segunda-feira, 3 de setembro de 2001

Direito Comercial. Sociedade Limitada. Parte II

Direito Comercial – Sociedade Limitada
Direito Comercial. Sociedade Limitada. Forma do Contrato Social. Tipos - Instrumentos Público ou Particular. Registro do Contrato Social perante Junta Comercial. Efeitos. Participação do advogado no contrato social. Contrato Particular na formação da Sociedade Limitada. Certidão da Junta Comercial do contrato social. Sociedade sem contrato formalizado. Efeitos. Forma oral de formação da sociedade. Efeitos perante os sócios. Boa fé de terceiros perante sociedades limitadas não formalizadas. Sociedade Irregular. Conceito. Sociedade de Fato. Conceito. Diferença entre Sociedade Irregular e Sociedade de Fato. Sociedades em Comum. Definição. Sanções para sociedades irregulares e de fato. 

1. Forma do Contrato Social

A sociedade limitada é constituída por meio de um contrato social, que é o instrumento jurídico que estabelece as regras de funcionamento da sociedade, direitos e deveres dos sócios, administração e capital social. O contrato social é a “certidão de nascimento” da empresa.

2. Tipos de Contrato – Instrumento Público ou Particular

O contrato social pode ser celebrado por:

  • Instrumento particular, o mais comum e suficiente para a maioria das sociedades limitadas;

  • Instrumento público, exigido apenas quando houver cláusulas que impliquem transferência de bens imóveis ao patrimônio da sociedade (art. 108 do Código Civil).

3. Registro do Contrato Social perante a Junta Comercial

Após sua elaboração e assinatura pelos sócios (e pelo advogado), o contrato social deve ser registrado na Junta Comercial do Estado onde a empresa terá sua sede.
Somente após esse registro a sociedade adquire personalidade jurídica, passando a existir legalmente (art. 985 do Código Civil).

4. Efeitos do Registro

O registro na Junta Comercial:

  • Confere personalidade jurídica à sociedade;

  • Permite que ela atue em seu próprio nome (ex.: firmar contratos, adquirir bens, contrair obrigações);

  • Garante responsabilidade limitada dos sócios ao valor de suas quotas;

  • publicidade aos atos societários, tornando-os oponíveis a terceiros.

5. Participação do Advogado no Contrato Social

O advogado é obrigatório na elaboração do contrato social, conforme o art. 1º da Lei nº 8.906/1994 (Estatuto da OAB).
Sua assinatura no documento é condição de validade para o registro, exceto nas sociedades simples ou microempresas em que a Junta Comercial dispensa expressamente essa exigência.

6. Contrato Particular na Formação da Sociedade Limitada

O contrato particular, devidamente assinado pelos sócios e pelo advogado, é plenamente válido e suficiente para a constituição da sociedade, desde que registrado na Junta Comercial.
A forma pública só é necessária se houver bens imóveis ou cláusulas que requeiram tal formalidade legal.

7. Certidão da Junta Comercial

A certidão simplificada ou específica emitida pela Junta Comercial comprova o registro e a regularidade da sociedade.
Ela é documento público que atesta a existência legal da empresa e a veracidade de suas informações cadastrais e societárias.

8. Sociedade sem Contrato Formalizado – Efeitos

Quando a sociedade inicia atividades sem o registro do contrato social, ela não adquire personalidade jurídica.
Passa a ser considerada sociedade irregular ou, em certos casos, sociedade de fato.

9. Forma Oral de Formação da Sociedade – Efeitos

A forma oral é possível apenas para caracterizar uma sociedade de fato, que existe na prática (de fato), mas sem validade jurídica plena.
Entre os sócios, podem ser reconhecidos efeitos obrigacionais (ex.: divisão de lucros e perdas), mas não há personalidade jurídica nem limitação de responsabilidade.

10. Boa-fé de Terceiros perante Sociedades não Formalizadas

Terceiros de boa-fé que contratam com uma sociedade não registrada são protegidos pelo ordenamento jurídico.
Os sócios respondem solidária e ilimitadamente pelas obrigações contraídas, pois a limitação da responsabilidade só surge com o registro regular da sociedade.

11. Sociedade Irregular – Conceito

É aquela cujo contrato social existe, mas não foi registrado na Junta Comercial.
Portanto, não tem personalidade jurídica, embora haja documento escrito que comprove a intenção de constituí-la.

12. Sociedade de Fato – Conceito

É aquela formada sem contrato escrito, funcionando apenas de maneira empírica, pela convivência e cooperação entre as partes, com a intenção de explorar atividade econômica em comum.

13. Diferença entre Sociedade Irregular e Sociedade de Fato

Característica Sociedade Irregular Sociedade de Fato
Contrato Social Existe (escrito), mas não registrado Não existe contrato escrito
Registro na Junta Comercial Inexistente Inexistente
Personalidade Jurídica Inexistente Inexistente
Prova da existência Documento escrito Prova testemunhal ou comportamental
Responsabilidade dos sócios Ilimitada e solidária Ilimitada e solidária

14. Sociedades em Comum – Definição

As sociedades em comum são aquelas sem registro, abrangendo tanto as irregulares quanto as de fato (art. 986 do Código Civil).
São sociedades sem personalidade jurídica, mas que podem ser reconhecidas judicialmente para fins de responsabilidade patrimonial e partilha entre os sócios.

15. Sanções para Sociedades Irregulares e de Fato

  • Ausência de personalidade jurídica;

  • Responsabilidade ilimitada dos sócios pelas obrigações sociais;

  • Impossibilidade de requerer recuperação judicial ou falência;

  • Dificuldade de acesso a crédito e licitações públicas;

  • Impossibilidade de inscrição no CNPJ (em regra, salvo regularização posterior).

Aqui vão alguns precedentes jurisprudenciais recentes e relevantes do STJ (e de outros tribunais superiores) sobre sociedade irregular / sociedade de fato / dissolução irregular / responsabilização de sócios, com comentários sobre sua aplicação:


🏛 Jurisprudência relevante e síntese de entendimentos

1. REsp 1.430.750 / SP (Min. Nancy Andrighi) – Relativização da exigência de prova exclusivamente documental

  • Nesse julgado, o STJ reconheceu que exigir que a comprovação da sociedade de fato seja feita exclusivamente por meio documental implicaria “esvaziamento do instituto” e favoreceria o enriquecimento sem causa. (JusBrasil)

  • Assim, admitiu-se que outros meios de prova, como testemunhal, perícia ou indícios, podem colaborar para demonstrar a affectio societatis ou participação dos sócios numa sociedade de fato (ou irregular). (JusBrasil)

  • Esse entendimento é hoje utilizado como paradigma em demandas de reconhecimento de sociedade de fato. (Modelo Inicial)

Comentário: essa flexibilização é importante porque muitas sociedades informais, por sua própria natureza, não dispõem de documentos societários completos. Reconhecer prova por outros meios evita que sócios fiquem sem proteção ou possibilidade de exigir haveres.


2. Súmula 435 do STJ – Dissolução irregular e execução fiscal / redirecionamento da execução

  • A Súmula 435 prevê que “a sociedade dissolvida irregularmente ou que deixou de apresentar as declarações fiscais” autoriza o redirecionamento da execução fiscal contra o sócio-gerente. (Superior Tribunal de Justiça)

  • Ou seja: quando a empresa encerra suas atividades sem cumprir formalidades legais (comunicação, liquidação, baixa fiscal etc.), há presunção de responsabilidade do sócio-gerente perante o Fisco. (Superior Tribunal de Justiça)

  • Essa presunção não significa que não possa haver defesa, mas reforça o risco de responsabilização pessoal em matéria tributária.


3. Dissolução irregular ≠ desconsideração automática da personalidade jurídica

  • O STJ entende que a dissolução irregular, por si só, não é suficiente para configurar abuso da personalidade jurídica (art. 50, CC). É necessário que se demonstre omissão, fraude, confusão patrimonial ou desvio de finalidade. (TJDFT)

  • A mera circunstância de ter havido dissolução sem observância dos atos legais não basta para “ferir” a separação patrimonial dos sócios, salvo prova concreta de abuso. (TJDFT)

Comentário: esse entendimento é importante para limitar a extensão de responsabilização dos sócios em casos de dissolução irregular, exigindo que o credor demonstre elementos que justifiquem a desconsideração.


4. Risco de responsabilização em contratos celebrados por sociedade irregular

  • Já foi decidido que, em contratos firmados por sociedade não registrada (irregular), os sócios respondem ilimitadamente e solidariamente, mesmo que posteriormente a sociedade seja regularizada. (JusBrasil)

  • Por exemplo: em execução baseada em contrato celebrado antes da regularização, os sócios devem responder diretamente pelas obrigações que a sociedade contraíra. (JusBrasil)


5. Reconhecimento de sociedade de fato / efeitos entre sócios e de terceiros

  • A jurisprudência dos tribunais estaduais e do STJ admite que se reconheça sociedade de fato para efeitos internos entre sócios (direito de haveres, dissolução, partilha), desde que demonstrada a affectio societatis e participação efetiva. (JusBrasil)

  • Como já visto, não se exige prova exclusivamente documental. A prova testemunhal e circunstancial pode complementar. (JusBrasil)

  • Mas, no que toca a terceiros, já pode haver reconhecimento da sociedade mesmo sem registro, com responsabilização dos sócios nas relações externas. (JusBrasil)


Exemplos práticos / decisões paradigmáticas

  • TJ-MG: reconheceu sociedade de fato com base em prova documental que demonstrava divisão de lucros e despesas, e afetio societatis. (JusBrasil)

  • TJ-PR: relativizou o art. 987 do CC, admitindo prova diversa da escrita para reconhecer sociedade de fato. (JusBrasil)

  • TJ-RS: reconheceu sociedade de fato e determinou apuração de haveres. (JusBrasil)

  • TJ-RJ (agravo em execução fiscal): redirecionou execução fiscal contra sócio administrador por dissolução irregular. (Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro)


Integração e repercussões práticas

  • A jurisprudência mostra que a formalização societária (registro do contrato social) não é mera formalidade simbólica — a ausência dela acarreta riscos relevantes (responsabilidade pessoal, dificuldade de ação, execução fiscal).

  • Mas também demonstra que o Judiciário evita formalismos exagerados, reconhecendo sociedade de fato com base em provas diversificadas, para evitar que a proteção da formalidade favoreça injustiças.

  • No campo tributário, o redirecionamento fiscal (Súmula 435) impõe especial cautela ao sócio-gerente de sociedades que deixem de cumprir obrigações de encerramento legal.

  • Em casos de dissolução irregular, salvo demonstrado abuso, não se admite desconsideração automática da personalidade jurídica.


Nenhum comentário:

Postar um comentário