Hoje o mundo amanheceu com a trista notícia da morte do boxeador Muhammad Ali. Ele foi um ícone do esporte, campeão mundial várias vezes e tudo mais, porém Ali é tão celebrado ainda hoje em dia por motivos que pouco tinham a ver com sua carreira como esportista. Na verdade Ali foi um homem bem à frente de seu tempo. Em uma época em que os negros americanos ainda lutavam por seus direitos civis, Ali foi uma figura central nessa luta. Ele teve grande impacto na mídia justamente por falar e defender aquilo que pensava, independente de ser politicamente correto ou não.
Durante a Guerra do Vietnã ele se posicionou contra a intervenção americana naquele distante país asiático. Como forma de retaliação o governo quis que ele se alistasse à força (na época o serviço militar dos EUA ainda era obrigatório) e enviado para o front, mas Ali resolveu reagir, rasgando e queimando sua carteira de reservista publicamente. Isso abriu um amplo debate dentro da sociedade não apenas em relação à obrigatoriedade de servir as forças armadas de forma compulsória, como também sobre o próprio sentido da guerra.
Depois, em outro gesto simbólico, resolveu trocar seu nome de batismo, Cassius Clay, pois entendia que esse era seu nome de escravo. Muitos negros americanos fizeram o mesmo. Para eles seus antepassados que tinham sido traficados da África negra durante a escravidão tinham seus nomes trocados por seus senhores escravocratas. Nomes ocidentalizados, que nada tinham a ver com seu nome real. Para Ali o abandono de Cassius Clay significava também o abandono das últimas correntes da escravidão negra na América.
Outro ato de Ali que causou grande repercussão foi sua conversão ao Islã. Ali entendia que o cristianismo havia contribuído para o sistema de escravidão de negros africanos e que deveria ser rejeitado por essa razão. Agora imaginem um homem como ele, negro, ativista e muçulmano numa América predominantemente branca e protestante durante os anos 60! Era realmente uma personalidade mais do que explosiva. Muitos dizem que a grande luta de Ali foi sua busca por uma vida melhor após ser diagnosticado com Mal de Parkinson. Penso diferente. A grande luta de Ali foi travada contra a própria sociedade americana, com seus preconceitos e ideologias dominantes.
Pablo Aluísio.