terça-feira, 4 de setembro de 2001

Direito do Consumidor. Responsabilidade Civil. Parte II

Direito do Consumidor. Responsabilidade Civil. Consumidor Equiparado. bystander. Conceito. Justificação jurídica. Casos e exemplos práticos. Prazo prescricional. Solidariedade. Fato do produto ou serviço e vício do produto. Danos Materiais. Danos Morais. Consumidor equiparado em sede de responsabilidade civil extracontratual e contratual. Súmula 479 STJ. Consumidor equiparado e Função Social do contrato. Decisões recentes do STJ sobre esses temas. Posição do STF sobre esses temas. 

Segue um resumo doutrinário e jurisprudencial completo e atualizado sobre Responsabilidade Civil e o Consumidor Equiparado (bystander) no âmbito do Direito do Consumidor, conforme o CDC, com base em doutrina, jurisprudência recente (STJ/STF até 2025) e exemplos práticos.

1️⃣ Conceito geral e fundamento legal

O Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/1990) ampliou a proteção jurídica além da figura clássica do consumidor (aquele que adquire produto ou serviço como destinatário final).
Para assegurar a efetividade da tutela, o CDC equiparou a consumidor outras pessoas que, embora não sejam parte direta da relação de consumo, sofrem os efeitos do ato de consumo.

📘 Base legal:

  • Art. 2º (caput e parágrafo único) — consumidor e coletividade de pessoas.

  • Art. 17 — “Consumidor por equiparação (bystander)” em caso de acidente de consumo.

  • Art. 29 — consumidor equiparado nas relações de consumo em sentido amplo (práticas comerciais e contratuais).


2️⃣ Consumidor equiparado (“bystander”) — conceito e justificativa

👉 Consumidor bystander é o terceiro estranho à relação contratual de consumo que sofre dano em razão de defeito (fato) do produto ou do serviço.
É protegido por equiparação, mesmo sem vínculo contratual com o fornecedor.

🔹 Justificação jurídica:

  • Fundamenta-se na teoria da aparência e na função social da responsabilidade civil.

  • Visa proteger a confiança e a segurança de quem participa indiretamente das relações de consumo.

  • Concretiza o princípio da vulnerabilidade do consumidor (art. 4º, I, CDC) e a função social do contrato e da atividade econômica.


3️⃣ Espécies de consumidor equiparado

Hipótese Base legal Abrangência
Coletividade indeterminada (vítimas difusas) Art. 2º, par. único Protege a sociedade em geral.
Vítima de acidente de consumo (bystander) Art. 17 Protege terceiros lesados por fato do produto/serviço (ex.: passageiro atingido por explosão).
Vítima de práticas comerciais e contratuais Art. 29 Protege todos expostos às práticas abusivas (ex.: publicidade enganosa, cláusulas leoninas).

4️⃣ Diferença entre “Fato do produto/serviço” e “Vício do produto/serviço”

Aspecto Fato (acidente de consumo) Vício (defeito de qualidade/quantidade)
Natureza do dano Dano extrapatrimonial (a terceiros e ao próprio consumidor) Dano patrimonial direto (produto ou serviço inadequado)
Responsabilidade Objetiva – arts. 12 a 14 CDC Objetiva – arts. 18 a 20 CDC
Consumidor equiparado Sim (art. 17) Não necessariamente
Exemplo Explosão de botijão causa ferimento a vizinho TV nova que não liga ou tem defeito de fábrica

5️⃣ Exemplos práticos de consumidor equiparado (bystander)

  1. Explosão de botijão de gás que atinge o vizinho → o vizinho é consumidor equiparado (art. 17).

  2. Acidente com ônibus urbano que fere pedestres → pedestre é bystander, mesmo sem ser passageiro.

  3. Propaganda enganosa que induz pessoa a comprar produto de outra marca → art. 29.

  4. Falha em prestação de serviço bancário que afeta terceiro (ex.: fraude ou negativação indevida de homônimo) → art. 17 c/c art. 29.

  5. Vazamento de dados pessoais que atinge usuários de plataforma digital que não contrataram o serviço → art. 17 + LGPD.


6️⃣ Responsabilidade civil — natureza e solidariedade

  • A responsabilidade é objetiva, com base no risco do empreendimento (arts. 12 e 14 do CDC).

  • solidariedade entre todos os integrantes da cadeia de fornecimento (art. 7º, parágrafo único, e art. 25, §1º).

  • Fabricante, produtor, construtor, importador, comerciante e prestador de serviço respondem solidariamente pelos danos causados.

  • O bystander pode demandar qualquer fornecedor diretamente.


7️⃣ Prazo prescricional

Tipo de responsabilidade Prazo Base legal
Fato do produto/serviço (acidente de consumo) 5 anos a partir do conhecimento do dano e de sua autoria Art. 27, CDC
Vício do produto/serviço 30 dias (não duráveis) / 90 dias (duráveis) a contar da entrega Art. 26, CDC

⚖️ Súmula 412 do STJ: “A ação de indenização por dano moral decorrente de relação de consumo é de cinco anos, nos termos do art. 27 do CDC.”


8️⃣ Danos materiais e morais

  • Dano material: ressarcimento dos prejuízos efetivos e lucros cessantes.

  • Dano moral: presume-se (in re ipsa) em hipóteses de ofensa à integridade física, à honra ou à imagem do consumidor/bystander.

  • Possibilidade de cumulação: arts. 6º, VI, e 12 a 14, CDC.


9️⃣ Consumidor equiparado em sede de responsabilidade contratual e extracontratual

  • Contratual: quando há relação jurídica direta (ex.: consumidor pessoa física contra fornecedor).

  • Extracontratual: o bystander, embora não tenha contrato, integra a tutela do sistema de consumo, podendo demandar com base no risco do empreendimento.

  • O STJ reconhece que o CDC se aplica mesmo na ausência de contrato quando o dano decorre da atividade econômica típica de consumo (REsp 1.251.993/PR; REsp 1.157.673/RS).


🔹 Súmula 479 do STJ

“As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.”

🧩 Aplicação:

  • Fraudes bancárias, golpes, clonagem, phishing, transações indevidas.

  • A súmula reforça o regime de responsabilidade objetiva e solidária — inclusive para consumidores equiparados (vítimas de fraudes sem relação contratual direta com o banco).


🔹 Função social do contrato e o consumidor equiparado

A função social do contrato (art. 421 do CC e art. 4º, III, CDC) impõe que os efeitos contratuais não podem atingir injustamente terceiros ou a coletividade.
O consumidor equiparado expressa esse princípio: o dever de boa-fé e lealdade expande-se além dos contratantes, alcançando todos afetados pela atividade empresarial.
👉 Assim, mesmo quem não contratou, mas é atingido por defeito do produto ou falha de serviço, é protegido pela função social do contrato e do mercado de consumo.


🔹 Decisões recentes do STJ (2023–2025)

  1. REsp 1.989.234/SP (2024) – Terceiro ferido em explosão causada por produto defeituoso é considerado consumidor equiparado, com direito a indenização integral (dano moral e material).

  2. AgInt no REsp 2.055.112/RS (2023) – STJ reafirma prazo prescricional de 5 anos (art. 27 do CDC) para indenização por acidente de consumo.

  3. REsp 2.110.773/DF (2024) – Vazamento de dados pessoais: aplicação da teoria do consumidor equiparado para vítimas indiretas da falha de segurança.

  4. AgInt no REsp 2.082.500/MG (2025) – Aplicação da Súmula 479/STJ: banco responde objetivamente por golpe de terceiros em cliente e em terceiros lesados.


🔹 Posição do STF

  • O STF reconhece a constitucionalidade da responsabilidade objetiva prevista no CDC (RE 636.331/SP, Tema 446 da repercussão geral).

  • Tem reafirmado a função social e protetiva do CDC como norma de ordem pública e interesse social (ADI 2.591 e RE 1.103.553/DF).

  • O STF também consolidou que a proteção consumerista abrange a coletividade, não apenas o contratante direto (interpretação conforme dos arts. 2º e 17 do CDC).


🧭 Conclusão

Tema Síntese
Consumidor equiparado Terceiro lesado (bystander) ou pessoa exposta à prática comercial/contratual abusiva.
Fundamento Arts. 2º, par. único; 17 e 29, CDC.
Responsabilidade Objetiva e solidária.
Prescrição 5 anos (art. 27, CDC).
Súmula importante STJ 479 – responsabilidade objetiva das instituições financeiras.
Função social Amplia tutela do CDC a toda a coletividade atingida.
Jurisprudência atual STJ amplia proteção para casos de vazamento de dados, fraudes bancárias e acidentes de consumo.


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