Fim de ano é tempo de organizar algumas bagunças. Remexendo em uma velha pilha de discos de vinil da minha velha coleção acabei me deparando com uma cópia antiga, já bem gasta pelo tempo, desse "Faith". Para matar um pouco a saudade resolvi colocar para tocar algumas faixas. Provavelmente apenas Michael Jackson e Madonna eram mais populares do que George Michael na década de 80. O cantor inglês era um dos maiores vendedores de discos do mundo! Suas turnês lotavam estádios planeta afora e George Michael tinha um fã clube tão forte e organizado como os de Madonna e Michael Jackson. "
Faith" foi seu auge absoluto. Depois de um começo de carreira no Wham! (uma espécie de Menudo em versão dupla) o cantor rompeu com o antigo amigo e se lançou em carreira solo.
Após assinar com uma grande gravadora ele mudou o visual (saiu o estilo namoradinho de colegial e entrou o jeito motoqueiro de ser). George Michael encarnava naquele momento o cara durão de rua, que arranjava briga em bares de motoqueiro onde só havia caras durões para bater. Com uma jukebox dos anos 50 ao lado e casaco de couro negro, o cantor praticamente se reinventou. O novo design caiu imediatamente no gosto de seu extenso fã clube. "Faith" vendeu quase 30 milhões de cópias ao redor do mundo! George Michael com seu visual de borracharia, barba por fazer e óculos espelhados virou um ícone de sensualidade e perigo para todas as adolescentes do mundo! Depois de conquistar o primeiro lugar nas paradas George Michael partiu para conquistar o mundo através de turnês megalomaníacas! Lotou estádios dos EUA à Europa e até no Brasil o ídolo das massas aterrissou.
Foi um dos primeiros álbuns gravados digitalmente no mundo - uma revolução e tanto para aquela época. George Michael mostrando uma maturidade incomum foi praticamente o único produtor de todas as faixas. Usando a nova tecnologia ao limite ele conseguiu produzir um disco único que até hoje causa admiração em quem ouve. Além disso ele sempre mostrou ser um intérprete muito talentoso, com voz muito agradável. Infelizmente assim como aconteceu com Michael Jackson, sua vida pessoal cheia de problemas e escândalos nublaram a isenção dos que escreviam sobre suas obras. O fato porém é que George Michael nunca mais voltou ao nível comercial e artístico que apresentou nesse "Faith", um álbum que até hoje é um dos maiores representantes da musicalidade da década de 80. Um apogeu que jamais voltaria a acontecer em sua carreira.
1. Faith (George Michael) - Inegavelmente é um pop descartável dos anos 80, música para tocar nas estações de rádio FM. Tudo feito para consumo rápido. A música título "Faith" vai justamente por esse lado. Agora pare para pensar um pouco. Compare essa pop music dos anos 80 com o que se ouve hoje em dia no Dial de sua programação. É algo muito superior a qualquer coisa que se ouça hoje em dia. Os arranjos dessa música são caprichados, lembrando inclusive as guitarras dos anos Rockabilly. Isso fica ainda mais evidente pelo próprio visual de George Michael nesse álbum. Ele surge como um roqueiro dos anos 50, com direito a casaco preto de couro e tudo. Uma antiga guitarra vintage completa o quadro. Ficou muito legal!
2. Father Figure (George Michael) - "Father Figure" foi outro grande sucesso desse álbum. É uma balada, mas que se diferencia justamente pelo estilo vocal de George Michael. Ele a canta em sussurros, causando um efeito de confissão em quem ouve a faixa. O coro feminino só valoriza ainda mais a canção. É aquela sonoridade anos 80 que se você ouviu na época nunca mais esqueceu. Extremamente fixada em sua mente. Coisas de produtor. A letra é também extremamente sensual. Em primeira pessoa George Michael conta para sua garota que quer ser sua figura paterna. Não na linha de se tornar um Sugar Daddy da jovem, mas sim ali lado a lado, desfrutando de momentos mais íntimos possíveis. Um violão espanhol solando ao fundo completam o quadro de sensualidade latente.
3. I Want Your Sex (I & II) (George Michael) - A música que mais fez sucesso desse álbum foi "I Want Your Sex (I & II)", Realmente um belo trabalho de arranjos providenciado pelo próprio George Michael que foi o produtor do disco. É interessante perceber também que essa faixa acabou sendo renegada pelo próprio George Michael alguns anos depois, principalmente depois que ele enveredou por uma linha mais séria em sua discografia. Não é mesmo incomum astros da música renegarem seus maiores sucessos depois de alguns anos. Até parece que sentem uma certa vergonha por terem feito sucesso com determinadas canções. Deixando isso de lado a canção tem um arranjo que mais parece um antigo R&B, com ênfase na parte mais acústica, isso sem deixar de lado o som mais sofisticado que acabou estourando nas rádios durante os anos 80. Já a letra, bem, essa era mais do que direta. Na época não se sabia que George Michael era gay, por isso o apelo de sua sexualidade pegou também as fãs em cheio. Com um visual bem másculo, com jeitão de roqueiro dos anos 50, George Michael logo se reafirmou como símbolo sexual para as garotas, algo aliás que vinha desde os tempos do Wham, só que naqueles tempos numa pegada mais juvenil.
4. One More Try (George Michael) - "One More Try" começa quase como uma música sacra. Essa balada foi outra que não saiu das paradas na época. De forma em geral esse foi mesmo o auge comercial da carreira do cantor. Praticamente todas as faixas do disco se tornaram hits. Impressionante. George Michael estava ali lado a lado com Michael Jackson e Madonna no domínio das paradas de sucesso. Aliás sempre cito os três artistas como a verdadeira "trindade" da música pop internacional dos anos 80. Seus discos eram formados de um sucesso atrás do outro. Em uma época onde a sonoridade da música comercial era infinitamente superior ao que se ouve hoje em dia eles se destacavam muito nesse aspecto. Sim, música comercial mesmo, feita para vender, mas com inegável qualidade.
5. Hard Day (George Michael) - "Hard Day" também é muito bem arranjada, porém é tal coisa, esse uso excessivo de sintetizadores (tão comum nos anos 80) deixou a gravação também bastante datada. A linha de baixo, instrumento mais tradicional e convencional, acabou salvando a canção de sua sonoridade 80s em excesso. Essa faixa fez relativo sucesso na época. Não é uma música de George Michael que você vai lembrar de imediato, mas bastará mais alguns segundo para que você se lembre bem dela. Tem um ritmo mais cadenciado. A letra não diz muita coisa, porém no conjunto se torna bastante razoável.
6. Hand to Mouth (George Michael) - A música começa com uma bateria digital (que era febre nos anos 80). A voz do George Michael também está modificada, muito remixada. Essa faixa fez um sucesso apenas razóavel em seu lançamento. Seu estrofe principalmente vai soar familiar para quem viveu a época. O refrão então, você lembrará com certeza. Mesmo assim penso que é uma faixa menor dentro do disco. Não chega a se destacar. Apenas seu ritmo mais relaxante vai chamar a atenção hoje em dia.
7. Look at Your Hands (David Austin / George Michael) - "Look at Your Hands" tem um arranjo tão anos 80! Esses saxofones, nesse tipo de linha melódica, me lembra imediatamente de Rob Lowe fingindo ser um músico naquele clássico "O Primeiro Ano do Resto de Nossas Vidas". Poderia ter feito parte dessa trilha sonora pois tem tudo a ver. Voltando para o "Faith" podemos perceber que a música tem seu embalo - com destaque também para as vocalistas femininas - mas nunca fez muito sucesso. Um Lado B de Michael. Bom embalo, dançante, bem produzida, mas sem maior brilho. Detalhe importante: foi composta em dupla com David Austin.
8. Monkey (George Michael) - A música "Monkey"ganhou clip, a gravadora se esforçou para fazer sucesso, mas a música nunca virou um hit! Por qual razão? Complicado dizer. O público tem seus próprios mistérios e nenhum analista consegue com certeza dizer se uma faixa vai ou não fazer sucesso. No videoclip temos uma parte em que George Michael, vestido de fazendeiro chic, com direito a suspensórios, dança em boa fotografia preto e branco. Na outra linha uma bem bolada edição mostra o cantor em diversos shows de sua turnê. É como eu escrevi, George Michael se esforçou muito para promover a canção - até fez coreografia própria, mas nunca pegou, nunca tocou bem nas rádios.
9. Kissing a Fool (George Michael) - E que tal beijar um tolo? Essa é a proposta de "Kissing a Fool". Ao contrário das anteriores esse bom swing fez sucesso e se tornou um hit internacional. O que não deixa de ser curioso pois é uma música bem simples, mas que caiu no gosto popular. Esse tipo de sonoridade me lembra muito os antigos cantores dos anos 40, com toda aquela ginga que se perdeu no tempo. Outro fato digno de nota: o arranjo não envelheceu nada e segue sendo tão saboroso e moderno como no dia em que chegou nas lojas pela primeira vez. Quem diria que essa faixa seria uma das mais impermeáveis ao tempo? Pois é... George Michael soando como algo novo, a última novidade.
10. Hard Day (Shep Pettibone Remix) (George Michael) - Numa época em que era raro termos remixes em álbuns de cantores e bandas, o George Michael inovou ao colocar essa faixa "Hard Day (Shep Pettibone Remix)". Era basicamente a mesma Hard Day, só que obviamente turbinada com todos os efeitos sonoros que eram possíveis nos anos 80. Ficou bem dançante, bem moderna, ideal para as pistas de dança. Importante chamar a atenção para o fato de que embora ainda não tivesse assumido publicamente que era gay o cantor era figurinha fácil em bailes e festas LGBTs. E ele bem sabia disso, tanto que contratou um grupo de DJs de Los Angeles especialmente para a elaboração desse remix. Um presente de George Michael para seu público mais fiel, obviamente.
11. A Last Request (I Want Your Sex Part III) (George Michael) - A mesma lógica fonográfica vem com "A Last Request (I Want Your Sex Part III)", só que aqui saiu o lado mais dance, frenético, para a entrada de uma balada bem calma, relax, bem diferente da "I Want Your Sex" original. Era fácil para George Michael brincar de produtor com esse tipo de faixa, afinal ele tinha à disposição o melhor dos mais modernos estúdios de gravação de Los Angeles e Nova Iorque ao seu dispor. Assim ele poderia dar diversas vertentes sonoras às músicas que havia gravado para o álbum "Faith". O resultado iria inspirar outros artistas a fazerem o mesmo, trilharem o mesmo caminho. Não deixou de ser uma inspiração bem interessante para quem gostava de música e sonoridade em geral. Foi até uma pequena revolução no mundo do disco que ele deu o pontapé inicial, quase sem querer.
Pablo Aluísio.