segunda-feira, 21 de setembro de 2020

Inimigos à Força

Esse foi o último western da carreira do ator Rock Hudson. Seu filme anterior no gênero, “Jamais Foram Vencidos” com John Wayne, fez bonito nas bilheterias assim Hudson acabou voltando para uma despedida final. Aqui ele contracena com o também veterano das telas Dean Martin. O ex-parceiro de Jerry Lewis interpreta Billy Massey, um rancheiro arruinado financeiramente que participa de um roubo ousado. Disfarçado de xerife, ele rende os passageiros de um trem enquanto seus comparsas roubam todos os viajantes e o cofre da locomotiva. Após o crime foge para as montanhas. Em seu encalço vai o verdadeiro xerife da região, Chuck Jarvis (Rock Hudson), que promete aos cidadãos da cidade que vai capturar e levar para a prisão o fora-da-lei. O problema surge após a descoberta da verdadeira identidade do criminoso, pois esse cresceu ao seu lado, foram amigos de infância e tudo acaba se tornando muito doloroso pois ele no fundo não deseja causar qualquer mal ao seu antigo amigo do passado. Surge assim um conflito interno no xerife, pois ao mesmo tempo em que ele precisa fazer cumprir a lei, ele também não quer causar qualquer mal ou dano ao fugitivo.

“Inimigos a Força” também foi um dos últimos trabalhos de Rock Hudson no cinema. Em 1973 ele já havia acumulado vários filmes que não foram bem sucedidos nas bilheterias. Ele deixou de ser um nome viável para grandes produções. Com vasto bigode, visual que iria adotar nos anos seguintes, Rock ainda tentava mostrar força no mundo do cinema, mas pelo visto não deu muito certo pois em pouco tempo ele estrearia na TV com a série “McMillian e Esposa”. O mesmo se pode dizer de seu colega em cena, Dean Martin, que surge já bastante debilitado pelos anos e anos de alcoolismo. O mundo do cinema já não parecia o lugar ideal para a dupla veterana. Assim como Hudson, Dean Martin também iria para a TV, onde apresentaria seu próprio programa de variedades.

De qualquer forma, mesmo se despedindo do cinema, essa dupla de atores conseguiu manter o pique da estória, principalmente nas melhores cenas do filme. Entre elas destaco o desfecho do filme, todo passado em uma floresta incendiada. Já nas cenas mais dramáticas, Dean Martin deixava um pouco a desejar. Numa cena em especial, ao lado da atriz Susan Clark, fica bem nítido seu problema com bebidas. Embora o personagem não esteja bêbado, a voz pastosa e sem firmeza de Martin dá a entender ao espectador que ele fez a cena completamente embriagado. Após um corte, ele já surge bem melhor, mostrando que o diretor provavelmente interrompeu as filmagens para o ator se recuperasse do porre! Mesmo com esse pequenos “desvios”, vamos dizer assim, “Inimigos à Força” é um bom faroeste da década de 1970. Nada brilhante, nada marcante demais, mas eficiente dentro de sua proposta na época em que o filme chegou nos cinemas.

Inimigos à Força (Showdown, Estados Unidos, 1973) Direção: George Seaton / Roteiro: Theodore Taylor, Hank Fine / Elenco: Rock Hudson, Dean Martin, Susan Clark / Sinopse: Após longos anos, dois amigos de infância se reencontram em lados opostos da lei. Um deles se torna um foragido perigoso após roubar um trem e o outro se torna um xerife disposto a tudo para cumprir a lei.

Pablo Aluísio. 

domingo, 20 de setembro de 2020

Harper, O Caçador de Aventuras

“Harper, o Caçador de Aventuras” é um filme da década de 60 com o sabor das antigas produções dos anos 40. O enredo é recheado de mulheres fatais, personagens dúbios, complexos e tramas praticamente indecifráveis. Como sempre acontecia naqueles antigos filmes o começo é relativamente simples mas conforme vai avançando a estória e as questões vão se revelando tudo começa a se tornar mais complicado. Seguir o fio da meada sem se perder é um desafio para os espectadores. Aqui Paul Newman interpreta um detetive particular cínico que é contratado pela esposa de um milionário desaparecido para encontrá-lo. Como sempre acontecia nos antigos roteiros da década de 40 aqui também temos muitas reviravoltas, muitas surpresas. Nenhum personagem é totalmente bom ou mal. Todos têm algo a esconder e a solução final desvenda todos os mistérios, não sem antes deixar muitas pistas falsas pelo caminho. O personagem Harper veio da literatura. Baseado no livro de “The Moving Target” do autor Ross Macdonald seu nome foi alterado para o filme por razões comerciais. De certa forma foi a solução encontrada pelo estúdio Warner para escalar seu astro Paul Newman em um filme que apesar de ser inspirado nos antigas produções noir bebia também da fonte da imensa popularidade da franquia James Bond.

Paul Newman está muito à vontade no papel de Harper. Mascando um chiclete atrás do outro ele se mostra bem cool e parece se divertir no papel. O bom resultado comercial do filme garantiria a ele um retorno ao mesmo personagem em “A Piscina Mortal” alguns anos depois. O elenco de apoio é todo bom. Lauren Bacall que interpreta a esposa do milionário desaparecido está especialmente cínica e mordaz. Viúva do mito Humphrey Bogart ela já tinha muita experiência nesse tipo de papel fatal. A personificação que me causou mais surpresa porém foi a da atriz Shelley Winters. Antigo sex symbol da década de 40 e 50 ela aqui se despe de sua vaidade para surgir como uma atriz decadente e deprimida, cujos tempos de fama há muito foram deixados para trás. Frustrada e sem esperança ela apenas existe, tentando viver um dia de cada vez. Winters está maravilhosa em sua atuação, muito marcante, digna de aplausos. Enfim, “Harper, o Caçador de Aventuras” é bem interessante e bem desenvolvido. É um tipo de filme onde a ação é mais intelectual (fica-se o tempo todo tentando descobrir o paradeiro do desaparecido) mas que vale a pena assistir, principalmente para quem gosta de desvendar charadas nesse tipo de roteiro.

Harper, O Caçador de Aventuras (Harper, Estados Unidos, 1966) Direção: Jack Smight / Roteiro: William Goldman baseado no livro de Ross Macdonald / Elenco: Paul Newman, Lauren Bacall, Julie Harris, Janet Leigh,  Robert Wagner,  Shelley Winters / Sinopse: Harper (Paul Newman) é um detetive contratado por uma mulher (Lauren Bacall) para encontrar seu marido desaparecido. O que parece ser algo simples acaba se revelando uma trama complexa e de difícil solução.

Pablo Aluísio. 

O Invencível

Kirk Douglas teve uma das filmografia mais longas e produtivas da história de Hollywood. São 92 filmes, onde o ator ao longo de cinco décadas de carreira, mostrou todo o seu talento, indo do drama à comédia, dos filmes de guerra aos filmes de western. Tudo realizado com grande talento e empenho profissional. Um de seus grandes filmes foi esse "O Invencível" de 1949, onde chegou inclusive a ser indicado ao Oscar de melhor ator. Muitos na época acreditavam que Kirk Douglas era o favorito ao prêmio, mas como em termos de Academia tudo pode acontecer, ele não levou a estatueta para casa. Claro, foi decepcionante para ele que apareceu na festa bem animado, mas não deu, Kirk não se tornou o escolhido daquela noite. Nesse filme Kirk Douglas interpretou um esportista conhecido como Midge, um sujeito de origem humilde que começa a subir na carreira de lutador de boxe. Conforme cresce e se torna uma figura importante no mundo esportivo, ele começa a esquecer todos aqueles que lhe ajudaram nessa longa caminhada. Abandona a mulher que fez tudo por ele e começa a ignorar parentes e amigos dos duros anos da pobreza. Como se vê é um personagem complicado de se interpretar, uma vez que na verdade se trata de um sujeito de caráter duvidoso, que acaba se deslumbrando com a sua própria fama e sucesso.

Para muitos especialistas na biografia de Kirk Douglas esse foi um dos filmes definitivos de sua carreira, pois o alçou para o estrelado. Não é para menos pois Kirk está completamente à vontade no papel do inescrupuloso Midge, uma pessoa que fica embriagada com seu próprio êxito nos ringues. O filme tem um clima noir dos mais marcantes, com belo uso da fotografia preto e branco, obviamente inspirado no cinema alemão da época. As cenas de lutas são extremamente bem editadas, o que valeu o Oscar de melhor montagem para o filme naquele ano. Até porque uma luta de boxe no cinema exigia emoção e nada melhor do que uma boa edição para realçar ainda mais esse aspecto.  

A atriz Marilyn Maxwell (grande amiga pessoal de outro astro da época, Rock Hudson) está perfeita no papel de Grace. Curiosamente o filme teria problemas anos depois no auge da chamada "Caça às Bruxas" pois o roteiro foi considerado o símbolo perfeito do sentimento subversivo que havia sido acusado o cinema americano daqueles anos. O roteirista Carl Foreman acabou sendo acusado de ser comunista e entrou para a lista negra. Bobagem paranoica, tipicamente da mentalidade débil mental do Macarthismo. Deixe tudo isso de lado, "O Invencível" é um perfeito retrato das mudanças de um homem que não conseguiu mais separar seu sucesso profissional de sua vida pessoal. Não se trata de uma ode à ideologia socialista. Assim fica a recomendação para os fãs do cinema noir da década de 1940, pois "Champion" é sem dúvida uma grande obra cinematográfica daquele período histórico do cinema americano.

O Invencível (Champion, Estados Unidos, 1949) Direção: Mark Robson / Roteiro: Carl Foreman, Ring Lardner / Elenco: Kirk Douglas, Marilyn Maxwell, Arthur Kennedy / Sinopse: Boxeador (Douglas) começa a colecionar vitórias nos ringues ao mesmo tempo em que começa a esquecer todos aqueles que o ajudaram a subir na carreira. O destino porém lhe reservará uma grande lição de vida. Filme vencedor do Oscar nas categorias de melhor edição (Harry Gerstad). Também indicado nas categorias de melhor ator (Kirk Douglas), melhor ator coadjuvante (Arthur Kennedy), melhor roteiro (Carl Foreman), melhor direção de fotografia em preto e branco (Franz Planer) e melhor música (Dimitri Tiomkin). Filme vencedor do Globo de Ouro na categoria de melhor direção de fotografia em preto e branco (Franz Planer).

Pablo Aluísio.

sábado, 19 de setembro de 2020

Médica, Bonita e Solteira

Depois do sucesso dos filmes estrelados por Rock Hudson e Doris Day, as produções românticas do cinema americano nunca mais foram as mesmas. Que o diga esse simpático "Médica, Bonita e Solteira" que tentava seguir pelo mesmo caminho. E o que exatamente esses filmes tinham de diferente? Na década de 1950 os filmes sobre relacionamentos eram extremamente românticos, melosos, puxando para o melodramático. Uma ingenuidade só! Já na década de 1960 eles se tornaram bem mais picantes, cínicos e bem humorados. A nova posição da mulher dentro da sociedade já não comportava aquela heroína bobinha dos antigos filmes, onde a mulher geralmente ficava sonhando acordada com o aparecimento do príncipe encantando com sua armadura reluzente e brilhante. Aqui temos um exemplo de personagem feminino que já era independente e não precisava de um casamento para se firmar dentro da sociedade. 

A protagonista desse filme se chamava Helen Brown (Natalie Wood), uma mulher independente, bem sucedida, que não precisa de um relacionamento com um homem para se tornar feliz. Em vista disso ela resolve escrever um livro contando sua forma de entender a nova realidade feminina de seu tempo. O livro se torna um grande sucesso de vendas, o que desperta a curiosidade do jornalista Bob Weston (Tony Curtis), que deseja descobrir todos os mais íntimos segredos por trás da imagem da autora do livro. Já deu para perceber que apesar das intenções nada louváveis de Bob ele vai acabar se apaixonando por Helen, pois afinal ela evita de todas as formas se tornar mais uma presa na enorme lista de conquistas do charmoso jornalista. A Warner investiu pesado nesse filme, até porque tinha a intenção de ganhar esse rico nicho de mercado das comédias românticas mais ousadas da década de 1960. Para isso não mediu esforços, colocando como meros coadjuvantes grandes nomes de Hollywood como por exemplo  Henry Fonda e Lauren Bacall. O filme é divertido, não há como negar, mas também fica muito longe de repetir os bons roteiros da dupla Hudson / Day. 

Apesar do carisma dos atores Tony Curtis e Natalie Wood, o filme não conseguiu cumprir todas as expectativas simplesmente porque em 1964 ele já foi considerado sem novidades,  já que o assunto já tinha sido exaurido nos filmes da Universal com Doris Day e Rock Hudson. De qualquer maneira vale ser redescoberto. Que o diga os produtores em Hollywood que se inspiraram nele para realizar "Abaixo o Amor" com Renée Zellweger e Ewan McGregor, uma homenagem bem humorada a esses antigos filmes. Assista aos dois filmes e compare. No mínimo você terá uma boa diversão.  

Médica, Bonita e Solteira (Sex and the Single Girl, Estados Unidos, 1964) Direção: Richard Quine / Roteiro: Helen Gurley Brown, Joseph Heller / Elenco: Tony Curtis, Natalie Wood, Henry Fonda, Lauren Bacall / Sinopse: Jornalista decide descobrir todos os segredos de uma bem sucedida autora feminista. Ela resolve escrever um livro sobre relacionamentos, trazendo a visão da mulher moderna, que não precisa mais de um marido para se firmar dentro da sociedade ou ser feliz em sua vida pessoal.

Pablo Aluísio.

O Marujo Foi Na Onda

Jerry Lewis começou a carreira se apresentando em pequenas espeluncas de Nova Iorque em troca de alguns trocados e só viu sua sorte mudar quando se uniu a um cantor desconhecido que também estava tentando abrir as portas do sucesso. Era Dean Martin. Eles criaram então um número perfeito. Um cantor galã que tentava se apresentar com todo o glamour e romantismo possível enquanto era atrapalhado por um pateta que fazia as maiores confusões. Esse novo show lhes trouxe mais público, melhores lugares para se apresentar e finalmente lhes abriram as portas do mundo do cinema. Foi o produtor Hall B. Wallis que deu as melhores oportunidades para a dupla Martin / Lewis na Paramount. Esse produtor tinha uma visão incrível pois ele sabia que o que fazia sucesso nos palcos poderia também muito bem fazer sucesso nas telas de cinema. Assim ele conseguiria ótimas bilheterias com a dupla e repetiria a dose anos depois ao acreditar em um jovem roqueiro que estava fazendo muito sucesso com seus shows ao vivo! O nome dele? Elvis Presley.

Pois bem, mas voltamos a Lewis e Martin. Esse “O Marujo foi na Onda” foi um dos primeiros filmes da dupla na Paramount. Rodado ainda em preto e branco a película seguia por uma fórmula que se tornaria sucesso absoluto de bilheteria nos anos que viriam. O roteiro é de certa forma uma repetição do que havia sido usado com muito sucesso em “O Palhaço do Batalhão” onde Jerry Lewis ia para o exército dando origem a muitas confusões. Aqui se trocou o exército pela marinha e repetiu-se o que havia dado tão certo antes, ou seja, muitas cenas divertidas, intercaladas com momentos musicais românticos a cargo de Dean Martin, que apresentava suas músicas entre uma palhaçada e outra de Lewis. O filme tem aquele clima bem leve, descontraído, que tentava agradar ao público que ia ao cinema apenas em busca de uma diversão bem humorada e descompromissada. 

Por fim um aspecto muito curioso sobre “O Marujo Foi na Onda”: nesse filme, no meio de tantos figurantes anônimos, surge um que se tornaria um dos maiores mitos da história do cinema alguns anos depois, o ator James Dean. Ela faz uma pequena ponta não creditada na cena da luta de boxe de Jerry Lewis. Ele era então apenas um jovem tentando a sorte em Hollywood e deu graças a Deus quando ganhou esse pequeno e quase imperceptível papel. Curiosamente anos depois Dean confessaria que no dia das filmagens havia tomado um milk shake estragado e que por isso quase vomitou em cima de Jerry Lewis. Uma pena não ter acontecido pois se encaixaria perfeitamente no enredo maluco do filme!  

O Marujo Foi Na Onda (Sailor Beware, Estados Unidos, 1952) Direção: Hal Walker / Roteiro: James B. Allardice, Martin Rackin / Elenco: Dean Martin, Jerry Lewis, Corinne Calvet, James Dean (não creditado) / Sinopse: Melvin (Jerry Lewis) e Al (Dean Martin) acabam entrando na marinha americana, sendo enviados para os mares do sul, o que dará origem a várias confusões.

Pablo Aluísio.

sexta-feira, 18 de setembro de 2020

São Francisco de Assis

"Vês a minha Igreja, Francisco? Está em ruínas! Vá e a reconstrói" - foram essas as palavras que Giovanni di Pietro di Bernardone (1182 - 1226) teria ouvido em uma de suas visões. Jovem, filho de um rico comerciante de Assis, que até aquele momento levava uma vida mundana, Francisco (um nome carinhoso dado a ele por sua própria família por causa de sua admiração pela cultura francesa) resolveu abandonar tudo, riqueza, dinheiro e poder para se dedicar a uma missão que marcaria não apenas sua própria vida, mas a do mundo em geral. Hoje ele é conhecido como São Francisco de Assis, um dos mais populares santos da rica tradição da Igreja Católica, mas naqueles tempos obscuros ele era apenas um jovem que resolveu seguir à risca o exemplo de Jesus Cristo. Adotou a pobreza, a caridade e a castidade como ideais de vida e resolveu transformar sua própria vida em uma demonstração viva do próprio evangelho. Sua pequena ordem foi considerada revolucionária em todos os aspectos. Enquanto os monges da época se enclausuravam em mosteiros de díficil acesso, alienados do mundo, Francisco e seus seguidores adotaram a pregação peregrina, indo a cidades e vilas distantes, levando a palavra e os ensinamentos de Jesus a todos, vivendo da caridade, sem ter qualquer bem material. Também foi pioneiro no carinho pelos animais e demais criaturas terrenas. A pequena ordem que fundou, os Franciscanos, até hoje é um das mais importantes ordens religiosas do mundo. Sua mensagem de paz e simplicidade tocou fundo o coração dos homens e Francisco é nos dias atuais tão importante e atual quanto era no século XIII.

De fato é impossível relatar uma vida tão rica em apenas um filme. Por isso esse "São Francisco de Assis", deve ser analisado com extrema cautela. É de se louvar o esforço do excelente diretor Michael Curtiz (o mesmo de "Casablanca") em dirigir esse épico religioso dessa magnitude no final de sua vida. Foi o último filme inteiramente dirigido por ele (já que no seguinte seu trabalho foi concluído por John Wayne, por causa de seu precário estado de saúde). Não há como negar que o resultado ficou muito bonito e principalmente respeitoso com o eterno legado de Francisco. Michael Curtiz merece todo o reconhecimento por mais um filme muito bom.

Mesmo assim não se poder negar que trechos importantes da vida do santo também foram ignorados ou mudados para se adequar melhor no pequeno espaço de tempo disponível. É um problema sem solução. Como escrevi, é simplesmente impossível captar uma alma tão grandiosa como a desse homem apenas em uma produção. Mas a despeito disso certamente a película merece aplausos. Em termos de elenco eu destaco a participação da atriz Dolores Hart que interpretou Santa Clara. Ao que tudo indica ela foi iluminada pelo doce exemplo de vida de Francisco e abandonou uma carreira promissora em Hollywood para se tornar freira beneditina algum tempo depois. Um exemplo maravilhoso em que a vida imita a arte. No saldo geral "São Francisco de Assis" é um belo épico que se não é completo ou definitivo, pelo menos abre as portas para quem sentir curiosidade em conhecer a fundo a história desse Francesco medieval que ainda hoje inspira milhares de pessoas mundo afora.

São Francisco de Assis (Francis of Assisi, Estados Unidos, 1961) Estúdio: Twentieth Century Fox / Direção: Michael Curtiz / Roteiro: Eugene Vale, baseado na obra de Ludwig von Wohl / Elenco: Bradford Dillman, Dolores Hart, Stuart Whitman, Cecil Kellaway, Finlay Currie / Sinopse: Cinebiografia de São Francisco de Assis, santo católico que nascido em família rica e influente, resolveu abandonar todos os bens materiais para cuidar dos pobres e desamparados. Levando uma vida simples, de extrema pobreza e devoção ao cristianismo acabou fundando uma das maiores ordens religiosas da história, a dos Franciscanos.

Pablo Aluísio.

A Floresta Maldita

Jim Fallon (Kirk Douglas) é um madeireiro astuto e falastrão que após ter vários problemas na costa leste resolve ir até as fronteiras do oeste selvagem em busca de novas florestas para devastar e fazer fortuna. Chegando na Califórnia ele encontra uma rica reserva natural, mas encontra obstáculos para colocar as mãos em toda a matéria prima pois a terra é disputada por madeireiros rivais e um grupo religioso que pretende preservar as milenares árvores do local. Se fazendo passar por um rico milionário que quer apenas preservar a rica floresta ele acaba conseguindo finalmente a posse da mata. Depois ele terá que escolher entre explorar comercialmente a madeira do local ou ouvir sua consciência deixando intacta a floresta e suas árvores suntuosas e majestosas. Esse “A Floresta Maldita” tem um roteiro ecológico, e isso muitas décadas antes da ecologia virar moda. Claro que a consciência de se preservar as florestas não tem a mesma abrangência do que atualmente se vê, mas mesmo assim o roteiro tenta de todas as formas mostrar que também é importante preservar a riqueza natural por sua importância para as futuras gerações. Afinal, se toda aquela floresta for derrubada, não haverá mais nada a se explorar ou ver nos anos futuros.

Embora seja um filme muito bem intencionado nesse aspecto, “A Floresta Maldita” também apresenta problemas. Em vários momentos a estória se torna truncada e mal desenvolvida, há um excesso de detalhes jurídicos envolvendo a trama que só a torna cansativa e arrastada. O roteiro perde muito potencial discutindo quem seria o verdadeiro possuidor da floresta e quem teria o direito de explorar toda aquela madeira. O personagem de Kirk Douglas, por exemplo, passa quase todo o tempo tentando driblar a lei, forjando documentos falsos ou então elaborando novas fraudes para tomar conta de tudo. Isso acaba deixando o ritmo um pouco arrastado e repetitivo.

As coisas de fato só melhoram mesmo quando o filme finalmente vai se aproximando de seu final. A questão jurídica é deixada de lado para apostar em boas cenas de ação. Na melhor delas o personagem de Kirk Douglas, tal como um Indiana Jones do faroeste, pula em cima de um trem em movimento que caminha para o abismo. Sua intenção é salvar a mocinha, separar o vagão onde ela está do restante da locomotiva e parar o mesmo, antes que atravesse uma ponte de madeira sabotada!  Ufa! Cenas como essas literalmente salvam o filme da primeira parte mais arrastada. No saldo final poderia realmente ser bem melhor, mas do jeito que está, até que diverte, apesar de alguns erros. Fica então a recomendação para os cinéfilos fãs do bom e velho Kirk Douglas. 

A Floresta Maldita (The Big Trees, Estados Unidos, 1952) Direção: Felix E. Feist / Roteiro: John Twist, James R. Webb / Elenco: Kirk Douglas, Eve Miller, Patrice Wymore / Sinopse: Inescrupuloso e ganancioso madeireiro vai até a Califórnia com o objetivo de devastar uma rica floresta local. A tarefa porém não será nada fácil pois ele terá que enfrentar um grupo religioso que luta pela preservação da natureza e comerciantes de madeira rivais.

Pablo Aluísio.

quinta-feira, 17 de setembro de 2020

A Corrida do Século

Divertida comédia assinada por Blake Edwards. Considero esse cineasta um dos mais subestimados diretores de humor da história do cinema. A crítica sempre torceu o nariz para seus filmes e ele nunca conseguiu reconhecimento para seu ótimo timing humorístico. Aqui Edwards volta ao inicio do século XX para contar a história de uma verdadeira corrida maluca, atravessando três continentes. Entre os competidores temos todos os tipos de aviadores e pilotos. Há desde galãs engomadinhos a trapaceiros vilanescos, passando por princesas delicadas que também querem provar que as mulheres podem fazer tudo o que os homens fazem. O diretor Blake Edwards imprimiu ao filme um tom cartunesco, de desenho animado mesmo, trazendo um claro sabor nostálgico a quem assiste ao filme nos dias atuais. A ideia inclusive daria origem a uma série de desenhos famosos na TV chamado justamente de “A Corrida Maluca” – quem lembra do famoso Dick Vigarista? Pois é, nada mais é do que uma adaptação animada dos mesmos personagens que vemos aqui.

O elenco de “A Corrida do Século” é outro ponto positivo a começar pela presença do sempre carismático Tony Curtis. Impagável a cena em que ele, cheio de bons modos, participa de uma verdadeira guerra de tortas na cara! Essa cena resume muito bem o clima que Blake Edwards quis dar ao filme em si, tudo muito escrachado, pastelão mesmo, sem vergonha de abraçar esse estilo de humor mais popularesco. Jack Lemmon e Natalie Wood completam o excelente time de atores. Natalie Wood interpreta uma espécie de Penélope Charmosa (quem lembra da personagem dos desenhos da Hanna-Barbera?). Já Lemmon está perfeitamente à vontade em sua caracterização que aliás nos passa a sensação de que ele na verdade está se divertindo como nunca, mais do que o próprio espectador.

Outro aspecto digno de nota desse “A Corrida do Século” é a sua direção de arte. Com visual nitidamente calcado na moda da década de 1960 (apesar da estória se passar na década de 1920) o filme traz um sabor nostálgico à prova de falhas. Tudo muito colorido e deliciosamente fake. Assim na pior das hipóteses o espectador ficará com um belo sorriso nos lábios. Se nunca assistiu não deixe de ver. “A Corrida do Século” pode não ser nenhuma comédia sofisticada ou inteligente, mas diverte bastante caso o espectador consiga entrar em seu clima envolvente. Diversão garantida.
 
A Corrida do Século (The Great Race, Estados Unidos, 1965) Direção: Blake Edwards / Roteiro: Arthur A. Ross, Blake Edwards / Elenco: Jack Lemmon, Tony Curtis, Natalie Wood, Peter Falk, Arthur O'Connell / Sinopse: No começo do século XX um grupo de pilotos entra em uma corrida internacional através de três continentes ao redor do mundo. Quem vai vencer a disputa? Filme vencedor do Oscar na categoria de melhores efeitos sonoros (Treg Brown).

Pablo Aluísio.