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quinta-feira, 12 de dezembro de 2019

A Montanha dos Sete Abutres

Há momentos em que os deuses do cinema parecem estar em estado de graça. Unir um diretor genial como Billy Wilder com um ator excepcional como Kirk Douglas não poderia dar em outra coisa. Esse clássico "A Montanha dos Sete Abutres" é uma verdadeira obra-prima da sétima arte. O enredo é um retrato puro e até mesmo cruel da alma do ser humano. Aqui visto sob o lado mais sórdido de cada personagem em cena. O brilhante roteiro serve para mostrar as reais intenções de certas pessoas que não estão preocupadas em ajudar os outros, mesmo que esses passem por momentos cruciais na vida, mas sim em como podem explorar uma situação limite em proveito próprio, passando por cima de todos os valores e de todos os sentimentos nobres. A trama explora muito bem esse aspecto. Chuck Tatum (Kirk Douglas) é um jornalista decadente que após ter trabalhado em grandes jornais de Nova Iorque vai parar em um jornalzinho de Albuquerque, bem no interior dos Estados Unidos. É uma queda e tanto na carreira. Tudo o que Tatum deseja é encontrar uma boa história para levantar novamente sua vida profissional. E ela surge, quase por acaso, após um homem ficar preso soterrado numa velha mina, construída em cima de um antigo cemitério indígena. Não demora muito e Tatum transforma o acontecimento em um verdadeiro circo, causando uma comoção na mídia nacional. Para ele o que importa não é o destino do pobre sujeito soterrado, mas sim o proveito pessoal que poderá tirar daquela tragédia.

O filme é bem isso. Um maravilhoso e ao mesmo tempo cruel tratado sobre a sordidez humana. Assim de forma bem simples poderíamos resumir esse grande clássico de Billy Wilder, "Ace in the Hole", sem dúvida um de seus mais brilhantes e inspirados trabalhos. Os personagens que o cineasta explora em seu roteiro formam o retrato da ambição humana sem limites, um conjunto de pessoas desprezíveis que só pensam em si mesmas e não hesitam em explorar a desgraça alheia em prol de seu proveito próprio. O jornalista interpretado por Kirk Douglas certamente é o mais perfeito retrato disso, um sujeito que só deseja o sucesso pessoal a qualquer custo, mesmo que isso custe a vida de um inocente.

A esposa do pobre sujeito soterrado, a falsa loira Lorraine Minosa (em ótima atuação da atriz Jan Sterling), é uma figura desalmada, mesquinha, má e interesseira que causa asco e nojo no espectador. Nessa tríade de gente ordinária não escapa nem mesmo o xerife da cidade, incorporando todas as corrupções que você possa imaginar. Billy Wilder assim procura mostrar ao público o lado mais desprezível de todos eles. O valor da vida humana é mera peça no tabuleiro de interesses vis e sórdidos. No final o que temos aqui é um retrato nada lisonjeiro da alma humana e uma prova maravilhosa do talento desse grande cineasta. É, em suma, um filme indispensável para se guardar em sua coleção.

A Montanha dos Sete Abutres (Ace in the Hole, Estados Unidos, 1951) Estúdio: Paramount Pictures / Direção: Billy Wilder / Roteiro: Billy Wilder, Lesser Samuels, W. Newman / Elenco: Kirk Douglas, Jan Sterling, Robert Arthur / Sinopse: Jornalista inescrupuloso e mau-caráter começa a explorar de forma vil uma tragédia para levantar sua carreira decadente. Filme indicado ao Oscar na categoria de Melhor Roteiro Original (Billy Wilder, Lesser Samuels e Walter Newman).

Pablo Aluísio.

quarta-feira, 16 de maio de 2018

Armado Até os Dentes

Título no Brasil: Armado Até os Dentes
Título Original: Man with the Gun
Ano de Produção: 1955
País: Estados Unidos
Estúdio: United Artists
Direção: Richard Wilson
Roteiro: N.B. Stone Jr, Richard Wilson
Elenco: Robert Mitchum, Jan Sterling, Karen Sharpe, Saul Atkins, Emile Meyer, John Lupton.

Sinopse:
No filme Robert Mitchum interpreta um pistoleiro de aluguel chamado Clint Tollinge. Se auto denominando um "pacificador de cidades" ele chega na pequena Sheridan atrás da mãe de sua pequena filha. Ao chegar no local acaba descobrindo que a cidade está sendo ameaçada e extorquida pelo bando de um rancheiro que quase nunca vai lá, mas que barbariza com quem se atreve a cruzar seu caminho. Colocando seus serviços à disposição do povo local, Clint logo é escolhido como auxiliar do xerife para colocar ordem no caos reinante.

Comentários:
Eficiente Western B que tem um roteiro tão redondinho que me deixou surpreso. A United Artists era controlada por artistas, atores e profissionais do cinema. Fundada ainda na época do cinema mudo, a companhia procurava inovar em suas produções. Infelizmente depois de vários anos em crise o estúdio precisou procurar por filmes mais comerciais, que trouxessem bilheteria sem muitos custos. O gênero faroeste assim se mostrou adequado pois era relativamente barato rodar um western e sua popularidade sempre garantia o retorno de um bom lucro para a empresa. Além disso sempre era um bom negócio rodar uma fita com o popular Robert Mitchum. Embora filmes noir fossem sua especialidade ele também se saia muito bem em filmes de bangue-bangue. Além dele o elenco de apoio também é muito bom.  O interessante aqui é que o vilão (e obeso mórbido) Dade Hollman só aparece nos cinco minutos finais, o que demonstra que o roteiro joga bastante com sua onipresença na região, embora praticamente não apareça em cena. O elenco é muito bom. Robert Mitchum compõe um tipo que curiosamente seria repetido por outro Clint, o Eastwood, em seus filmes. Caladão, durão, cara de poucos amigos, ele logo impõe respeito por sua perícia e velocidade no gatilho. O elenco feminino é todo formado por beldades e starlets da época. Como o enredo mostra um grupo de dançarinas de cabaret a fartura de mulheres bonitas é alta no filme, com destaque para Karen Sharpe, jovem e estreante no cinema. Esse foi o primeiro filme do diretor Richard Wilson. Embora estreante nas telas se saiu muito bem pois consegue imprimir ação e tensão nas medidas certas. Curiosamente ele iria dirigir poucos filmes em sua carreira, preferindo exercer a função de produtor anos depois. Enfim, recomendo "Armado Até os Dentes" para os fãs de western. É um filme rápido, bem atuado e com roteiro bem construído.

Pablo Aluísio.

sábado, 17 de fevereiro de 2007

A Trágica Farsa

Foi o último filme da carreira do ator Humphrey Bogart. O interessante aqui é que em seu último papel, Bogart interpretava um sujeito que após várias táticas desonestas se arrependia e procurava por redenção – algo um tanto quanto distante de todos os seus famosos papéis de personagens cínicos do passado, que viraram sua marca registrada ao longo da carreira. Afinal essa coisa de redenção pessoal era para os fracos, pelo menos do ponto de vista de sua vasta galeria de personagens interpretados ao longo de décadas de carreira em Hollywood. Não é desnecessário relembrar que nos primeiros filmes Bogart geralmente interpretava gângsters da pesada, sujeitos forjados na criminalidade, sem essa de remorso ou culpa. Eram caras durões, acima de tudo.

Em “A Trágica Farsa” Bogart interpreta o jornalista esportivo Eddie Willis que após 17 anos trabalhando em jornais da cidade se vê subitamente desempregado. Tentando sobreviver, ele procura contato dentro do mundo dos esportes e acaba se envolvendo com o promotor de lutas de boxe Nick Benko (Rod Steiger). Inicialmente Benko escala Willis como relações públicas de um jovem boxeador chamado Toro Moreno (Mike Leno) mas esse não confirma seu potencial. Visando recuperar seu dinheiro investido Benko propõe a Willis uma parceria em uma série de lutas forjadas com o único objetivo de enganar e ganhar o dinheiro de apostadores desavisados. Além de ganhar dinheiro das apostas a dupla pretende trilhar o caminho do pouco talentoso boxeador para uma luta com o atual campeão de pesos pesados em Nova Iorque o que lhes trará uma soma considerável, uma verdadeira fortuna.

O roteiro de “A Trágica Farsa” é muito bem desenvolvido e mostra sem paliativos o podre universo das lutas arranjadas dentro da liga de boxe dos Estados Unidos durante a década de 1950. No começo de tudo o personagem de Bogart se sente completamente à vontade enganando e tapeando os apostadores de lutas por onde passa, mas após a morte de um lutador ele começa a se arrepender do que está fazendo. E é justamente nesse período de crise de consciência que o filme cresce e Bogart mostra todo o seu talento. Em seu último papel o ator Humphrey Bogart explora bem sua própria decadência fisica em prol de seu papel. Ele encaminha-se para o lado do crime por não ter mais nenhum outro caminho a seguir. Velho e aparentemente ultrapassado, ele é logo jogado de lado pelo mercado de trabalho,  o que de certa forma justifica seus atos ao longo do filme (embora não totalmente). ]

Foi certamente um típico caso onde a vida imitava a arte. Tão vulnerável estava Bogart durante as filmagens que o estúdio lhe pediu que voltasse para “dublar” certas passagens do filme pois sua voz estava inaudível (por pura falta de energia ao dizer suas falas). A fotografia em preto e branco e o fato da estória ser baseada na vida do promotor Harold Conrad ajudam ainda mais em seu resultado final. O filme foi lançado no Festival de Cannes de 1956 e dividiu opiniões. Para o New York Times o filme era "uma história brutal e desagradável, com toques de melancolia". De uma maneira ou outra fica a recomendação desse “A Trágica Farsa”, o último filme de um dos maiores mitos da história da sétima arte, Humphrey Bogart.

A Trágica Farsa (The Harder They Fall, Estados Unidos, 1956) Direção: Mark Robson / Roteiro: Philip Yordan baseado no livro de Budd Schulberg / Elenco: Humphrey Bogart, Rod Steiger, Jan Sterling / Sinopse: Jornalista desempregado (Humphrey Bogart) resolve entrar no submundo das lutas forjadas no mundo do boxe Americano da década de 1950. Filme indicado ao Oscar na categoria de Melhor Fotografia em Preto e Branco (Burnett Guffey). Indicado à Palma de Ouro no Cannes Film Festival.

Pablo Aluísio.

 

quarta-feira, 10 de maio de 2006

As Aventuras de Búfalo Bill

Mais um clássico do faroeste americano. Os lendários Buffalo Bill Cody (Charlton Heston) e Wild Bill Hickok (Forrest Tucker) se empenham pessoalmente no sucesso da Pony Express, uma via de comunicação rápida entre a distante Califórnia e o centro do poder americano, Washington. O sucesso da rede é vital para manter o estado da Califórnia como parte integrante da União, pois políticos inescrupulosos desejavam que ocorresse uma separação, uma secessão do mais importante e rico estado do oeste do restante do país. Por essa razão não era nada fácil estabelecer essa via de integração entre as duas costas da nação americana pois poderosos interesses queriam que tudo se tornasse um fracasso. O roteiro desse filme mistura personagens reais com eventos de mera ficção. "As Aventuras de Búfalo Bill" evoca a mitologia do velho oeste. Obviamente que tanto Buffalo Bill como Wild Bill Hickok existiram de fato e se tornaram símbolos daquela era, mas também é verdade que nunca se envolveram em uma aventura como a mostrada nesse filme, muito embora a Pony Express também tenha existido, tanto que no final da película os produtores colocaram inclusive uma carta do presidente Abraham Lincoln elogiando os serviços dessa via de comunicação que serviu para manter a Califórnia unida ao restante dos Estados Unidos. Assim o grupo de roteiristas do filme criou um enredo que misturava história com eventos de imaginação. E esse aspecto, que era até bem comum na época, funcionou muito bem.

Outro aspecto a se considerar vem da interpretação de Charlton Heston no papel de Búfalo Bill. Como se sabe Bill foi o dono de um espetáculo de velho oeste que cruzava os Estados Unidos em bem sucedidas turnês. Em determinado momento de sua vida ele virou mais um artista de palco do que qualquer outra coisa. Tanto que fundou uma empresa circense, especializada em apresentações de cowboys e índios, que o tornaram muito rico. O enredo desse filme passa longe disso, procurando mostrar o personagem em sua juventude, mas isso não inibiu Heston que encontrou o tom certo para Búfalo Bill, embora fossem fisicamente bem diferentes. O verdadeiro Bill era loiro com grandes cabelos e bigode espalhafatoso. Também usava roupas chamativas e exageradas, fora dos padrões. Heston tem a aparência de um cowboy comum no filme, em nada diferente das demais pessoas. Claro que o filme não avança muito nesse aspecto de se preocupar com fatos históricos da biografia de Búfalo Bill. Tente comparar com a caracterização que Paul Newman faria de Bill anos mais tarde desse mesmo personagem e você entenderá a diferença substancial entre as duas interpretações. No saldo geral é um bom western valorizado pelo enredo que presta homenagem aos cavaleiros da Pony Express que, com seus esforços, mantiveram uma nação unida, de costa a costa, apesar de todas as dificuldades.

As Aventuras de Búfalo Bill (Pony Express, Estados Unidos, 1953) Estúdio: Paramount Pictures / Direção: Jerry Hopper / Roteiro: Charles Marquis Warren, Frank Gruber / Elenco: Charlton Heston, Rhonda Fleming, Jan Sterling, Forrest Tucker / Sinopse: Buffalo Bill Cody (Charlton Heston) e Wild Bill Hickok (Forrest Tucker) participam da consolidação da Pony Express, uma linha de comunicação entre as costas leste e oeste dos Estados Unidos. Formada por bravos homens montados a cavalo, eles levavam mensagens de um lado ao outro do país.

Pablo Aluísio.