Livro lançado revela e analisa a ficha policial do Rei do Rock no FBI. Sob as ordens diretas de seu todo-poderoso diretor J.Edgar Hoover, a força policial número um dos EUA – o FBI – manteve e mantém arquivos sobre gente supostamente perigosa e subversiva, ou considerada individualista e excêntrica demais. Entre tais pessoas tem havido celebridades, e entre estas o alvo de observação oficial mais surpreendente foi talvez Elvis Presley – O Rei do Rock. Pode-se imaginar Hoover permanentemente obcecado com os movimentos coreográficos de quadris que valeram a Elvis o apelido de The Pelvis. Do início ao apogeu de sua carreira, Elvis Presley representou um perigo para a moral, os valores sacrossantos e quanto o FBI entendesse como a quintessência da alma da juventude americana. Na época, os americanos não desconfiavam de seu próprio governo como desconfiam hoje. Não ocorreria a ninguém, nem mesmo ao coronel Tom Parker, que o FBI espionasse seu cliente Elvis Presley. Foi só depois da morte de Hoover, em 1972, que táticas discutíveis e, em alguns casos, ilegais vieram a público e passaram a ser questionados.
O Novo livro Elvis – Top Secret de Earl Greenwald e Kathleen Tracy, tem por subtítulo "A história inédita do Arquivo Secreto do FBI sobre Elvis Presley". E começa revelando as origens da desconfiança do ressentimento que Presley, como tanta gente, sempre nutriu em relação às autoridades em geral. Tudo começou quando o próprio pai, Vernon, foi preso por falsificar um cheque. O xerife de Tupelo, Mississipi, prendeu-o por uma noite, só para que não esquecesse mais de quão desagradável só pode ser uma noite na cadeia. Mas o que impressionou e ficou na memória de Elvis foram os insultos que a autoridade número um da pequena cidade despejou sobre seu pai. Nunca mais o garotinho esqueceu o impacto do poder simbolizado pelo distintivo do xerife. Gente de baixa reputação como os Presleys não tinha outro recurso, nenhuma corte de apelações. E a família mudou-se para Memphis, Tennessee, com o espírito de recomeçar do zero.
A big city foi ora benção, ora maldição para Elvis. Ele gostou da cidade grande porque dava mais oportunidade e mais liberdade à família. Mas sentiu-se como se estivesse perdido uma parte da própria identidade.
No colégio, jamais se comportou como um dos rebeldes sem causa explícita, tipificados pelos protagonistas do filme "juventude transviada". Mas havia um conteúdo de desafio em sua atitude sob a forma de cabelos compridos pintados de preto, com o topete laqueado que, anos depois, ele próprio, Elvis, ditaria ao mundo da moda jovem. Suas roupas eram de gosto no mínimo discutível, para a época. E seu jeito não escondia a turbulência interior com que uma fração incrível da juventude mundial se identificou, nos anos 50. Em classe, Elvis Presley foi um aluno medíocre, embora sem mácula. Raramente chamou a atenção de algum professor e muito menos deu razão para reprimendas. Não fosse o guarda roupa e passaria praticamente incógnito. Mas uma decepção o marcou. Elvis queria muito entrar para o time de Football, mas o técnico não deixou, explicando que para entrar ele teria de cortar o cabelo.
Fama Precoce e Controvérsia
O segundo capítulo do livro Elvis – Top Secret "Fama Precoce e Controvérsia", focaliza o fenômeno da fama da noite para o dia. Já em Abril de 1956, jornais de Memphis e outras localidades estampavam cartas de leitores e leitoras ( sobretudo mães) preocupadas com a influência de seu sex-appeal: "quero saber quanto tempo a gente vai levar até se dar a conta exata do que ele (Elvis) está fazendo". Ou esta carta de um aluno do segundo grau: "nunca me considerei uma espécie de exemplo a ser seguido, porque faço tudo que a maioria dos jovens da minha idade faz. Mas repito: o que ele (Elvis) faz na TV e em toda parte por onde se apresenta rebolando é simplesmente podre! Não gostaria que minha mãe ou minhas irmãs vissem isso". Cartas parecidas como essa começaram a chegar também, naturalmente à mesa de J Edgar Hoover. E estrelas de televisão de primeira grandeza, humoristas como Steve Allen e Sid Caeser, por exemplo, acabaram ridicularizando Elvis, tornando-o um dos alvos favoritos de suas piadas.
A Vida no Exército e o estranho caso do Dr. Schmidt
O capítulo 3 (o mais longo), "A Vida no Exército e o estranho caso do Dr. Schmidt", tem um estranho co-protagonista que atende por este pseudônimo, "Dr. Schmidt" ( o livro não hesita em usar pseudônimos sempre que a identidade dos personagens é ou deve permanecer em secreto). Estamos em 1959, Elvis Presley foi convocado para o exército e está servindo em Bad Nauheim, Alemanha Ocidental. "Hans Schmidt" é um dermatologista sul africano que patenteou um tratamento de pele supostamente milagroso. Elvis sofreu muito de acne na adolescência. Aos vinte e poucos anos, o pavor da velhice o traumatiza. "Schmidt" põe, sem querer, o dedo na ferida quando lhe escreve uma carta extremamente detalhada oferecendo a tal "terapia aromática" que desenvolveu em seu consultório em de Johanesburgo. "Schmidt" é um vendedor e tanto. Sua retórica teria afugentado os que fogem dos charlatões como diabo da cruz. Mas Presley, um rapaz no fundo ingênuo e de pouca cultura, tem uma reação oposta e fica impressionado com tanto Know How. Tendo sido entalhador e chofer de caminhão, Elvis entende de mecânica e de madeiras. Mas frases como "receptividade neuromuscular", "elasticidade epidérmica", fazem seus olhos brilhar de espanto.
"Schmidt" não abre mão da chance de ir à Alemanha ministrar-lhe pessoalmente o milagroso tratamento. A secretária de Elvis escreve, em resposta, que se "Schmidt" puder viajar até a Alemanha, as despesas da viagem serão acrescentadas aos seus honorários. Para "Schmidt" isto significa dizer simplesmente negócio fechado. Ele responde dando a Elvis a opção de depositar o dinheiro em conta bancária ou, de preferência, mandar-lhe a passagem. Duas semanas mais tarde escreve de novo. Agora não se dirige mais a Mr. Presley, é Dear Elvis, na maior intimidade. Na sua crescente impaciência, "Schmidt" resolve tomar as providências necessárias usando inclusive o próprio dinheiro. Acha que já conhece Elvis na intimidade, no entanto sequer recebeu resposta a sua última carta. Elvis é soldado, tem deveres a cumprir todo dia. E o tamanho de sua correspondência é inimaginável.
Na carta seguinte, "Schmidt" reflete quase em desespero: "Elvis, mais uma vez peço que me deixe ir prestar-lhe um serviço, só me diga quando. Conclusivamente, participo-lhe que já abandonei meu negócio e toda a clientela, só para ir servi-lo. Por favor, Elvis, não me decepcione. Eu não me recuperaria facilmente". E o Dr. "Schmidt" acaba viajando de Johanesburgo para Bad Nauheim com uma mala sobrecarregada de emolientes da cútis especialmente personalizadas para o tom e a textura dérmica de Elvis. Vernon Presley dá um baile no filho: - você trouxe um médico da África, via aérea? Não há bastante creme de pele à venda por aqui? Garoto, você é o sonho de qualquer vendedor!. E o insinuante "Schmidt" acabou tornando-se praticamente da casa, entrando e saindo com a bolsa cheia de segredos para a eterna juventude. Massagea diariamente os ombros, o rosto, pescoço do cantor. Elvis já namorava então Priscilla Beaulieu (com quem se casaria)
Mas ele não percebeu, por trás das boas maneiras convencionais "Schmidt", uma ciumenta frieza com relação à moça. O tom das visitas de "Schmidt" aos Presleys iria começar a mudar. Ele passou a tomar certas liberdades. Em pouco tempo, ficou intimo de todo o entourage (exceto de Vernon Presley, que nunca o topou), inclusive os próprios companheiros de farda do cliente: "Schmidt" tem mais de 40 anos, mas é um fã nervoso, esfuziante. Quanto mais à vontade se sente com os Presleys, mais maneirista se torna. Elvis não liga muito para isso, apresenta-o em geral como "um amigo da família, de visita a Europa" e atribui os maneirismos ao fato de ele ser estrangeiro, até o dia em que vários soldados começam a queixar-se de uma constante paquera por parte do Dr "Schmidt"!. Segundo os pracinhas, o homem havia tocado sugestivamente ou tentado encostar a mão em várias partes de seus corpos e, em um caso em especial, até se ofereceu para determinada prática sexual.
Elvis Presley ficou tão perplexo com esta história que não reagiu calculadamente. Prometeu aos pracinhas que iria Ter uma conversa de homem para homem com "Schmidt" e teve. O outro abriu-se com ele: "Eles entenderam mal minhas intenções... mas é verdade que, no passado eu me relacionei com homens, assim como com mulheres. Espero que isso não o choque...
Elvis deu a entender que não. Mas nem por isso decidiu-se a despachar de volta para casa o Dr que viajara meio mundo para conhece-lo e servi-lo. É provável que, com a proximidade física, o Sex-appeal de Elvis se tenha revelado irresistível para o farmacêutico gay. O fato é que Schmidt a partir de então, transformou em obsessão a maior de todas as suas fantasias, uma vez, durante o tratamento que se concentrava em rosto, pescoço e ombros, pôs a mão por entre as pernas do cliente com intenção totalmente extra medicinal. Elvis pulou da cadeira ainda cheio de creme, mas genuinamente chocado para poder se revoltar, e mandou que Schmidt se retirasse dali.
- Não tenha medo de mim, Elvis, ninguém gosta mais de você do que eu – foi a resposta.
No dia de natal, Schmidt reapareceu para cumprimentar a família Presley. Foi um vexame. Elvis espinafrou-o na frente de todos. O outro pediu-lhe as contas e compensação financeira pelos prejuízos que iria Ter. Elvis então concordou em pagar 200 dólares pelo tratamento e 315 dólares para uma passagem de avião para Londres, uma vez que Schmidt não decidira não voltar mais ao seu país. Mas, no dia seguinte, o fã mudou de idéia e pediu 2000 dólares, ameaçando-o em caso de recusa, arruinar a carreira de Elvis, através da imprensa. O astro decidiu levar o caso ao comandante do destacamento e o caso acabou sendo investigado pelo exército americano, que logo descobriu, entre outras coisas, que Schmidt jamais fora médico de coisa alguma.
Uma última carta do fã apaixonado, antes de pegar o avião para Londres, revelava sua decisão de não tomar nenhuma ação judicial. Ele não guardava maiores rancores. E o episódio acabou por aí, mas não sem deixar profundas marcas psicológicas em Elvis Presley.
Visões do Apocalipse
O capítulo 4 intitula-se "visões do apocalipse"; após os dois anos de serviço militar, a morte da mãe e um segundo casamento relativamente precoce do pai, Vernon, transformaram Presley em uma abrasiva mistura de carência e desordem afetiva. Sua válvula de escape é o sexo, um sexo quase sempre informal, anônimo e freqüente. A sua atitude para com o sexo oposto torna-se antagonista, às vezes abusiva, do ponto de vista emocional. Ele trata as moças com quem sai como se fossem prostitutas de rua. O sexo tinge-se de ódio e alguma paranóia. Toda mulher está a fim de usá-lo, seja financeiramente, seja para ver o nome publicado no jornal. A auto estima de Elvis decai: nenhuma delas pode Ter se encantado pelo ar de seu charme... não bastasse, e ele resolve filmar a própria libidinagem, com garotas menor de idade! Elvis quase pagou caro por esta besteira. Embora não tivesse contado nada a ninguém (a não ser anos mais tarde, antes de morrer), seu agente pessoal, o coronel Parker, descobriu a coisa e conseguiu confiscar o filme com cenas de orgias. Afinal, se jerry Lee Lewis havia-se arruinado só porque ele se casou com uma prima adolescente, o que é que filmes pornôs não poderiam causar, em potencial, à carreira de Elvis (e a dele, coronel Parker)?...
Ameaças de Morte e Dores de Cabeça Judiciais
No capítulo 5 "Ameaças de Morte e Dores de Cabeça Judiciais", a década de 60 está chegando ao fim e isto é um alívio para Elvis. O decênio de 70 é mais do que bem vindo. Está na hora de mudar porque tudo anda mal: a carreira musical, os filmes, a saúde, até o casamento com Priscilla, que ele jamais soube tratar como uma mulher de carne e osso. Mas, ao longo da década, nada mudou, na prática. Elvis não voltou ao topo das paradas de sucesso de forma consistente, nem Hollywood lhe ofereceu um roteiro que desse vida à sua estereotipada imagem cinematográfica. O jeito foi concentrar-se em performances ao vivo, de preferência sem sair do circuito Las Vegas – Lake Tahoe, porque os rigores e desconfortos das excursões e a vida on the road não estavam mais para ele. Novos dissabores não tardaram. Em 1970, uma mulher chamada Patrícia Parker ajuizou uma queixa paternidade contra Elvis. Ela estava no sétimo mês de gravidez e alegava Ter tido um ligeiro caso com Presley em Las Vegas.
Elvis, naturalmente, jurou que jamais dormira com ela; que seu único contato com a fã havia sido uma fotografia durante um show no Interrnational Hotel. Em agosto daquele ano, um telefonema anônimo anunciou que Elvis seria seqüestrado no próximo fim de semana. Um outro telefonema e nova ameaça: um homem, com forte sotaque do Sul dos EUA, dizia estar sabendo que dois homens foram contratados para matar Elvis Presley, mas em troca de 50.000 dólares, livraria a cara do cantor. As suspeitas recaíram sobre alguém ligado a Patrícia Parker. Mas não seria verossímil: mesmo que Elvis tenha tido um caso com ela, ameaças telefônicas não sintonizam bem com o temperamento de alguém empenhado em ganhar uma causa através dos competentes canais judiciais. Elvis soma 2 mais 2 e conclui que quem telefonou o conhecia muito bem, e é de sua própria terra de origem. A ameaça seria então um enorme blefe, com a finalidade de arrancar-lhe dinheiro. Até a quantia pedida reforçava isto, por ser um montante fácil de reunir depressa, ao passo que muito mais dinheiro seria problemático de levantar de uma vez.
Enfim, nada aconteceu e o episódio terminou sem um clímax. Elvis fez o show daquela noite com mais intensidade do que de costume. E nunca mais ouviu falar do misterioso telefonista anônimo. A polícia de Las Vegas manteve o caso aberto por duas semanas, depois arquivou. A experiência serviu para isolar ainda mais Elvis Presley emocionalmente e abriu caminho para uma estranha aliança com o famigerado recluso Howard Hughes.
Elvis e Howard Hughes
O FBI abriu uma pasta para Elvis em 1956. Ironicamente ao longo de 20 anos, ao mesmo tempo que investigava secretamente a sua vida, o FBI trabalhou para protegê-lo de inimigos reais e imaginários. Volta e meia, Presley recorria ao FBI em busca de proteção. Foi alvo de inúmeras ameaças de morte. Recebeu uma vasta correspondência com insinuações de violência. E houve incontáveis tentativas de chantagem e difamação. No início, Elvis não ligava muito. Com o tempo porém foi se tornando paranóico (como Howard Hughes) quanto a própria segurança, a ponto de quase não mais sair de casa por sentir medo. No fim da vida, em contato constante com o FBI, ele relatava qualquer telefonema ou transeunte misterioso que fosse visto em frente da lendária mansão de Memphis, Graceland. Qualquer semelhança com Howard Hughes não era mera coincidência e formou-se assim uma inesperada amizade. Presley conhecera Hughes em Las Vegas, na década de 50.
Hughes, um homem imprevisto e cismado, gostou de sua simplicidade. Achava o fenômeno Elvis Presley fascinante e queria entendê-lo em primeira mão. Marcou um encontro com Elvis. Foi a única vez, em que os dois conversaram a sós. Tempos mais tarde, o cantor descobriu que compartilhava das fobias e das suspeitas do bilionário. Em 1969, praticamente o dono de metade de Las Vegas, levava uma existência misteriosa no último andar do Hotel Desert Inn. Um homem obcecado por germes e bactérias, entre outras excentricidades, não cortava mais as unhas nem os cabelos. Hughes (tão paranóico que nunca deu o seu telefone para Elvis) ligava para Memphis a altas horas da noite, e os dois se queixavam amargamente dos infortúnios da fama... A instabilidade pessoal de Hughes acabou tornando a ansiedade de Presley muito mais insuportável.
Pouco antes de morrer, Elvis anunciou a alguns íntimos que ia começar a se exercitar com vistas a uma turnê projetada e que ia reunir a coragem necessária para despedir, de uma vez por todas, o coronel Parker. O abuso de drogas teve um papel decisivo no ataque cardíaco que o matou em 16 de agosto de 1977. Mas Earl Greenwood e Kathleen Tracy questionam moralmente a atitude das pessoas próximas, que deixaram esse abuso tomar tais proporções e durante tanto tempo. Muitos tiveram a ganhar mais com Elvis doentio e dependente. A começar por seguranças cujo trabalho consistia em praticamente não fazer nada: eles tinham mais chance de roubar Elvis descaradamente caso ele estivesse drogado. Se por um lado, era difícil dar conselhos pessoais a Elvis, seu pai Vernon e o empresário Tom Parker estiveram sempre em posição de autoridade que lhes permitia ao menos tentar fazer alguma coisa. Só em agosto / setembro de 1977, Tom Parker ganhou perto de um milhão de dólares com a venda de camisetas, chapéus e demais objetos de lembrança póstuma que encheram as lojas de Memphis da noite para o dia.
O livro se encerra com as especulações das causas mortis do ídolo. Para uns, suicídio, para outros, uma superdose acidental, outros finalmente acreditam mesmo em homicídio culposo. Os autores concordam e discordam das três versões. Culpam o vício da comer frituras demais a vida toda, culpam o excesso de mulheres e culpam o excesso de drogas e medicamentos, tudo aliado à personalidade extremamente emotiva e insegura, do ponto de vista auto critico, de Elvis Presley, que nunca soube o significado da palavra moderação.
Artigo escrito por José Guilherme Correa.