quarta-feira, 5 de janeiro de 2005

Elvis Presley - For LP Fans Only (1959)

Em 1958 Elvis Presley se tornou oficialmente um soldado do exército dos Estados Unidos. Ele foi enviado para a Alemanha para uma divisão de tanques localizada na fronteira e sua carreira simplesmente parou. Não haveria mais shows e nem gravações em estúdio. Elvis estaria fora do jogo por dois longos anos, nos quais ele iria congelar na fria região próxima a Frankfurt. Nada de músicas novas, melodias românticas, rocks ou filmes em Hollywood. Durante esse longo período fora, a RCA Victor não poderia ficar sem discos novos de sua maior estrela. No auge do sucesso, no pique da glória, Elvis conseguia vender mais que todos os demais artistas do selo juntos. Ele era um cantor indispensável para a saúde comercial da gravadora. Uma coisa era certa: o mercado não podia ficar sem discos novos de Elvis. Era preciso encontrar alguma saída, alguma solução para esse problema.

Assim a gravadora começou o lançamento de uma série de coletâneas. Usando fotos novas do artista, criava-se uma ilusão de que era um álbum novinho em folha do Rei do Rock. Só que na verdade todas as faixas eram meras rerises. Algumas até bem-vindas, pois só tinham sido lançadas antes pela Sun Records. E como se sabe a pequena gravadora de Memphis não tinha alcance nacional e nem muito menos internacional. Seus compactos foram vendidos em números limitados de cópias. Dar ao fã de Elvis na época a chance de ouvir as primeiras gravações do cantor, ainda no comecinho da carreira, não era ruim, pelo contrário, era um deleite para os colecionadores. Nasceu assim esse LP feito somente para fãs.

E foi através desse disco que muita gente ouviu pela primeira vez a música "That's All Right" que foi a primeira música gravada por Elvis Presley a ser lançada comercialmente. Chegou ao mercado pela primeira vez em um pequeno single da Sun Records. Foi gravada em julho de 1954, com um Elvis de apenas 19 anos de idade. Na época ele era motorista de caminhão da companhia de energia elétrica de Memphis. Composta originalmente por um artista negro chamado Arthur Crudup, o "Big Boy", essa música foi virada pelo avesso por Elvis. No estúdio ele deu seu toque pessoal para a baladinha country e acabou mudando a história da música mundial.

"Poor Boy" fez parte da trilha sonora do filme "Love Me Tender" (Ama-me com Ternura, no Brasil). Oficialmente a música teria sido escrita por Vera Matson e Elvis Presley, porém na verdade nem ele e nem ela criaram a canção e sim Ken Darby, o diretor musical dos estúdios Fox, marido de Vera. O Coronel Parker exigiu que Elvis figurasse como um dos autores por causa do valor dos direitos autorais. Depois que o próprio Elvis confessou que não fazia músicas, o velho empresário deixou isso de lado. Financeiramente era bom para ele e Elvis, mas do ponto de vista da verdade dos fatos não se sustentava. Elvis realmente não escrevia músicas, no máximo dava alguma ideia, mas sem escrever versos ou harmonias. Deixando isso de lado sempre gostei dessa música. É simples, com letra até juvenil, mas seu ritmo country mais leve e divertido a salva do lugar comum. A cena no filme também ficou muito boa, embora em minha opinião tenha tido uma edição ruim, que não valorizou a performance que Elvis tentava mostrar na tela.

"I Was The One" foi escrita pelo time de compositores formado por Aaron Schroeder, Claude Demetrius, Hal Blair e Bill Peppers. Por que ela foi tão trabalhada? Acontece que essa balada romântica fez parte das primeiras sessões de Elvis na RCA Victor. Era janeiro de 1956 e o estúdio estava nervoso, tentando recuperar rapidamente o dinheiro investido em sua contratação. As músicas que Elvis gravou nesse período foram bem estudadas, escritas pelos produtores, em especial Steve Sholes, que estava bem preocupado com seu emprego. Caso Elvis não se tornasse um sucesso de vendas ele certamente seria demitido.

Assim a música, que seria lançada como lado B do single "Heartbreak Hotel" foi lapidada mesmo, com todo mundo dando sugestão. O resultado ao meu ver ficou excelente. Como foi lançada em compacto, não fez parte da seleção musical do primeiro álbum de Elvis na RCA, o que sempre achei um grande erro de mercado. Aliás nem mesmo "Heartbreak Hotel", o grande clássico, entrou no disco original. Enfim, essas eram regras não escritas dentro da indústria musical da época. Os Beatles, alguns anos depois, iriam seguir por esse mesmo caminho. Só depois é que todos iriam perceber que era um erro.

"My Baby Left Me" foi escrita pelo compositor negro Arthur "Big Boy" Crudup. Ele foi muito importante dentro da carreira de Elvis porque sua primeira gravação profissional na Sun Records foi justamente feita em cima de uma de suas criações. Infelizmente Grudup morreu pobre e esquecido, destino de muitos artistas negros que viviam no sul dos Estados Unidos. No final da vida uma de suas únicas fontes de renda vinha justamente dos direitos autorais provenientes das gravações de Elvis. O próprio cantor lhe fez uma pequena homenagem lhe mandando uma placa em bronze com palavras de agradecimento. A versão que ouvimos aqui nesse disco foi gravada no dia 30 de janeiro de 1956, nos estúdios da RCA Victor.

O rock "Shake, Rattle and Roll" se notabilizou e fez sucesso na voz de Bill Haley e seus Cometas. Ele foi uma espécie de pai cinquentão do Rock em seu surgimento, pois quando começou a fazer sucesso já tinha passado da idade de ser considerado um rockstar, tal como Elvis. Isso porém não o impediu de fazer muito sucesso, principalmente com seu clássico absoluto "Rock Around The Clock", considerado o primeiro grande sucesso de Rock´n´Roll nos Estados Unidos.

Elvis gravou pouco do material inesquecível e marcante de Bill Halley, mas o admirava bastante, tendo inclusive se encontrado pessoalmente com ele. É famosa a foto de Elvis, já devidamente fardado para o exército, ao lado de Halley. De qualquer maneira essa versão de Elvis não faria muito sucesso em sua voz pois seu potencial comercial já tinha se esgotado com o lançamento do single de Bill Haley.

A baladinha country "I'm Left, You're Right, She's Gone" foi gravada por Elvis Presley na Sun Records na data de 5 de março de 1955. É interessante notar que quando a Sun vendeu o passe de Elvis para a RCA Victor havia uma cláusula nesse contrato que dava para a nova gravadora direito a toda e qualquer gravação feita por Elvis no estúdio de Sam Phillips. Era o que se costumava chamar na época de "cláusula universal de direitos autorais".

Isso se referia a tudo, desde uma música completa gravada por Elvis na Sun, até pequenos takes, ensaios, restos de gravação, qualquer coisa, qualquer registro em áudio. E quando Elvis foi para a RCA também foram os tapes que ele havia gravado em Memphis. Alguns deles perfeitos e bem gravados, que não foram negligenciados pela gravadora de Nova Iorque. Assim essa música não deixou também de ter seu espaço nesse álbum com o selo da multinacional. E esse country foi até bem comercializado pela gravadora pois disquinhos de jukebox foram enviados para a região sul, principalmente ali perto do Arkansas, onde acabou fazendo bastante sucesso.

"Playing for Keeps" foi gravada no dia 1º de setembro de 1956. Essa balada inicialmente deveria ter entrado no álbum "Elvis" nesse mesmo ano, só que isso nunca aconteceu. A RCA Victor decidiu que iria lançar a canção como single, mas depois de sucessivos adiamentos se perdeu o tempo certo de colocá-la no mercado. Acabou indo parar como lado B do single "Too Much" em janeiro de 1957. Com isso a música foi um tanto desperdiçada do ponto de vista comercial. Acredito que se tivesse sido lançada da forma certa em 1956 teria se tornado um dos grandes sucesso de Elvis naquela época.

Essa canção foi composta por Stan Kesler. Ele foi um artista da Sun Records e seu caminho crusou com o de todos os cantores da pequena gravadora de Sam Phillips. Era amigo de Jerry Lee Lewis e Johnny Cash. De sua autoria Elvis gravaria diversas músicas, como por exemplo  "I'm Left, You're Right, She's Gone" e "I Forgot to Remember to Forget", Além disso tocava sempre nas gravações de Carl Perkins. Enfim, foi um membro menos conhecido dessa geração pioneira de roqueiros surgidos nos anos 1950 pelo selo amarelo da Sun, em Memphis. Uma figura importante, mas hoje em dia pouco conhecida.

E por falar em Sun Records, esse álbum também trazia uma antiga faixa gravada por Elvis nesse pequeno estúdio de Memphis. Era "You're a Heartbreaker". Ela foi gravada por um Elvis Presley ainda muito jovem, quase amador, em dezembro de 1954. Segundo fontes mais seguras essa foi uma das primeiras sessões na Sun, contando apenas com Elvis, tocando violão, Scotty Moore em sua guitarra e Bill Black com aquele grande contrabaixo que hoje em dia pertence a Paul McCartney.

Dentro da discografia de Elvis essa baladinha country foi lançada originalmente em janeiro de 1955 como lado B do single "Milkcow Blues Boogie". Outra boa gravação que foi desperdiçada? Em termos. Não podemos ignorar o fato de que naquele tempo ninguém sabia se Elvis iria dar certo como cantor profissional, por isso a inclusão da gravação em um compacto da Sun Records, por mais simples que fosse, para todos os envolvidos já era um sinal de que eles tinham mesmo gostado do resultado final. Eram outros tempos, outras prioridades na vida do jovem Elvis Presley.

A faixa "Lawdy Miss Clawdy" foi gravada no dia 3 de fevereiro de 1956. Nessa época Elvis já era um cantor profissional contratado pela grande multinacional RCA Victor. Os dias de quase amadorismo, da Sun Records, tinham ficado para trás. Agora ele viajava bastante, não apenas para fazer shows, mas também para gravar nos melhores estúdios de gravação, fossem localizados em Nova Iorque, Nashville ou Los Angeles. Elvis estava sempre ocupado, cumprindo seus compromissos de agenda. Relembrando o passado, conferindo a carga de trabalho a que era submetido, realmente apenas um jovem de sua idade iria conseguir manter aquele pique. E o mais incrível é que Elvis conseguia produzir muito, com qualidade artística.

Essa canção "Lawdy Miss Clawdy" havia sido composta pelo talentoso Lloyd Price. Era uma das preferidas de Elvis, tanto que assim que ele colocou os olhos na set list enviada pela RCA, com a lista das músicas sugeridas para gravação, ele a escolheu rapidamente, sem pensar duas vezes. Inicialmente a RCA pensou em colocar a faixa no primeiro disco de Elvis, mas essa ideia inicial não foi para a frente. Depois ela foi escolhida para fazer parte do segundo álbum do cantor na gravadora, mas igualmente foi deixada de lado. Entender porque uma canção tão boa foi sucessivamente cancelada nesses discos é uma questão sem resposta. É complicado entender o que se passava na cabeça desses executivos e produtores que montavam o repertório dos álbuns de Elvis nessa época distante.

Já "Mystery Train" vinha do repertório do acervo herdado da Sun Records pela RCA. Quando Elvis foi contratado pela grande gravadora de Nova Iorque ficou estipulado em seu contrato que a RCA também teria direito a todas as gravações que ele havia feito na gravadora de Sam Phillips. E essas canções foram sendo lançadas (ou relançadas) aos poucos. Em discos como esse "For LP Fans Only" surgia mais uma boa oportunidade de colocar essas gravações antigas no mercado novamente. Essa aqui foi gravada em julho de 1955, em um tempo em que Elvis ainda estava decidindo se iria virar cantor profissional mesmo ou fazer um curso de eletricidade para trabalhar na companhia de energia de Memphis. Nesses tempos ele apenas dirigia o caminhão da firma.

Em relação aos valores artísticos de "Mystery Train" devemos relembrar que para muitos críticos essa foi uma das maiores e melhores gravações de Elvis em sua carreira. Para Sam Phillips, por exemplo, não havia a menor dúvida que tinha sido o melhor que Elvis havia produzido em sua pequena gravadora. E de fato chega a ser incrível como aqueles jovens músicos conseguiram chegar em um take tão perfeito, com tão poucos recursos disponíveis. A tecnologia de gravação da época era rudimentar. Fazer edições era praticamente impossível. Assim era mesmo uma questão de se chegar em um momento especial para capturar o talento dos artistas. No caso de Elvis, Scotty e Bill, isso aconteceu justamente aqui. Foi mesmo algo fantástico por parte deles. Algo que aliás nunca mais se repetiria ao longo de sua persmanência na Sun de Memphis.

Pablo Aluísio.

terça-feira, 4 de janeiro de 2005

Elvis Presley - King Creole (1958)

Falando sinceramente Elvis Presley nunca contou com a boa vontade dos críticos de cinema ao longo de sua carreira. Via de regra seus filmes e suas atuações eram criticadas severamente pelos especialistas da sétima arte. Porém como toda regra tem exceção, em "Balada Sangrenta" (King Creole, 1958) ele finalmente recebeu elogios. As razões são muitas e até bem diferentes entre si. "King Creole" era cinema puro, cinema de qualidade. O fato do protagonista ser interpretado por um rockstar era um mero detalhe. Penso que os fãs de cinema sempre rejeitaram quando ídolos da música tentaram fazer sucesso nesse campo cultural. Havia uma barreira entre as artes. Quem era do cinema estava dentro. Quem era do mundo da música teria que suar para provar seu valor.

Só que ficou mesmo complicado tecer a lenha nesse filme, principalmente quando se tinha Michael Curtiz como diretor. Ele era um símbolo da era de ouro do cinema americano. Dirigiu dezenas de grandes filmes, entre eles "Casablanca", considerada uma obra-prima absoluta das telas. Arrasar com "King Creole" significava arrasar também com Michael Curtiz e isso definitivamente estava fora de cogitação entre os críticos e entre os cinéfilos. Assim eles todos tiveram que reconhecer os méritos do filme, mesmo que para isso precisassem engolir Elvis Presley no elenco.

E a trilha sonora do filme? Outra surpresa maravilhosa. O puro Rock foi deixado um pouco de lado, ou melhor dizendo, as faixas fortes ainda estariam presentes no disco, mas com outra sonoridade. Não havia mais como a banda tradicional de Elvis dar conta dos arranjos, por isso um grupo enorme de músicos foi contratado pela RCA Victor. A maioria deles eram músicos de jazz, de New Orleans. Justamente o tipo de artista que essas músicas pediam. De fato essa sessão de gravação foi a mais peculirar e ímpar da carreira de Elvis até aquele momento. Um tipo de som que ele nunca havia feito antes em sua vida.

E apesar de ser uma espécie de novato nesse tipo de sonoridade, Elvis se deu bem. Ele apenas entendeu que deveria continuar a ser o mesmo cantor de antes. Os arranjos de metais ao seu lado seriam apenas um bônus. E não deixava de ser curioso também que não fazia muito tempo Elvis havia criticado sutilmente o jazz numa entrevista. O jornalista perguntara a ele se gostava de jazz. Elvis respondeu que não. Não iria falar mal do estilo musical, mas que na verdade não ouvia jazz, não gostava e não o entendia muito bem. É de se estranhar que de todos os ritmos musicais Elvis tenha implicado logo com o jazz. Em Memphis esse tipo de música era até bem comum. Só que Elvis parecia bem mais à vontade cantando gospel, blues ou country. O jazz definitivamente não fazia a cabeça daquele jovem de vinte e poucos anos. Porém lá estava ele nos estúdios da RCA Victor, gravando o seu disco mais jazzístico de sua carreira.

Essa trilha sonora do filme "King Creole" (Balada Sangrenta, no Brasil) é realmente muito boa. Os compositores e arranjadores tinham a complicada missão de unir o som de New Orleans e seu cenário musical mais do que rico, com a sonoridade do novo gênero musical que estava nascendo, o Rock. Não era algo fácil de fazer, mas ouvindo esse disco nos dias atuais chegamos facilmente na conclusão de que todos os envolvidos, criadores e músicos, conseguiram o que estavam procurando, com enorme êxito.

Basta colocar o disco para tocar e ouvir as primeiras notas da música tema, "King Creole", para perceber que vinha coisa muito boa por aí. Essa canção foi encomendada especialmente para a dupla Leiber e Stoller. Eles já tinham uma parceria de enorme sucesso ao lado de Elvis. Basta lembrar da trilha sonora anterior, "Jailhouse Rock" para bem entender que essa união de talentos tinha dado mais do que certo. Essa é uma faixa forte, com arranjos marcantes e letra relevante. Nada de bobagens, apenas um recado duro e visceral. Interessante é que a interpretação de Elvis da música no filme é um tanto convencional, dentro dos padrões. Para uma música tão marcante o diretor Curtiz deveria ter pensado em algo mais forte, contundente.

E as semelhanças de fórmula com outras trilhas sonoras continuavam. Afinal o que era "Lover Doll" a não ser uma nova tentativa de repetir o êxito de Teddy Bear. Só que havia um diferencial por aqui. O personagem de Elvis no filme era um sujeito que vivia em uma linha divisória bem clara, entre ser um bom rapaz ou cair na marginalidade. Na cena do filme ele canta e encanta com essa canção de tema tão pueril enquanto seus comparsas de quadrilha roubam a loja. Pois é meus caros, penso que esse personagem Danny Fisher foi o papel mais forte e marcante de Elvis no mundo do cinema. Falavam muito em James Dean, mas o Danny de Elvis estava mais para um jovem James Cagney, o ator que mais interpretou gângsters famosos nas telas de cinema.

E apesar de Danny ser um cara forjado nas ruas, vivendo em espeluncas administradas pela máfia, ele tentava vencer na vida com os estudos. A família dele acreditava que apenas a formação educacional iria salvar ele do mundo do crime, o que era uma visão certa do mundo naquela fase histórica. Só que ele tinha dois lados. Em uma cena poderia representar o bom moço, para em outra se envolver com pequenos crimes, furtos e coisas do tipo. Para representar o lado bom de Danny, a trilha sonora trazia a canção "Steadfast, Loyal and True", algo como uma espécie de hino escolar, muito tradicional nos Estados Unidos. Os jovens aprendiam a música da escola e depois que se formavam esses temas musicais funcionavam como boas lembravas, como símbolo de nostalgia dos tempos colegiais. Elvis cantou a música praticamente sozinho, com o mínimo de acompanhamento. Um bom momento do disco para curtir apenas sua voz, sem banda e grupo de apoio. Ficou bem bonito.

A gravação da música "Crawfish" trouxe uma novidade dentro da discografia de Elvis. Era a primeira vez que o cantor dividia os microfones com uma cantora. Acontece que o Coronel Parker era completamente contrário a Elvis realizar duetos em seus discos. Na visão do empresário isso diminuía Elvis, o seu prestígio como artista. Elvis deveria vender discos apenas com seu talento, sem precisar de ninguém. Era um tipo de orgulho sem sentido que o Coronel trazia dos seus dias de homem de circo, de gerenciador de artistas de parques de diversões. Uma coisa até mesmo bizarra se formos analisar bem.

Só que no caso dessa canção não havia outra alternativa. Elvis cantava a bela música em uma sacada em New Orleans enquanto uma senhora negra passava pela rua vendendo lagostim. Ela anunciava seus produtos à venda cantando, ao qual o personagem de Elvis respondia, também cantando. Uma bela cena, evocativa do dia a dia daquela cidade, de seus vendedores ambulantes e dos hábitos culinários da região. Quando foi a hora de decidir se a música traria ou não a participação da cantora Kitty White no álbum, o Coronel tentou tirar a participação dela da trilha sonora. Só que isso iria deixar a música sem sentido. Assim a RCA e a Paramount Pictures decidiram que ela estaria sim no disco e como eles mandavam por questões contratuais, a decisão foi mantida. Sabiamente ninguém deu ouvidos aos absurdos do Coronel. Até porque isso também poderia ser interpretado como uma questão de racismo, o que iria pegar muito mal perante os fãs de Elvis.

De todas as músicas de "King Creole" a única que Elvis levou em frente na sua carreira foi "Trouble". Ela inclusive iria ter uma importância incrível dentro do NBC TV Special em 1968. De fato é uma canção com vida própria, que poderia ser mesmo aproveitada dentro da carreira de Elvis dissociada desse filme e do contexto onde ela era apresentada no cinema. A letra também era ideal para o personagem de Elvis em "Balada Sangrenta", uma vez que ele tinha seu lado sombrio, vinculado ao submundo do crime em New Orleans. Aliás os únicos personagens de Elvis no cinema que tinham esse lado mais perigoso e criminal eram justamente o Danny de "King Creole" e o Vince de "Jailhouse Rock", não por acaso seus papéis mais fortes na sétima arte.

"As Long As I Have You" é uma boa balada do disco. Não teve muito uso fora da trilha sonora do filme. Todos os filmes de Elvis tinham sua dose de canções românticas. Fazia parte do pacote, afinal naqueles tempos os filmes de Elvis poderiam ser considerados como romances musicais (em alguns casos, comédias musicais), onde seus personagens invariavelmente tinham que cortejar a mocinha do filme, namorar com ela, tudo para encantar seu público feminino na época que no caso era formado nessa fase de sua carreira por uma imensa maioria de adolescentes. Fazia parte dos roteiros ter sempre uma ou mais cenas românticas onde essas baladas se encaixavam perfeitamente bem.

Colocar Elvis para cantar temas de jazz, ao estilo da Louisiana, não foi algo simples na época. Para quem não sabe esse estado americano tem uma das culturas mais singulares dos Estados Unidos. Nada se compara com a riqueza cultural (logo, musical também) dessa região. Muitos tinham receios de que Elvis iria ser massacrado pela onda de críticas que viria quando o disco chegasse nas lojas. Afinal aquela sonoridade não tinha nada a ver com os discos anteriores que Elvis havia gravado. Era algo novo, pantanoso para ele naquele momento da carreira. Elvis poderia passear facilmente pelo country, pelo gospel, pelo blues e pelo rock. Afinal nesses ritmos ele estaria em casa. Mas uma trilha sonora com elementos de jazz? Era outra história.

Felizmente os compositores, arranjadores e produtores desse álbum tiveram o bom senso de mesclar o estilo de Elvis com o estilo da Louisiana. E não é que deu certo mesmo! Basta ouvir a canção "New Orleans" para entender bem isso. Os arranjos de metais estão todos lá, mas também há o estilo único de Elvis cantar, os Jordanaires e parte de sua banda original. É uma mistura que parecia ser impossível, mas que no final deu certo. Mesmo que os jovens fãs de Elvis viessem a estranhar certos aspectos dessa trilha sonora, eles não iriam detestar o que iriam ouvir. Conseguiram chegar em um bom equilíbrio, algo que muitos achavam que não iria dar certo.

E para suavizar ainda mais tudo, havia o lote de músicas românticas cantadas por Elvis, faixas como "Don't Ask Me Why". Imagine para uma fã adolescente de Elvis nos anos 1950, apaixonada platonicamente por seu ídolo, ouvindo versos como "Eu vou continuar lhe amando / Não me pergunte o porquê / você é tudo o que estou desejando / Não diga adeus / Eu preciso de você mais e mais...". Claro, as jovens iam nas nuvens, sonhando com o "namorado perfeito" que era o próprio Elvis. Isso iria superar qualquer estranhamento que elas viessem a ter com os arranjos fora do padrão desse álbum "King Creole". 

Também me chama a atenção que uma parte das canções dessa trilha sonora eram bem mais convencionais do que as chamadas típicas de New Orleans. Essas poderiam estar em qualquer outro disco ou álbum normal de Elvis, sem problemas. Algumas vezes havia um mix, como em "Young Dreams". Aqui havia uma letra bem mais mediana, com pequenos, leves toques e nuances, para lembrar só um pouquinho do jazz do sul. Essa faixa aqui sempre me lembrou muito de "Young and Beautiful" pois as duas falam de romances juvenis, de amores de adolescentes. A juventude é louvada, aclamada, colocada em um pedestal. Elvis canta que tem jovens lábios para beijar, jovens braços para abraçar sua amada. E convida sua namorada para viverem juntos jovens sonhos de amor ao seu lado. Nada como um amor adolescente, na flor da idade, meus caros. As fãs de Elvis da época, nem preciso dizer, suspiravam ao ouvirem esses versos...

Então chegamos na faixa "Dixieland Rock". Antes de qualquer coisa cabe a pergunta: O que é Dixieland? Dixieland é um lugar que não existe no mundo real. É como Avalon. É um símbolo, uma imagem, uma localidade no imaginário de todo norte-americano nascido no sul dos Estados Unidos. Dixieland é um lugar nenhum e ao mesmo tempo são todos os lugares. Todas as cidades do sul são Dixieland, embora nenhuma delas seja de fato Dixieland. Dixieland é o sentimento de regionalidade, de pertencer ao sul. Quando um sulista nascido nos Estados Unidos diz que nasceu em Dixieland, todos entendem. Ele nasceu no sul, não importando qual estado e cidade ele efetivamente nasceu.

New Orleans é no sul. New Orleans então está em Dixieland. Agora o interessante é que a cultura de New Orleans é tão própria que podemos dizer que se existe uma cidade sulista que seja bem diferente do resto do sul, essa seguramente é New Orleans. Aqui há forte herança da cultura negra, dos escravos que chegaram no novo mundo nas caravelas dos escravocratas das fazendas de algodão do sul. Nesse novo mundo os negros mantiveram seus costumes, sua cultura e sua música. Ao mesmo tempo eles trouxeram para si parte também da cultura francesa, pois a  Louisiana pertenceu por muitos anos à coroa francesa, daí vem seu nome, a terra de Louis, rei da França.

"Dixieland Rock" é uma boa gravação de King Creole, o álbum, mas também temos que convir que com todo esse peso cultural que caiu sobre ela, as coisas se tornaram um pouco turvas. É um bom momento do disco, um momento cheio de vibração e energia, com Elvis em pleno pique. Só não vale tentar comparar com a herança cultural que o nome Dixieland evoca, até porque aí seria realmente até mesmo uma covardia. Séculos e séculos de cultura esmagariam esse música pop / rock da nascente cultura roqueira da década de 1950.

E sobre "Hard Headed Woman", que já tive oportunidade de escrever, não vejo muita salvação. O ritmo é muito bom, muito positivo, pra frente, go, go, go... Só que convenhamos... a letra é realmente péssima. A própria expressão que dá título à música soaria de mau gosto nos dias de hoje. Soaria vulgar, de cultura rasteira. Aqui foi desperdiçado o bom trabalho vocal de Elvis e sua banda, além dos instrumentistas da orquestra de metais que o acompanhou. Tudo isso para chamar uma jovem senhorista de "mulher cabeça-dura"? Não, não me soa interessante. Um momento anacrônico de uma trilha sonora muito boa. Essa música porém merece ser esquecida por trazer uma letra de quinta série.

Pablo Aluísio.

Elvis Presley - Elvis Golden Record Vol. 1 (1958)

Nos anos 50 os singles (compactos simples com duas canções, uma no lado A e outra no lado B) eram a verdadeiras estrelas do mundo musical. Ter um disco de sucesso significava antes de tudo ter uma música tocando nas rádios e um single nas primeiras posições da parada. Geralmente esses singles tinham que contar com um grande sucesso para o lado principal e uma canção menos conhecida, mas que fosse boa o suficiente para prender a atenção do consumidor nos famosos "Lados B". Elvis Presley viveu intensamente a "era dos grandes singles". Seus maiores sucessos nunca foram lançados em álbuns e sim em singles, que geralmente ficavam de fora dos LPs. Por quê os singles eram tão importantes nesse tempo? Simplesmente porque eram baratos (custavam menos do que 1 dólar), vendiam muito e caiam como uma luva para as emissoras de rádio, que os usavam como o melhor meio de divulgação para os artistas.

Além disso a produção de singles era relativamente barata, tanto que muitas gravadoras de fundo de quintal surgiram nos EUA por essa época, entre elas a própria Sun Records de Sam Phillips. Como os custos eram baixos não havia tanto risco para um pequeno empresário montar seu próprio selo e arriscar a sorte na esperança de conseguir um grande sucesso nacional. Foi nesse ambiente que Elvis surgiu e despontou. Todos poderiam ter uma chance assim, até mesmo um caminhoneiro de Cia Elétrica, caso tivesse uma boa voz. Nesse mundo dominado pelos singles Elvis reinou absoluto. Nenhum artista conseguiu vender o número de singles que ele vendeu nos anos 50 (nem mesmo os Beatles na década seguinte). Raramente um grande single de sucesso de Elvis vendia menos do que 5 milhões de cópias! Se esse é um grande número ainda hoje imagine há 50 anos atrás! Era uma sucesso enorme, que espantou até mesmo a RCA Victor, que pressionada pela enorme demanda chegou a colocar fábricas inteiras de sua propriedade apenas para produzir singles de Elvis Presley.

Nesse ínterim os LPs (álbuns com 10 ou 12 músicas) eram considerados secundários pela indústria, pois ao contrário dos singles eram caros e não estavam ao acesso de qualquer um, principalmente de um adolescente cheio de espinhas na cara vivendo da mesada do pai. Os álbuns geralmente eram utilizados para as gravações de maior duração como óperas! Não era o meio ideal para um cantor de público jovem, pois muitas vezes esses nem tinham dinheiro suficiente para comprar um Long Playing. A série Golden Records foi bolada pelo Coronel como uma forma de reunir os maiores singles de Elvis em um álbum. Provavelmente se você fosse um adolescente dos anos 50 nem iria comprar esse disco, pois já teria todos os singles de Elvis que foram reeditados aqui. Mas como todos sabemos o Coronel sempre procurava ganhar mais e aproveitar o produto até o esgotamento dele. Então Parker simplesmente uniu todos os compactos campeões em um só álbum.

Além disso Elvis estava para passar por uma grande reviravolta em sua vida pessoal e o Coronel procurava se precaver levantando alguns trocados a mais. Por isso é importante analisar o que estava ocorrendo com Elvis nesta época. No mesmo mês que este LP era lançado (março de 1958) Elvis começava seu serviço militar nas forças armadas norte americanas. Foi o acontecimento mais comentado pela imprensa no período trazendo enorme publicidade para o cantor. De inicio Elvis foi despachado para Fort Hood no Texas e depois completou seu serviço na Alemanha. Ele iria ficar um longo tempo sem gravar e fazer filmes e por isso a RCA resolveu lançar esta reunião de seus principais sucessos. E assim nasceu o disco "Elvis Golden Records". A primeira coletânea dos sucessos da carreira de Elvis Presley reúne músicas que fizeram parte de singles que atingiram enorme sucesso quando lançadas.

Este é o primeiro da série "Golden Records" que iriam contar com mais três discos que seguiam a mesma filosofia. Com a consolidação do LP foi necessário reunir os principais hits da carreira de Elvis neste formato, pois a maioria delas só havia sido lançadas antes como singles. Desta forma estão reunidas aqui verdadeiras pérolas do inicio do Rock'n'Roll e as mais conhecidas músicas do anos cinquenta, pois sem nenhuma sombra de dúvida esta foi a década de ouro da carreira de Elvis. Aqui esta a nata do período antes dele servir o exército, em que o Rei virou a história da música popular pelo avesso O disco "Elvis Golden Records" chegou ao terceiro lugar nas paradas, uma posição muito boa pois o LP só apresentava músicas já lançadas anteriormente. Vamos agora detalhar faixa a faixa todos as grandes músicas que fizeram parte desse histórico álbum

HOUND DOG (Jerry Leiber / Mike Stoller) — Sem dúvida uma das mais conhecidas músicas de Elvis. Originalmente foi lançada por Willie "Big Mama" Thornton em 1953. A Versão de Elvis surgiu como lado B do single "Don't Be Cruel" alcançando o primeiro lugar nas paradas em julho de 1956. Esse single é o mais vendido de toda a carreira de Elvis. No estúdio "Hound Dog" se transformou em uma das mais difíceis de gravar, levando Elvis e seu grupo a produzir mais de trinta takes! Finalmente Elvis se deu por satisfeito, escolhendo uma das versões como definitiva. No começo Elvis não quis gravá-la, mas como a música havia se transformado em um dos pontos altos de seus shows, o cantor cedeu aos apelos dos executivos da RCA Victor e a gravou em 2 de julho de 56 nos estúdios da RCA em Nova Iorque, os mesmos que havia utilizado para gravar parte das músicas de seu primeiro disco. Nessa mesma noite Elvis ainda gravaria as versões definitivas de "Don't Be Cruel" e "Any Way You Want Me". Uma das razões que levaram Elvis a ter uma certa resistência em gravar "Hound Dog" era o teor sua letra. Obviamente ela deveria ser cantada por uma cantora (de preferência negra, como Big Mama) pois era uma mensagem direta de uma mulher afro-americana despachando seu "homem" por ele ser infiel e mentiroso, apesar de tentar manter uma pose de honesto. Usando de gírias típicas da comunidade negra, Leiber e Stoller tinham essa clara intenção ao escrever sua música. Anos depois Stoller se manifestou: "Eu nunca escrevi o verso 'Well, you ain't never caught a rabbit and you ain't no friend of mine', isso foi escrito por Elvis para tentar disfarçar um pouco o conteúdo do que realmente queríamos dizer. Hound Dog foi feita para ser cantada por uma mulher...mas a versão de Elvis ficou tão legal que ninguém se tocou sobre isso". "Hound Dog" sem dúvida foi um tremendo êxito, mas Elvis a imortalizou mesmo ao apresentá-la no programa de Milton Berle na TV americana. Esse número entrou definitivamente na história e se transformou numa das melhores performances de sua vida.

LOVING YOU (Jerry Leiber / Mike Stoller) - Música título do segundo filme de Elvis, "Loving You" (a mulher que eu amo, 1957), que foi gravada em três arranjos diferentes: uma versão acústica para uma determinada cena do filme, em balanço blues e a versão clássica, conhecido por todos, lenta e romântica, que está presente neste LP. A razão para tantas versões é a determinação dos diretores musicais da Paramount para que fosse gravada variações diferentes para a aprovação final do estúdio. Além disso deveria haver takes de "Loving You" suficientes para utilizar em material promocional, como trailers, divulgação em rádios, etc. Aliás "Loving You" acabou se tornando um problema para Elvis. Muitos dos takes produzidos nas sessões de janeiro de 57 foram rejeitados pela Paramount. Então Elvis deve que voltar várias vezes aos estúdios para regravar grande parte do material, tanto que a versão definitiva de "Loving You" só saiu mesmo dia 24 de fevereiro. Mesmo assim Elvis não estava completamente seguro de que aquela seria a versão ideal. Mas sem mais tempo a RCA Victor resolveu lançá-la mesmo no single junto com "Teddy Bear". O single, como já foi escrito aqui, fez grande sucesso e novamente mostrou que seus compositores, Leiber e Stoller, se firmavam cada vez mais como os principais escritores de Elvis. A música em si possui melodia e letra simples, ideal para os corações juvenis dos anos cinquenta.

ALL SHOOK UP (Elvis Presley / Blackwell) — Elvis teve a idéia sobre essa música durante um de seus sonhos. Depois a repassou para Blackwell para que ele a transformasse em música. Quando a melodia e a letra ficaram prontas Elvis ainda fez algumas modificações, principalmente acelerando um pouquinho o tempo da canção. Como Elvis estava na ordem do dia, sendo venerado em massa pela juventude americana, quando o single chegou às lojas foi imediatamente transformado em um de seus maiores sucessos. Esta canção alcançou tamanha repercussão entre a moçada que chegou inclusive a virar gíria, entrando para o vocabulário da juventude norte americana da época. Bem gravada, numa ginga e manha toda pessoal, "All Shook Up", apesar de curtinha (menos de 2 minutos de duração) varreu as paradas do mundo inteiro chegando a vários primeiros lugares simultâneos em diversos países (inclusive no Brasil). Elvis alcança uma das mais brilhantes interpretações de sua vida resultando num dos singles mais vendidos de sua carreira. O single alcançou o primeiro lugar da parada da revista Billboard em março de 1957 tendo sido gravada em 12 de janeiro do mesmo ano nos estúdios Radio Recorders em Hollywood.

HEARTBREAK HOTEL (Axton / Durden / Presley) — Tommy Durden era um músico e compositor desempregado morando na Flórida, quando numa certa manhã de um domingo qualquer de 1955 se deparou no jornal local com uma notícia no mínimo inusitada: um homem de trinta e poucos anos havia se suicidado e deixado um bilhete ao seu lado na cama escrito com apenas uma frase: "Eu caminho por uma rua solitária". A polícia local não sabia a identidade do suicida e perguntava no diário lido por Tommy: "Você conhece esse homem?". Durden logo viu que aquilo era tão interessante que poderia dar em música, um Blues é claro! Logo começou a escrever a canção. Como escrevia sempre melhor em parceria procurou no dia seguinte sua amiga Mae Axton. Mae era importante para Durden por duas razões básicas: Ela era uma radialista influente e poderia vender a canção em uma convenção de DJs e também escrevia muito bem. Axton adorou a idéia de Tommy e em poucos tempo já estava ao seu lado melhorando a letra da música. Logo ela sugeria que se esse homem caminhava em uma rua solitária, essa deveria ter um Hotel dos corações partidos! Pronto, a música estava completa! No mês seguinte Mae Axton foi a Nashville para a convenção nacional dos DJs de rádios. Sua principal intenção era vender a música que compôs ao lado de Durden. Chegando lá ela logo conheceu Elvis, que também estava circulando pela convenção. Mae então tocou a música para Presley num demo cantado pelo cantor Glen Reeves. Elvis ouviu e seus olhos brilharam! Era aquele som que ele estava procurando. Ele havia sido contratado pela RCA Victor e estava precisando de novas músicas para a sua primeira sessão de gravação na grande gravadora. Ele e Mae Axton fecharam no mesmo dia. Em troca Mae ofereceu parceria a Elvis como compositor. Elvis agradeceu a gentileza e levou a música consigo para sua primeira sessão na RCA em janeiro. O resultado foi melhor do que o esperado: "Heartbreak Hotel" logo se tornou o primeiro grande sucesso de Elvis em nível nacional quando lançada em Janeiro de 1956 com "I was the one" no lado B alcançando o primeiro lugar simultâneo nas paradas Country, R&B e Pop - um fato inédito até então!. Essa sem dúvida é um dos maiores sucessos de toda a carreira de Elvis Presley, um símbolo e uma marca registrada de seu estilo.

JAILHOUSE ROCK (Leiber / Stoller) - "Jailhouse Rock" é um dos maiores clássicos da história do Rock mundial. Poucas músicas conseguiram traduzir e representar toda uma época e uma geração como essa. Perfeitamente executada, com ótimo arranjo a canção é uma das mais conhecidas da carreira de Elvis Presley. Nesse dia Elvis resolveu dispensar a participação dos Jordanaires após ter gravado alguns takes com os vocalistas. Elvis acertou, a canção ganhou em ritmo e fluência. Além disso o vocal de Elvis está simplesmente visceral, tanto que ele mesmo confidenciou depois ter sido essa uma das mais difíceis de acertar. Reconhecido pelos especialistas como o melhor rock gravado por Elvis em toda a sua carreira, a canção até hoje empolga e não envelheceu nem um minuto. Tão preciso e atual é o seu arranjo que até parece que foi gravada ontem. Música título do terceiro filme estrelado por Elvis que no Brasil recebeu o nome de "O Prisioneiro do Rock", sendo que sua trilha foi lançada em um EP (compacto duplo) em outubro de 1957. Foi ainda lançada como single em setembro de 1957 com "Treat Me Nice" no lado B. O sucesso foi imediato e o single chegou ao primeiro lugar na parada americana. A cena do filme em que Elvis apresenta esta canção é considerado o melhor momento do cantor no cinema. Leiber e Stoller afirmaram posteriormente que sua intenção era "...imitar o som de pedras quebrando" o que de certa forma foi conseguido. Foi gravado em 30 de abril de 1957 nos estúdios Radio Recorders em Hollywood. Assim Elvis ignorou a intenção satírica dos autores (Jerry Leiber e Mike Stoller) e interpretou a canção com fúria. Jailhouse Rock foi o primeiro single da história a ir direto para o topo das paradas no Reino Unido em 1957. Porém a trajetória de sucesso dessa canção imortal continuou. No 70º aniversário de Elvis a música foi mais uma vez relançada em single para comemorar a data. Não deu outra, a música novamente liderou as paradas, 48 anos depois de ter sido gravada! Imortal é isso aí!

LOVE ME (Jerry Leiber / Mike Stoller) - Sem dúvida uma das mais belas criações daquela que sem dúvida foi a mais importante dupla de compositores do Rei. Leiber e Stoller compuseram as mais importantes músicas da carreira de Elvis como "Jailhouse Rock", "Trouble" e "King Creole", entre outras. Esta foi feita especialmente para Elvis pois Leiber e Stoller achavam interessante o apego que Elvis tinha por músicas românticas, então resolveram compor uma canção sob medida para o gosto e a interpretação do cantor. Era uma das preferidas dele, tanto que a integrou em seu repertório nos anos setenta estando presente em quase todos os seus discos gravados ao vivo neste período. Também foi lançada num compacto duplo em outubro de 1956 junto com outras músicas de seu segundo LP, onde "Love Me" foi originalmente lançada. A música é uma das mais conhecidas de Elvis dos anos 50, pelo seu romantismo, por sua bela melodia e pela letra apaixonante. Embalou muitos corações apaixonados e serviu de trilha sonora para muitas paixões eternas. Sem dúvida um registro de Elvis em um de seus melhores momentos de estúdio.

TOO MUCH (Rosenberg / Weinman) - Música título de um single lançado em janeiro de 1957 com "Playing for Keeps" no lado B alcançando o segundo lugar nas paradas. O disco foi lançado num momento em que Elvis estava sendo muito visado pela mídia norte americana por causa das polêmicas apresentações dele no Ed Sullivan Show e nos programas de Milton Berle e Steve Allen. Foi gravada em 2 de setembro de 1956 juntamente com as músicas que fizeram parte do segundo disco do cantor, "Elvis".

DON'T BE CRUEL (Presley / Blackwell) - Lançado no single mais vendido da carreira de Elvis Presley, juntamente com "Hound Dog" no lado B. A canção foi uma das mais bem sucedidas parcerias entre Elvis e Blackwell. Esse era um renomado compositor de R&B nascido e criado no Brooklin de Nova Iorque. Em meados dos anos 50 ele foi contratado pela poderosa Hill & Range, que ao longo dos anos iria providenciar muitas das músicas escritas para o cantor. Elvis em diversas entrevistas nos anos cinquenta afirmou ser esta a sua música preferida. Seu produtor na Sun Records, Sam Philips, por sua vez declarou: "Não gostei de Heartbreak Hotel, mas quando ouvi Don't be Cruel eu pensei comigo mesmo: Agora eles descobriram o que fazer com o talento de Elvis". Foi lançada em julho de 1956 atingindo o primeiro lugar rapidamente. Foi durante a apresentação desta música que Elvis foi censurado no Ed Sullivan Show pois os produtores do programa resolveram só o mostrar da cintura para cima! Sem dúvida este ato simbolizou todo o moralismo da sociedade americana dos anos 50. "Don't be Cruel" foi gravada em 2 de julho de 1956 em Nova Iorque

THAT'S WHEN YOUR HEARTACHES BEGIN (Raskin / Brown / Fisher} - Em 1953 Elvis entrou pela primeira vez em um estúdio de gravação. Pagou quatro dólares e saiu com o primeiro acetato de sua vida. No lado principal "My Hapiness" e no lado B, "That's when your heartaches begin". A lenda afirmava que o cantor havia gravado este disco para dar de presente a sua mãe, mas o que Elvis queria mesmo era ouvir como ficava sua voz num disco. Este pequeno acetato ficou perdido por vários anos, sendo que nem mesmo Elvis sabia aonde ele foi parar durante todo esse tempo (o mitológico compacto só foi encontrado após a morte de Elvis com um amigo de ginásio de Presley e lançado pela primeira vez no box "The King Of Rock'n'Roll). Esta versão do disco "Elvis Golden Records", por sua vez, é uma gravada posteriormente por Elvis já como cantor profissional e que foi lado B de "All Shook Up" em março de 1957. A versão original desta música foi lançada em 1950 pelo grupo "The Ink Spots".

(Let Me Be Your) TEDDY BEAR (Kall Mann / Bernie Lowe) - No auge do sucesso de Elvis correu um boato que ele adorava ursinhos de pelúcia. Apesar de não ser verdade o boato ganhou força e de um momento para o outro o cantor se viu num mar de bichinhos dados pelos seus fãs. Em uma entrevista Elvis afirmou que tinha guardado todos em sua casa! Para aproveitar esta história foi composto este grande sucesso, que alcançou o primeiro lugar da parada de singles da revista Billboard com "Loving You" no lado B. O single foi um campeão absoluto de vendas quando foi lançado em junho de 1957. Assim como "Mean Woman Blues", "Teddy Bear" também não fez parte das sessões de gravação da trilha sonora do filme "Loving You". Ela foi registrada dias depois em uma sessão que só foi realizada para Elvis gravá-la. Nesse mesmo dia Presley ainda gravou uma versão "envenenada e maldita" de "One Night" chamada "One Night Of Sin". Esse take alternativo acabou se tornando bem badalado após a morte do cantor. Curiosidade: o "Teddy", nome dado ao ursinho é uma homenagem ao presidente americano Theodore Roosevelt, conhecido por suas caçadas e espírito aventureiro.

LOVE ME TENDER (Presley / Matson) - Música título do primeiro filme de Elvis Presley, que no Brasil recebeu o nome de "Ama-me com Ternura" (Love Me Tender, 1956). O titulo original do filme era "The Reno Brothers", faroeste sem grande importância, estilo B da Fox, que nunca teria entrado na história se não fosse pela primeira participação de Elvis Presley no cinema. A história se passava durante o final da guerra civil norte americana e tratava da delicada disputa de uma mulher por dois irmãos. Um deles (Richard Egan) voltava do campo de batalha e descobria, estarrecido, que sua antiga namorada (Debra Paget) estava agora casada com seu irmão mais novo (Elvis). E isso só havia acontecido porque todos estavam convencidos que ele havia morrido no campos de algodão do sul, lutando contra os exércitos da União. Já imaginou a confusão?

O roteiro gira em torno desse triângulo amoroso familiar. Elvis, muito novo e com os cabelos ainda bem próximos de sua tonalidade natural, não compromete em nenhum momento, mesmo sendo sua estreia como ator. Quando lançado em 1956, "Love Me Tender" se tornou um tremendo sucesso de bilheteria. Elvis mostrou que era um nome quente não só no mundo musical, como também na tela grande. Muitos fãs inclusive foram em peso na semana anterior ao lançamento oficial do filme apenas para assistir ao trailer que mostrava pequenos trechos de Elvis cantando! O disco acompanhou o sucesso do filme. A trilha foi lançada em um compacto duplo com "We're Gonna Move", "Let Me" e "Poor Boy" todas de autoria de Elvis Presley e Vera Matson. Era o inicio de uma carreira cinematográfica que iria contar com mais de trinta filmes. A canção "Love Me Tender", por sua vez, foi gravada em agosto de 1956 nos estúdios I da 20th Century Fox em Hollywood e lançada um mês depois em single com "Any Way You Want Me" no lado B, chegando ao primeiro lugar da Billboard na primeira semana. Elvis não contou com sua banda tradicional, os Blue Moon Boys, pois o estúdio não tinha contrato com eles e sim com músicos determinados pelo estúdio cinematográfico da Fox. Músicos profissionais do cast fixo da companhia.

Mesmo um pouco fora do ambiente que lhe era familiar, Elvis, ao lado de Darby, produziu "Love me Tender" e lhe deu um arranjo bastante simples, porém muito eficiente, sentimental e belo. Depois de registrar sua participação no estúdio Elvis aproveitou a oportunidade de se apresentar no The Ed Sullivan Show em 9 de setembro para promover a música e o filme. O sucesso foi imediato e Elvis foi assistido por mais de 50 milhões de americanos. 82,6% dos televisores dos EUA estavam sintonizados nele naquela noite. A nação parou para assistir Elvis interpretar "Love Me Tender", um recorde que só foi quebrado depois pelo assassinato do presidente Kennedy e pela apresentação em 1964 dos Beatles no mesmo programa. Tamanha repercussão levou rapidamente o disco a se tornar o primeiro da história a ter 1 milhão de cópias pré vendidas, graças à expectativa gerada em torno de seu lançamento. Um marco na carreira de Elvis e uma das canções mais identificadas com sua imagem. Um ícone romântico da cultura musical dos Estados Unidos, baseada na velha música "Aura Lee" em adaptação do maestro Ken Darby.

TREAT ME NICE (Leiber / Stoller) - Outra canção deliciosa de Leiber e Stoller sendo lançada como lado B de "Jailhouse Rock". Para essa canção Elvis resolveu gravar duas versões: uma no dia 30 de abril durante as gravações do filme e outra no dia 5 de setembro que acabou se tornando a definitiva e oficial. A primeira foi utilizada durante o filme e curiosamente é considerada por muitos como a melhor. Isso se deve principalmente porque o arranjo da primeira versão é bem mais soft e leve do que a da versão original, mais excessivamente produzida. De qualquer forma as duas são ótimas e podem ser conferidas sem nenhum receio. No filme Elvis fez questão de chamar um dos compositores para participar da cena em que ele a apresenta. Lá está Mike Stoller, atrás de Elvis, fazendo figuração como um dos membros da banda do cantor. Aliás é bom frisar que ele também participou das gravações da trilha sonora em estúdio. Outro grande momento da trilha sonora que é reconhecida, de forma merecida aliás, como uma das melhores de Elvis.

ANYWAY YOU WANT ME (Schroder / Owens) - Lado B do single "Love me Tender". Não faz parte da trilha do filme sendo gravada nas mesmas sessões que deram origem as canções "Dont be Cruel" e "Hound Dog" em julho de 1956. Possui um toque de guitarra típica de algumas músicas dos anos cinquenta. Nota-se até mesmo uma certa estafa na voz de Elvis. Também não poderia ser diferente pois nessa mesma noite ele tinham trabalhado duro para chegar nas versões definitivas de "Don't Be Cruel" e "Hound Dog" (sendo que essa última teve mais de 30 takes gravados!). Sem ter mais fôlego Elvis registrou essa balada e deu por encerrada a sessão.

I WANT YOU, I NEED YOU, I LOVE YOU (Mysels / Kosloff) - Na véspera da gravação desta música o avião de Elvis havia sofrido um pane e se eles estavam ali era por um verdadeiro milagre. Elvis ficou tão nervoso com o acontecimento que só conseguiu gravar esta música durante a sessão. Ela foi gravada em 11 de Abril de 1956 nos estúdios da RCA em Nashville. Foi lançada como single em maio de 1956 junto com "My Baby Left Me" no lado B alcançando o terceiro lugar na parada da revista Billboard. Elvis a apresentou de fraque e cartola no programa de Steve Allen em 1956. Curiosidade: Era uma das preferidas de John Lennon.

Pablo Aluísio - Setembro de 1999 / revisado e atualizado em novembro de 2001

Elvis Presley - Peace In The Valley

Elvis Presley - Peace In The Valley (1957)
Quando o compacto duplo Peace In The Valley apareceu nas lojas americanas em abril de 1957 a imprensa torceu o nariz para o lançamento! “Elvis Presley, aquele roqueiro, agora cantando músicas religiosas? Quem ele pensa que está enganando?” Infelizmente não é de hoje que a chamada grande imprensa mostra desconhecimento de causa em relação a Elvis Presley. O jornalista dos grandes meios de comunicação quase sempre é um “generalista”, um sujeito que sabe pouco sobre muita coisa e muita coisa de praticamente nada! Assim também foi com Elvis. Focados apenas no lado roqueiro do jovem Elvis eles desconheciam completamente sua trajetória, suas raízes musicais e seu lado mais espiritual. Ignoravam por exemplo que um dos grandes sonhos de Elvis sempre foi o de participar de um quarteto gospel e de que ele, mesmo quando participava de sessões comuns e regulares, sempre se aquecia cantando o mais puro gospel de sua infância e juventude. Até mesmo no dia a dia Presley gostava de se ver envolvido com a música religiosa. Mesmo famoso não perdia seus programas de rádio preferidos onde a programação geralmente girava em torno desse estilo musical.

Quando voltou aos estúdios para “encher a lata”, ou seja, gravar novas músicas para a RCA Victor, Elvis aos poucos foi gravando canções religiosas. Nada havia sido previamente programado sobre isso mas entre uma música convencional e outra Elvis foi registrando algumas canções gospel. Uma aqui, outra acolá, como quem não queria nada. Ele estava empolgado com a ótima repercussão de sua apresentação de “Peace in The Valley” no programa de Ed Sullivan algumas semanas antes então por que não gravar algumas músicas nesse estilo? Poderia dar certo, quem sabe. O ideal seria a gravação de quatro músicas para compor um compacto duplo e assim Elvis o fez. Obviamente esse tipo de música nada tinha a ver com imagem pública que ele tinha entre o grande público naquela época. Para a massa Elvis Presley era um roqueiro com brilhantina no cabelo que no palco rebolava de forma indecente e escandalosa! Nada, absolutamente nada a ver com um cantor religioso de baladas espirituais.

A verdade era que o homem Elvis Presley tinha pouco a ver com sua imagem pública. Enquanto todos pensavam que ele era um selvagem ao estilo dos personagens de Marlon Brando e James Dean no cinema, Elvis era apenas um rapaz jovem tentando subir na vida para dar uma vida melhor aos seus pais. Calmo, tímido até, não ousava falar palavrões em casa diante de Gladys e nem de Vernon Presley. Caseiro e apegado com sua mãe sempre ligava para ela onde quer que estivesse para dizer que tinha feito boa viagem e estava tudo bem. Enfim, o oposto do demônio delinquente juvenil que imaginavam dele.  De certa forma esse compacto duplo era a realização de um velho sonho de Presley, a de ser um cantor gospel, de levar suas músicas preferidas para sua imensa legião de fãs, sempre nesse processo levando também uma mensagem de espiritualidade e religiosidade a todos os seus admiradores. Uma postura muito digna e adequada, diga-se de passagem. Esse tipo de trabalho sempre enchia Elvis de orgulho pessoal e ele sempre encontraria um jeito dali em diante de encaixar algo nesse estilo em seus shows e discos. Quando chegou nas lojas o resultado foi considerado muito bom. Elvis colocou um pé no mercado gospel,  um dos mais influentes e ricos da sociedade americana, ao mesmo tempo em que sua imagem foi bem melhorada diante dos setores mais conservadores do país. Um saldo final muito positivo. As canções que fizeram parte desse compacto duplo foram essas:

Peace In The Valley (Thomas A. Dorsey) – Escrita em 1939 para a grande cantora Mahalia Jackson. Essa era uma música que tocava fundo na alma de Elvis porque lembrava a ele sua infância na pequena Tupelo no vizinho Estado do Mississippi onde nasceu. Quando a canção estourou nas rádios ele tinha apenas 4 anos de idade, o que ajudou a criar uma lembrança afetiva da música em sua vida. Interessante é que Elvis foi o mais fiel possível ao disco original de Jackson. Até nos mínimos detalhes – como a guitarra solando ao fundo – Elvis tentou reproduzir em seu registro. O acompanhamento vocal é praticamente o mesmo, mostrando que Elvis queria mesmo uma gravação fiel à antiga versão. Uma postura de respeito com a versão original, sem dúvida. A letra, como não poderia deixar de ser, é evocativa a um lugar imaginário onde haveria paz, onde os lobos seriam mansos e os ursos gentis. Uma metáfora do céu e do paraíso prometido aos bons cristãos que levassem uma vida digna e correta. Bem escrita a canção entrou na galeria das mais queridas entre os evangélicos do sul dos Estados Unidos. A versão oficial de Elvis foi gravada no dia 13 de janeiro de 1957 em Hollywood nos estúdios Radio Recorders.

It Is No Secret (Stuart Hamblem) - A versão original foi lançada em 1950 pelo cantor religioso Bill Kenney e o grupo The Ink Spots. A canção foi composta pelo cowboy cantor Stuart Hambleim que era muito popular por seu famoso programa de rádio – que era ouvido também pelo garoto Elvis e sua mãe Gladys nos primeiros dias da família Presley em Memphis. Hambleim se tornou muito conhecido por causa dos temas que escreveu para os grandes nomes do faroeste americano como Gene Autry, Roy Rogers e John Wayne. Anos depois decidiu seguir uma linha mais evangélica, completamente centrada em músicas religiosas e “It Is No Secret” faz parte dessa sua nova fase de vida. A versão de Elvis tem um toque mais moderno se formos comparar com a versão original. Aqui ele quis certamente melhorar um pouco em relação ao disco original. Sua visão da canção ficou pronta no dia 19 de janeiro de 1957, logo após Elvis finalizar a trilha sonora daquele que seria seu novo filme, “Loving You”.

I Believe (Drake / Graham / Shirl / Stillman)  - Extremamente emocional para Elvis, essa música ganha em grandiosidade e emoção, principalmente porque notamos nitidamente como ele se entregava completamente, de corpo e espírito, a esse sentimento religioso. Música Gospel sempre teve um significado muito grande para Elvis, provavelmente foi o primeiro tipo de canção que ele ouviu, nos cultos da assembleia de Deus, do qual fazia parte. Tinha um carinho especial por elas tendo gravado três discos exclusivamente com este gênero musical no decorrer de sua carreira: "His Hand in Mine" em 1960, "How Great Thou Art" em 1967 e "He Touched Me" em 1972. Curiosamente todos os prêmios Grammy da carreira de Elvis Presley lhes foram dados por seus trabalhos religiosos!

Take My Hand Precious Lord (Thomas A Dorsey)  - Outra música composta por Thomas Dorsey, "Take My Hand Precious Lord" foi particularmente complicada de finalizar. Depois de várias tentativas Elvis se deu por satisfeito e após ouvir todos os takes da sessão escolheu a que melhor lhe agradava. Mas intimamente, como confidenciou a Scotty Moore, não ficou muito certo sobre a escolha. Isso demonstra como Elvis trabalhava fixamente e arduamente sobre uma canção até achar a versão definitiva. Estas quatro canções incluídas em "Peace In The Valley" foram a materialização de um dos sonhos de infância de Elvis, pois desde de criança ele almejava ser cantor de músicas religiosas. É certo pelos registros que Elvis certamente deu o melhor de si. Ele ainda não tinha o pleno domínio vocal que iria adquirir ao longo dos anos mas isso em nada prejudicou ou maculou o resultado final, pelo contrário, mostrou que definitivamente ele não era apenas um cantorzinho para consumo jovem, um mero ídolo adolescente. Era na realidade um dos melhores intérpretes surgidos dentro da música americana, algo que provaria nos anos seguintes. Um talento inigualável certamente.

Elvis Presley - Peace In The Valley (1957) - Elvis Presley (voz e violão) / Scotty Moore (guitarra) / Bill Black (baixo) / D.J.Fontana (bateria) / Gordon Stoker (piano) / Dudley Brooks (piano) / Hoyt Hawkins (órgão) / Jordanaires (acompanhamento vocal) / Produzido por Steve Sholes / Arranjado por Elvis Presley e Steve Sholes / Gravado nos estúdios Radio Recorders - Hollywood / Data de Gravação: 12 a 13 de janeiro de 1957 e 19 de janeiro de 1957 / Data de Lançamento: abril de 1957 / Melhor posição nas charts: #39 (EUA) # - (UK).

Pablo Aluísio.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2005

Elvis Presley - Jailhouse Rock (1957)

JAILHOUSE ROCK (1957) - Se "Love Me Tender" foi um teste e "Loving You" a primeira tentativa de Elvis em se firmar como um astro em Hollywood, "Jailhouse Rock" é a consolidação desse objetivo. Com ótimo roteiro e um papel feito sob encomenda para Elvis, "Jailhouse Rock" foi o grande filme do cantor nos anos 50. A imagem do cantor vestido com roupas de presidiário entrou definitivamente na história da cultura pop e se tornou um dos ícones mais conhecidos do cantor em Hollywood. "Jailhouse Rock" foi o primeiro filme de Elvis pela MGM, estúdio conhecido por ter feito os maiores musicais da história do cinema. Com tanto know how o produto final não poderia sair diferente. Inclusive Elvis era visto como uma tábua de salvação para o estúdio, pois além de proporcionar ótimas bilheterias iria inevitavelmente levar o gênero musical para as platéias mais jovens. Em 1957 a era dos grandes musicais de Hollywood já ficara para trás, os grandes nomes do período de ouro desse estilo de filme estavam aposentados ou amargando um injusto ostracismo. O Rock'n'Roll de certa forma representava a linguagem dos jovens da época, que não estavam mais interessados nos passos de Gene Kelly e Fred Astaire.

Os grandes filmes da Metro como "Cantando na Chuva" ou "O Picolino" eram vistos pelos jovens roqueiros como passatempos bobos da juventude de seus pais. Sem conseguir encontrar uma via de comunicação com as novas gerações a MGM procurou se adaptar. E qual era a melhor forma de atrair essa moçada de volta aos cinemas para assistir seus grandes musicais? Ora, usando o maior ídolo dessa juventude: Elvis Presley. Imagine o choque de gerações dentro do set de filmagem. Uma equipe da velha escola tentando compreender e traduzir em película os anseios de uma juventude que eles mal conheciam. Isso se revelou perfeitamente em um fato ocorrido durante as filmagens. O coreógrafo e o diretor Richard Thorpe se encontraram com Elvis no dia em que iriam filmar a famosa cena em que ele cantaria o tema principal. Quando os dançarinos começaram a desenvolver sua coreografia Elvis se viu diante de um número completamente baseado no estilo de Fred Astaire e Gene Kelly, com aqueles passinhos de dança milimetricamente ensaiados. Além de fora de contexto o número era completamente ultrapassado segundo a visão de Elvis. Caso se apresentasse daquele jeito em um filme ele seria ridicularizado por seu público. Elvis viu que teria salvar o dia mais uma vez. Mudar tudo e começar do zero. O cantor esperou pacientemente tudo aquilo terminar e com educação sugeriu a Thorpe que iria, ele mesmo, desenvolver um número junto dos dançarinos. O que Elvis fez naquela tarde entrou para a história do cinema.

Em pouco mais de um dia de ensaios Elvis mostrou a todos como a cena deveria ser feita. Procurou determinar o local onde cada dançarino deveria estar e a forma que deveria se apresentar. Pela primeira em sua vida Elvis estava desenvolvendo um de seus mais notórios talentos, o de dançarino. Embora nunca tenha desenvolvido totalmente esse aspecto de sua personalidade artística, Elvis naquele dia se superou e conseguiu com aquele número entrar para a galeria dos grandes momentos musicais da história da MGM, lado a lado com os mestres do passado. E fez isso sem precisar adotar o estilo de ninguém, apenas confiou em sua intuição e realizou uma das cenas mais lembradas do cinema dos anos 50. O resultado final foi dos mais felizes: o filme foi elogiado pela crítica e o público lotou os cinemas mais uma vez. Fora isso o single "Jailhouse Rock / Treat Me Nice" se transformou em um dos discos mais vendidos da década. A trilha completa foi lançada em um compacto duplo com as seis canções do filme (sem nenhuma bonus song). Enfim, "Jailhouse Rock" é um dos mais vitoriosos projetos da carreira de Elvis, um momento único que captou para a posteridade toda a glória do Rei do Rock no auge de seu sucesso.

JAILHOUSE ROCK (Leiber / Stoller) - "Jailhouse Rock" é um dos maiores clássicos da história do Rock mundial. Poucas músicas conseguiram traduzir e representar toda uma época e uma geração como essa. Perfeitamente executada, com ótimo arranjo a canção é uma das mais conhecidas da carreira de Elvis Presley. Nesse dia Elvis resolveu dispensar a participação dos Jordanaires após ter gravado alguns takes com os vocalistas. Elvis acertou, a canção ganhou em ritmo e fluência. Além disso o vocal de Elvis está simplesmente visceral, tanto que ele mesmo confidenciou depois ter sido essa uma das mais difíceis de acertar. Reconhecido pelos especialistas como o melhor rock gravado por Elvis em toda a sua carreira, a canção até hoje empolga e não envelheceu nem um minuto. Tão preciso e atual é o seu arranjo que até parece que foi gravada ontem. Música título do terceiro filme estrelado por Elvis que no Brasil recebeu o nome de "O Prisioneiro do Rock", sendo que sua trilha foi lançada em um EP (compacto duplo) em outubro de 1957. Foi ainda lançada como single em setembro de 1957 com "Treat Me Nice" no lado B. O sucesso foi imediato e o single chegou ao primeiro lugar na parada americana. A cena do filme em que Elvis apresenta esta canção é considerado o melhor momento do cantor no cinema. Leiber e Stoller afirmaram posteriormente que sua intenção era "...imitar o som de pedras quebrando" o que de certa forma foi conseguido. Foi gravado em 30 de abril de 1957 nos estúdios Radio Recorders em Hollywood. Assim Elvis ignorou a intenção satírica dos autores (Jerry Leiber e Mike Stoller) e interpretou a canção com fúria. Jailhouse Rock foi o primeiro single da história a ir direto para o topo das paradas no Reino Unido em 1957. Porém a trajetória de sucesso dessa canção imortal continuou. No 70º aniversário de Elvis a música foi mais uma vez relançada em single para comemorar a data. Não deu outra, a música novamente liderou as paradas, 48 anos depois de ter sido gravada! Imortal é isso aí!

TREAT ME NICE (Leiber / Stoller) - Outra canção deliciosa de Leiber e Stoller sendo lançada como lado B de "Jailhouse Rock". Para essa canção Elvis resolveu gravar duas versões: uma no dia 30 de abril durante as gravações do filme e outra no dia 5 de setembro que acabou se tornando a definitiva e oficial. A primeira foi utilizada durante o filme e curiosamente é considerada por muitos como a melhor. Isso se deve principalmente porque o arranjo da primeira versão é bem mais soft e leve do que a da versão original, mais excessivamente produzida. De qualquer forma as duas são ótimas e podem ser conferidas sem nenhum receio. No filme Elvis fez questão de chamar um dos compositores para participar da cena em que ele a apresenta. Lá está Mike Stoller, atrás de Elvis, fazendo figuração como um dos membros da banda do cantor. Aliás é bom frisar que ele também participou das gravações da trilha sonora em estúdio. Outro grande momento da trilha sonora que é reconhecida, de forma merecida aliás, como uma das melhores de Elvis.

YOUNG AND BEAUTIFULL (A. Silver / A. Schroder) - Canção romântica que foi escrita especialmente para Elvis quebrar os corações de suas fãs adolescentes. Primeiro cantor a possuir um vasto conjunto de fãs clubes organizados nos anos 50, Elvis era considerado pelas jovens dos chamados anos dourados como o "namorado ideal", pelos fãs masculinos como um "modelo rebelde a se seguir" e pelas mães dessa moçada como "uma ameaça aos bons costumes". Embora fosse visto durante os anos 50 como um rebelde e delinquente essa imagem seria alterada profundamente em 1958 quando Elvis foi para o exército. A partir desse momento a imagem de Elvis sofreu uma profunda modificação passando a ser considerado um bom moço para até mesmo para as mães. Essa imagem de um Elvis rebelde e transgressor realmente não condizia com a verdade. Talvez por ser polêmico e considerado um sucessor legitimo de James Dean nos anos 50, o cantor era apontado de forma equivocada como o grande incentivador do aumento da delinquência juvenil dos EUA. Um mau elemento, à margem da sociedade. Nada mais longe da verdade. Elvis era apenas um garoto do sul, extremamente ligado em sua família, profundamente religioso e que procurava levar uma vida decente. Obviamente não estava aí para contestar os valores da classe média americana. Era antes de tudo uma pessoa que procurava subir na vida com seu talento.

Claro que papéis como o de Vince Everett do filme "Jailhouse Rock" contribuíram e muito para essa visão, mas tudo não passava de marketing dos estúdios. Elvis se dava bem com todos no set e principalmente com suas estrelas. Para contracenar com Elvis em "Jailhouse Rock" foi contratada a starlet em ascensão Judy Tyler. Logo nasceu uma amizade entre Elvis e ela. Ambos era novatos no cinema e procuravam antes de tudo se consolidar no meio. Mas antes mesmo de se tornar uma estrela de cinema Judy Tyler foi vítima de um destino trágico. Ela morreu logo após as filmagens em um acidente automobilístico. O fato chocou a todos, e em particular Elvis, que lamentou profundamente o passamento de sua colega de trabalho, ainda tão jovem, talentosa e com um futuro tão promissor pela frente. Não tardou muito para que "Jailhouse Rock" entrasse na lista negra de Elvis. Para evitar ficar deprimido Elvis baniu o filme de sua vida e nunca mais o assistiu. Isso inclusive iria acontecer um ano depois com "Loving You". Nesse filme Gladys Presley, mãe do Rei, aparecia em cena batendo palmas em uma das cenas. Depois que sua mãe faleceu Elvis riscou do mapa também seu segundo filme. Não queria recordar Gladys ali ao seu lado, viva e feliz. Freud Explica!

(You're So Square) BABY I DON'T CARE (Leiber / Stoller) - É outra verdadeira pérola da dupla Leiber e Stoller que foram os responsáveis por quase toda a parte musical deste fantástico filme. Um fato curioso ocorreu na sessão de gravação desta música: o baixista Bill Black não conseguiu executar de forma satisfatória a Introdução da música, então Elvis pegou o contrabaixo de Black e tocou a introdução de forma impecável, sendo esta a definitiva e a que aparece no disco. Curiosamente na cena do filme aconteceu uma coisa engraçada: sem se dar conta Scotty Moore acabou comprometendo a continuidade do filme. Nas cenas em que se mostrava Elvis em close, Scotty aparece sem óculos e nas cenas abertas com o cantor focalizado a uma certa distância, Scotty se apresenta com seus óculos pretos! Obviamente as tomadas de perto e de longe foram filmadas em ocasiões diferentes, porém na montagem final em que as duas cenas são unidas surge o erro de continuidade bem nítido. Apesar desse pequeno pecado técnico a cena em si é ótima, com Elvis animado e dançando em seu peculiar estilo.

I WANT TO BE FREE (Leiber / Stoller) - Outra canção composta por Leiber e Stoller. Dessa vez o resultado final fica um pouco abaixo da média. Nada que deponha contra o talento dos autores, mas se formos comparar com o restante da trilha sonora fica claro que o resultado fica abaixo do esperado. Novamente Elvis registrou duas versões na madrugada do dia 30 de abril (aliás, toda a trilha sonora foi praticamente gravada na mesma noite). Uma das versões foi utilizada exclusivamente no filme e a outra, oficial, lançada no EP (compacto duplo). Como sempre o Coronel Parker não deixaria a música ficar restrita à trilha do filme. Obviamente ele iria procurar uma forma de lançá-la novamente para ganhar alguns níqueis extras. E foi assim que "I Want To Be Free" foi relançada no disco "A Date With Elvis". Também no mesmo LP o Coronel ainda encaixaria "Baby I Don't Care" e "Young and Beautifull". Parker mais uma vez dava continuidade ao seu lema de vender a mesma coisa duas vezes!

DON'T LEAVE ME NOW (Schroeder / Weisman) - Novamente?! Essa canção fez parte como "bonus song" da trilha de outro filme de Elvis, "Loving You" (a mulher que eu amo, 1957). Difícil explicar o porquê desta canção ter sido incluída aqui. Inclusive, esta não é a mesma versão do filme anterior. Particularmente prefiro a versão de "Loving You", apesar da ótima introdução de piano desta. Mas enfim, de qualquer forma ela vem para enriquecer ainda mais a ótima trilha deste filme. Um belo final para um inesquecível trabalho de Elvis Presley.

Elvis Presley - Jailhouse Rock (1957): Elvis Presley (vocal, violão e baixo) / Scotty Moore (guitarra) / Bill Black (baixo) / D.J. Fontana (bateria) / Dudley Brooks (piano) / Mike Stoller (piano) / The Jordanaires (vocais) / Arranjado por Steve Sholes e Elvis Presley / Produzido por Steve Sholes / Data de gravação: 30 de abril de 1957, exceto "Treat Me Nice" gravada em 5 de setembro de 1957 / Local de gravação: Radio Recorders, Hollywood / Data de lançamento: setembro de 1957 (single) e outubro de 1957 (Extended Play) / Melhor posição alcançada nas charts: EUA #1 e UK #1 (single) e EUA #1 e UK #18 - (Extended Play).

Texto escrito por PABLO ALUÍSIO - setembro de 2005.

Elvis Presley - Just For You

Poucos dias depois que o compacto duplo "Peace In The Valley" chegou nas lojas americanas a RCA Victor lançou no mercado outro compacto, igualmente duplo, apenas com músicas inéditas gravadas por Elvis Presley. O mercado de fato esperava por um novo single depois do grande sucesso de "All Shook Up", mas isso definitivamente não aconteceu. A razão é que os executivos da gravadora após ouvirem as novas faixas que Elvis havia gravado no Radio Recorders chegaram na conclusão que nenhuma delas tinha força suficiente para estourar nas paradas. Eram boas canções sim, bem gravadas e tudo o mais, porém não tinham vocação para virarem hits na Billboard. Excesso de zelo? Falta de confiança no novo material? Em parte sim. Realmente os engravatados da Victor não estavam errados. Elvis vinha de "All Shook Up", um tremendo sucesso e não seria interessante ver seu novo single ficar para trás nas principais paradas. A decisão então foi reunir quatro das novas músicas para lançamento no mercado em forma de Extended Play (o nome americano para o nosso compacto duplo).

A direção de arte da capa reciclou uma foto que havia sido tirada para fazer parte da capa do segundo álbum do cantor no ano anterior. Elvis inclusive está com a mesma camisa, o mesmo violão e no fundo o mesmo cenário. A única diferença é que ele está usando um casaco vermelho bem chamativo. A contracapa repetia o que era praxe na época: uma mera lista promocional de outros compactos duplos da RCA Victor nas lojas. Estão lá os nomes dos novos disquinhos de Perry Como, Harry Belafonte, Chet Atkins, Eddie Fisher, Glenn Miller, Eddy Arnold, entre outros. Na época isso era considerada mera propaganda, mas hoje em dia esse tipo de informação não deixa de ter um charme extra pois ficamos sabendo quais artistas estavam no mercado fazendo concorrência a Elvis. E foi justamente essa disputa feroz no mercado que fez com que a RCA lançasse esse "Just For You". A trilha sonora de "Loving You" só chegaria aos fãs no meio do ano e para evitar que Elvis ficasse vários meses sem nada de inédito nas lojas a gravadora se apressou em colocar no mercado o disco.

O curioso em "Just For You" é que ele logo se tornaria obsoleto para os colecionadores. Como vinha um novo filme de Elvis por aí nos cinemas, a RCA decidiu reaproveitar todas essas faixas para colocá-las no Lado B do álbum da nova trilha sonora. Os fãs que compraram o compacto logo tiveram que gastar dinheiro novamente com as mesmas músicas que voltavam no LP "Loving You". Era a velha estratégia do Coronel Parker de vender a mesma coisa duas vezes, algo que ele aprendeu muito bem em seus dias de circo. Assim todas as faixas de Just For You acabaram se tornando as primeiras “bonus songs” das trilhas sonoras de Elvis Presley. O que eram "Bônus Songs"? Basicamente eram gravações de Elvis que não faziam parte dos filmes, mas que eram incluídas no álbuns das trilhas para completa-las. Geralmente as trilhas de Elvis tinham de seis a sete canções e eram insuficientes para ocupar todo o espaço de um antigo LP. Dessa maneira as Bônus Songs eram adicionadas, se completando as dez ou doze faixas necessárias. Todos os artistas da época faziam isso e com Elvis não seria diferente.

O carro chefe de Just For You era a boa "I Need You So". Uma balada sentimental que apesar de bem executada nunca conseguiu boa repercussão. Completando o lado A temos o country "Have I Told You Lately That I Love You" cujo destaque é a boa sonorização do grupo vocal The Jordanaires. Por essa época eles já estavam completamente entrosados com Elvis e essa simbiose já surgia perfeitamente nos registros. Já o lado B abria com a deliciosa "Blueberry Hill". Falaremos melhor sobre ela quando formos analisar a trilha de "Loving You", mas de antemão quero dizer que é uma pena que a RCA nunca tenha trabalhado melhor nessa música. Eu a considero excelente. Seu potencial de virar hit na época já havia se esgotado pois ela já tinha feito sucesso na voz de outros cantores, porém mesmo assim merecia melhor destino certamente. "Just For You" fecha com outra boa balada," Is It So Strange", uma bela canção que também nunca encontrou bom espaço dentro da discografia de Elvis. Ela reaparecia anos depois no álbum "A Date With Elvis" quando o cantor estava servindo o exército americano na Alemanha.

Quando chegou no mercado "Just For You" surpreendeu e conseguiu emplacar um ótimo segundo lugar entre os compactos duplos mais vendidos. Isso incentivou a RCA a lançar novos EPs de Elvis nos anos seguintes, disquinhos que só deixariam mesmo de serem lançados por volta de 1966 quando a RCA lançou as últimas trilhas sonoras de Elvis nesse formato. Não se preocupe, ainda falaremos muitos sobre esses charmosos vinis que marcaram a discografia de Elvis Presley. Até lá.

Elvis Presley - Just For You (1957)
I Need you So
Have I Told You Lately That I Love You
Blueberry Hill
Is It So Strange

Elvis Presley – Just For You (1957) / Elvis Presley (voz e violão) / Scotty Moore (guitarra) / Bill Black (baixo) / D.J.Fontana (bateria) / Gordon Stoker (piano) / Dudley Brooks (piano) / Hoyt Hawkins (órgão) / Jordanaires (acompanhamento vocal) / Produzido por Steve Sholes / Arranjado por Elvis Presley e Steve Sholes / Gravado nos estúdios Radio Recorders - Hollywood / Data de Gravação: 18 e 19 de janeiro de 1957 / Data de Lançamento: abril de 1957 / Melhor posição nas charts: #2 (EUA).

Pablo Aluísio.

domingo, 2 de janeiro de 2005

Elvis Presley - Loving You (1957)

Esse foi o segundo filme de Elvis Presley e o primeiro a ganhar um disco no formato LP ou álbum. "Love Me Tender", o filme anterior, teve sua trilha sonora vendida em compacto. Aliás é bom salientar que Elvis foi um dos primeiros artistas jovens a ganhar essa honraria de ter suas músicas lançadas em álbum. Naquela época as gravadoras usavam esse formato mais para o lançamento de música clássica ou óperas. Não era comum um artista pop como Elvis ter discos de longa duração como esse. Geralmente esse tipo de artista tinha seu trabalho lançado apenas em singles, conhecidos no Brasil como compactos.

Não havia músicas suficientes para encher todo um álbum. Então a RCA Victor colocou no lado B do disco várias canções do "Just For You". Para os fãs o lado A era a grande novidade. Só músicas inéditas, todas gravadas para o filme "A Mulher Que Eu Amo" (Loving You, em seu título original em inglês). A boa notícia é que eram boas músicas, excelentes gravações por parte do cantor. A maioria delas foi gravada em Hollywood em janeiro de 1957. Para essas sessões Elvis trouxe sua banda habitual. Nada de músicos contratados pelos estúdios de cinema como havia acontecido em "Love Me Tender". Aqui Elvis fez questão de trabalhar com seus próprios músicos.

"Mean Woman Blues" foi escolhida para abrir o disco. Grande momento tanto do álbum, como do filme, quando Elvis a canta em uma de suas melhores cenas no cinema durante os anos 50. Essa era uma composição de Claude Demetrius, aqui aparecendo pela primeira vez em um disco de Elvis - e ele não se tornaria um compositor habital na discografia de Elvis, apesar de seu grande talento. O ritmo era até um pouco fora dos padrões, unindo a escala musical típica de um blues com a agitação do nascente rock ´n´roll. A mistura, apesar de ser original e muito bem composta, não chegou a agradar todo mundo. Alguns mais tradicionais criticaram, ignorando o fato de que o blues foi um dos gêneros musicais que deram origem ao rock. Enfim, erraram no ponto de vista.

"Blueberry Hill" abriu o lado B do álbum. Essa não fazia parte da trilha sonora de "Loving You" e foi colocada no disco para completar espaço. Isso de um ponto de vista puramente comercial, porque do ponto de vista artístico essa era uma grande canção. Foi composta por um trio (Vincent Rose, Al Lewis e Larry Stock) e virou sucesso na interpretação do ótimo Fats Domino. Seu toque de piano inicial era sua maior característica. Algo inclusive que levou Elvis a tentar tocá-la ao vivo algumas vezes durante os anos 50. Ficou muito bom, na maioria das vezes. Como a música já havia esgotado seu potencial de sucesso com Fats, ela nunca chegou a se tornar um hit na voz de Elvis, mas isso em nada tira seus méritos. É um dos melhores momentos de todo o disco.

Não é surpresa para ninguém que o grande hit desse álbum foi mesmo "(Let Me Be Your) Teddy Bear". A música foi escrita pela dupla Kal Mann e Bernie Lowe. O interessante é que apesar de todo o sucesso alcançado por essa canção, Elvis nunca mais iria gravar nada desses compositores. Ao contrário do que aconteceu com Ben Weisman, por exemplo, eles simplesmente sumiram da discografia de Elvis. O que terá acontecido? De qualquer maneira a música do ursinho Teddy foi mesmo um grande sucesso. Foi lançada em single e atingiu rapidamente a marca das cinco milhões de cópias vendidas.

As fãs da época adoravam a música e entenderam (de forma errada) que Elvis colecionava ursinhos de pelúcia. Na verdade ele jamais havia pensado em algo parecido. As únicas coisas que Elvis colecionava naqueles tempos eram discos e carros. Ele não tinha interesse em brinquedos felpudos para crianças, afinal já era um homem adulto. Apesar disso e de repente Elvis se viu em um mar de bichinhos enviados por correspondência para Graceland. Sem saber direito o que fazer com tantos ursinhos, que encheram um quarto inteiro na sua mansão, o cantor teve a boa ideia de doar todos eles para instituições de caridades que cuidavam de crianças carentes e órfãs. Foi um gesto bonito, mostrando mais uma vez o lado generoso da personalidade de Elvis.

A música título do filme foi a bela balada "Loving You". Escrita pela excelente dupla de compositores formada por Jerry Leiber e Mike Stoller, a faixa era nitidamente uma tentativa de repetir o sucesso de "Love Me Tender" (a música tema do filme anterior). Nunca chegou ao mesmo patamar de popularidade,, mas também não fez feio nas paradas. Muitas versões foram gravadas ao longo de todos esses anos, inclusive pelo cantor brasileiro Roberto Carlos. O curioso é que Elvis precisou de um tempo para se acostumar com sua melodia. Ela tinha um lado melancólico, quase parando, que destoava um pouco do que Elvis estava produzindo naquele ano. Afinal aquele era o Elvis rocker, o Elvis roqueiro, e Loving You, baladona romântica por excelência, exigia uma certa postura que aquele jovem de 22 anos ainda não tinha.

Os compositores Sid Tepper e Roy C. Bennett escreveram a música mais hollywoodiana desse álbum. Estou falando de  "Lonesome Cowboy". Parecia até mesmo uma música bem antiga, dos clássicos faroestes dos anos 1940. Essa dupla iria cair nas graças do Coronel Parker e na década seguinte eles iriam escrever a maioria dos temas musicais de filmes de sucesso de Elvis como "Feitiço Havaiano" (Blue Hawaii) e "Saudades de um Pracinha" (G.I.Blues). Ao lado de Ben Weisman foram os mais assíduos compositores de músicas para filmes de Elvis na década de 1960. De uma forma ou outra o tema, que não chegou a fazer sucesso nas paradas, serviu perfeitamente para o contexto do filme, que mostrava um jovem cantor tentando vencer na carreira, bem no circuito country and western.

"Hot Dog" foi escrita por Jerry Leiber e Mike Stoller. E isso leva muita gente boa a confundir com o clássico "Hound Dog". Músicas com nomes parecidos, de mesmos autores. A confusão seria bem esperada. Só que "Hot Dog" é um rock rápido, escrito especialmente para o filme e que nunca teve maior destaque dentro da carreira de Elvis. "Hound Dog", por outro lado, é um clássico absoluto na voz de Elvis Presley, ainda hoje lembrada e presente em qualquer coletânea do cantor que se preze.

Outro rock rápido, de cura duração, usado para fechar o lado A do vinil original é "Party". No disco de 1957 ela vinha logo após "Hot Dog" dando até mesmo uma impressão no ouvinte de que se tratava de um medley de rocks ligeiros por parte de Elvis. Como ele vivia sua fase mais roqueira, nada mais conveniente do que encher a trilha sonora de músicas desse estilo musical. Essa canção foi escrita por Jessie Mae Robinson. Apesar de ter um forte apelo de palco, ela nunca foi usada por Elvis em seus concertos.

"Got a Lot o' Livin' to Do"foi composta às pressas pela dupla Aaron Schroeder e Ben Weisman para ser gravada por Elvis em janeiro de 1957, Os produtores do filme em Los Angeles ligaram para a dupla, que morava em Nova Iorque, para que eles criassem uma música para uma determinada cena, que iria trazer um dos principais momentos do filme. E assim a canção foi criada. Ficou muito boa, pode até mesmo ser considerado o melhor rock do disco. Também merecem aplausos a própria cena do filme, que ficou muito bem coreografada e fotografada. As fãs de Elvis na época, nem é preciso dizer, adoraram tudo.

Da mesma dupla de compositores, Aaron Schroeder e Ben Weisman, veio outra canção que foi aproveitada no Lado B do antigo vinil. Se trata da boa "Don't Leave Me Now". Essa canção tem uma boa pegada melódica, que inclusive me lembra de blues mais tradicionais. Gravada em fevereiro de 1957 ela nunca teve maior destaque dentro da discografia de Elvis, o que sempre achei uma pena. É uma canção subestimada, com ótimo acompanhamento de piano. A letra é bonitinha, tem um senso romântico bem típico dos adolescentes e poderia ter sido escrito por um colegial apaixonado em seu caderno escolar. Leia os versos: "Não me deixe agora / Agora que eu preciso de você / Quão triste e solitário eu ficaria / Se você disesse que terminamos / Não despedace meu coração / Este coração que te ama / Elas serão nada para mim / Se você me deixasse agora".

Um dos aspectos que a discografia de Elvis Presley de uma maneira em geral deixou a desejar foi a ausência de músicas compostas pelos maiores compositores da história da música dos Estados Unidos. Elvis, como grande astro, poderia ter gravado discos e discos apenas com a fina flor da canção americana. Apenas com os mais consagrados autores de todos os tempos. Porém, infelizmente, só esporadicamente esse encontro entre o talentoso cantor e esses gênios da criação musical aconteceu.

Um desses raros encontros podemos encontrar aqui no álbum "Loving You". Se trata de "True Love", composta pelo grande Cole Porter, considerado por muitos historiadores de arte como um dos maiores gênios da música mundial. Porter foi aclamado desde cedo em sua carreira. Ao longo de sua vida compôs verdadeiras preciosidades em forma de notas musicais. Elvis poderia ter gravado muitas canções de Cole Porter ao longo da vida, mas isso infelizmente não aconteceu. Seus direitos autorais eram considerados caros demais pelo Coronel Parker. Além disso havia essa mentalidade de que Porter estava fora do espectro do que se esperava encontrar em um disco de Elvis Presley. Era algo mais alinhado com os álbuns de Frank Sinatra, para alguns. Um erro de percepção em minha opinião.

Outra boa aquisição ao álbum em termos de qualidade musical foi essa criação de Ivory Joe Hunter chamada "I Need You So". Aqui havia um toque de gosto pessoal do próprio Elvis. Quem conhece o material gravado de forma amadora na Alemanha, quando Elvis estava por lá servindo o exército, sabe bem que as músicas de Ivory Joe Hunter estavam sempre sendo tocadas por Elvis ao piano em sua casa. Ele gostava muito desse compositor, isso na sua esfera pessoal mesmo, de seu próprio gosto musical. Curiosamente, por anos e anos, Elvis não voltaria a gravar nada dele, só voltando a trazer para seus discos canções de Hunter já nos anos 70, quando já havia se transformado em um artista completamente diferente do começo de sua carreira.

Da dupla de compositores Johnny Russell e Scott Wiseman, o disco traz a boa "Have I Told You Lately That I Love You?". É uma boa canção country and western. Por essa época Elvis ainda surgia com esse tipo de música em seus discos. Depois de um tempo ele iria direcionar seu repertório para um material mais pop, principalmente na era dos filmes em Hollywood. De vez em quando algo country seria gravado, mas em menor escala. As trilhas sonoras exigiam um outro tipo de seleção musical. Em relação ao country Elvis só voltaria a gravar muito material dessa linha nos anos 70, quando aí sim virou um artista tipicamente saído da geração de artistas de Nashville.

Pablo Aluísio.