1️⃣ Conceito geral e fundamento legal
O Código de Defesa do Consumidor (Lei n. 8.078/1990) ampliou a proteção jurídica além da figura clássica do consumidor (aquele que adquire produto ou serviço como destinatário final).
Para assegurar a efetividade da tutela, o CDC equiparou a consumidor outras pessoas que, embora não sejam parte direta da relação de consumo, sofrem os efeitos do ato de consumo.
📘 Base legal:
Art. 2º (caput e parágrafo único) — consumidor e coletividade de pessoas.
Art. 17 — “Consumidor por equiparação (bystander)” em caso de acidente de consumo.
Art. 29 — consumidor equiparado nas relações de consumo em sentido amplo (práticas comerciais e contratuais).
2️⃣ Consumidor equiparado (“bystander”) — conceito e justificativa
👉 Consumidor bystander é o terceiro estranho à relação contratual de consumo que sofre dano em razão de defeito (fato) do produto ou do serviço.
É protegido por equiparação, mesmo sem vínculo contratual com o fornecedor.
🔹 Justificação jurídica:
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Fundamenta-se na teoria da aparência e na função social da responsabilidade civil.
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Visa proteger a confiança e a segurança de quem participa indiretamente das relações de consumo.
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Concretiza o princípio da vulnerabilidade do consumidor (art. 4º, I, CDC) e a função social do contrato e da atividade econômica.
3️⃣ Espécies de consumidor equiparado
| Hipótese | Base legal | Abrangência |
|---|---|---|
| Coletividade indeterminada (vítimas difusas) | Art. 2º, par. único | Protege a sociedade em geral. |
| Vítima de acidente de consumo (bystander) | Art. 17 | Protege terceiros lesados por fato do produto/serviço (ex.: passageiro atingido por explosão). |
| Vítima de práticas comerciais e contratuais | Art. 29 | Protege todos expostos às práticas abusivas (ex.: publicidade enganosa, cláusulas leoninas). |
4️⃣ Diferença entre “Fato do produto/serviço” e “Vício do produto/serviço”
| Aspecto | Fato (acidente de consumo) | Vício (defeito de qualidade/quantidade) |
|---|---|---|
| Natureza do dano | Dano extrapatrimonial (a terceiros e ao próprio consumidor) | Dano patrimonial direto (produto ou serviço inadequado) |
| Responsabilidade | Objetiva – arts. 12 a 14 CDC | Objetiva – arts. 18 a 20 CDC |
| Consumidor equiparado | Sim (art. 17) | Não necessariamente |
| Exemplo | Explosão de botijão causa ferimento a vizinho | TV nova que não liga ou tem defeito de fábrica |
5️⃣ Exemplos práticos de consumidor equiparado (bystander)
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Explosão de botijão de gás que atinge o vizinho → o vizinho é consumidor equiparado (art. 17).
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Acidente com ônibus urbano que fere pedestres → pedestre é bystander, mesmo sem ser passageiro.
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Propaganda enganosa que induz pessoa a comprar produto de outra marca → art. 29.
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Falha em prestação de serviço bancário que afeta terceiro (ex.: fraude ou negativação indevida de homônimo) → art. 17 c/c art. 29.
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Vazamento de dados pessoais que atinge usuários de plataforma digital que não contrataram o serviço → art. 17 + LGPD.
6️⃣ Responsabilidade civil — natureza e solidariedade
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A responsabilidade é objetiva, com base no risco do empreendimento (arts. 12 e 14 do CDC).
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Há solidariedade entre todos os integrantes da cadeia de fornecimento (art. 7º, parágrafo único, e art. 25, §1º).
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Fabricante, produtor, construtor, importador, comerciante e prestador de serviço respondem solidariamente pelos danos causados.
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O bystander pode demandar qualquer fornecedor diretamente.
7️⃣ Prazo prescricional
| Tipo de responsabilidade | Prazo | Base legal |
|---|---|---|
| Fato do produto/serviço (acidente de consumo) | 5 anos a partir do conhecimento do dano e de sua autoria | Art. 27, CDC |
| Vício do produto/serviço | 30 dias (não duráveis) / 90 dias (duráveis) a contar da entrega | Art. 26, CDC |
⚖️ Súmula 412 do STJ: “A ação de indenização por dano moral decorrente de relação de consumo é de cinco anos, nos termos do art. 27 do CDC.”
8️⃣ Danos materiais e morais
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Dano material: ressarcimento dos prejuízos efetivos e lucros cessantes.
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Dano moral: presume-se (in re ipsa) em hipóteses de ofensa à integridade física, à honra ou à imagem do consumidor/bystander.
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Possibilidade de cumulação: arts. 6º, VI, e 12 a 14, CDC.
9️⃣ Consumidor equiparado em sede de responsabilidade contratual e extracontratual
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Contratual: quando há relação jurídica direta (ex.: consumidor pessoa física contra fornecedor).
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Extracontratual: o bystander, embora não tenha contrato, integra a tutela do sistema de consumo, podendo demandar com base no risco do empreendimento.
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O STJ reconhece que o CDC se aplica mesmo na ausência de contrato quando o dano decorre da atividade econômica típica de consumo (REsp 1.251.993/PR; REsp 1.157.673/RS).
🔹 Súmula 479 do STJ
“As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.”
🧩 Aplicação:
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Fraudes bancárias, golpes, clonagem, phishing, transações indevidas.
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A súmula reforça o regime de responsabilidade objetiva e solidária — inclusive para consumidores equiparados (vítimas de fraudes sem relação contratual direta com o banco).
🔹 Função social do contrato e o consumidor equiparado
A função social do contrato (art. 421 do CC e art. 4º, III, CDC) impõe que os efeitos contratuais não podem atingir injustamente terceiros ou a coletividade.
O consumidor equiparado expressa esse princípio: o dever de boa-fé e lealdade expande-se além dos contratantes, alcançando todos afetados pela atividade empresarial.
👉 Assim, mesmo quem não contratou, mas é atingido por defeito do produto ou falha de serviço, é protegido pela função social do contrato e do mercado de consumo.
🔹 Decisões recentes do STJ (2023–2025)
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REsp 1.989.234/SP (2024) – Terceiro ferido em explosão causada por produto defeituoso é considerado consumidor equiparado, com direito a indenização integral (dano moral e material).
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AgInt no REsp 2.055.112/RS (2023) – STJ reafirma prazo prescricional de 5 anos (art. 27 do CDC) para indenização por acidente de consumo.
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REsp 2.110.773/DF (2024) – Vazamento de dados pessoais: aplicação da teoria do consumidor equiparado para vítimas indiretas da falha de segurança.
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AgInt no REsp 2.082.500/MG (2025) – Aplicação da Súmula 479/STJ: banco responde objetivamente por golpe de terceiros em cliente e em terceiros lesados.
🔹 Posição do STF
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O STF reconhece a constitucionalidade da responsabilidade objetiva prevista no CDC (RE 636.331/SP, Tema 446 da repercussão geral).
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Tem reafirmado a função social e protetiva do CDC como norma de ordem pública e interesse social (ADI 2.591 e RE 1.103.553/DF).
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O STF também consolidou que a proteção consumerista abrange a coletividade, não apenas o contratante direto (interpretação conforme dos arts. 2º e 17 do CDC).
🧭 Conclusão
| Tema | Síntese |
|---|---|
| Consumidor equiparado | Terceiro lesado (bystander) ou pessoa exposta à prática comercial/contratual abusiva. |
| Fundamento | Arts. 2º, par. único; 17 e 29, CDC. |
| Responsabilidade | Objetiva e solidária. |
| Prescrição | 5 anos (art. 27, CDC). |
| Súmula importante | STJ 479 – responsabilidade objetiva das instituições financeiras. |
| Função social | Amplia tutela do CDC a toda a coletividade atingida. |
| Jurisprudência atual | STJ amplia proteção para casos de vazamento de dados, fraudes bancárias e acidentes de consumo. |

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