domingo, 15 de maio de 2011

U2 - War

Em relação ao U2 existe uma verdade absoluta: não se pode entender o grupo, seu som e suas letras sem entender suas origens. O U2 é um grupo de rock político desde sempre, mesmo em seus primeiros álbuns já se nota claramente esse aspecto. Embora os anos 80 tenham dado origem a excelentes artistas não há como negar que aquela década também foi o auge do Pop. E o mundo Pop é aquela coisa: se investe muito mais no visual e na imagem dos artistas do que em qualquer outra coisa. O artista pop é uma celebridade por excelência, vide os maiores ícones daqueles tempos, Michael Jackson e Madonna. Ser político, tratar de assuntos sérios naquela época não era fácil, mas o U2 salvou a lavoura daqueles tempos relativamente bem fúteis. Eles deixaram as futilidades de lado e resolveram falar dos problemas políticos de seu país, da barra enorme que era ser um jovem na Irlanda durante a opressão inglesa aos seus cidadãos e à sua liberdade. Não havia espaço para baboseiras, o assunto era sério. 

Um exemplo você pode conferir nesse "War", cujas intenções do grupo ficam evidenciados logo no título. Que artista pop adolescente dos 80´s iria dar o nome de "Guerra" a um disco? Absolutamente nenhum. Assim o U2 rompeu realmente barreiras. O som do grupo e principalmente as letras fugiam do feijão com arroz, das melodias cheias de sintetizadores e dos temas banais do tipo adolescente ama garota, mas garota não o ama. Na época havia também outro fator importante: O Bono ainda não era tão pretensioso e nem queria salvar o mundo como vemos hoje em dia! Ele apenas fazia um som honesto ao lado de seu conjunto e se considerava apenas um membro da classe trabalhadora irlandesa que conseguiu se destacar no cenário musical - e isso era o ápice da vida deles, não salvar o planeta Terra da destruição como vemos agora. Deixando isso um pouco de lado "War" ainda é muito bom musicalmente e não perdeu a força, mesmo depois de tantos anos. O Rock como gênero musical talvez seja um dos únicos que resiste muito bem ao tempo, praticamente nunca ficando datado (com exceções, é óbvio). De qualquer maneira se você não está nem aí para esse tipo de discussão e quer apenas matar as saudades de sua juventude o disco ainda cai muito bem pois está cheio de hits radiofônicos da época, afinal de contas onde mais você iria ouvir o hino "Sunday Bloody Sunday"?

U2 - War (1983)
Sunday Bloody Sunday / Seconds / New Year's Day / Like a Song../ Drowning Man / The Refugee
Two Hearts Beat as One / Red Light / Surrender / 40 / U2 - War (Irlanda, 1983) Produção: Steve Lillywhite / Selo: Island / Data de gravação: 17 de maio, 20 de agosto de 1982 / Data de Lançamento: Fevereiro de 1983 / Músicos: Bono (vocal, guitarra), The Edge (guitarra, piano), Adam Clayton (baixo), Larry Mullen Jr (bateria), Kenny Fradley (trompete), Steve Wickham (violino), The Coconuts (vocais).

"Sunday Bloody Sunday" talvez seja a música mais politizada do U2. Uma letra relembrando o domingo sangrento, quando os soldados ingleses abriram fogo contra manifestantes irlandeses desarmados, parte da população civil que apenas estava reivindicando seus direitos. Um absurdo completo. A harmonia da música inclusive lembra uma marcha militar para destacar ainda mais a indignação dos membros da banda. E pensar que apenas ditaduras atiravam contra pessoas inocentes... a democrática Inglaterra também carregou essa mancha em seu história.

"Seconds" é a segunda canção do disco. Aqui o teor da letra também é político. Nessa mensagem Bono tenta chamar a atenção para o perigo da corrida armamentista entre as grandes potências nucleares da época (Estados Unidos e União Soviética), cada uma construindo mais e mais armamentos nucleares de alta potencialidade destrutiva. Aonda tudo aquilo iria terminar? O ritmo da canção é muito boa, lembrando inclusive a primeira faixa "Sunday Bloody Sunday". O ritmo se desenvolve como uma marcha militar. Outro recado de Bono sobre os problemas que o mundo vivia naquele momento.

A terceira música desse disco acabou se tornando também seu maior hit nas rádios dos anos 80. Se trata de "New Year's Day". Aqui os arranjos já são bem mais caprichados, com destaque para a guitarra duplicada ao fundo. A gravadora farejou sucesso nessa gravação e lançou como single em janeiro de 1983 com a faixa "Treasure (Whatever Happened to Pete the Chop)" no lado B. O sucesso se confirmou. Foi a primeira música do U2 a ter destaque na parada da Billboard nos Estados Unidos. Também foi a primeira música do grupo a entrar na seletiva lista "Top 10" do Reino Unido. Para jovens irlandeses praticamente desconhecidos foi um avanço e tanto na carreira.

Pablo Aluísio.

sábado, 14 de maio de 2011

The Beatles - The Decca Tapes

Toda história de sucesso precisa ter um começo modesto. Assim que Brian Epstein assinou com os Beatles ele sentiu a necessidade de que o grupo precisava de uma grande gravadora. Era preciso ter um disco para divulgação do som do quarteto. A primeira providência foi arranjar um teste com a gravadora Decca em Londres. A Decca era tradicional no mercado e tinha grandes artistas sob contrato. Todo o trabalho de divulgação e promoção de seu departamento de marketing era considerado o melhor da Inglaterra. Era o ideal para os Beatles. Eles obviamente ficaram animados e até tocaram muito bem na audição. O problema é que foram recusados! Isso mesmo, a Decca recusou aquele que seria o grupo de rock mais popular do mundo, que venderia milhões de cópias de discos nos anos seguintes!

Felizmente as gravações sobreviveram ao tempo e podem ser ouvidas aqui nesse álbum. O tal sujeito - que depois seria demitido obviamente por ter recusado o maior fenômeno musical de todos os tempos - alegou que grupos de rock formado apenas por rapazes já estavam fora de moda, que não tinha mais nada a ver aquele tipo de som e que as chances daquele grupo de rock desconhecido de Liverpool dar certo era muito remota. Trocando em miúdos foi um dos maiores banhos de água fria que se poderia imaginar. No caminho de volta da viagem o grupo, claro, ficou bem para baixo, desanimado mesmo. Só não ficaram mais entristecidos porque Brian Epstein tinha uma carta na manga. Ele havia marcado outra audição, dessa vez na gravadora EMI.

Brian havia conhecido um produtor considerado excêntrico dentro da empresa chamado George Martin. Embora fosse um talento musical e maestro de profissão, Martin ganhava a vida gravando discos de comédia no selo Parlophone. Absolutamente ninguém levava a Parlophone à sério dentro da EMI e por isso ninguém ligou muito quando George Martin fechou com os Beatles, assinando o primeiro contrato profissional da vida daqueles jovens. Para os demais executivos da EMI, o velho George Martin só havia contratado um grupo de rock desconhecido para tocar um barulho em seu selo. Mal sabiam eles no que os Beatles iriam se transformar...

De qualquer forma, musicalmente falando, esses primeiros registros na Decca já mostra um conjunto de músicos bem entrosados, fruto da época em que eles se apresentavam diariamente na Alemanha. O repertório, por essa razão, é basicamente o set list de seus concertos em Hamburgo. Há música de salão, para dança, como a famosa "Besame Mucho", rocks mais viscerais como "Money (That's What I Want)" e até covers de Buddy Holly como "Crying, Waiting, Hoping". Em Hamburgo os Beatles tocavam para marinheiros americanos que passavam alguns dias de folga nos clubes noturnos da cidade. Por isso os Beatles tinham de se virar para agradar esses militares. Havia espaço também para músicas surreais como "The Sheik Of Araby" e homenagens ao ídolo Chuck Berry em números como "Memphis Tennessee" que também seria gravada por Elvis Presley alguns anos depois. Enfim, uma boa amostra do tipo de som que os Beatles tocavam em seus primeiros anos de estrada. Não há nenhum deslize por parte deles na audição, todas as canções estão bem tocadas, demonstrando acima de tudo que o executivo que os reprovou na época era mesmo um produtor bem idiota.

The Beatles - The Decca Tapes (1982)
Like Dreamers Do / Money (That's What I Want) / Till There Was You / The Sheik Of Araby / To know Her Is To Love Her / Take Good Care Of My Baby / Memphis Tennessee / Sure to Fall (In Love With You) / Hello Little Girl / Three Cool Cats / Crying, Waiting, Hoping / Love Of The Loved / September In The Rain / Besame Mucho / Searchin. / Data de gravação: janeiro de 1962 / Músicos: John Lennon (guitarra), Paul McCartney (baixo), George Harrison (guitarra), Pete Best (bateria).

Pablo Aluísio.

The Beatles - John Lennon e sua Guitarra Rickenbacker

No auge dos Beatles se criaram vários símbolos associados ao grupo, fossem os cabelos (considerados escandalosamente longos para a época), ou os terninhos britânicos com corte francês. Até mesmo os próprios instrumentos musicais que eles usavam viraram marca da banda. Um dos ícones nesse sentido foi a guitarra Rickenbacker com a qual Lennon gravou praticamente todos os primeiros discos dos Beatles. A famosa  marca de instrumentos musicais chegou pela primeira vez a John quando os Beatles tocavam em Hamburgo, na Alemanha. Isso mesmo, o design e a tecnologia da Rickenbacker eram alemães. É curioso que enquanto os outros ídolos da música, como Elvis Presley, preferiam a tradicional Gibson, Lennon não abria mão da sua guitarrinha alemã, que nem era considerada tão boa e cheia de recursos como as demais.

Nos tempos do Cavern Club a guitarra que John Lennon usava era conhecida como Heiligengeistfeld. Era um modelo mais simples (até tosco, diria) sem muitos recursos. O instrumento era de tal forma fraco em suas qualificações técnicas que o próprio Lennon precisou modificá-la. Algo que ele mesmo fez com uma velha chave de fenda. Ele instalou vários acessórios Hofner comprados numa loja de instrumentos musicais de Hamburgo. A grana era curta, os Beatles tocavam na noite para ter o que comer no dia seguinte. Em tempos de dureza a criatividade geralmente despontava.

Depois que os Beatles voltaram para a Inglaterra a sorte começou a mudar e John Lennon aposentou sua velha companheira de palco. Em fins de 1961 ele adquiriu uma guitarra Rickenbacker 325 conhecida popularmente como modelo Capri. Foi essa guitarra que se tornou mundialmente famosa em suas mãos pois foi tocando nela que Lennon atravessou a fase mais gloriosa dos Beatles. A usou em praticamente todos os álbuns do grupo de "Please Please Me" até "Rubber Soul" quando a própria sonoridade dos Beatles começou a mudar, deixando de lado a boa e velha Rickenbacker. Um fato curioso sobre essa guitarra é que John Lennon a destruiu em 1967 durante uma bebedeira em sua casa em Londres. Em uma farra John a teria jogado do segundo andar e o instrumento se espatifou no chão com a queda.

Alguns anos atrás um segundo instrumento, do mesmo modelo e que também havia pertencido a Lennon, foi vendido em um leilão por 800 mil dólares. Essa segunda guitarra pertencia a Ringo Starr que teria sido presenteado com ela por John em Nova Iorque no ano de 1975. Ringo visitava os Estados Unidos quando em um encontro no apartamento de Lennon ele teria oferecido o instrumento a Ringo "pelos bons e velhos tempos dos Beatles". Não era a mesma dos acordes inesquecíveis dos discos dos Beatles, mas de qualquer maneira, como foi provado em leilão, tinha também seu valor histórico e musical.

Pablo Aluísio.

sexta-feira, 13 de maio de 2011

The Beatles - Beatles VI (1965)

Certa vez John Lennon disse que não conseguia entender direito a discografia americana dos Beatles. Como se sabe a Capitol, gravadora que detinha os direitos de lançamento dos discos dos Beatles nos Estados Unidos, criava seus próprios álbuns e esses eram bem diferentes dos discos ingleses (só para situar o leitor é interessante explicar que a discografia inglesa é de fato a oficial dos Beatles). Pois bem, os executivos da Capitol geralmente pincelavam faixas soltas e as misturavam com canções dos álbuns originais ingleses. Para completar o caldeirão fundiam tudo com singles ingleses e europeus.

"Beatles VI" vai por esse caminho. Na verdade se trata, muito a grosso modo, de uma fusão dos discos britânicos "Beatles For Sale" e "Help!". O curioso é que esses álbuns venderam imensamente mais cópias do que os originais britânicos, uma vez que o mercado inglês não poderia ser comparado com a complexidade e a imensidão do mercado consumidor americano. Para nós, brasileiros, esse disco soava completamente estranho pois felizmente a Emi Odeon no Brasil resolveu seguir, sabiamente, o catálogo original que foi lançado na Inglaterra e no resto da Europa (com obviamente pequenas exceções como os discos brasileiros ao estilo "Beatlemania" e "Beatles Again").

É curioso perceber também o fato de que o disco é basicamente uma seleção de covers, principalmente de cantores e compositores americanos (como Buddy Holly e a dupla Leiber e Stoller). Um tipo de homenagem fabricada Made in USA dos Beatles em relação ao rock feito na América. Uma espécie de "Yankees Go Home" ao avesso! Lançado nos Estados Unidos em meados dos anos 60 o LP original vendeu muito e alcançou os primeiros lugares da parada naquele país. Depois disso o álbum foi poucas vezes relançado no mercado americano, talvez pelo fato de que a partir dos anos 70 o interesse dos fãs americanos cresceu em relação aos discos do Reino Unido. No Brasil o LP nunca foi lançado, nem antes e nem depois, sendo cópias americanas um item raro entre colecionadores. Pois é, banda de alcance internacional, os Beatles também apresentavam diferenças nas diversas discografias das mais diferentes nações.

The Beatles - Beatles VI (1965)
Kansas City / Eight Days A Week / You Like Me Too Much / Bad Boy / I Don't Want To Spoil The Party / Words Of Love /  What You're Doing / Yes It Is / Dizzy Miss Lizzie / Tell Me What You See / Every Little Thing / País de origem: Estados Unidos / Estúdio / Selo: Capitol Records / Produção das gravações originais: George Martin / Formato Original: Vinil / Músicos: John Lennon, Paul McCartney, George Harrison e Ringo Starr.

Pablo Aluísio.

The Beatles - Eleanor Rigby

Paul McCartney compôs essa canção durante as filmagens de "Help!". Ele inclusive quase escolheu a música para fazer parte da trilha sonora do filme, mas pensou melhor e resolveu trabalhar ainda mais nela antes de levá-la para o estúdio. Assim que George Martin a ouviu pela primeira vez percebeu que ali havia uma faixa clássica que não se enquadraria com os instrumentos de um grupo de rock. Era necessário escrever um arranjo mais erudito, usando um quarteto de cordas, de preferência. Paul aceitou imediatamente as sugestões. Assim os instrumentos básicos dos Beatles foram deixados de lado.

Um grupo de músicos foi contratado e Paul e Martin começaram a lapidar a canção em Abbey Road. Para se ter uma ideia Ringo Starr nem sequer participou da gravação da música. John e George só colaboraram fazendo os vocais de apoio. Embora John tenha creditada a canção como uma de suas criações, o fato é que sua participação foi quase nula. Paul esclareceria anos depois que John havia escrito apenas uma linha da letra e feito o backing vocal, nada muito além disso. Aliás nenhum dos Beatles tocou na faixa, sendo tudo providenciado mesmo pelo gênio George Martin.

A letra, composta quase que exclusivamente por Paul falava sobre solidão. Essa é certamente uma das letras mais cinematográficas dos Beatles pois em essência narra o enterro de Eleanor Rigby, uma pessoa solitária, em cujo funeral ninguém compareceu a não ser o Padre McKenzie para fazer as orações finais. Durante anos Paul disse que a personagem Eleanor Rigby era ficcional, tanto que antes de escolher esse nome outros foram usados na composição como Miss Daisy Hawkins.

A sonoridade porém não agradava Paul que depois finalmente encontrou o que procurava em "Eleanor Rigby". A explicação soava bem plausível, isso até historiadores dos Beatles encontrarem uma lápide real no cemitério de Liverpool com o nome de Eleanor Rigby, cuja data de falecimento constava como o de 1939. Informado sobre a descoberta Paul se disse completamente surpreso. Quem sabe seu nome ficou em seu subconsciente, pois Paul costumava frequentar o local quando era mais jovem. Mais um mistério na história desse verdadeiro clássico da carreira dos Beatles.

Eleanor Rigby (Paul McCartney / John Lennon) Álbum: Revolver / Data de Gravação: 28 e 29 de abril, 6 de junho de 1966 / Local de Gravação: Abbey Road Studios, Londres / Produtor: George Martin / Músicos: Paul McCartney (vocal), John Lennon (vocal), George Harrison (vocal), Tony Gilbert (violino), Sidney Sax (violino), John Sharpe (violino), Juergen Hess (violino), Stephen Shingles (violão), John Underwood (violão), Derek Simpson (violoncelo), Norman Jones (violoncelo).

Pablo Aluísio.

quinta-feira, 12 de maio de 2011

John Lennon - Live Peace in Toronto

Em 1969 chegou nas lojas o álbum "John Lennon - Live Peace in Toronto". Esse pode ser considerado o primeiro disco solo de John do ponto de vista puramente musical. Seus outros trabalhos ao lado de Yoko Ono traziam apenas sons experimentais e nada mais. Aqui sim havia finalmente música. É um show ao vivo com a Plastic Ono Band, um arremedo de grupo musical que John reuniu às pressas para fazer o concerto. O disco abre com um cover de Lennon para o clássico de Carl Perkins, "Blue Suede Shoes", que como todos sabemos se tornaria imortal mesmo na voz de Elvis Presley. Apesar da pressa de se ensaiar na véspera do show e tudo mais, essa versão de John Lennon é bem executada, diria até muito boa. Há uma pegada bem mais pesada do que as versões originais e os solos de guitarra valorizam muito o resultado final. Com essa performance Lennon quis deixar claro suas raízes, de onde tinha surgido sua vontade de ser um roqueiro. Tudo podia ser encontrado nos primeiros discos da pioneira geração do rock americano. O resto era bobagem.

Depois ele mais uma vez deixou o arranjo mais pesado e visceral nessa nova versão de "Money", uma canção marcante dos primeiros discos dos Beatles. É impossível não lembrar dos Beatles aqui. A melodia foi, digamos, modificada bastante por John. Ficou com menos velocidade, mas também mais pesada. Uma solução por parte de Lennon que me agradou completamente devo dizer. A única ausência mais sentida vem da ausência justamente dos vocais de apoio de Paul e George. A voz isolada de John deixa uma sensação de vácuo, de que algo está faltando. E está mesmo, pois os Beatles eram mesmo insubstituíveis.

Depois de dois covers - excelentes, é bom frisar - John se sai com uma versão envenenada de "Dizzy, Miss Lizzy". Essa canção fechava o álbum "Help!" dos Beatles. Não era uma composição de Lennon e McCartney, mas sim uma faixa composta por Larry Williams. Na época de sua gravação original ao lado dos Beatles, John justificou sua gravação como um lembrete aos demais membros do grupo de que os Beatles era uma banda de rock ´n´ roll e isso jamais deveria ser esquecido. Por isso ele optou por essa pauleira, com guitarras estridentes e fortes. Talvez John estivesse incomodado com gravações como "Yesterday" e todos aqueles violinos. Para John Lennon isso agredia um pouco a imagem que ele gostava de ter de si mesmo, a de um jovem roqueiro rebelde com casaco de couro.

Uma pena que John Lennon nunca tocou "Yer Blues" ao vivo com os Beatles. Essa canção que foi lançada no Álbum Branco era de excelente qualidade, um blues ao velho estilo. Tinha um ótimo arranjo, contando com excelentes solos de Harrison. Infelizmente quando ela foi gravada os Beatles já tinham desistido dos concertos e das turnês internacionais. Assim acabou se tornando uma canção apenas de estúdio. Os Beatles jamais a tocariam ao vivo.

Tinha grande potencial de palco, algo que certamente Lennon sabia, tanto que a levou para seu show em Toronto. A execução de John ao lado da Plastic Ono Band até que é muito boa, mas certamente jamais poderia ser comparada à versão oficial dos Beatles. Embora bem fiel ao disco, deixa em certos aspectos muito a desejar, principalmente no duelo de guitarras no solo, em sua parte final.

"Cold Turkey" também apresenta problemas. Aceleram demais a velocidade da música, tão absurdamente que ficou parecendo até mesmo outra canção! Absurdo! Essa canção ganhou uma bela versão de estúdio, que inclusive foi lançada como single na época. Ao vivo ela ficou estranha, principalmente por Lennon não demonstrar muita fidelidade ao disco original.

Para falar a verdade percebe-se até mesmo um certo desleixo por parte dele, o que não deixa de ser uma surpresa, já que a música era já naquela época considerada uma de suas melhores faixas na carreira solo. Os gritinhos de Yoko também não ajudam em nada. O público fica até mesmo assustado com eles. Isso fica claro quando se percebe as tímidas palmas depois que o grupo termina de tocar a canção. Pelo visto não gostaram muito.

Depois de "Cold Turkey" Lennon resolve cantar um dos seus hinos de paz, a super conhecida "Give Peace a Chance". Essa música pacifista foi escrita por Lennon para participar de sua campanha pela paz "War is Over". Curiosamente a música trazia como coautor Paul McCartney, embora ele não tivesse na verdade nada a ver com a canção. Era a velha cláusula, ainda dos primeiros anos dos Beatles, que afirmava que eles sempre assinariam Lennon / McCartney, mesmo quando as canções fossem feitas por apenas um deles. Como os Beatles ainda estavam na ativa em 1969 - eles só se separariam definitivamente em 1970 - Lennon cumpriu sua parte do acordo, colocando seu companheiro de banda na coautoria da canção.

Pablo Aluísio.

Frank Sinatra - Swing Easy!

Quando Frank Sinatra foi para a gravadora Capitol ele queria mesmo mudar, procurar por novos rumos. Com um contrato que lhe dava plena autonomia na gravação de seus discos ele começou a planejar cuidadosamente cada álbum. Os LPs da carreira de Sinatra na Capitol eram extremamente pessoais pois ele pensava me praticamente tudo, da seleção musical às capas, dos arranjos aos menores detalhes. Tudo partia de Sinatra e tinha que passar por ele antes de qualquer decisão definitiva. De certo modo Sinatra era visto quase como um tirano pelos executivos da gravadora, mas havia uma clara razão para isso: Sinatra almejava a perfeição e acima de tudo o sucesso. Sua fase na Capitol é para muitos críticos não apenas a mais comercial de sua carreira, como também a mais criativa, pessoal e brilhante de Sinatra. Ele suavizou tudo, desde seu visual até às próprias canções, procurando por um repertório agradável que soasse bem aos ouvidos do homem comum da América.

Esses álbuns da Capitol não foram pensados e nem criados para um público mais erudito. O próprio Sinatra dizia que os realizou para o trabalhador comum que precisava relaxar na sala de sua casa após um dia duro de trabalho. Por essa razão notamos em praticamente todos os discos dessa fase essa suavidade agradável que tanta caracteriza esses trabalhos musicais. A intenção de agradar era tamanha que Sinatra resolveu abrir algumas sessões de gravação para o público e jornalistas. Alguns fãs eram escolhidos pela produção de Sinatra, além de críticos musicais de renome. Todos acompanhavam o método de trabalho do cantor atrás dos microfones.

O mais curioso é que Sinatra acabava criando uma relação com essas pessoas, quase como se estivesse perante um grande público. Entre um gole e outro de café ele ia cantando, contando piadas ou histórias engraçadas, enquanto interagia com seus músicos (apenas os melhores, escolhidos a dedo por Sinatra e o produtor Nelson Riddle entre as principais big bands americanas da época). Frank geralmente escolhia um horário especial para trabalhar (entre oito da noite à meia-noite). Nesse meio tempo ele dava o melhor de si, entretinha os convidados, tudo em um clima muito íntimo e aconchegante. O resultado? Um dos discos mais simpáticos e de fácil digestão do velho Sinatra. Uma verdadeira preciosidade que não pode faltar em sua coleção de (boa) música.

Frank Sinatra - Swing Easy! (1954)
Just One of Those Things
I'm Gonna Sit Right Down (And Write Myself a Letter)
Sunday
Wrap Your Troubles in Dreams
Taking a Chance on Love
Jeepers Creepers
Get Happy
All of Me

Pablo Aluísio.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Paul McCartney - Egypt Station

Esse é o novo álbum de Paul McCartney. "Egypt Station" é o seu título. Como se pode perceber ele não está nem um pouco disposto a se aposentar. John Lennon sempre disse que Paul era viciado em trabalho. A mais pura verdade. Esse álbum me deixou bem satisfeito, mais do que os anteriores. Paul abraçou novamente as boas melodias, as sonoridades agradáveis ao ouvido, voltando para aquele tipo de música que sempre foi sua marca registrada. É um repertório que me fez lembrar dos melhores discos de Paul nos anos 80. Ele definitivamente não perdeu a mão em compor e produzir músicas nesse estilo. Isso você perceberá logo no começo do CD. "I Don't Know" tem um belo arranjo em piano e violão. Seus primeiros acordes me fizeram lembrar imediatamente de "Only Love Remains". A letra é simples, passando uma mensagem que não vai mudar o mundo, mas que agrada bastante. Aqui Paul acerta justamente por escolher o simples e eficiente. Nada de sons exagerados, tentando evocar uma modernidade que não agrega em nada no final das contas.

Como não poderia deixar de ser a faixa mais comentada entre os fãs brasileiros é justamente a música que Paul fez em homenagem ao nosso país. Os primeiros acordes já entregam que Paul foi em busca de inspiração na boa e velha Bossa Nova. Depois ele acrescenta uma sonoridade mais moderninha, mas sem nunca deixar o acompanhamento inicial. Essa canção que Paul batizou de "Back in Brazil" foi composta quando ele estava em turnê pela terra brasilis. Segundo o produtor Greg Kurstin essa foi uma das primeiras canções gravadas e uma das que mais deram trabalho a Paul em estúdio. Sim, o Brasil não é para iniciantes! Outro destaque desse disco é "Hand in Hand". Seu estilo me fez lembrar muito das canções do disco "London Town" de 1978. É a mesma simplicidade romântica, com poucos instrumentos ao fundo, quase como se Paul estivesse cantando uma canção de ninar. O arranjo de quarteto de cordas que vai surgindo aos poucos também acrescenta muito ao resultado final. Achei acima de tudo uma faixa cativante, principalmente para quem é fã de longa data do ex-Beatle.

Gostei de "Who Cares" desde a primeira vez que ouvi. Certo, a canção tem um começo meio esquisito, mas depois que Paul coloca para fora seu lado, digamos, experimental, a canção embala. É uma daquelas faixas que me lembram dos discos de Paul lá por volta de meados dos anos 80. Com um arranjo de guitarras bem à vontade, é um dos bons momentos do disco. Uma faixa crua que cumpre o que promete. Já "Fuh You" parece simplória em seus primeiros acordes. Porém é preciso reconhecer que ela tem uma das melhores melodias do álbum e um refrão que vai grudar na sua cabeça de forma definitiva. Com duas audições você já pegou a linha da canção, não a esquecendo mesmo. É aquele tipo de som descompromissado que fez a carreira solo de Paul. Não me admira que esse CD tenha vendido tanto. Sua sonoridade que nos remete ao bom e velho Paul dos anos 80 aqui prova que a antiga fórmula ainda funciona muito bem. Típico som para tocar na FM naquela viagem de carro que você vai ter que fazer no fim de semana.

Gosta de uma boa balada ao violão? Então a dica do álbum é a singela "Confidante". Paul disse que sempre compôs ao longo da vida com basicamente apenas dois instrumentos: violão ou piano. Suas músicas mais clássicas sempre foram feitas ao piano. As mais bucólicas sempre surgiram nas cordas do violão que ele sempre gosta de carregar para onde vai, até porque a inspiração pode pintar a qualquer momento, em qualquer lugar. Essa faixa foi composta ao violão, enquanto Paul tirava férias numa estação de verão nos Estados Unidos. Composta à beira do lago mantém bem esse clima. Mais um momento agradável do álbum. Gostei bastante. Devo dizer que não curti muito "People Want Peace". Não se trata de implicância com a letra pacifista onde Paul tenta apertar um botão para virar o ativista John Lennon dos anos 70. Nada disso. Certo que a música tem muitos clichês - alguns já mais do que saturados - porém o que derrapa aqui em minha opinião é a própria melodia, que considero fraca e sem direção. O finalzinho com todo mundo batendo palma, como se estivessem em um acampamento hippie, também não convence em nada. Esse tipo de música era com John Lennon, não tem jeito. Com Paul parece forçada e falsa. 

Enfim, essas são algumas músicas que mais me chamaram a atenção, mas há outros bons momentos certamente. Em termos de música todos acabam desenvolvendo seus próprios gostos pessoais, como é de praxe. Minha conclusão sobre esse álbum de Paul McCartney é que ele obviamente perde em comparação com outras obras musicais do passado desse grande artista, mas em relação a outros CDs mais recentes até que se sai muito bem. Talvez haja excesso de faixas (18 são um pouco demais em minha opinião) teriam deixado o disco mais enxuto, com mais qualidade. Entretanto esse é uma escolha pessoal do artista. Assim o que temos é um álbum acima de tudo agradável de se ouvir.

Paul McCartney - Egypt Station (2018)
Opening Station
I Don't Know
Come On to Me
Happy with You
Who Cares
Fuh You
Confidante
People Want Peace
Hand in Hand
Dominoes
Back in Brazil
Do It Now
Caesar Rock
Despite Repeated Warnings
Station II
Hunt You Down/Naked/C-Link

Pablo Aluísio.