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sábado, 2 de abril de 2011

Mandela: Herói ou Vilão?

O recente falecimento do líder Nelson Mandela deu origem a duas reações extremadas em nosso ponto de vista. A grande imprensa, a grande mídia, não pensou duas vezes em transformar Mandela em um santo imaculado. Um homem simplesmente perfeito e sem falhas em sua trajetória política na defesa de sua causa. Por outro lado os detratores de sua biografia mostraram um lado obscuro, nada lisonjeiro de sua trajetória.

Quem afinal tem razão?

Inicialmente vamos expor os argumentos dos que acham que o mito Mandela não passa de uma farsa bem arquitetada pela grande mídia. Pessoas como Olavo de Carvalho, por exemplo, defendem a tese de que Mandela nunca passou de uma marionete de um jogo político e financeiro sórdido durante todos esses anos. Para provar isso cita o fato de que Mandela só conseguiu ser libertado após receber o apoio de grandes grupos econômicos mundiais, entre eles o grupo Rockefeller. E qual seria o interesse desses magnatas em relação a Mandela? Segundo dizem havia um grande interesse em colocar as mãos nas imensas jazidas de diamantes da África do Sul. Com o governo liderado pela minoria branca isso havia se tornado impossível pois o direito de exploração e venda dos diamantes era exclusivo do governo. Com a queda do apartheid o capital estrangeiro finalmente tomou posse da riqueza de diamantes (de um valor imenso, segundo analistas). É inegável que ao assumir o poder Mandela realmente revogou a lei de exploração exclusiva das minas abrindo o espaço para os grandes grupos internacionais explorarem através de contratos de concessões de uso comercial os diamantes ao seu bel prazer. Será que tudo não passou de uma coincidência ou temos aqui realmente uma nova teoria da conspiração com bases sólidas?

Outro ponto de críticas em relação a Mandela foi sua política de alianças internacionais que para muitos foi muito equivocada. Mandela manteve bons laços de amizade e aproximação com ditadores sanguinários dentro do continente africano e fora dele foi figura próxima a pessoas como Fidel Castro, Muammar al-Gaddafi e até mesmo Saddam Hussein, todos conhecidos como ditadores linha dura que não admitiam oposição aos seus governos ao ponto das prisões de seus países ficarem cheias de presos políticos. Ora, o próprio Mandela foi um preso político por 27 anos em seu país, como poderia dar apoio internacional a esse tipo de gente? Não seria uma enorme contradição?

No plano interno Mandela também foi bastante criticado. Ele apoiou o aborto de forma praticamente incondicional. Hoje em dia a África do Sul tem um dos sistemas legais mais abertos do mundo nessa questão. No país o aborto é encarado como algo muito natural. As mulheres nem mesmo precisam de justificativa para abortar seus filhos quando bem entenderem. Em termos de legislação não existe nada parecido no mundo. O efeito disso é que o número de abortos na África do Sul aumentou consideravelmente e como se não bastasse o alto número de crianças mortas o índice de mortalidade das mães também disparou. Mandela justificava sua política pró-aborto de maneira até singela, afirmando que "As mulheres tem direito de escolherem o que é melhor para seu corpo". Só não conseguia explicar como esse direito ia ao ponto de matar crianças indefesas.

Outro ponto ruim que mancha a biografia de Mandela é a sua posição, quando jovem, em favor do uso da violência para combater o regime. Quando foi condenado por atos de sabotagem contra instalações militares Mandela assumiu sua culpa. Afirmou que não havia outra maneira. Ele também foi acusado de incentivar a invasão da África do Sul por países estrangeiros, em um ato de alta traição. Sobre isso porém negou afirmando que nunca foi traidor de seu país. O suposto terrorismo do Mandela foi desnecessário. Afinal de contas ele não tinha chance, como não teve, de vencer pela violência, por isso ficou tantos anos preso. Pela força ele não conseguiria nada, nunca. Deveria ter feito como Mahatma Gandhi, que nunca usou a violência e venceu pela força do exemplo. A mancha na biografia do Mandela ficará, para sempre - e ele, repito, não ganhou nada com isso.

A história só dá o título de grandes líderes sociais a pessoas que tentaram mudar a mentalidade de forma pacífica. As pessoas lembram do Ghandi mas não de pequenos grupos armados indianos que jamais venceriam uma guerra contra a Inglaterra imperial. Nos EUA o Pastor Martin Luther King é reverenciado já os Panteras Negras, que usavam a violência, não. Se Mandela tivesse partido para a vingança contra os brancos depois de sua saída da prisão ele teria o mesmo status de qualquer ditador africano sanguinário - e como sabemos sabe esse tipo de gente não falta por lá. O apoio internacional só vem para essas causas quando seus líderes decidem se transformar em exemplos de paz e honra. Violência e luta armada não levam a nada, não nesse tipo de situação onde o que está em jogo é a mudança de uma mentalidade. Em seu favor podemos dizer que embora Mandela tenha demorado um pouco a entender isso ele finalmente demonstrou uma outra postura quando saiu da prisão mostrando que evoluiu sobre essa questão.

Mas depois de ler tudo isso você pode ficar em dúvida sobre as qualidades de Nelson Mandela. Aqui chegamos no ponto em que perguntamos porque se tornou tão querido? De fato a biografia de Mandela tem muitos méritos. Independente da forma como ele chegou ao poder o fato é que assim que se tornou presidente adotou uma postura de convivência pacífica com os brancos. Veja que grande postura moral teve esse homem. Ele ficou por 27 anos preso, em uma cela minúscula, passando por todos os tipos de humilhação mas quando finalmente foi colocado em liberdade não partiu para um acerto de contas. Pelo contrário, deu a mão ao antigo opressor branco. Esse foi de fato o principal gesto que fez de Mandela um símbolo não apenas de luta contra um regime racista e sem pudores, mas também como um pacificador, um conciliador, um homem da paz.

Algumas posturas que tomou em vida inclusive causaram revolta em seus antigos amigos de militância. Em certa ocasião se tornou praticamente um garoto propaganda da indústria de vinho da África do Sul. Ora as grandes vinícolas sempre pertenceram a grupos de industriais brancos mas Mandela justificou o ato dizendo que isso não tinha importância, que no final das contas era uma indústria da África do Sul, acima de tudo, e por isso deveria ser incentivado e divulgado no exterior.

Outro ponto digno de aplausos foi a luta de Mandela em manter a África do Sul unida. O país foi concebido e criado pelo colonizador europeu branco, que traçou suas fronteiras e criou seu sistema administrativo, político e de poderes (legislativos, judiciário e executivo). Para radicias negros a própria ideia da África do Sul deveria ser abolida, com a criação de vários pequenos centros de poder que recriassem o antigo sistema tribal do povo nativo negro da região. Mandela foi completamente contra esse pensamento. Formado em direito, homem culto e inteligente, ele sabia que isso mais cedo ou mais tarde daria origem a uma infinidade de conflitos armados, o que levaria a África do Sul a uma guerra civil sem fim, como acontecia em vários países africanos vizinhos. A decisão de manter o país unido sob uma mesma bandeira também pode ser creditada como um dos grandes feitos de Mandela como estadista. Agindo assim ele trouxe paz e estabilidade para seu país.

Por fim não há como negar sua grande contribuição de Mandela para diversas causas sociais. Além de ter sido figura de proa na queda do regime racista de seu país, o apartheid, Mandela abraçou a luta de conscientização e combate em relação a AIDS. Como se sabe o continente africano é um dos mais atingidos por essa doença e Mandela entrou de coração nessa luta até quando suas forças já não o permitiram seguir em frente.

Em vista de tudo o que foi exposto chegamos na conclusão de que Nelson Mandela nem foi o santo imaculado que fazem crer certos artigos e reportagens que vemos na TV e jornais nesses dias e nem tampouco o vilão desalmado e vilanesco pintado por seus detratores. Ele foi simplesmente um ser humano, com erros e acertos em sua trajetória. Nada mais, nada menos do que isso.

Pablo Aluísio.