Lindo filme! Pelo que já havia lido antes sabia que iria ser uma produção interessante, mas acabou me surpreendendo mais do que o esperado. A história começa sem muitas explicações para o espectador. A personagem Cheryl, interpretada pela atriz Reese Witherspoon, está em um penhasco. Após uma longa e penosa subida até lá, seus pés estão praticamente destruídos pelo esforço. O sangue jorra por suas meias. Em um lance de azar uma de suas botas acaba caindo penhasco abaixo. Ela obviamente perde a pouca paciência que lhe sobrara, tendo um ataque de raiva! Depois dessa cena inicial vamos finalmente entendendo o que ela está fazendo lá e quais são suas reais motivações. Nada é jogado inteiramente ao público, tudo vai surgindo paulatinamente, sem pressa, como se estivéssemos dentro de sua mente, compartilhando seus pensamentos. Através de suas lembranças vamos então conhecendo parte de sua história, suas perdas, suas dores emocionais, seus problemas pessoais. Por ser tão refinada a maneira como esse enredo é contado posso dizer que esse foi até agora o melhor roteiro que me deparei nesse ano. Muito bem escrito, apelando muito mais para o sentimento, para as sensações, do que para aquela velha fórmula convencional de se contar uma história no cinema. A vida definitivamente é dura e para sobrevivermos temos também que sermos durões, como bem observa um dos personagens em determinado momento do filme. Cheryl aliás vai encontrando diversos tipos ao longo de sua caminhada. Algumas boas pessoas, outras perigosas, mas sempre com uma surpresa em cada local em que se encontra. Ela quer chegar ao destino inteira, satisfeita consigo mesmo e o mais importante de tudo: superando seus diversos traumas.
A jornada assim não se resume a uma garota tentando vencer os desafios de atravessar a pé o deserto de Mojave - uma das regiões mais secas e hostis dos Estados Unidos - mas principalmente encontrar-se, conhecer a si mesmo em um nível mais profundo. Diante dessa proposta o resultado final se mostra muito marcante, muito sensível e também bastante inspirador. Reese Witherspoon recebeu diversas indicações por sua atuação em vários festivais de cinema mundo afora. Todas merecidas. A atriz supera finalmente comédias do tipo "Legalmente Loira" e derivados, para finalmente adentrar em um tipo de cinema com mais conteúdo, que tenha algo realmente importante a dizer. Por falar nisso Witherspoon merece não apenas os elogios por sua atuação, mas também pela coragem, pois ela própria se empenhou bastante na realização do filme, inclusive exercendo a função de produtora. Na verdade foi Reese quem comprou os direitos autorais do livro escrito por Cheryl Strayed chamado "Wild: From Lost to Found on the Pacific Crest Trail". Sim, tudo o que você verá no filme foi baseado em uma história real e isso adiciona ainda mais méritos para a produção como um todo. Uma jornada de superação, cuja maior lição é aquela que nos ensina que devemos seguir sempre em frente, não importando os desafios, não procurando apagar completamente o passado de nossas vidas, pois ele também faz parte do que somos, mas sim entendendo e procurando aprender com ele. Afinal de contas a vida é justamente isso, uma longa caminhada rumo ao desconhecido. A forma como você chegará lá é que irá definir se você foi ou não uma pessoa realmente feliz.
Livre (Wild, Estados Unidos, 2014) Direção: Jean-Marc Vallée / Roteiro: Nick Hornby, baseado no livro escrito por Cheryl Strayed / Elenco: Reese Witherspoon, Laura Dern, Gaby Hoffmann / Sinopse: Após a morte de sua mãe e do fim de seu casamento de sete anos, Cheryl Strayed (Reese Witherspoon) resolve fazer a trilha de Pacific Crest, onde pretende avaliar os rumos de sua vida, seus problemas sentimentais e partir em direção a sua paz interior. Filme indicado ao Oscar nas categorias de Melhor Atriz (Reese Witherspoon) e Melhor Atriz Coadjuvante (Laura Dern). Indicado ao Globo de Ouro na categoria de Melhor Atriz - Drama (Reese Witherspoon). Também indicado ao BAFTA Awards e ao Screen Actors Guild Awards na mesma categoria.
Pablo Aluísio.