domingo, 14 de novembro de 2021

Elvis Presley - Elvis Now (1972)

Os brasileiros de forma em geral gostam bastante desse álbum "Elvis Now". As razões para isso são várias. Vai desde a inclusão de um dos maiores sucessos de Elvis no Brasil com a canção "Sylvia", passa pelo fato de ter uma das músicas mais marcantes dos Beatles, "Hey Jude" (o que levou muitos a comprarem o disco naquele distante ano de 1972), indo até seu design de capa, multicolorida, com jeitão hippie. Também foi um dos LPs mais vendidos de Elvis em nosso país, ganhando várias reedições ao longo dos anos. De fato temos aqui um excelente disco de estúdio, um pouco diferente em sua produção dos grandes discos de Elvis da época, mas que se firmou mesmo por causa de sua bela qualidade artística. Por essa época Elvis estava vivendo seu inferno astral, com o conturbado e complicado divórcio de Priscilla. Isso porém ainda era meio ocultado do público em geral, assim todos apenas pensavam que Elvis estava vivendo mais um bom momento em sua carreira profissional, cantando regularmente em Las Vegas, fazendo turnês, etc. Uma época bacana de sua vida, isso apesar das pistas deixadas por Presley em várias das letras que cantava nesse período.

1. Help Me Make It Through The Night (Kris Kristofferson) - Havia uma variedade de gêneros musicais nesse álbum de Elvis lançado em 1972, mas era inegável também que a country music se fazia muito presente em seu repertório. A primeira faixa do disco era justamente um country chamado  "Help Me Make It Through The Night" de autoria do cantor e compositor Kris Kristofferson. Era uma canção bem recente na época, lançada no disco "Kristofferson" de 1970. Esse álbum tinha se tornado um dos preferidos de Elvis, justamente pelo seu estilo country / rock de Nashville que estava começando a se sobressair nas rádios do sul. A história de criação dessa canção é bem curiosa. Ela foi explicada pelo autor alguns anos depois, em entrevista. Ele disse que leu uma entrevista de Frank Sinatra para a revista Esquire onde o cantor se esquivava de uma pergunta sobre suas crenças religiosas. Frank respondeu: "Em que eu acredito? Eu acredito em um copo de whisky, em uma boa companhia, na bíblia... ou em qualquer coisa que me ajude a atravessar a noite!". Sinatra vinha passando por uma crise depressiva após o fim de seu casamento e passava as noites em claro, tentando chegar no dia seguinte. Foi justamente em cima dessa declaração que Kris Kristofferson escreveu sua canção. Inicialmente ele ofereceu a música para Dottie West, mas ela recusou. Assim ele acabou a gravando originalmente para o seu álbum de 1970. A versão de Elvis surgiria dois anos depois. Para alguns Elvis havia se identificado com a letra, pois ele também vinha passando por problemas relacionados a uma grave depressão, após o fim de seu casamento com Priscilla. Além disso Elvis tinha sérios problemas de insônia, que o deixava acordado por noites seguidas. Assim se tornava bem óbvio que ele tinha muitos motivos para se ver naquelas palavras escritas por Kristofferson.

2. Miracle of the Rosary (Lee Denson) - Elvis nasceu em berço evangélico, mas jamais se fechou dentro da doutrina religiosa dos seguidores de Lutero. Pelo contrário, ao longo da vida ele procurou por várias manifestações religiosas diferentes, tendo estudado as religiões orientais (que sempre o fascinaram, até o fim da vida) e o cristianismo dito mais tradicional. Elvis tinha muito apreço com a religião católica, a primeira religião cristã a surgir na história, principalmente na forma como os católicos tratavam a Virgem Maria. Uma das orações preferidas do cantor aliás era a "Ave Maria" que ele sempre rezava em momentos de reflexão. Assim Elvis decidiu que iria trazer a "Ave Maria" para seus discos. A forma que ele encontrou para isso foi gravar a canção religiosa católica "Miracle of the Rosary", que ele considerava belíssima! Tão inspirado ficou ao ouvi-la pela primeira vez que comprou algumas imagens católicas para ter em sua casa, tanto em Graceland, como na Califórnia. Elvis não se importava com críticas de que aquilo seria algum tipo de idolatria, porque havia estudado o catecismo romano e entendido a razão de ser das imagens católicas. Nada a ver com idolatria ou algo do tipo. Esse era um velho preconceito evangélico que Elvis não aceitava, pelo contrário, sempre tentava explicar teologicamente que as imagens serviam apenas como instrumentos de fé. Além disso ele amava a arte sacra dos católicos, tendo trazido para seu figurino inúmeros crucifixos e adornos da igreja de Roma. Um dos sonhos de Elvis inclusive era fazer uma viagem até Roma, para conhecer o Vaticano. Quando estava servindo o exército na Alemanha ele chegou a programar uma viagem que só foi cancelada na última hora por causa de imprevistos. Acabou assim indo até Paris, mas sem deixar de lado seus planos de ir até a Basílica de São Pedro. Nos anos 70 ele teve bastante vontade de realizar uma grande turnê por toda a Europa, com Roma incluída dentro do cronograma, mas tudo foi por água abaixo por causa do Coronel Parker que não tinha passaporte e não poderia acompanhar o cantor por seus shows pelas grandes cidades históricas da Europa.

3. Hey Jude (Lennon / McCartney) - Bom, é consenso que uma das razões do sucesso de vendas de "Elvis Now" foi mesmo a inclusão de uma bela versão de "Hey Jude", o clássico imortal dos Beatles. Elvis deu uma leveza toda própria à sua versão, culminando em uma sonoridade e uma performance realmente magistral. Um aspecto que gosto muito dessa gravação é que Elvis canta a balada com uma certa suavidade, uma leveza, que não havia nem mesmo na versão original dos Beatles. Isso se deveu ao fato de que Elvis na verdade não tinha programado nada no sentido de gravar a música dos Beatles. A coisa simplesmente aconteceu dentro do estúdio, quase como se fosse um ensaio sem maiores compromissos. Perceba que Elvis não segue à risca a ordem da letra original. Ele começa até mesmo com um verso errado. Também podemos perceber o quanto ele estava relaxado ao rir um pouco quase no final da faixa (coisa que nos velhos tempos inutilizaria qualquer take com pretensões de se tornar uma faixa oficial). No final das contas era apenas Elvis cantarolando uma música de que gostava, sem pressão, sem pretensão de soar perfeito. Outro fato curioso é que durante anos os Beatles silenciaram sobre a gravação de "Hey Jude" por parte de Elvis. Na realidade eles nem sequer existiam mais como grupo em 1972. Isso porém não evitou uma certa expectativa sobre a opinião do quarteto sobre essa faixa. Tudo ficou meio omisso até que Paul McCartney visitou Memphis durante uma de suas concorridas turnês. Ele foi até Graceland, visitou o museu, posou ao lado das guitarras que tinham pertencido a Elvis e depois, falando com a imprensa americana, confidenciou que havia amado a versão de Elvis para uma de suas maiores criações, justamente a versão de "Hey Jude" que ouvimos nesse disco. O próprio explicou tudo com seu jeito peculiar de se expressar ao afirmar: "Adoro ouvir Elvis cantando Hey Jude! É ótimo, tenho o disco até hoje comigo! Fantástica interpretação!". Assim se o próprio criador desse hino imortal dos anos 60 adorou a faixa quem somos nós para criticar qualquer coisa, não é mesmo?

4. Put Your Hand in the Hand (Gene McLellan) - Avançando no disco temos ainda a faixa intitulada "Put Your Hand in the Hand". Confesso que nunca gostei muito dessa canção. Ela tem uma melodia até agradável, mas o excesso de repetições da letra e do refrão cansam o ouvinte após algumas audições. A letra é gospel, trazendo de volta o Elvis religioso, sempre louvando a Deus. A letra basicamente é quase uma oração, incentivando o ouvinte a colocar seu destino nas mãos de Deus, ou melhor dizendo, colocando suas mãos nas mãos do homem da Galileia, que com suas próprias mãos acalmou as águas do mar. Basicamente é isso. Como se trata de uma música religiosa o refrão é repetido inúmeras vezes. Não há nada de errado nesse tipo de composição harmônica, apenas acredito que canse um pouco, funcionando melhor mesmo dentro de um culto religioso, com todos batendo palmas e cantando juntos.

5. Until It's Time For You To Go (Marie) - O Lado A do single extraído desse álbum veio com a melancólica "Until It's Time For You To Go". Essa era uma nova versão de Elvis para um sucesso de meados dos anos 60. A música havia sido escrita e lançada pela artista canadense Buffy Sainte-Marie. Ela foi uma nativa que cantando sobre paz, amor e ativismo político, conseguiu se sobressair no cenário da música naquele período. Sua versão original é bem de acordo com o movimento hippie, com apenas voz e violão, algo singelo, simples, mas ao mesmo tempo bonito e harmonioso. Elvis de certa forma tirou a melodia de suas origens e a levou para um estilo mais country and western. Também sua banda TCB vinha nessa pegada. Elvis assim tornava a música mais palatável para o público do sul dos Estados Unidos, que tinha mais familiaridade com a sonoridade vinda de Nashville. Muito provavelmente Elvis nem tenha se inspirada na gravação original de Sainte-Marie, mas sim na versão do grupo britânico The Four Pennies. Eles a gravaram em 1965 e conseguiram transformar sua gravação em um top 20 da parada. Um feito e tanto. Pena que na voz de Elvis a música não voltou a obter muito sucesso na parada de singles. Muito provavelmente ela já havia chegado ao máximo em termos de êxito comercial com os ingleses, sete anos antes.

6. We Can Make the Morning (Jay Ramsem) - "We Can Make the Morning" tem um belo trabalho vocal por parte dos grupos de apoio de Elvis. Essa canção sempre considerei uma das melhores sob esse aspecto. Talvez não tenha sido tão bem recebida pelo público porque sua sonoridade destoava um pouco do que tocava nas rádios na época. "American Pie" de Don McLean era um hit nas paradas e mostrava bem o que todos estavam querendo ouvir por volta de 1972. Músicas grandiosas como essa de Elvis Presley dificilmente iriam se sobressair no mercado. A RCA Victor porém resolveu ignorar isso e colocou a música de Jay Ramsey como lado B do novo single de Elvis. Não houve boa receptividade, fazendo com que o compacto chegasse apenas ao quadragésimo lugar entre os compactos mais vendidos, um resultado muito longe do que a gravadora pretendia. É uma pena já que definitivamente a canção era bonita e bem executada. Apenas não era a ideal para ser lançada como single naquela ocasião. De qualquer maneira acabou recebendo boas críticas por parte de revistas especializadas em música. Se não foi tão bom do ponto de vista comercial, pelo menos ganhou a simpatia dos críticos musicais.

7. Early Morning Rain (Gordon Lightfood) - Outro bom momento desse álbum "Elvis Now" veio com a faixa "Early Morning Rain". Um belo country, com melodia agradável e relaxante. De todas as canções desse disco essa foi certamente uma das que ele mais utilizou em seus concertos durante os anos 70. Aliás é interessante notar que também foi incluída no especial de TV "Aloha From Hawaii". Aqui Elvis não a usou no show propriamente dito, mas numa sequência própria, sem público, apenas a cantando de forma sóbria, concentrada. Curiosamente apesar de ser um country (um gênero nascido no sul dos Estados Unidos), a canção havia sido composta por um canadense, Gordon Lightfoot, em 1966. A versão porém que inspirou Elvis a gravar a faixa foi a de Peter, Paul and Mary. Elvis simplesmente adorava o estilo vocal desse trio que fez grande sucesso nos anos 60.

8. Sylvia (Geoff Stephens / Les Reed) - É fato que os americanos nunca deram muita bola para a balada romântica "Sylvia". Nos Estados Unidos essa música nunca chegou a ser um sucesso. Nem entre os fãs mais ardorosos daquele país há qualquer destaque dado para a canção. Assim ela é considerada mesmo um verdadeiro "Lado B", ou seja, uma faixa gravada apenas para completar o espaço de um disco. Nada mais do que isso. O curioso é que mesmo em fóruns de colecionadores no exterior há um certo desprezo pela gravação. No Brasil as coisas mudam de figura. "Sylvia" foi certamente um dos maiores sucessos da carreira de Elvis Presley. A música tocou muito nas rádios, ajudou o álbum "Elvis Now" a vender muito em nosso país, além de ter sido colocada como single nacional para aproveitar o sucesso na época. O compacto (único no mundo todo) até hoje é cobiçado por quem coleciona discos de vinil. Em suma, "Sylvia" foi um grande hit verde e amarelo, sob qualquer ponto de vista. Fazendo um exercício de imaginação, se Elvis tivesse vindo ao Brasil realizar algum show por aqui nos anos 70 certamente ele teria que colocar "Sylvia" como um dos destaques de seus concertos, já que o público brasileiro não iria admitir uma apresentação sem essa canção tão querida dos fãs brasileiros. Como infelizmente isso nunca aconteceu e como Elvis ficou mesmo enclausurado dentro dos Estados Unidos pelo resto de sua vida, ele nunca chegou a interpretar a música ao vivo, afinal para os americanos ela nunca passou de ser um mero "Lado B" da discografia do cantor. Que pena!

9. Fools Rush In (Rube Bloom / Johnny Mercer) - Outro country do disco foi a faixa "Fools Rush In". A primeira versão veio com Johnny Mercer em 1940. Tempo de guerra, com os soldados americanos se preparando para lutar na Europa contra os nazistas. Essa versão porém era bem antiga, não marcando muito Elvis (afinal ele tinha apenas cinco anos de idade quando ela foi lançada) As versões que parecem ter inspirado Elvis vieram bem depois, primeiro com Frank Sinatra e depois com Ricky Nelson que a transformou em um grande sucesso em 1963. A letra também demonstrava trazer uma certa identificação para Elvis na época. Afinal apenas os tolos abriam completamente seu coração. Com a traição de Priscilla, o divórcio e tudo o mais que de ruim lhe havia acontecido não era mesmo de se admirar que Elvis não se sentisse apenas magoado com o fracasso de seu casamento, mas também como um verdadeiro tolo por ter acreditado demais no amor

10. I Was Born About Ten Thousand Years Ago (Elvis Presley) - Outro aspecto curioso desse disco foi a opção da RCA Victor em colocar a versão completa, sem cortes, de "I Was Born About Ten Thousand Years Ago". Como sabemos essa música foi picotada no disco "Elvis Country" de maneira até interessante, original, mas também torturante para quem queria ouvi-la completa. Para apaziguar as críticas de quem ficou insatisfeito por tê-la apenas aos pedaços no disco de 1971, a gravadora resolveu ouvir as reclamações, a selecionando aqui da forma como foi gravada, completa, sem  Interrupções ou algo do tipo. A letra, como já tivemos a oportunidade de explicar, ia bem ao encontro de algumas crenças e doutrinas religiosas que Elvis vinha estudando naqueles tempos, com referências a reencarnação e imortalidade da alma. Por isso a afirmação de se ter mais de dez mil anos! Coisas que Elvis conversava praticamente todos os dias com seu cabeleireiro e "guru" Larry Geller. Ler e debater temas religiosos era um dos passatempos preferidos do cantor, algo que ele nunca abandonou, colecionando literatura sobre o assunto até o dia em que morreu.

Elvis Presley - Elvis Now (1972): Elvis Presley (vocais, violão) / James Burton (guitarra) / Chip Young (guitarra) / Charlie Hodge (Violão) / Norbert Putnam (baixo) / Jerry Carrigan (bateria) / Kenneth Buttrey (bateria) / David Briggs (piano) / Joe Moscheo (piano) / Glen Spreen (órgão) / Charlie McCoy (gaita) / The Imperials (vocais) / June Page (vocais) / Millie Kirkham (vocais) / Temple Riser (vocais) / Ginger Holladay (vocais) / Produzido e arranjado por Felton Jarvis e Elvis Presley / Data de gravação: 6 e 8 de junho de 1970, 15 de março, 15 a 21 de maio e 8 a 10 de junho de 1971 / Local de gravação: Estúdios B da RCA em Nashville / Data de Lançamento: Fevereiro de 1972.

Pablo Aluísio.

4 comentários:

  1. Elvis Presley - Elvis Now (1972)
    Pablo Aluísio.

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  2. Pablo:
    Logo que o Elvis morreu as discotecas, lojas de venda de discos de antigamente, ficaram lotadas de todos o tipos de discos do Elvis, desde trilhas sonoras dos filmes insossos de Hollywood, até dos shows de coletâneas. Essa capa do disco do seu post é uma das que eu mais lembro no setor de discos das Lojas Americanas. Realmente estávamos na pré história em relação aos tempos atuais.

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    1. Logo após a "morte" de Elvis em agosto de 1977, a RCA promoveu os LPs em catálogo a partir do Almost in Love (1971), relançando o That's The Way it Is como "Elvis era Assim". Não havia nenhum LP de filme em catálogo, exceto a coletânea Almost in Love - que vendeu muito em suas 4 edições. Só em 1978 que o excelente Fun in Acapulco seria relançado. Em 1982 a RCA relançou 19 discos, muitos de filmes, no selo PURE GOLD. Elvis Now foi prensado ou teve novas matrizes fabricadas (segundo os meus cálculos me baseando em matrizes) em 1972 (vinil rígido e dynaflex) 1974, 1977, 1982, 1986 (dead wax do lado B largo) 1989 e 1991, já com o selo "vazado". Ou seja, esse album ficou em catálogo em LP por mais de 20 anos no Brasil. Na edição dos anos 90, o "Now" é branco, e não amarelo.

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  3. Esse disco vendeu muito no Brasil. Teve várias edições ao longo dos anos.

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