canção. Além disso a proximidade de Elvis com ele não era recente. Basta lembrar do clássico "You'll Never Walk Alone". Muitos lembram de Hurt por causa da versão de Timi Yuri em 1961. Porém temos que dar também todos os créditos para Hamilton, já que Elvis simplesmente adorava seus discos antigos.

"Solitaire" é certamente a música mais melancólica desse álbum. Essa bela canção foi gravada e lançada originalmente em 1972 por Neil Sedaka. Depois disso a música ganhou uma série incrível de regravações, dando origem a novas versões, nas vozes dos mais diferentes artistas da época. Nos Estados Unidos a versão que alcançou maior sucesso foi a dos Carpenters, em 1975. Ela fez parte da seleção de canções do álbum "Horizon" e se transformou em um grande sucesso, chegando aos primeiros lugares da parada Billboard.

Por isso quando Elvis a gravou em 1976 a música já não tinha mais potencial em se tornar de novo hit em sua interpretação. Mesmo assim, para seus fãs, era sempre interessante ouvi-la na voz de Elvis Presley. E a versão de Elvis Presley não deixou a desejar. Ele interpretou a canção de forma bem intimista, acompanhado de poucos músicos de sua banda. Nada de arranjos exagerados. Apenas o essencial, o básico, dando destaque para sua voz. Ficou bonita de se ouvir.

No meio de tantas músicas românticas e lentas, "Love Coming Down" era um bom country que animava um pouco mais a audição do  From Elvis Presley Boulevard. Essa canção foi escrita por Jerry Chesnut, excelente compositor, especializado em música country. Elvis já tinha escolhido outras canções dele para gravar, com destaque para "T-R-O-U-B-L-E" do álbum "Elvis Today". Sempre que Elvis ia atrás de material novo, inédito no mercado, Chesnut surgia como uma opção. A RCA Victor enviava muitas canções compostas por ele para os estúdios, quando Elvis tinha gravações programadas. Provavelmente ele a ouviu pela primeira vez nas sessões do "Elvis Today", mas resolveu gravá-la apenas em Graceland, nas sessões da Jungle Room.

Jerry Chesnut havia nascido em  Harlan County, no Kentucky e tinha as mesmas raízes culturais de Elvis, por isso a identificação vinha quase que imediatamente. E Elvis Presley não seria o único popstar a gravar seu material. Depois dele outros grandes astros da country music como Alan Jackson e George Jones também gravariam seu repertório. Até mesmo Elvis Costello traria parte da obra de Chesnut para sua discografia. Foi uma carreira longa, de mais de cinquenta anos de música. Infelizmente depois de anos compondo belas canções de countru music, ele veio a falecer em dezembro de 2018.

Já no fim da vida Elvis costumava dizer que não queria mais gravar músicas que não acreditava. Ele estava farto, depois de anos e anos, de gravar material de que não gostava. Principalmente na era dos filmes em Hollywood ele teve mesmo que fazer muitas concessões. No final de sua carreira, quando o fim já se aproximava, Elvis poderia finalmente dizer que só gravava o que bem queria e quando queria.

E nessa fase ele adorava cada vez mais o country de seus anos de infância em Memphis. Havia material novo? Certamente sim. Porém ele sempre sondava e flertava com o passado. Era uma maneira de revisitar sua própria vida. Não podemos condenar Elvis por isso. Claro que não! De certa maneira isso lhe trouxe de volta o prazer de cantar ao vivo e de gravar material de que pessoalmente gostava.

Em 1967 Tom Jones havia gravado com sucesso a balada "I'll Never Fall In Love Again". Chegou inclusive a se apresentar na TV, soltando o vozeirão. O público gostou do que viu e ele ganhou uma excelente audiência. Elvis, que era muito amigo de Tom Jones, deve ter sentido uma pontinha de inveja porque nessa época ele estava preso com contratos de Hollywood. Não tinha poder de escolher aquilo que queria cantar. Tudo já vinha imposto pelos estúdios de cinema e pela RCA Victor. E como ele havia gostado muito da música surgiu mesmo aquela vontade de fazer sua versão que só iria chegar ao mercado em 1976 com esse disco "From Elvis Presley Boulevard, Memphis, Tennessee". Curiosamente Elvis seguiu os arranjos da versão de Tom Jones sem mudar em quase nada. A única diferença veio justamente da performance vocal. Tom Jones era bom cantor, isso era inegável, mas não tinha a mesma potência vocal de Elvis que na sua versão não poupou emoção e poderio vocal. Quase a balada sentimental virou uma ópera, principalmente no último verso. Ficou bem bonita a versão de Mr. Presley. Tom Jones foi superado, algo que ele próprio reconheceu na época.

Em 1973 Larry Gatlin soltou sua versão intimista de "Bitter They Are, Harder They Fall". Pessoalmente gosto muito desse seu trabalho original. Mais uma vez, ele não tinha o poder vocal de Elvis, por isso optou por adotar uma postura bem mais contida, quase lacrimejante. Os violinos ao estilo country pontuavam toda a gravação e até pequenos sinos foram acrescentados. Com Elvis esse arranjo ficou mais grandioso. A TCB Band aqui foi por outra direção, deixando a voz de Elvis assumir o centro do palco. Afinal o que faltava em Larry Gatlin, sobrava no Elvis quarentão dos anos 70. E ele realmente caprichou. Em termos de comparação não há o que comentar. Elvis se impôs mais uma vez e o que era intimista e mais calmo, virou novamente uma explosão de voz nas notas alcançadas por Elvis Presley. Ouvindo esse tipo de gravação chegamos em uma conclusão óbvia. Ele foi um artista grandioso, não há como negar.

"Never Again" tem um dos melhores arranjos do disco. Começa com um belo dedilhado de dois violões, criando uma atmosfera intimista, lembrando até mesmo baladas de gêneros mais introspectivos, como a nossa conhecida "Bossa Nova". Curiosamente a estrutura da melodia segue uma linha que agradava muito Elvis nessa época, com aquele estilo de ir sempre crescendo ao longo de sua execução. Começa quase sussurrada, vai subindo o tom, até ganhar ares de grandiosidade. Um tipo de estilo musical em que Elvis poderia mostrar todo o seu potencial vocal. E o coro também não fica atrás, principalmente nas últimas notas quando eles (Elvis e seus grupos vocais de apoio) levam tudo para uma espécie de explosão emocional coletiva.

A letra é interessante. Ela mostra a história de um homem que amou demais, se entregou demais a uma paixão avassaladora do seu passado, mas acabou magoado, traído, ferido por aquela que ele considerava ser o amor de sua vida. Não quero passar a imagem de alguém que se repete, mas essa letra é bem óbvia em relação ao que Elvis passou em seu casamento com Priscilla. A mágoa que sofreu, por ter sido traído pela sua própria esposa e mãe de sua filha, a enorme fossa que ele entrou depois disso, a depressão que teve que passar, tudo isso o fez jurar que nunca mais iria passar por algo assim novamente. A primeira parte da letra já deixa isso muito claro, principalmente quando Elvis canta versos como esse: "Espero nunca amar alguém tanto assim de novo! Eu não quero mais suportar isso, pois já estive ferido antes". Recado mais claro do que isso, impossível.

"The Last Farewell" é outro bom momento desse álbum cheio de baladas tristes, mas ao mesmo tempo relevantes. Esse é outro bom trabalho de arranjo do produtor Felton Jarvis, mas ao contrário de outras canções como "Never Again" que começa calma e vai crescendo, aqui a introdução é um tanto épica, para depois as coisas irem acalmando aos poucos. A melodia é agradável aos ouvidos, com Elvis cantando quase a meia voz, como se estivesse curtindo bastante a melodia junto ao ouvinte, criando com isso um sentimento de cumplicidade com seus fãs. A música em si foi muito trabalhada depois por Felton Jarvis pois ele acrescentou muitos instrumentos posteriormente à gravação. Antes do lançamento os acréscimos foram levados para aprovação de Elvis e ele gostou do resultado final.

Essa letra é quase cinematográfica. Ela leva o ouvinte a imaginar uma determinada situação, onde um marinheiro se despede de sua amada no porto, prestes a ir para a "velha Inglaterra". Mesmo Elvis não tendo sido da marinha e nem ter qualquer ligação com isso (a não ser pelo fato de ter interpretado um marinheiro em "Girls, Girls, Girls") a mensagem da canção é que provavelmente gerou interesse em Elvis. É praticamente um roteiro de cinema, com começo, meio e fim, explorando a dor da despedida de alguém que vai para o mar, mas deixa seu grande amor para trás - imagine aí em sua mente Elvis vestido de marinheiro dando um abraço final na sua amada para ir embora para a Inglaterra. Ficou estranho? Um pouquinho, mas devo dizer que no final o resultado ficou muito bom, criando um clima bem diferente nos discos de Mr. Elvis Presley.

Pablo Aluísio. 

Elvis Presley - Welcome to My World (1976)

Esse álbum foi uma coletânea lançada pela RCA Victor em março de 1977. Assim quando Elvis faleceu esse era um dos discos disponíveis nas lojas o que fez com que se tornasse um sucesso de vendas, sendo premiado com o disco de ouro e platina pelo número de cópias vendidas. Uma questão de estar no momento certo, na hora em que os fãs correram às lojas para comprar tudo o que havia de Elvis em catálogo.

Dito isso é preciso saber que de maneira em geral é um disco sem maiores novidades, composto praticamente todo de reprises, com ênfase em um repertório mais country e romântico. Uma das coisas que gosto muito desse disco é sua capa. Para isso aconselho os fãs a irem atrás do vinil original pois a capa de um disco de vinil é muito mais interessante nesse ponto do vista artístico que aquelas pequenas capas de CDs. No LP original temos a oportunidade de apreciar bem o trabalho desse talentoso artista que captou Elvis muito bem em sua ilustração. Certamente é uma das capas mais bonitas da discografia de Elvis.

O disco se chamou "Welcome to My World". Essa música nunca foi gravada em estúdio por Elvis. Ela já tinha aparecido antes, como faixa inédita dentro da discografia do cantor, no disco "Aloha From Hawaii". Muitos consideraram a performance de Elvis nessa canção um dos pontos altos daquele especial de TV. Concordo com essa visão. Realmente é uma bela música, muito adequada para o momento em que Elvis vivia. Com boa letra e excelente arranjo, marcou a carreira do cantor, a ponto inclusive de ter se tornado um sucesso nas rádios. O que teria a criticar aqui é que a RCA apenas reprisou a mesma versão do "Aloha". Teria sido uma boa ideia na época sugerir que Elvis gravasse a música em estúdio. Seria assim uma novidade para os colecionadores. E isso certamente impulsionaria ainda mais as vendas.

Do cantor e compositor Kris Kristofferson temos aqui sua bela criação chamada "Help Me Make It Through the Night". É interessante saber que segundo seu próprio autor ela foi composta para ser gravada por Frank Sinatra. E tudo se baseando em uma entrevista dele, onde afirmava que atravessar a noite era o mais duro para ele naquele momento de sua vida. Usando isso de tema, Kris Kristofferson criou sua música. É bem provável que Elvis também tenha se identificado com essa letra. É sabido de todos que o cantor sofria de insônia e muitas vezes passava as noites acordado. É curioso saber que o compositor original mirou em Sinatra, mas acabou acertando mesmo em Elvis Presley.

Dando continuidade na análise do álbum "Welcome To My World" vamos tecer mais comentários sobre algumas de suas músicas. "I'm So Lonesome I Could Cry" é um clássico da música country dos Estados Unidos. Ela foi composta e gravada pela primeira vez por Hank Williams. No Brasil ele não é muito conhecido, mas em seu país natal ele é considerado um verdadeiro ícone do estilo musical. Chega a ser reverenciado até hoje pelos cantores que seguem sua linha. Elvis não ignorava a importância de Hank. Afinal ele foi um garoto ouvindo rádio em Memphis e obviamente os discos desse astro country eram os mais tocados.

Hank Williams teve uma morte trágica, morrendo no banco traseiro de seu carro. Ele estava no auge de sua glória como artista quando isso aconteceu. Até hoje sua morte segue sendo um mistério. Para muitos morreu de tanto beber. Para outros ele tinha uma doença não diagnosticada, o que o levou à morte de forma repentina. De uma maneira ou outra Elvis não deixaria esse nome passar em branco na sua discografia. A versão que temos aqui nesse álbum foi a mesma que foi lançada no disco duplo "Aloha From Hawaii", o que não deixou de ser um desapontamento para os colecionadores da época que esperavam por alguma versão inédita. Na época porém essa não era a política da RCA em suas coletâneas. Era uma outra mentalidade.

Para quem estava em busca de algo inédito a única consolação vinha no final do disco com uma gravação ao vivo e inédita de "I Can't Stop Loving You". Foi a única novidade de um álbum que não primava pelas gravações inéditas. Eu penso que Elvis Presley cantou demais essa faixa em seus concertos nos anos 1970. E quando isso acontecia ele criava uma certa preguiça em cantar corretamente as músicas. Geralmente, quando já estava de saco cheio mesmo, ele combinava a música com algumas piadinhas, mudando sua letra para arrancar alguns sorrisos do público. Essa aqui felizmente escapou, mas podemos ainda perceber um certo cansaço de Elvis em ter que repeti-la mais uma vez. Ele deveria ter adotado algumas mudanças em seu repertório para que isso não viesse a acontecer.

Kris Kristofferson também surgia presente nesse disco com sua bonita "For the Good Times". Era uma boa versão de Elvis da música, gravada ao vivo, no dia 10 de junho de 1972. Como Elvis havia optado mesmo pelo country em sua fase final de carreira, ele tinha basicamente dois caminhos a seguir. Revisitar o antigo country, a música clássica do interior dos Estados Unidos, gravando gente como Hank Williams e também trazer versões de artistas contemporâneos, como acontece aqui. A letra tinha um certo tom de nostalgia. No final de tudo combinava bem com o tipo de trabalho que Elvis vinha desenvolvendo. Era uma canção country e em sua letra trazia um sentimento de saudade do passado. Isso era puro Elvis naquele período, não há como negar.

As sessões de Elvis no American Studios foi uma consequência natural de sua apresentação no NBC TV Special, o "Comeback Special" que trouxe Elvis de volta aos seus melhores momentos. Não mais a gravação em série de trilhas sonoras para filmes em Hollywood, mas sim a busca por material musical de maior qualidade. A música "Gentle on My Mind" fez parte desse pacote de renovação.

Essa canção foi gravada na madrugada do dia 14 de janeiro de 1969, no American Studios em Memphis, Tennessee. Elvis estava particularmente inspirado nessa noite, chegando nas versões definitivas de outras músicas como "You'll Think of Me", "I'm Movin' On" e "A Little Bit of Green". A música foi composta por John Hartford, cantor e compositor de Nova Iorque, muito conhecido por suas criações musicais nos gêneros de bluegrass, country e folk.

"Make the World Go Away" foi gravada em junho de 1970. Fez parte das sessões de gravações conhecidas posteriormente como a maratona de Nashville, porque naquela ocasião Elvis iria gravar uma grande quantidade de músicas que seriam lançadas em discos ao longo dos próximos anos. Nessa mesma noite ele também chegaria nas versões finais de "Funny How Time Slips Away", "I Washed My Hand in Muddy Water" e "Love Letters". Elvis, como se pode perceber, estava mais afiado do que nunca.

Esse country foi composto por Hank Cochran. Ele foi um cantor e compositor muito popular no circuito musical de Nashville, a capital mundial da country music. Escreveu músicas para inúmeros artistas como Patsy Cline, Ray Price e Eddy Arnold. Nomes que hoje em dia são pouco lembrados, mas que dentro da cultura country daquela época eram verdadeiros astros e estrelas do cenário musical. Curiosamente o auge da popularidade de Hank aconteceu durante a década de 1960, só que nesse período Elvis se concentrou em suas filmes de Hollywood e esse compositor não fazia esse tipo de material. Só depois, quando Elvis procurou redirecionar sua carreira foi que finalmente o caminho deles se cruzaram. A versão de Elvis ficou excelente e um tanto grandiosa, algo que de certa forma ia contra o próprio estilo country, que se baseava mais na simplicidade da vida do interior.

"Release Me (And Let Me Love Again)" foi lançada originalmente no álbum "On Stage - February 1970". A música foi gravada em Las Vegas naquela que seria a segunda temporada do cantor na cidade, ainda nos tempos do International Hotel, que depois seria vendido e se tornaria o Las Vegas Hilton. Essa temporada em particular é um pouco subestimada, porque ficou entre a estreia de Elvis em Las Vegas (sua primeira temporada) e aquela que seria registrada no filme "That´s The Way It Is" (Elvis é Assim). Penso que foi uma série de shows em que Elvis estava muito bem, em ótimas performances.

A versão que ouvimos aqui é a mesma do "On Stage". Nessa época a RCA Victor em suas coletâneas, como no caso dessa "Welcome to My World" não inovava muito. Raramente versões inéditas chegavam nos álbuns oficiais de Elvis. O advento das faixas raras, takes alternativos, etc, só iria acontecer muitos anos depois.

Do famoso Hank Williams, o disco traz uma de suas músicas mais conhecidas, "Your Cheatin' Heart", Essa é a mesma versão que Elvis gravou antes de seguir para a Alemanha, onde iria cumprir seu serviço militar. A clássica música country foi gravada por Elvis Presley no dia primeiro de fevereiro de 1958. Curiosamente a RCA Victor iria arquivá-la por anos e anos, só chegando pela primeira vez no mercado em meados dos anos 1960, no disco "Elvis For Everyone". Por que isso aconteceu? Provavelmente porque os executivos da gravadora não acharam um espaço para a música dentro da discografia de Elvis. Ele era na época um rockstar e essa música era um country tradicional da velha escola. Acredito que os produtores achavam ela fora do caminho do que Elvis vinha produzindo em estúdio. Por isso foi para o arquivo.

Do ótimo compositor e pianista Don Robertson temos "I Really Don't Want to Know". Essa música destoa um pouco do trabalho usual desse compositor. Ao longo da carreira de Elvis, Don Robertson escreveu lindas canções românticas para o cantor. Só que essas faixas eram canções ao piano numa escala mais moderna, mas de acordo com as grandes cidades e sua sofisticada seleção musical. Algumas até iam para o lado de um jazz mais sofisticado. E então depois de escrever tantas canções de amor é algo surpreendente que ele tenha cirado esse country mais ao estilo raiz. Provavelmente Don Robertson nunca viveu em uma cidade do interior rural dos Estados Unidos, mas o fato é que era talentoso o suficiente para compor um tema como esse, que fugia do universo em que vivia. De uma maneira ou outra essa faixa acabou entrando no álbum "Elvis Country (I'm 10,000 Years Old)", onde foi originalmente lançada dentro da discografia de Elvis Presley.

Pablo Aluísio.