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quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

Constance - O Livro de Sangue

Vingança
Entrou pela cozinha. A velha não o viu. Ele tinha contas a acertar. Aquela velha no passado quis matá-lo. Depois ficou anos e anos procurando destruir sua reputação, publicando em jornais frases de deboche e escárnio, o ofendendo através de piadas psicóticas. Ela tinha personalidade retardada, era infantilóide e embora estivesse com 80 anos parecia ainda uma víbora adolescente. Também era uma das madames mais ricas de Paris! 

Agora havia chegado a hora de dizer basta. O Lord Constance, vampiro fino e elegante, queria descontar tudo o que havia passado. Chegou por trás da velha que, ouvindo mal, não o viu chegar. Ele a pegou pelos cabelos. Estavam na cozinha da casa. Pegou ela pelos cabelos e buum... a bateu com força na quina da pia dura de pedra da cozinha. A pancada foi forte e certeira. Ela perdeu imediatamente os sentidos. 

O Lord vampiro percebeu que ela não tinha mais consciência. Só para se assegurar que aquele ser não iria voltar a pegou novamente pela cabeça e deu uma, duas, três, fortes pancadas com sua cabeça no chão. O crânio fez barulho de ter trincado. O Lord então pegou um machado, o levantou e zumm... cortou a cabeça da velha fora! A cabeça rolou e rolou... Foi parar perto de uma poça de água...

Não iria beber seu sangue. Não queria beber o sangue daquela nobre de quinta categoria. Mulher rica de Paris, mas de baixos instintos. Ela tinha o que merecia. Era uma megera, uma insana, uma psicótica com ares de perversidade. De personalidade tóxica até o último fio de cabelo. Sua vida se esvaira. Estava morta. Constance nem perdeu tempo. Deu um chute feroz em sua cabeça decepada que estourou na parede da cozinha. O sangue cobriu tudo. Ele olhou uma última vez para aquilo. Estava satisfeito. Ela agora jazia nas profundezas do inferno. 

Acendeu um último cigarrete, olhou para o luar e saiu pela janela, para nunca mais voltar naquela casa...

O Amor Que Não Ousa Dizer Seu Nome...
Constance era um vampiro violento. Em sua vida humana ele teria sido um lord inglês, um daqueles senhores, dono de várias propriedades, entre elas uma bela mansão no bucólico interior britânico. O diferencial era que ele na realidade era um homem interessante, muito concentrado em suas pequenas e grandes obsessões. A maior delas seria a arqueologia. Constance tinha uma das melhores coleções de artefatos antigos da Inglaterra Vitoriana. E para alcançar as peças que desejava ele não media esforços. Comprava peças antigas a preços absurdos. Depois as levava para sua biblioteca particular que mais parecia um museu de história natural. 

Não se sabe ao certo como Constance se tornou um Lord Vampiro. Provavelmente caiu nas garras de algum vampiro disfarçado de homem comum. Constance era homossexual como muitos de seus conhecidos, desde os tempos em que frequentou as melhores escolas da terra de vossa Majestade. Então quando ficou adulto ele foi seduzido a ir até um covil de homossexuais. Era uma atividade clandestina, que poderia inclusive dar prisão. Por essa razão havia toda uma cultura de subterrâneo sobre o mundo homossexual e Constance viveu muito nesses redutos durante sua juventude. Numa dessas ocasiões acabou virando uma presa fácil. Caiu na armadilha. Foi mordido. Virou uma criatura da noite. 

Agora estava seguindo sua existência como ser da noite em plenos anos 1980. Parecia ser um tempo com mais tolerância e os homossexuais finalmente encontravam sua voz. Só que Constance também viu a chegada de uma nova doença, a AIDS, que vitimou muitos de seus amigos homossexuais. foi um choque sem dúvida, mas ele particularmente passou sem sofrer nada. Afinal ele sequer estava vivo. 

Depois de muitas décadas Constance decidiu se mudar para Berlim, na Alemanha. Ele havia ficado maravilhado com o clima cultural da grande cidade alemã. Havia muitas oportunidades por ali, até porque em uma cidade cheia de punks sempre haveria possibilidade de carne moída e sangue fresco grátis. Os policiais não estavam nem aí se os punks fossem encontrados mortos. Os tiras odiavam os punks, aos quais chamavam de vagabundos. Sempre que o corpo de um punk era encontrado o chefe de polícia perguntava se outro vagabundo havia morrido. 

Só que não era apenas essa a atração de Constance em Berlim. Ele havia lido um livro muito interessante de um historiador francês que trazia supostas cartas escritas por um vampiro antigo chamado Maximilian. Era por demais interessante. A crítica literária viu o livro como lorota, apesar do historiador ter dito várias vezes que eram cartas verdadeiras. Constance acreditou nas cartas do Vampiro de Versalhes. E ele estava especialmente interessado no Livro de Sangue citado nesses velhos escritos. Estava decidido a encontrar o tal artefato raro para levar para sua coleção particular na Inglaterra. 

E ele não iria medir esforços nesse sentido...

Lascívia e Sangue
O vampiro Constance chegou em Berlim em plena madrugada. Chuva fina lá fora. Ainda assim foi para o Palácio do amigo Hanz onde uma festa decadente se desenrolava. Logo na entrada foi recebido por Jessica, linda dama da noite. Pele branca, grandes seios de granito, corpo altamente proporcional. Uma verdadeira estátua grega. Os olhos fixados e as mãos trazendo uma linda taça de sangue fresco. Constance sentiu-se em casa com toda aquela decadência. 

Pelos corredores lindas virgens eram servidas aos convidados. Só havia uma regra: beba o sangue que quiserem, mas preservem a vida das donzelas. Ninguém quer problemas com os policiais da cidade. Beba a jugular e preserve as garotas para quem sabe mais uma noite de prazer. 

Para Constance aquele era um alívio que ele sentia. Nas últimas semanas sabia que o Anjo da Morte andava em seu clã. Parentes mortos e alguns na fila para visitar o Hades, o abismo sem fim, Hanz sabia de tudo e queria ser um bom anfitrião para Constance. Só não queria ser perturbado por velhas lendas medievais. Ele já vivera o suficiente para não acreditar mais nesse tipo de coisa. Estava cansado de tudo isso. 

Então convidou Constance para ir para o leito ao lado da suculenta Jessica James. E ele o fez. Queria ter relações sexuais com aquela mulher. Seria um ótimo desfecho para sua jornada, sua viagem. 

Ela se despiu em sua frente. Um belo corpo de mulher. Aquele tipo que ele tanto adorava. Havia fartura de carnes suculentas ali. Ele iria se fartar. Uma bela vagina, bem torneada, convidativa. E Constance ficou um bom tempo apenas mamando suas tetas rosadas. Depois a penetração. Já não era tão bom como antigamente. 

Embora também curtisse homens na cama, de vez em quando Constance gostava de entrar no meio das pernas de belas mulheres. Sentir-se um homem de tempos em tempos. E nesse papel também era um homem bem viril, satisfazendo a lascívia delas com doses de prazer infinitos. Elas gemiam alto no orgasmo. Constance socava sem dó e nem piedade. 

Depois do coito satisfatório, uma dose de sangue humano. Pensou em morder Jessica, mas olhando para ela dormindo tranquilamente ao seu lado não quis acordar a doce estátua de mármore. Ao invés disso vestiu sua longa capa vitoriana e decidiu andar pelos salões escuros do Palácio até o amanhecer. Queria ficar sozinho e pensar um pouco sobre sua busca...

Sangue e Areia
Constance agora estava em uma escavação arqueológica nos arredores de Berlim. Em um passado distante ali havia uma grande floresta onde lutaram romanos contra os bárbaros germanos. Grandes histórias de lutas e batalhas épicas se desenvolveram naquele solo. Só que a floresta há muito deixou de existir. A madeira foi colocada ao chão, usada para produzir carvão. Sobrou um vale estéril, com muita poeira e pó que entravam nas narinas dos homens que participavam daquela escavação. 

Constance tinha interesses ali. Ele havia comprado alguns artefatos antigos daquela escavação. Chegou a levar para sua coleção um precioso Elmo romano que havia sobrevivido no tempo. Aquilo era uma raridade absoluta, uma peça de um tempo que não existe mais, quando o Império Romano dominou praticamente toda a civilização ocidental. Constance tinha verdadeira adoração pela história da Roma Antiga. tinha pensado certamente em ampliar sempre e sempre sua coleção particular. 

Só que a históriia do Livro de Sangue não lhe saía da cabeça. Ele queria entender o que era verdade e o que era mera lenda naquele conto que lhe chegou em mãos. Poderia ser tudo, inclusive nada. Só que para aprofundar naquela questão ele entendeu que teria que ir até Paris, investigar se Maximilian de fato existiu ou se era apenas um personagem de literatura. Afinal desde os anos 80 livros sobre vampiros era uma moda no mundo editorial. Poderia muito bem ser que tudo aquilo não passava de uma fantasia. 

Queria ir na Biblioteca de Paris atrás das cartas de Maximilian. Será que elas ainda existiam? E Pierre, o tal historiador, era de fato uma pessoa real? Só havia mesmo uma possibilidade de seguir todos os passos, indo em direção à velha cidade de Paris, andar por suas ruelas medievais e antigas. Ir em busca da história desse homem que supostamente teria vivido no auge do Palácio de Versalhes. 

Certamente isso iria durar um tempo. Iria exigir um certo esforço de sua parte. Teria que ter paciência e organização em sua busca pessoal. Não adiantava se apressar. Nesse mundo de investigar histórias tudo poderia ser muito lento, complicado, obscurecido pelas areias do tempo. Como dizia o ditado popular, o tempo torna todos os homens sábios. Pena que também os mata. Como ele era um vampiro não tinha pressa nenhuma pois tinha todo o tempo do mundo. Claro, se ninguém o estivesse caçando. Em breve ele iria entender que alguém também seguia seus rastros no meio da escuridão. 

Pierre
Pierre era um homem destruído pelo tempo. Estava com 80 anos de idade e sofria de Mal de Parkinson. Quando Constance o encontrou pela primeira vez teve uma verdadeira compaixão pelo estado daquele homem. Ele estava curvado, sua coluna estava desviada e ele tremia as mãos o tempo todo. Por um breve momento Constance pensou serialmente em cancelar aquele encontro. Só que o velho homem estava em sua frente e ele decidiu seguir com a conversação. 

- Boa Noite Pierre. Deixe-me apresentar. Sou Constance. Estou em busca de informações sobre Maximilian! - Disse o cortês em seu perfeito sotaque britânico. 

- O Vampiro de Versalhes? Puxa, essa história me trouxe muitos problemas... muitos problemas mesmo... - Confessou Pierre sentando-se em sua cadeira, com uma bengala em mãos. 

- O que aconteceu? - Sondou o inglês. 

- Bom, eu estava em ascensão, numa carreira acadêmica. De repente me dei mal com aquele livro sobre vampiros. Obviamente ninguém acreditou em mim. Virei piada. Vampiros não existem!

- Calma, essa é uma conclusão precipitada... - Disse Constance fitando os olhos do homem à sua frente. Ele fez um efeito especial em seus olhos que o tornaram muito brilhantes, tal como um lobo na escuridão. Só uma maneira sutil para deixar claro a Pierre que ele estava na frente de uma criatura da noite...

- Meu Deus! O que é isso? - Tentou se levantar rapidamente, mas sem conseguir por causa de sua grave doença...

- Acalme-se. Eu jamais iria lhe fazer mal, velho homem. Sente-se, fique calmo. Estou apenas em busca de informações mesmo. Me diga com sinceridade. Maximilian realmente existiu?

- As cartas certamente existem. Estiveram em minhas mãos por muitas vezes. Já o seu conteúdo.... é outra coisa... Fiz breves pesquisas, mas não pude ir em frente. Tinha que ganhar o pão do dia a dia. Não podia ficar viajando em busca de uma sombra...

- E hoje onde se encontram as cartas originais?

- Na biblioteca de Paris. 

- Era o que desejava saber. Então me vou, velho homem. Quero lhe desejar muita saúde e paz. Quero que você tenha um final de existência feliz como ser humano. Eu falo isso do fundo de meu coração combalido. 

Pierre viu sinceridade em suas palavras. Não demorou logo e o alto e elegante Constance se levantou. Colocou seu bonito chapéu e saiu do encontro com Pierre. Estava satisfeito com o que ouvira dele. 

Só que Pierre tinha uma última pergunta a lhe fazer...

- Espere... Uma última pergunta. Existe mesmo vida após a morte?

Constance virou-se, olhou sobre seus ombros, abriu um sorriso e respondeu...

- Como eu vou saber? Eu nunca morri! Não no sentido tradicional do termo. 

Dito isso tirou uma moeda do bolso e jogou para o alto. Depois a deu de presente para Pierre. 

- Eis aqui um presente. É uma velha moeda romana dos tempos do imperador Tibério... 

Deu a moeda para o velho historiador...

- Muito obrigado... Eu dei minha vida pela história...

Não havia tempo para mais nada. Com sua grande capa preta Constance andou rápido, com passos firmes. Abriu a porta e se foi, desaparecendo no meio da noite. 

Pablo Aluísio. 

domingo, 20 de dezembro de 2009

Morte na Ravina

Todos Mortos...
Little Bighorn, Montana, 30 de junho de 1876
Entramos nas colinas próximas a Little Bighorn, no Território de Montana, em 30 de junho de 1876. Cinco dias antes a Sétima Cavalaria do General Custer havia sido destroçada por índios nessa mesma região. Estávamos chegando para conferir pela primeira vez o que teria realmente acontecido. Será que eles tinham mesmo sido mortos pelos nativos? Era necessário o envio de uma parte da cavalaria para verificar in loco o que de fato teria acontecido. Antes de qualquer coisa devo me apresentar. Esse que escreve essas linhas é o Major Paul Byron, faço parte da décima nona cavalaria e minha missão era de ir até aquela região para ver tudo com os próprios olhos. 

Antes de entrarmos na ravina já encontramos corpos de militares. Todos em avançado estado de decomposição. Muitos tinham sofrido com a tradicional ritualística dos nativos de retirar seus escalpos, a parte da frente dos cabelos nos crânios dos homens mortos. Os índios usavam os escalpos em seus cintos e nos cavalos para mostrar aos demais guerreiros da tribo a sua bravura na guerra contra o homem branco. 

Vi o corpo de um jovem soldado com a boca aberta e os olhos de terror. O rigor cadavérico preservou para a eternidade suas últimas feições em sua face praticamente juvenil. Não havia armas entre os corpos, uma prova de que elas tinham sido levadas pelos índios. Isso significava que estavam fortemente armados e municiados. Mais um sinal de que deveríamos ter muito cuidado. 

Finalmente depois de quase uma hora no lugar identificamos o corpo de Custer. Ele estava cadavérico, mas conseguimos reconhecer pelo uniforme, pelas insígnias e também pelos cabelos que sobraram, loiros, longos, ao vento. Seus dedos tinham sido cortados e seu corpo estava muito mutilado, demonstrando o ódio e a fúria de seus inimigos no calor da luta. Eles não apenas mataram Custer, eles fizeram de tudo para lhe tirar sua dignidade. O tronco havia sido separado de suas pernas, um dos pés foram arrancados e sua dentro de sua boca havia flechas de fogo. Um triste fim para um dos oficiais mais importantes da história do exército americano. 

Flechas de Sangue
Era muito cansativo ser da cavalaria dos Estados Unidos. Além do risco de levar uma flecha em qualquer lugar, havia ainda as longas cavalgadas. Isso destruía a coluna de qualquer mortal, mesmo que você fosse jovem e com boa saúde. O ser humano simplesmente não nasceu para ficar tantas horas na sela de um cavalo, no meio daquele deserto horrível, onde só viviam as cobras e os lagartos. E o calor era infernal. O suor descia em cascatas por trás do chapéu azul da cavalaria. As mãos, dentro das luvas, ficavam ensopadas com aquele clima horrível! 

Por isso quando a oitava cavalaria foi designada para um território longe demais, nenhum dos soldados comemorou. Era mais uma cavalgada infernal, mais uma viagem rumo ao deserto infame. Só que dessa vez eles tiveram uma surpresa. Foram parar em um lugar até muito bonito. A fronteira entre o território onde os apaches foram levados e o território do homem branco que a cavalaria deveria defender, não era muito distante.

Havia duas colinas separando os dois mundos. No meio das duas colinas havia um lindo rio das águas mais limpas que você possa imaginar. Essas águas vinham direto das montanhas. O rio era formado do degelo da neve do alto dessas montanhas. Era uma coisa linda de se ver. O rio era azul feito o céu. Os soldados lhe deram o nome de Blue River. 

Como estavam cansados demais, tiveram autorização de seus oficiais para tirarem suas roupas, para nadar naquelas águas maravilhosas. Só uma coisa eles não deveriam fazer: beber diretamente do rio. Só podiam fazer isso depois de ferver a água. Precaução contra doenças, estava no manual do soldado americano. 

Nadar naquelas águas era uma maravilha e todos se renderam a elas. Quer dizer, todos não. O comandante ficou firme em seu cavalo. Depois desceu e se encostou preguiçosamente em uma pedra. E ele não conseguiu esconder o prazer de estar em um lugar tão bonito! Ainda mais para um sujeito que acabara de chegar de um lugar de morte e destruição. Não fazia muito tempo estava coordenando seus homens no enterro dos militares da sétima cavalaria, mortos na emboscada às tropas do General Custer. Ele mesmo havia participado do reconhecimento do cadáver do general. 

Sair daqueles campos da morte para depois ir parar em lugar de cartão postal como aquele era mais do que bem-vindo, era uma maravilhosa consolação. Ele então se deitou e relaxou. Parecia muito relaxado. Estava em paz consigo mesmo. Tirou as luvas cheias de poeira do deserto e as colocou de lado. Ele poderia morrer ali mesmo, nunca mais sair daquele paraíso, que para o velho militar estava tudo bem. Estaria tudo justificado. 

Para um homem de 50 anos, já sentindo o peso da idade, era mais do que agradável ficar ali vendo aquelas belas águas azuis. Só que nem ele e nem seus homens prestaram a devida atenção pois no alto da colina dos índios, começavam a chegar mais e mais guerreiros Apache. A coisa estava prestes a mudar. 

O único som que se ouviu foi a da flecha cortando o ar... 
Ela saiu do alto da colina e foi direto ao alvo, nas costas de um dos soldados...

O ataque havia começado...

Pablo Aluísio. 

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Manuscritos de um Vampiro

Manuscritos de um Vampiro
Segue abaixo mais um lote de manuscritos encontrados nas catacumbas de Paris no final dos anos 1920. Reza a lenda que seria de um Lord Vampiro, há muito desaparecido...

Capítulo 1 - Mil Demônios em seu leito fétido...
Paris, 12 de outubro de 1801
Estive lembrando de novo de uma figura imunda que cruzou meu caminho. Mulher de baixos instintos. Soube que ainda está viva, para minha surpresa. Sim, velha, sim, decrépita, mas ainda respirando. Aliás ela e seus irmãos, todos patifes da pior laia, ainda vivem e andam sobre a Terra. Daí eu me pergunto, como isso seria possível... Volto a dizer, que não existe nada. Nem um céu acima de nós e nem um inferno abaixo de nossos pés. É tudo invenção, tudo mitologia. 

Caso existisse algo desse tipo, mulheres como essa, que se dizem crentes em Deus, mas que no fundo são hipócritas malditas, já teriam virado pó. Um pastiche cremoso, feito de suas visceras. Mas como nada existe mesmo, elas caminham sobre a Terra de forma livre, leve e solta. Ainda são imundas, mesmo com o passar dos anos. Como são velhas de decrepitude a carne fede, os homens pegam nojo, ainda mais com suas personalidades cheias de preconceito, racismo e escrotidão. São mulheres escrotas no mais alto nível que você possa imaginar. Duas irmãs que vivem na sarejta moral e espiritual. 

De qualquer forma como sou um vampiro, que muitas pessoas não acreditam existir, vou deixar aqui uma oração negra de maldição, velha tradição da literatura do mal-dizer, muito em voga em eras passadas. Era uma forma de amaldiçoar o próximo ou a próxima. Eis minhas palavras nesse sentido, dirigidas para HM. Queima freira do Diabo, queima...

"Oh, seres das trevas...
Amaldiçoem as pegadas dessa velha imunda
Que Mil Demônios avancem sobre ela, de noite, de dia, a qualquer hora...
Que suas imundicies que saem de sua boca voltem para ela...
Que a miséria de sua alma fétida corroe suas entranhas...
Que o sono fique perturbado, que seja feito de pesadelos...
E que pela manhã o câncer que já esteve em seu corpo avance...
Avance, tome os órgãos, todos eles...
Destrua a imunda, destrua, por dentro, em todo lugar...
Coma suas vísceras, como o verme come os corpos apodrecendo nas covas do cemitério...
A carne fedendo, as unhas pretas, o cheiro de podridão...
E que ela seja enviada para seu lugar natural...
A mais baixa profundida do infernos...
Onde beijará as placas ardentes do submundo do reino das trevas...

Está lançada a praga, está lançada a maldição eterna..." 

Capítulo 2 - Encontro noturno em Portugal
Lisboa, 15 de dezembro de 1802
Eu estive em Portugal poucas vezes em minha vida. Hoje estou aqui. Ontem me encontrei com um senhor vampiro chamado Andrade Soarez. Ele é um velho vampiro, de muitos séculos de existência. Visualmente parece ser um senhor distinto, cabelos grisalhos e tudo mais. E realmente é uma presença agradável. Sabe aquelas pessoas gentis que você reconhece até mesmo em pequenos gestos. Pois bem, era o caso dele. Fomos para uma pequena cantina numa alameda do centro de Lisboa e conversamos durante duas horas naquela noite. Ele reclamou bastante dos jovens da noite, vampiros com menos de 200 anos de existência. Para ele era um bando sem salvação, um bando de vagabundos!

Não que não houvesse vampiros ruins no passado, ele confessou que havia. Foi mais além e disse que determinadas casas ou clãs eram formadas apenas por gente de esgoto, asquerosos, gente sem nenhum tipo de valor humano ou inumano. Era a escória em sua palavra. Citou um velho vampiro muito antigo de uma casta tradicional. Disse que o chefe desse clã era miserável e avarento e que todos os seus 11 filhos eram seres desprezíveis. Ele perdeu o filho mais velho, que acabou caindo dentro de sua própria armadilha. Depois disso assumiu a coordenação do clã o segundo mais velho. Um homem impotente e que por baixo de uma aparência de vampiro honrado, era ladrão e golpista. 

Os demais não valiam muito. Havia três irmãs mais velhas, três víboras. Uma era mística fanatizada, a outra uma megera incurável e a mais jovem uma canalha pérfida. Mulheres da noite tão feias que não arranjaram pretendentes. Pareciam morcegos atrofiados, aleijados. Os demais irmãos mais novos eram em essência patifes. Todos envolvidos em redes de prostituição, bebedeiras e crimes dos mais diversos tipos. Um deles precisou fugir acusado de roubo de dinheiro público. Terminou sua vida (ou morte, já que vampiros supostamente teriam vida eterna) como um aleijão que mal conseguia se levantar de uma cadeira. Mesmo debilitado e sem forças, continuava o mesmo ser desprezível. 

Esse clã familiar vampiro não resistiu ao tempo. Demorou, mas aos poucos todos foram desaparecendo. Uma ninhada de ratazanas. O senhor então bebeu sua última gota de vinho e me confessou que a tal vida eterna também havia se tornado um fardo, ainda mais agora que ele finalmente compreendia que o ser humano era um projeto que deu errado. Passavam os séculos e os mesmos erros eram cometidos, inclusive na sociedade, dentro da política, das comunidades de uma maneira em geral. Agora, com séculos nas costas ele só queria desapatecer de uma vez por todas, numa esquina escura de uma cidade portuguesa. E foi justamente isso que ele fez após se despedir da minha presença, com breves palavras finais. 

Capítulo 3 - Oh Morte, Venha a ela...
Paris, 8 de janeiro de 1824
Oh Helena, pessoa sórdida e vil!
Que sua boca seja invadida por sangue de hemorragia, que a luz de seus olhos se apaguem, que você sofra todos os males possíveis e imagináveis. Que se afogue em seu próprio sangue e perversidade, que o mau cheiro de suas entranhas entre em suas narinas e de lá nunca mais saiam... Que você sofra muito em suas últimas horas nessa existência miserável que você vive. Que os vermes decompositores rejeitem sua carne podre no caixão!

Que ao morrer seus restos mortais de chorume cadavérico sejam jogados numa caçamba de lixo e não em um túmulo, pois nem isso você merecerás! Joguem no lixo essa pessoa imunda, esse ser humano de quinta categoria, esse estrume, escória, imundície suprema... Que o lixo e a lama sejam seus últimos companheiros nessa vida desgraçada que levas...

Eu estarei na beira de seu túmulo onde vou me encher de pus fédido para cuspir em seus dejetos cadavéricos. Aquele pus amarelo fedorento escorrendo de sua foto péssima... Eu anseio por esse momento... Vou cuspir, cuspir e cuspir em sua memória... Que você morra muito em breve, que tenha muito sofrimento, que caia no descrédito e na humilhação coletiva, que seu nome seja motivo de escárnio e ofensa pelos séculos que virão...

Tu não és nobre, tu és lixo putrefato... Eu como vampiro vou olhar para você em seu último refúgio e cuspirei em seus restos mortais, Oh Helena, morra, morra eternamente na escuridão de sua própria imundície pessoal e que leve com você todos esses seres sórdidos que você chama de família... Oh Helena, apodreça, apodreça...

Capítulo 4 - Helena
Paris, 11 de janeiro de 1824
Ontem reencontrei um velho amigo, Lord Constance. Como sempre estava muito elegante e charmoso. Velhos vampiros não aprendem truques novos, muito embora educação e elegância já não tenham a mesma força atrativa para essas jovens de hoje, todas muito frívolas e superficiais. Pois bem, foi um breve, mas traumático encontro. Não pela presença de Constance, pois sempre gostei muito dele como Lord das trevas e tudo mais, mas sim pelo que ele me contou, quase no final da nossa conversa, quando já estava colocando seu bonito chapeu para se retirar. Eles se virou para mim e fez a pergunta fatal: 

- Você soube de Helena Margot?

Fiz cara de surpresa, mas escondendo fúria e raiva incontroláveis pois Helena era o nome proibido no meu caso, ainda mais depois de tudo o que aconteceu...

- Não estou sabendo de nada...

Constance então colocou as mãos em meus ombros, como se estivesse me preparando para a informação que iria me abalar. Ele olhou em meus olhos fixamente e disparou...

- Helena Margot morreu ontem em Paris. Ela estava com 94 anos de idade! Estava com demência avançada, além de Mal de Parkinson e havia sido abandonada em um asilo nos arredores da cidade pelos últimos familiares que lhe restavam...

Foi como receber uma estaca final em meu coração! Senti o sangue jorrar de meu coração falecido... Foi muito doloroso... Fiz rosto de pessoa consternada, um pouco teatral, mas foi isso... Não me veio mais nada à mente... Estava chocado demais para reagir, para falar algo que fosse minimamente coerente ou complexo... 

Ele então, percebendo que eu tinha ficado abalado, pediu desculpas, falou que tinha que ir e que havia sido muito bom me reencontrar... Com os olhos marejados, úmidos, ainda consegui dizer a ele:

- Claro Constance, o prazer foi todo meu... - Então ele virou-se e foi embora. 

Fiquei sozinho olhando o luar. Estava arrasado... Eu havia amaldiçoado o nome de Helena Margot por muitas décadas, mas a verdade é que a simples citação de seu nome ainda me abalava. Eu estava em choque! 

Helena, Helena... Nunca houve uma beleza como Helena... A amei e a odiei em doses extremas, sem meio termo... Ódio e Amor nas mesmas proporções... Provavelmente o único amor que tive em toda a minha existência... Eu tenho que enfrentar meus demônios interiores e contar nossa história, o que ocorreu no passado. Quero deixar registrado no papel nossa história. E é o que farei, nobre amigo, nas próximas cartas que irei lhe escrever...

Capítulo 5 - O Baile
Paris, 23 de janeiro de 1824
De acordo com o que lhe escrevi na última carta aqui vao algumas recordações que tenho de Helena Margot, que ja amaldiçoei em inúmeras vezes nas noites eternas em que vago sem rumo pelas ruas desertas e escuras em Paris. Hábito que admito, amo de coração, acaso tivesse eu ainda um coração batendo em meu peito de puro vácuo. Eu me recordo que a vi pela primeira vez em um salão de festas, um baile dado em homenagem ao filho de um conde que estava se formando em letras jurídicas. Não lembro mais o nome desse nobre. O tempo joga suas areias em nossas lembranças, mesmo as mais marcantes. 

Estava eu andando pelo baile, falando com as damas de ocasião quando surgiu Helena em minha frente. Uma doce donzela na flor de seus 16 anos de idade. Pele maravilhosa, olhos profundamente azuis, cabelos longos, ondulados e loiros como as mais puras e intocadas divindades nórticas. Estava conversando com uma amiga, dando risadinhas, contando alguma coisa engraçada entre elas. Pareciam muito felizes e contentes. E eu, literalmente falando, esbarrei nela sem querer. Estava de costas, bebendo, quando de repente percebi que havia batido em alguém de forma involuntária. O salão estava cheio, era inevitável esse tipo de situação!

- Oh, perdão, senhorita, não foi minha intenção - lhe disse assim que tomei par da situação um tanto embaraçosa...

- Não, tudo bem, fique tranquilo - ela me disse.

- Espero que não tenha derramado o seu copo em seu lindo vestido... - Uma observação pertinente enquanto a olhava de cima a baixo. Na verdade estava inebriado com sua beleza. Com o falso motivo de estar procurando por alguma gota em seu vestido, pude apreciar todas as suas curvas, a beleza de seus seios, a pela de porcelana....

- Não,  não me molhou... até porque se tivesse caído alguma bebida em meu vestido eu estaria louca, louca... - Ela disse sorrindo, aliás dentes perfeitos, brancos, maravilhosos... Fiquei inebriado...

Então puxamos algum tipo de conversa banal, apenas para tentarmos nos conhecer melhor. 

Pude perceber que ela tinha tiradas ótimas, de puro humor, sobre os vestidos das demais damas. Não era algo de maldade, achei tudo de um bom humor realmente cativante. Fiquei muito interessado nela. 

Não era uma adolescente comum. Ela era muito inteligente. Devo dizer que era mais inteligente do que eu, haja visto que ela fez algumas piadas comparando os convidados com alguns personagens de literatura que eu já ouvira falar, mas que não tendo lido os livros me deixou numa situação de humildade intelectual que raras vezes senti. Uma mulher assim era algo notável. Conhecer ela naquela noite me marcou. E não demoraria para nos vermos novamente, em outras situações mais do que interessantes...

Pablo Aluísio. 

domingo, 6 de dezembro de 2009

O Vampiro de Versalhes

Cap I - Um Conto Vampiresco
Louis de Bourges foi um jovem afortunado. Nasceu em uma família nobre, pertencente da Casa de Boubon. Foi criado brincando nos jardins de Versalhes com o pequeno Luís. Quem seria esse amigo de infância no futuro? Ora, seria o futuro rei Luís XVI, de triste memória, pois o destino quis que ele se tornasse o último monarca da França pré-revolução. O adolescente Bourges também foi grande amigo de juventude de Maria Antonieta. Quando ela foi para Versalhes, vinda de sua terra natal Áustria, a garota tinha apenas 14 anos de idade. Mal sabia falar a língua de seu futuro marido. Na época era comum as casas nobres trocarem casamentos entre seus membros. Era uma forma de selar a paz entre países e nações.

Sua vida humana foi no luxo, na fartura e na festa, isso na corte mais luxuosa e excêntrica da Europa. Memoráveis as festas à fantasia promovidas pela amiga Antonieta, onde todos os membros da corte surgiam em fantasias belíssimas, com muita pompa e elegância. Tempos maravilhosos. Bourges não tinha muitos talentos pessoais, não era particularmente estudioso e tampouco se preocupava em construir o futuro com seus próprios méritos. Isso não existia, em absoluto. Só pelo fato dele ser um nobre já o definia como um homem bem sucedido. E o fato de ter sido amigo pessoal do casal que reinava na França o qualificava para qualquer cargo público que quisesse, onde pretendesse e com o salário que pedisse. Era assim naquele mundo de altos privilégios.

Só que a besta foi solta. E o que era a besta? Era a revolta do povo francês. Durante anos o povo foi esmagado por uma grande crise financeira. Enquanto o povo passava fome a corte de Versalhes se banhava em festas cada vez mais extravagantes. A Rainha Maria Antonieta desfilava com seus vestidos maravilhosos e seus excêntricos penteados ao estilo Poof. Havia ai uma tensão. O povo sustentava a classe nobre parasita enquanto mal conseguia colocar um prato de comida para seus filhos. Maria Antonieta e os nobres viviam de pura ostentação. O rei Luís XVI logo ganhou uma fama de fraco e impotente pois não conseguia consumar seu casamento para gerar um herdeiro. Havia um clima de panela de pressão prestes a explodir a qualquer momento.

Louis de Bourges não parecia preocupado. Com 19 anos de idade ele estava mais preocupado em levar para a cama as moças da pequena nobreza. Nem é preciso lembrar que a devassidão sexual imperava em Versalhes. Todas as mulheres eram de todos os homens. E algun homens também eram homens de outros homens. Embora a monarquia passasse a imagem oficial de católica e conservadora, o fato é que a luxúria imperava. A Rainha Maria Antonieta logo ganhou fama de devassa, com gravuras pornográficas sendo vendidas em toda Paris. Bourges não se importava. Ele detestava política, além disso estava em uma fase de vício em sexo, de todas as maneiras, de todas as formas. Sua pecadora existência porém estava prestes a chegar ao final. Em pouco tempo a Revolução Francesa bateria à porta de sua tranquila e perfeita vida. O mundo estava prestes à virar de ponta-cabeça.

Fazia quantos anos que Louis havia visitado Versalhes pela última vez? Essa conta não se faz com anos, mas com séculos. Fazia seguramente mais de 2 séculos que ele havia atravessado aquelas portas... e agora tudo parecia tão diferente. Não havia mais toda aquela elegância das pessoas da nobreza andando por seus corredores. Não havia a pompa e o luxo de Versailhes. Não havia mais nada. As pessoas que agora andavam por aqueles corredores eram turistas com suas bermudas e máquinas de filmar. Gente gorda, com os dedos sujos de batata frita. Um horror!

Louis voltava para Versalhes para um exercício de nostalgia. E deveria estar morto há séculos. Todas as pessoas que ele conheceu deveriam estar mortas. Ele havia visitado há pouco o túmulo de Maria Antonieta. Pobrezinha. Cortaram sua cabeça, jogaram seu corpo em uma vala comum, jogaram cal por cima de seu rosto lindo. Um fim de vida trágico.

Louis, o vampiro, tinha sido seu amigo. Agora de volta a Versalhes ele revia todos os salões, todas as salas, que um dia vivenciaram uma linda história da monarquia francesa. O Palácio com seus inúmeros espelhos realmente representavam um desafio a um ser cuja imagem não se refletia neles. Porém Louis era cuidadoso. Ele ficava parado sem passar na frente de um espelho se houvesse muitas pessoas próximas. Não queria dar sopa ao azar.

E ao adentrar o quarto que um dia pertenceu a Maria Antonieta, ele chorou. Chorou não apenas pela dor da morte horrível da amiga, chorou pela morte de toda uma era. Chorou pelo fim das grandes festas. Chorou ao saber que nunca mais iria fazer parte de uma corte tão maravilhosa como aquela. O mundo em que ele agora existia era sem brilho e sem glamour. Os revolucionários franceses envenenaram a alma dos homens. E Louis havia vivido toda essa história na pele. Ele estava na Rússia quando a revolução dos comunistas tomou o poder. Ele viu o sangue escorrendo da montanha mais uma vez... E ele chorou novamente por lembrar disso.

Cap. II - Valerie de Versalhes
Louis ainda se lembra da primeira vez que bebeu sangue. Foi na velha casa que servia de "fazendinha" para Maria Antonieta. Não poderia haver coisa mais inusitada. Enquanto os verdadeiros camponeses franceses sofriam com a grave crise econômica, muitos deles passando fome com suas famílias, a rainha brincava de camponesa em uma fazendinha de mentira perto do Petit Trianon, seu palácio privativo perto em Versalhes. Nesse lugar tinha tudo que uma verdadeira fazenda francesa tinha, como bois, porcos, aves, peixes. Só não tinha camponeses de verdade. Quem frequentava aquele lugar era a nobreza entediada que precisa preencher seus dias de tédio com alguma diversão.

Louis conheceu a jovem Valerie ali. Era filha de um dos serviçais de Versalhes. Uma mulher de longos cabelos pretos cacheados, carnes fartas, com jeito de ser muito quente na cama. Carnuda e muito sensual, Val pecava pela dentição ruim e feia. Ali ela se revelava mesmo uma senhorita das classes inferiores. Tinha dois dentes centrais prejudicados, chegando a serem ridículos. Louis porém não estava interessado em sexo. Ele poderia satisfazer sua lascívia entre as pernas da mulher quando bem entendesse. Só que ele não queria sua vagina, mas sim sua jugular. Louis queria sangue para se alimentar.

E o mais estranho é que ele nem tinha tido consciência ainda que havia se tornado um vampiro, uma criatura da noite. Não sabia quem o havia mordido, provavelmente na madrugada anterior, numa orgia no templo do amor, onde nobres e garotas da plebe se entregavam ao máximo da luxúria. Onde ninguém era de ninguém, onde todos beijavam todos, chupando todos os membros sem se importar quem era os seus donos. Na orgia de sexo e bebidas provavelmente perdeu a consciência. Com o pescoço à mostra foi infectado, virando para sempre um desgraçado filho de Satã que jamais encontraria a morte... ou a vida!

Val pensou que Louis queria transar com ela. Levantou as saias, mostrou as coxas carnudas. Louis deu um salto, tal com um ente predador que ataca sua caça. Ela mal teve tempo de reação. Seus olhos abriram com espanto, tentou dar um grito, mas Louis tapou sua boca e em um ato de extrema violência quebrou seu pescoço. O sangue de presas vivas sempre foi mais saboroso para os vampiros. Eles conseguiam sentir o pulso de seus corações no delicioso líquido vermelho, mas como Louis ainda era um novato nem pensou muito nisso. Preferia matar, ante de ingerir. O inesquecível para ele nessa noite nem foi o sangue dela corrente em seus caninos, mas sim a sensação única de ver a vida de sua vítima escoar pelas pupilas dilatadas. A morte chegando e a vida indo, lhe trouxe um enorme prazer.

Cap. III - Anne de Bourbon
Em 1982 uma velha agenda foi desenterrada nos amplos jardins de Versalhes. Estava debaixo de uma pequena cerca. Corroída pelo tempo, conseguiu resistir ao tempo por causa das areias onde foi enterrada. Enterrada ou perdida? Não se sabe ao certo. O que se sabe é que em suas páginas havia um conteúdo inacreditável. Ao ler página após página o leitor iria chegar na conclusão que era o diário de um vampiro! Estranho não é mesmo? Assinando apenas como "Lobo da Noite" essa figura era na realidade Louis, um jovem que circulava na nobreza de Versalhes nos tempos de Maria Antonieta.

A primeira página era reveladora. O autor confessava sua própria situação ao escrever: "Estou morto! Minha temperatura corporal é nula. Minha pele vai perdendo a elasticidade se eu não for atrás do néctar dos deuses. O que é o Néctar dos deuses? É sangue humano, meu caro. Eu preciso de sangue humano. Não importa, se de jovem ou velho, homem ou mulher. O sangue humano é preciso para que o corpo não entre em decomposição. Alguns disseram que ratos e animais inferiores eram o bastante. Não são! Só o sangue de um ser humano restaura a beleza da juventude. Eu sou um animal e preciso abater um animal da mesma espécie para continuar existindo".

E havia mais nesse desabafo: "As pessoas gostam de ver vampiros como seres nobres. Não são! São monstros. Se há alguma elegância, se há alguma educação ou modos finos, isso tudo é apenas a antevéspera do ataque. Eu quero morder o pescoço, eu quero quebrar a coluna de quem estou matando. Eu sou um predador e eu sou um imundo das trevas. Todos os vampiros que tive o desprazer de conhecer eram seres repugnantes. Asquerosos... asquerosos! Fingiam ser até mesmo religiosos, mas no fundo eram seres forjados no ódio. Não havia finesse, havia sede de sangue!".

Muitas vezes a ira soltava das páginas: "Eu quero triturar essa vadia, eu quero matar ela. É bonita? Se acha superior? Eu quero mostrar a ela quem é o superior! Eu sou superior, eu sou eterno! A escrota se chamava Anne Bourbon. Depois de virar mãe solteira, ao ser usada como vasilha de esperma de um médico arrogante e insensato, ela ficou grávida. Ele a largou.  Quando eu era mortal havia gostado dela. Fui desprezado. Mais do que isso, fui ridicularizado! Maldita, maldita! Agora veja essa vadia. Largada, abandonada. Mãe solteira. Tu não vale nada, mas eu vou sair com você. Eu vou te seduzir na calada da noite. Vou te fazer sentir uma deusa, como nos velhos tempos quando eras jovem e bonita. Porém eu vou te destroçar quando levá-la a um quarto de quinta categoria de um bordel imundo de Paris. Eu vou te matar, mas antes vou fazer com que se sinta especial. Depois vou sugar seu sangue, cravar minhas unhas em sua pele bronzeada e vou tirar sua vida.  Com prazer enorme vou te jogar na lata de lixo! Pensa que me desprezou no passado e vai ficar por isso mesmo? Eu vou te destruir, eu vou sugar sua vida, sua desgraçada miserável". O amor não correspondido pode mesmo facilmente ser transformado em puro ódio irracional.

 Segundo consta nos registros policiais o corpo de Anne de Bourbon foi encontrado numa velha casa no dia 12 de dezembro de 1799. Ela tinha a cabeça decepada e vários cortes em todo o seu corpo. Pelo tamanho das feridas havia sido atacada por um animal feroz, provavelmente um lobo ou um urso selvagem. Mas quem poderia imaginar um urso andando por Paris? Não havia sentido nisso. Por essa razão o inquérito ficou por anos sem solução até ser arquivado definitivamente cinco anos depois.

Se o que estava escrito era verdade ou não, o autor vampiro revelava tudo. O texto contava sobre a morte de Anne: "Eu a encontrei por volta das oito horas. Apesar dos anos passados ela ainda poderia ser vista como uma mulher desejável. Claro, dois filhos depois seus seios já não eram os mesmos. Ela também não era uma atleta e por isso gorduras denunciavam o passar dos anos. Seus dedos, tantos dos pés como das mãos, sempre foram horríveis. Parecia algo mal feito, de segunda mão. Era o que denunciava suas origens pobres, de gente que foi subindo aos poucos na escala social. Ela era inicialmente filha de um militar de terceiro escalão. Depois que ficou grávida do tal médico melhorou um pouco seu status".

E continuou: "Depois de bebermos vinho por toda a noite, a convidei para ir a um quarto ali perto. Ela já estava um pouco embriagada. Foi fácil levar aquela jovem senhora, já se tornando velha snehora, para aquele lugar escuro. Ao colocar esse corpo feminino na cama pensei como eu era tolo aos 19 anos de idade. Pensando que aquilo ali tinha algum valor maior. Não tinha, era carne de segunda. Olhei para ela e disse falsamente como ela era bonita. Nisso a Anne deu um sorriso. Em fúria rasguei seu rosto com minhas mãos. O sangue jorrou por todo o quarto..."

"Ela quis gritar, mas eu dei um forte soco em sua cara. Ela não chegou a perder os sentidos, mas ficou zonza... não perdi mais tempo e avancei em seu pescoço. Não foi uma mordida, foi uma carnificina! Eu arranquei grandes nacos de sua carne... o sangue me lambuzou todo... eu fiquei em êxtase... queria uivar como um lobo... e continuei a cortar e cortar... tome sua vadia, sua puta! É isso o que você merece... um morte indigna... Eu quis lhe dar seu amor, mas você não quis... Agora pagará, MORRA CADELA, MORRA CADELA... eu amei cada segundo da morte daquela mulher. Bebi e bebi seu sangue até me fartar..."

Os detalhes combinavam com o que estava descrito pela polícia. Foi uma morte digna de Jack, o Estripador. Aliás para os investigadores que estiveram na cena do crime foi muito além disso. O pescoço estava em frangalhos. Sua cabeça foi separada do corpo não por um corte de espada ou faca, ou algo equivalente, mas sim por mordidas, cada vez mais profundas e violentas... algo que destruiu suas estrutura física. Depois de tudo o assassino havia jogado sua cabeça dentro do vaso sanitário imundo que havia naquele quarto infecto. Havia ali claro sinais de fúria e vingança. Depois que o vampiro aniquilou e humilhou sua vítima ele ainda se virou para dar uma última cuspida naquela carcaça sem vida. "IMUNDA, IMUNDA... " - Foram suas últimas palavras antes de virar sua capa e sair pela noite adentro.

Essa foi a segunda morte da não vida vampiresca de Louis de Bourges.

Cap. IV - A Condessa Russa
Em meados de 1820 o vampiro Louis ouviu falar que a condessa russa Raissa estava em Paris. Uma mulher fabulosamente rica, única herdeira de um militar que havia caído nas graças do czar. Com sua morte ela teria herdado milhões em joias, propriedades e dinheiro, depositado nos mais exclusivos bancos da Europa. Apesar de toda a riqueza, a condessa era uma pessoa desprezível. Ela era uma mulher feia. Apesar de possuir olhos verdes, todo o conjunto era tenebroso. Ao invés de ter curvas, como convém a uma bela mulher, ela tinha o corpo quadrado. Não havia seios. Era magra em demasia. Os dentes estavam amarelados pelo fumo. O conjunto era ruim. Era uma mulher feia por fora e por dentro.

Ela procurava compensar sua feiura indo atrás de belas jovens. Era lésbica. Porém ao invés de se relacionar com essas moças, que eram lindas, mas pobres, a condessa abusava de todas elas. No começo enchia todas dos mais belos vestidos. Das mais belas joias. Depois quando começavam a se sentir belas, a condessa começava a tirar tudo. Era um jogo psicológico doentio. Ela queria humilhar, desprezar a juventude a a beleza dessas mulheres. Na Rússia se dizia que ela havia matado algumas de suas servas. Não por acaso as mais belas. Ela tinha complexo de inferioridade perante aquelas belas jovens. Como era feia e ruim, queria destruir a beleza feminina da face da terra.

Quando as mortes começaram a incomodar, por terem caído na boca do povo, a condessa decidiu ir embora para Paris. Só que na capital francesa ela não perdeu o gosto pela morte. Em poucas semanas já surgia como suspeita da morte de uma jovem empregada. Só que Paris não era São Petersburgo. Na capital francesa ela seria investigada e se seus crimes fossem descobertos, seriam punidos. O Lord Louis a desprezava. Em pouco tempo procurou se aproximar dela. Com seu eterno corpo de 19 anos (idade em que se tornou um vampiro, um ser da noite), ele seduziu uma das damas de companhia da condessa. Em pouco tempo foi apresentado a ela. Na verdade o vampiro só queria matar aquela mulher.

Numa noite, conversando com a condessa, Louis descobriu que ela realmente era uma pessoa asquerosa. A condessa desfilou todos os seus preconceitos. Odiava negros e pessoas de cor. Era racista. Preconceito racial. Achava os homossexuais aberrações, isso apesar de ser uma lésbica violenta e possessiva. Como se pode perceber tinha preconceito sexual, ao mesmo tempo sendo a pessoa mias hipócrita da Europa. Dizia ser religiosa, mas sua vida pessoal era de pura devassidão. Mais uma prova de sua hipocrisia. E para fechar o quadro geral, odiava pessoas pobres. Tinha preconceito social contra as pessoas mais humildes. Era a mulher mais asquerosa da Europa. Seu destino era de morte. Louis estava pronto para cumprir esse destino.

O vampiro, com os longos anos passado, acabou se tornando uma pessoa culta. Era ótimo na conversação envolvendo livros, artes e história. Afinal ele tinha sido uma testemunha ocular de todos os acontecimentos desde os tempos de Maria Antonieta. Durante uma das noites a condessa o convidou para ir ao teatro com ela. Iriam de carruagem. Aliás a carruagem da condessa, vinda da Rússia, chamava atenção por onde passava. Era puro luxo e ostentação. E seria dentro dessa gaiola de ouro que o Lord vampiro iria atuar.

Já era tarde da noite quando saíram do teatro. Ao entrarem numa rua escura de Paris, Louis não perdeu tempo. Ele imediatamente deu uma pausa, olhou para a condessa e disse: "Seu destino chegou!". A condessa riu e perguntou: "O que você está querendo dizer com isso?"... mal houve tempo dela terminar a frase. Com suas garras de vampiro, Louis rasgou seu rosto. Ela ainda deu um grito, o que levou o condutor da carruagem parar para ver o que estava acontecendo. Ao descer e olhar pela janela ele viu Louis já sugando a jugular da condessa dentro da carruagem.

"Meus Deus! O que é isso?" - gritou o empregado. Louis percebendo que ele poderia criar problemas pulou fora da carruagem em um piscar de olhos. Com uma barra, tirada da lateral da carruagem, atingiu em cheio a cabeça do homem. Esse caiu imediatamente, seu sangue jorrava pela calçada escura e molhada da ruela. A condessa ainda respirava. Louis teria que matá-la, caso contrário ela iria virar uma vampira. Imagine uma pessoa ruim como aquela com os poderes de um ser da noite! Com a mesma barra que estava em mãos Louis nem pensou duas vezes e cravou ela no peito da nobre russa, destruindo seu coração com o impacto. O cenário foi desolador. A condessa destroçada, com o corpo arruinado e seu condutor afogado no próprio sangue. Louis então viu que ambos estavam mortos. Ele calmamente pegou seu elegante chapéu, sua capa e sua bengala sueca e saiu, tranquilamente pela rua, encoberto pela noite, que agora, após tantos anos como vampiro, aprendera a amar mais do que tudo nessa existência noturna.

Cap. V - A Jovem Estefânia
Depois de encontrar vários textos avulsos fui nas principais bibliotecas nacionais em busca de manuscritos. Quem sabe poderia haver algo sobre esse estranho personagem chamado Louis de Bourges. Acabei me deparando com uma série de manuscritos que podem ser catalogados em ordem cronológica. Muitos deles com informações preciosas. A maioria deles datam a pattir de 1850 e são creditados a uma suposta família Bourges. Ali estão registros de avô, pai e filho. Minha opinião? Todos foram escritos pelo próprio Louis, que ia assumindo novas identidades conforme o tempo ia passando. Assim Louis I era o mesmo Louis II e Louis III. Era a mesma pessoa, o mesmo vampiro, escrevendo suas experiências enquanto as areias do tempo iam se acumulando em sua existência.

O tal de Louis Bourges II surge por volta de 1850. Ele se auto denomina estudante de direito, indo pela primeira vez para a Universidade Jurídida de Paris. É curioso. O Louis original nada mais tinha sido do que um devasso na corte de Maria Antonieta. Agora, passados décadas da morte da rainha, ele parecia se inclinar para os estudos. A leitura de livros era o seu foco. Se tornar um jovem e promissor advogado um de seus objetivos. Sobre isso, datando de março de 1850, o novo Louis escrevia em uma carta enviada para uma tal senhorita Estafânia ou Estefânia (a letra estava bem ruim, borrada pelo tempo): "Eu quero um novo recomeço em minha existência. Os dias de loucos parasitas ficaram para trás. Se há algo que aprendi nessa minha vida é que os livros engrandecem o homem. A busca pelo saber e pela sabedoria é o grande desafio. Oh, como eu tinha uma vida tola! Agora... novos tempos, novos desafios..."

Esse Louis II era bastante empenhado na sua nova profissão. Ele se tornou advogado pela luta dos trabalhadores pobres. Quem diria que um antigo nobre, da corte mais luxuosa e fútil da história da Europa, iria se dedicar tanto ao campo das lutas sociais? Em um texto que encontrei na biblioteca o jovem jurista Louis proclama por igualdade: "Os trabalhadores, que geram toda a riqueza, vivem na mais completa pobreza. Uma classe de novos burgueses, sugam toda a riqueza da nação." Quem diria mesmo. Os ideais de um socialismo utópico agora calavam alto no peito daquele jovem homem de estudos jurídicos.

Mas os sonhos, pelas minhas pesquisas, iriam durar pouco. O jovem Louis II foi preso e julgado pelo crime da morte de uma jovem chamada Estefânia Saint - o mesmo nome que encontrei na carta citada. Ela foi encontrada na beira de uma estrada de terra, mordida no pescoço. Pelo visto Louis não conseguiu conter seus impulsos vampirescos e colocou tudo a perder. Ele foi visto subindo na carruagem da jovem donzela pouco antes de seu corpo ser encontrado sem vida. Embora fosse um bom advogado ele não conseguiu convencer os jurados de sua inocência. Acabou sendo condenado pela morte da garota, pegando 40 anos de prisão em uma cadeia de Nice. Depois de poucos meses ele fugiu e desapareceu para sempre das páginas dos jornais.

Foi então que Louis III apareceu. Ele dizia ser o filho de Louis II (balela, era a mesma pessoa). Através de um rápido inventário herdou todos os bens e imovéis do suposto pai. Vendeu tudo e foi embora de Paris para sempre. Ao que me consta esse terceiro Louis foi para a Romênia, onde comprou uma grande propriedade rural, que contava inclusive com um castelo medieval. Estaria Louis agora pensando em levar uma vida de Conde Drácula, igual ao famoso personagem da literatura? É possível. Por isso nem pensei duas vezes e fui até a região onde ele morou até, segundo meus registros preliminares, 1880. Estaria eu seguindo as pistas certas? Veremos no próximo capítulo.

Cap. VI - Londres, 1888
Um dos escritos mais interessantes do Lord Vampiro se refere a Jack, o Estripador. Isso mesmo. Colocarei aqui suas impressões na íntegra: "Em 1888 eu fui até Londres. Quando estava em Paris soube que havia um assassino insano nas ruas da cidade, em um bairro pobre, cheio de prostitutas, chamado Whitechapel. Em um primeiro momento pensei se tratar de um membro da minha linhagem, um desgraçado chupador de sangue, que havia enlouquecido, matando e estuprando mulheres que eram conhecidas como desafortunadas, mulheres pobres, com problemas de alcoolismo, que vagavam pelas ruas e ofereciam seus corpos a quem estivesse interessado. Pobres mulheres perdidas nesse mundo vil e violento, devo dizer que senti pena delas.

Infelizmente, para meu infortúnio, descobri que as mortes tinham cessado quando finalmente coloquei os pés naquela cidade suja, sempre com céu nublado e muita neblina asfixiante. Apesar de todo o glamour e pompa da rainha Vitória, devo dizer que viver ali naquela pocilga não era a melhor coisa do mundo. Sempre preferi o belo litoral do sul da França, isso apesar de como é óbvio, não poder desfrutar das praias ensolaradas daquela região. Mas voltemos, voltemos, porque tenho uma revelação a fazer. Muito provavelmente ninguém vai resgatar esses meus escritos das areias do tempo, mas vou escrever, porque hoje é uma noite particularmente sombria.

O verdadeiro Jack, o Estripador era um pobre coitado corroído pela doença mental chamado Aaron Kosminski. Ele era um imigrante polaco, de origem judaica, que foi para Londres atrás de seu irmão mais velho que abriu um pequeno comércio de vendas de roupas para mulheres. O Aaron era o filho mais jovem dessa família. Ele foi criado sem pai, pois esse morreu muito cedo. Os judeus sofriam forte perseguição na Polônia. Por isso parte da família Kominski se mandou para a Inglaterra. Lá eles mudaram seus nomes para Abrahams. Primeiro porque era mais fácil de pronunciar na língua. Segundo, porque eles tinham medo de serem reconhecidos como judeus que eram. O medo era grande naquela época.

Aaron Kosminski matou aquela mulheres porque estava em surto psicótico. Ele tinha esquizofrenia e iria passar o resto de sua miserável vida em um hospício imundo. Ele nunca escreveu aquelas cartas para a polícia de Londres se auto denominando Jack, o Estripador. Ele era analfabeto. Quem escreveu as cartas foi um jornalista que queria afinal de tudo vender jornais. Era o seu negócio. Penso até que esse louco do Kosminski sequer sabia o que estava fazendo. Ele não tinha consciência de seus crimes. Quando cheguei a Londres fui com o objetivo de trucidar o assassino Jack, mas quando descobri a verdade, simplesmente desisti. Não valia a pena. Eu tive pena e nojo dessa criatura.

Por fim mais uma revelação. Os judeus de Londres sabiam que Aaron Kosminski era Jack, mas esconderam a verdade. Por qual razão? Eles tinham receios que uma onda de violência contra judeus iria explodir depois que a verdade fosse espalhada. Por isso decidiram resolver a questão de uma forma menos escandalosa. A família de Aaron Kosminski o levou até um hospício e de lá ele nunca mais saiu. Morreu pesando 30 quilos, completamente louco, envolto em sua própria mente doentia. E isso foi tudo. Queria saber quem foi Jack, o Estripador? Está aí toda a verdade, pobre mortal..."

Cap. VII - Estrasburgo, 1899
Entre os escritos há uma carta não enviada pelo Lord Vampiro. Está endereçada a uma tal Thatiana. Provavelmente um amor do passado. Segue seu texto: "Estrasburgo, 2 de janeiro de 1899. Querida Thatiana, lhe escrevo para contar minhas últimas novidades. Recebi sua carta no último fim de semana e decidi responder, afinal sou um cavalheiro. Estou no momento nesse bonita cidade na fronteira com a Alemanha. Há meses fico na dúvida se devo ultrapassar a fronteira. Não gosto muito da cultura alemã, nem de sua culinária. Na dúvida fica onde estou, curtindo o tempo passar, enquanto faço mil planos.

Viver, de certa maneira, é fazer planos. Alguns dão certo e outros dão terrivelmente errados. Soube que você se casou com aquele sujeito. Olha, vou ser indelicado. Aquele não é homem para você. Além de já ter traído sua confiança, é um homem sem estudos, sem formação cultural. Fruto de uma cidadezinha do interior, rude e desprezível. Penso que ele vai ser um estorvo por toda a sua vida. Você vai carregar esse indíviduo nas costas, por toda a vida. Ele até pode ser bonito no momento, mas o tempo vai passar. Ele vai ficar gordo e tudo o que vai sobrar em sua vida é um homem ignorante e estúpido que você vai sustentar. Estou sendo rude? Pode ser, porém não tão rude como será seu casamento com ele. Essa é minha opinião sincera. Lamento dizer.

Em relação a mim, adotei a solteirice completa. Ser solteiro é ter liberdade. Hoje estou aqui, amanhã... não sei. Possa ser que acorde e decida fazer uma viagem. Ninguém vai ter nada a ver com isso. Não terei que dar explicações a ninguém. Tenho uma prima. Ela reclamava de que seus pais a prendiam muito. Então se casou precocemente "para ter liberdade". Pobre mulher! Saiu das algemas de pais opressivos para uma nova jaula, agora controlada pelo marido. Triste destino. O homem solteiro vive por si. Tem suas próprias aventuras. Curte a noite, saboreia o luar. Casamento é uma das piores invenções humanas. Aprisiona em correntes, quase sempre enferrujadas. É um contrato. E como todo contrato a pessoa só  assina se quiser. Prefiro não colocar minha assinatura em um papel desses. Prefiro ter minha carta de alforria.

Sobre os amigos dos tempos da faculdade, nunca mais vi ninguém. Devo dizer que sinceramente falando muitos deles eu apenas suportava. Era muita conversa vazia sobre esportes. Você descobre o quão um homem é vazio pelo teor de suas conversações. Se ele só fala em times e jogos, pode ter certeza que há um idiota na sua frente. A maioria dos que conheci na universidade eram assim. Uma gente bem decepcionante, devo confessar. Os suportava na época do curso de direito, mas agora não preciso mais suportar aquela gente. Com a graduação fiquei livre de todos eles, graças a Deus! E pensar que outro dia um velho conhecido me enviou uma carta de Toulouse me convidando para uma reunião de velhos alunos. Deus me livre de um destino desses! Não quero... não quero... não desejo mal nenhum para aquelas pessoas, mas ao mesmo tempo também não quero eles por perto. Aguentar cinco anos de sua companhia já foi o bastante... Hoje só sento para conversar com quem tem algo interessante a dizer. Falar sobre cultura, artes e filosofia. Todo o resto me parece tempo perdido. Então é isso minha cara amiga. Desejo tudo de bom para ti e suas filhas. Abraços de seu eterno amigo Louis."

Cap. VIII - O Vampiro Guitage
Por volta de 1904 ou 1905, o Lord Vampiro Louis conheceu um curioso vampiro latino-americano conhecido nos meios obscuros das ruas sombrias de Lisboa simplesmente como Guitage, ou resumidamente Gui. E quem era essa criatura das trevas? Não se sabe ao certo. Ele ficou obcecado por sangue de lindas virgens da capital portuguesa. Por seu sotaque e forma de agir ele provavelmente tinha origem além-mar, talvez no distante e exótico Brasil. Só que Gui não falava sobre seu passado, como se escondesse algo trágico. E quando não se fala muito sobre o que passou, se abrem janelas para especulações.

Era um vampiro antigo, provavelmente trezentos anos. Dizia-se que havia sido mercador de escravos para o nordeste brasileiro. Outras fontes diziam que havia criado uma rede de masoquismo no novo continente, o que fez com que fosse perseguido pelos colonos. De uma maneira ou uotra, por volta do século XVIII ele finalmente subiu em uma velha nau holandesa de madeira e foi para a Europa. Essa estranha figura se instalou em Lisboa, onde abriu uma taverna que só funcionava a partir do crepúsculo. Ali, dizia-se (sempre muito boatos envolvidos) que ele mantinha uma casa de tolerância com beldades inglesas que importava para Lisboa. Esse vampiro - sim, eu o conheci e sei do que estou falando - tinha mesmo preferência por mulheres jovens a quem podia sugar o sangue, participando de orgias sexuais sem fim.

A vida devassa e inescrupulosa de Guitage fez com que Louis cruzasse seu caminho. Havia um código de ética entre vampiros europeus e essa sombra noturna estava violando todas essas regras não escritas. Havia rumores que Gui estava transformando algumas de suas raparigas em vampiras, o que ia contra todo o protocolo de comportamento de um nobre bebedor de sangue humano. Assim Louis resolveu visitá-lo, como se fosse um mero cliente de seu estabelecimento de prostituição sádica.

Louis, que havia vivido na luxuosa corte de Maria Antonieta, achou o cabaré de Gui um verdadeiro horror estético. Com cortinas vermelhas escuras, clima de pura decadência moral, não era o lugar adequado para se levar alguém de bom gosto e valores morais. Gui sentava-se ao centro do grande salão e comandava suas prostitutas de inferno. Logo Louis percebeu que pelo menos duas ou três delas já estavam transformadas. Um absurdo vampiresco, transformar aquelas cadelas em nobres de sangue. Ele obviamente deveria ser punido.

Guitage, o vampiro-gigolô, havia cruzado um limite. E eu sabia que deveria eliminá-lo depois daquela noite. Houve uma grande surpresa na noite que Louis adentrou aquele recinto. Todas as noites um baile Dantesco era realizado, onde todos os convidados ficavam completamente nus. Era engraçado e mórbido nas mesmas proporções. Certo, as mulheres propiciavam uma bela vista, pois eram mulheres bonitas, de seios fartos. Já os homens, gordos e de barrigas salientes, destruíam a imagem global daquele festim de horrores. E no bordel de Gui havia dois tipos de homens. Os ricos estavam ali para depois realizar favores de corrupção para aquele ser da noite. Já os pobres e mais jovens seriam sua janta, já na alta madrugada. Afinal Gui também não tinha reserva de apetite para sua sede de sangue humano.

Louis ficou em sua mesa, olhando ao redor. Ele apenas ficou olhando pelo canto do olho enquanto tomava um vinho do Porto de boa procedência. Gui se aproximou e quis conhecer aquele cavalheiro estranho que ele nunca havia visto. Pelo seu sentido de ser da noite sabia, mesmo que de forma inconsciente, que era um de seus pares. Apresentações formais foram feitas e Guitage sentou alguns instantes com aquele nobre com sotaque francês. Algo soava no ar, um estranho clima de doce veneno. Aqueles seres sabiam que em pouco tempo haveria um jogo de vida e morte prestes a começar sob a luz da lua cheia.

Cap. IX - Ruas Sangrentas de Lisboa
O Lord Louis tinha planos de matar Guitage, mas decidiu que deveria ser algo bem planejado, sem pressa, tudo deveria ser executado de forma minuciosa. Para sua surpresa, enquanto tecia planos e mais planos em sua mente, o vampiro Gui foi encontrado morto em sua taverna esfumaçada e escura. As investigações apontavam para uma certa mademoiselle Cuca. Essa jovem moça era uma das escravas sezuais do vampiro. Uma pessoa que sofreu atrozes torturas em suas mãos por anos e anos. Depois de muitos abusos, o caldeirão um dia iria entornar. Ela o havia matado com requintes de crueldade.

Guitage foi encontrado pelos policiais completamente calcinado. Impossível reconhecer. Porém havia dois detalhes determinantes que chamaram muito a atenção de Louis na noite seguinte quando leu os jornais com as notícias. Em volta do pescoço de Gui havia um arame farpado que o prendia a um crucifixo. E em seu peito uma grande estaca havia sido fincada. Isso provava duas coisas importantes. Primeiro que Guitage estava definitivamente morto. Nenhum vampiro iria sobreviver aquele tipo de agressão com ares de culto religioso, seguindo bem de perto o manual dos matadores de vampiros. Segundo, o mais importante, é que quem o matou sabia que estava matando um vampiro. Teria sido apenas a mademoiselle Cuca ou alguém com os adequados conhecimentos a havia lhe ajudado?

De uma maneira ou outra, Louis comprou uma passagem de viagem para a Espanha naquele mesmo dia. Lisboa era uma bonita cidade, mas o excesso de igrejas e catolicismo o incomodava muito. Nas pequenas ruas de pedras seculares sempre havia uma procissão passando, gente rezando. Para falar a verdade ele nunca havia conhecido um povo tão religioso como aquele. E isso, para um vampiro, era a pior parte. Ter que ficar ouvindo aquelas ladainhas, aquelas orações que pareciam nunca chegar ao final, o incomodava bastante. Era muita carolice para um vampiro velho como aquele.

Assim que anoiteceu ele então subiu na carruagem e foi embora rumo à Espanha. Essa seria a última vez que Louis iria fazer uma longa viagem com carruagem. A modernidade havia chegado também na Europa. Os carros estavam dominando as estradas. O próprio Louis achava aquela máquina algo intrigante. Ele costumava zombar um pouco, dizendo que eram carruagens sem cavalos, porém quem poderia deter o progresso? Ao longo dos séculos ele nunca havia visto uma prova concreta da existência de Deus, mas todos os dias se espantava com a capacidade da ciência em inovar e trazer melhorias para a sociedade. Seria a ciência o verdadeiro Deus da humanidade? De vez em quando ele se pegava com esse tipo de questionamento passando por sua mente.

Cap. X - Perdido nas areias do tempo...
Depois de muitas pesquisas só uma velha carta, amarelada pelo tempo, foi encontrada desse singular personagem. Era o ano de 1914, não por acaso o ano em que explodiu a primeira guerra mundial. Depois dessa data e dessa carta nada mais foi encontrada sobre o Lord vampiro Louis em bibliotecas da Europa continental. O que terá acontecido? Por onde andou? Estaria ainda vagando nas noites escuras? Pela importância do registro histórico passo a seguir a publicar na íntegra a carta escrita pelo ser noturno.

"La Rochelle, 28 de julho de 1914. Prezado Lobothan, Pelo visto a guerra eclodiu de vez em nossa querida Europa. Não há mais heróis e nem vilões. O morticínio será trágico e de proporções imprevisíveis. Eu sabia que mais cedo ou mais tarde a Casa de Habsburgo iria levar todos para a ruína completa. Nunca gostei dessa gente, são seres desprezíveis. Além de parasitas inomináveis, também são gigolos de suas próprias filhas. Desde os tempos anteriores a Maria Antonieta, todas as arquiduquesas eram prostituítas pelas casas reais afora. Os cretinos até mesmo diziam que deveria se fazer casamentos, ao invés de guerras. Sempre foram gananciosos e facínoras, isso sim! Nunca me enganaram.

E agora todos esses jovens vão para os campos de batalhas, onde morrerão por coisa nenhuma. O patriotismo é uma estupidez. O militarismo só bate forte em mentes de debeis mentais. Morrer pelo quê? Morrer por quê? As guerras são lugares terríveis onde jovens morrem através de outros combatentes que não conhecem e nem odeiam, tudo por causa de velhos políticos que se conhecem e se odeiam. Coloquem todos esses patifes em ringues de lama e lá que eles resolvam seus problemas pessoais e políticos. Não enviem jovens para o campo da morte. É isso o que penso sobre tudo o que está acontecendo... Assinado, cordialmente, por seu amigo Louis"

Há um obituário em nome de Louis datada de meados de 1916, nessa mesma cidade de La Rochelle. Esse nobre senhor foi encontrado morto em sua pequena cabana nos arredores da cidade. Morreu tranquilamente enquanto lia um livro de ciência política. O senhor Jean Lobothan cuidou de seu funeral. Ninguém apareceu, apenas o padre Mckenzie que leu alguns salmos, enquanto o caixão de Louis descia em sua cova. Era uma manhã gelada de inverno. A senhora Eleanor, que havia sido sua governanta nos últimos meses jogou um pequeno buquê de flores violetas. Depois todos se cumprimentaram e deram as costas, deixando Louis para a eternidade. E os flocos de neve começaram a cair suavemente em seu ataúde preto com detalhes dourados...

Pablo Aluísio.

Cartas Vampirescas

Cap. 1 - Eu, o Vampiro...
Eu, Lord de Stlevanisk, figura antiga, figura que cruzou os séculos, deixo aqui alguns registros do que vi com meus próprios olhos. Me tornei vampiro há séculos, já andei com patifes, piratas, homens do governo, políticos ditos respeitados, chefes de governo e Estado e posso dizer que todos são iguais. A raça humana é escória, imundície. Não valem nada. Me tornei vampiro ao renegar a cruz de Cristo. Ele era um bosta, um revolucionário fracassado do século I, não tinha nada de sagrado e nem de Deus. Uma mentira, uma farsa que enganou milhões e continua enganando. A mente humana é ridicularmente medíocre e obtusa. Os romanos mostraram a ele como se trata de terrorismos em geral. Levou uma surra enorme, depois morreu pendurado numa cruz. Os abutres comeram sua carne, o resto caiu no chão para os cães comerem. Ressuscitou nada, quando falam isso eu dou uma grande gargalhada...

Estava com sede. Ontem de madrugada visitei o apartamento de uma velha professora. Deveria ser uma pessoa inteligente, mas me deparei com uma mulher burra e grosseira, de baixos instintos. Não era bonita, embora fosse vaidosa. Tinha os cabelos nada naturais, cafonas, banhados em química por décadas para tentar preservar uma juventude que não mais existia. Pessoa patética. Você nunca mais será jovem! Já é uma velha decrépita. Ninguém mais lhe quer. Seu futuro será o frio túmulo, sendo corroída por vermes decompositores que certamente vomitarão ao consumir sua carne fétida e imunda.

Imunda a define bem! Uma fascista imunda! Adepto de torturas e porões da ditadura. Quando soube que gostava de torturas lhe dei um gostinho do que é uma tortura. A massacrei lentamente, tirando inicialmente sua pele, como se faz a um coelho abatido. Pele de gente velha, cheia de manchas e rugas. Não servia para nada aquela pele. Joguei no lixo. Com a sua carne viva resolvi me divertir. Joguei sal em cima. os gritos dela foram bem interessantes, me divertiram um pouco. Voz feia, voz de gente velha. Ninguém liga se grita. Acham que é uma louca tendo crises. E no fundo ela era uma louca mesmo! Pensei em fazer um serviço de reciclagem para melhorar o mundo! 

Depois disso cortei seus dedos, orelhas e seios. O sangue jorrou. Bebi um pouco e me arrependi. Como era uma velha tomava muitos remédios. O sangue ficou com gosto péssimo. Como não servia mais para nada arranquei sua cabeça em um só golpe. Existem pessoas que não servem mais para nada, nem para jogos mortais com um velho vampiro que sou! Decidi que só vou atrás das mulheres jovens daqui em diante. Chega de velharias inúteis. Eu quero é sangue jovem! Etarismo? Pois é, palavra nova para velhos preconceitos. Eu me tornei vampiro para nunca perder a minha vida e a minha juventude. Devo ser mesmo um bastardo preconceituoso. Minha mentalidade é de séculos atrás, por isso não me julguem. Enquanto penso isso limpo meu elegante terno do sangue daquela velha imunda. Ah, os ossos do ofício... 

Cap. 2 - Velhas Cartas...
Encontrei velhas cartas no porão, algumas banalidades, mas algumas com aspectos interessantes, lembranças de um tempo passado que jamais voltará novamente... Passa a transcrevê-las a partir de agora...

Londres, 19 de setembro de 1873
Chuvas noturnas, ruas escuras, coração entristecido. Ando por essas ruas sombrias lembrando do amor que nunca veio. Era uma mentira. A doce pela qual estava apaixonado era uma fraude. Não era a bela mulher de meus sonhos, ao contrário disso era uma vulgar. De classe social superior se achava mais importante, mais relevante, certamente se considerava superior à minha pessoa. Só que na verdade era uma figura lamentável, feia de corpo, baixos instintos. O rosto poderia ser considerada bonito, com muita boa vontade, mas no geral era bem mal organizada. O amor veio da minha própria solidão e não daquele ser que hoje sei ser abjeto. 

Porca imunda, coberta de sífilis e outras doenças sexualmente transmissíveis. Morta moral, rameira suprema. Fizeste de seu corpo um playground para qualquer um. Imunda faceira, rosnando na areia de vômito e gozo de outros. E pensar que nutri bons sentimentos por esse tipo de pessoa asquerosa. Teu futuro virá e será triste. Mando mil demônios em sua direção. Lepra será bem-vinda depois de saberes o mal que lhe desejo. Amaldiço seu passado, presente e futuro. Que seu espírito sempre imundo seja acompanhado em suas carnes decompostas. Vaca de brejo imundo. 

Riu de mim naquele salão vitoriano. Rirei de você em meus pensamentos. Não terás filhos, todos serão mal formados de suas mpurezas. Vermes estarão nas tuas entranhas. De suas raízes nada brotará, a não ser infâmia, desabor e decepção. Quero ir em sua cova dar uma cusparada eterna. O cadarro escoerá de sua foto bem posada. Nada sobrará de sua existência. O esquecimento será sua última químera. Bons ventos a aguarda nas profundezas do inferno mais vil. Morra, apodreça, finde para todo o sempre! Imunda, imunda...

Cap. 3 - O Túmulo dos Mares
Paris, 16 de abril de 1912
Cá estava eu em uma belo café de Paris quando me deparei, lendo o jornal daquele dia, que o navio HMS Titanic afundou no Atlântico Norte, levando para o fundo do mar mais de 1500 almas! Que desperdício de alimento, meu caro Azmodeus! E tudo aconteceu porque o maldito navio bateu em um iceberg naquelas águas geladas! Pois é, a maioria das pessoas morreram congeladas mesmo. Ao cair naquele oceano frio não restou outra chance para elas. Vão com Deus, os pobres. Vão com o Diabo, os ricos. Afinal não foi o Nazareno que disse que era mais fácil um camelo entrar no buraco de uma agulha do que um rico entrar no reino de Deus? Então, estão todos fritando agora. Imagine que destino, morrer na água gelada, pagar seus pecados no inferno em chamas. Só dando risadas! 

A ironia pessoal é que quase comprei um ticket do Titanic quando estava pensando em viajar para os Estados Unidos. Desisti na última hora, após ver algumas fotos de cowboys! Gente suja aquela! Obviamente não conseguem ter um dente na boca. Cheiram a bosta de vaca, passam anos sem tomar banha. Detesto gente mal cheirosa. Assim, desisti daquela terra de bárbaros e vim para Paris onde posso desfilar com minhas roupas finas, meu monóculos elegante e minha bengala com esquifes de leões de marfim. 

Viro a página e vejo que a polícia de Paris procura por uma modelo francesa desaparecida na calada da noite. Hahahahaha... Não vão achar, crianças de azul. Ela esteve em meu menu ontem à noite. Confesso que foi mais do que um lanchinho e menos do que um cardápio refinado. Ela não era de alta estirpe. De certo modo era uma mulherzinha pé de chinelo que fazia muita força para parecer da alta sociedade. Eu a degustei como quem devera uma comida de rua. Estava com fome. Nem sempre comemos os mais finos pratos franceses. Algumas vezes nos contentamos com comida rápida! 

Ser imortal tem seus problemas. Não faça amizades íntimas, não seja amigo de ninguém, prefira a solitude. Viver sozinho, quando você tem vida interior rica e extensa, pode ser o maior dos prazeres. Por isso, faminto vampiro, adquira cultura! Vá aos museus, leia os melhores livros, visite os mais requintados teatros - e os populares também, para falar mal. Adquira cultura que você no final de tudo nunca estará realmente sozinho...

Cap. 4 - Sangue sobre a Alemanha
Berlim, 30 de janeiro de 1933
Estou em Berlim, onde vim passar um fim de semana agradável em meu hotel preferido da cidade. Assim pensava eu. Quando cheguei na cidade, já tarde da noite, encontrei um clima realmente péssimo. Chove muito e está frio, mas não é nada disso o que estou tentando descrever. A Alemanha tem um novo chanceler, um sujeitinho ridículo chamado Hitler. Esse é daqueles que não tem vergonha de ser bestial. Só defende as bandeiras erradas e para minha surpresa nessa culta e sofisticada Alemanha muitos o seguem de forma fanatizada. Estou impressionado com a perversidade desses nazistas. Nenhum vampiro se equivale. Sao malvados e perversos, cheios de preconceitos e muito ódio, ódio visceral é bom esclarecer. 

Odeiam judeus, mas não apenas eles. Odeiam qualquer um que não seja alemão, loiro e alto. São assumidamente racistas e escrotos e muitos dos mais velhos o seguem despudoradamente. Esses velhos se dizem conservadores, andam com o livro sagrado nas mãos, rezam de forma fervorosa. Rezam para que os diferentes sejam mortos. São pessoas péssimas, sinceramente falando. O velho JC ficaria horrorizado em ver no que sua mensagem se transformou na mente desses idiotas violentos...

Nunca pensei que gente culta, com nível educacional superior, iria se prestar a uma coisa dessas, mas é a pura verdade. Eu confesso que a Europa caminha mal tendo uma de suas principais nações nas mãos desses loucos. O que poderá vir pela frente? Eu não sei, mas sei que boa coisa não virá...

Com essa nova ideologia perversa as ratazanas saíram dos esgotos. Nem disfarçam mais como pensam ou o que querem. Desejam morte, clamam pela morte. Eu tenho quinhentos anos de existência e nunca vi nada igual. E tudo potencializado por um sistema de propaganda política poderosa, que aliena, faz lavagem cerebral e aprisiona mentalmente o sujeito. Quem já tinha propensão à doença mental então, nem se fala. Loucura... essa é a definição do que ocorre na Alemanha nos dias de hoje, no dia em que escrevo essa carta. Prevejo em breve um mar de sangue por toda a Europa...

Cap. 5 - A Cruz e o Vampiro
Roma, 19 de junho de 1878
Eu sou um vampiro. As pessoas podem perguntar se eu tenho medo da cruz. Tenho nada! Isso é coisa da literatura. Não tem porque ter medo da cruz. O JC foi um revolucionário judeu que tentou lutar contra a dominação romana e se deu mal. Vamos encarar a realidade. Ele não era aquilo que as pessoas pensam. Hoje em dia a palavra Messias nos leva a uma ideia de algo espiritual, de ser superior nesse sentido. Nos tempos do JC ser Messias significava ser um líder político. O Messias era o Rei. O filho de Deus era um título dado ao Rei. JC queria ser o Rei Judeu que expulsou os romanos. Se deu mal. Foi preso, crucificado e morto. Não teve isso de ressurreição. Cresçam meninos. Nenhum homem jamais ressuscitou na história da humanidade!

Outra coisa: a cruz era um instrumento de tortura usado pelos romanos para matar os inimigos do Estado. Nada mais do que isso. JC ficaria certamente horrorizado se soubesse que a cruz daria origem a uma religião em seu nome. Seria o fim para ele. Era como se um enforcado fosse representado religiosamente por sua forca. Um absurdo completo, vamos falar a verdade. 

Assim, diante de todos esses argumentos, porque diabos eu teria medo da cruz? Não. não tem nenhuma lógica nisso tudo. Além disso geralmente o crucifixo é levantado por membros do clero católico. Hei, psiu, vou te contar um segredo: Tem poucos santos dentro desse clero. Quase nenhum! O que existem são muitos homossexuais embaixo das batinas. Ande de madrugada pelas ruas próximas ao Vaticano. Você vai encontrar vários desses religiosos do clero em busca de uma companhia masculina. Sim, a maioria é homossexual! 

Então eu vou sair correndo por causa de um homossexual cheio de pecados (dentro da doutrina que eles mesmos dizem seguir), segurando uma representação de um instrumento de tortura romano, símbolo de uma religião criado por um insurgente judeu contra os romanos no século I? Mas que lógica existe nisso? Por favor me poupe de suas crendices bobobas...

Cap. 6 - Jack de Whitechapel
Londres, 10 de novembro de 1888 
A cidade só fala nisso. Jack, o Estripador, voltou a matar na noite anterior. Antes de mais nada devo defender a minha classe. Não, Jack não é um vampiro. É apenas um porco sádico e demente. Vampiros são elegantes e matam para sobreviver, afinal precisamos do sangue quente dos seres humanos. Esse Jack é claramente um doente mental. ele mata essas pobres mulheres que vivem pelas ruas como prostitutas, tentando de forma desesperada ganhar a vida e depois as mutila de forma horrenda. Eu nunca faria aquilo com uma mulher que morderia seu pescoço. Tem que respeitar a vítima. 

Dentro da nossa comunidade sabemos quem é Jack, o Estripador. Os vampiros sabem tudo o que acontece na noite. Só que não ajudaremos aos policiais, esses porcos que muitas vezes nos perseguem sem razão alguma. Eu me lembro do que aconteceu com Lara, uma jovem vampira que foi massacrada por esses imundos. Não, não faremos nada para facilitar seus trabalho. Trabalhem porcos, trabalhem...

Mas como essa é uma carta confidencial direi a você quem é Jack, afinal devemos nos informar. Ele é um sujeito que sempre viveu ao lado do irmão em um dos bairros mais pobres de Londres. Ele é um imigrante de uma família que veio da Polônia em busca de trabalho e de uma vida melhor. Seu nome é Aaron Kosminski. Trabalha como barbeiro e açougueiro em espeluncas de Whitechapel. É um tipo rude, porcalão, vulgar e sofrendo de uma grave doença. 

O dito cujo contraiu sífilis de prostitutas londrinas. Por isso as odeia, por isso quer matar todas elas. A doença esta corroendo seu cérebro. Ele está enlouquecendo aos poucos. Vai terminar seus dias em uma instituição para loucos, urinado em si mesmo, comendo fezes pensando ser comida. Esse é o tal Jack, o Estripador. Não tem nenhum glamour nele. Apenas miséria, pobreza e desespero insano. E assim caminha a humanidade. 

Cap.7 - Asas Sobre a América
New Orleans, 23 de janeiro de 1940
O mundo está novamente em guerra. Quando afirmo que a humanidade não vale nada, falo com convicção, minhas queridas criaturas da noite. Há um cheiro de falso moralismo e patriotismo verdadeiro no ar. O presidente americano reluta em entrar na guerra, principalmente em uma guerra na Europa onde não faz muito tempo muitos jovens americanos perderam suas vidas. Se a Europa tem problemas, que eles mesmos venham a resolver seus problemas, assim afirmam os que defendem a neutralidade dos Estados Unidos na guerra. 

Em New Orleans fui apresentado à religião Vodu. Acho tudo um grande simbolismo, mas destituído de valores práticos. Ninguém fará mal a outro apenas confeccionando bonequinhos de argila para causar sofrimento alheio. É tudo simbólico, mas não passa mesmo de pensamento mágico. Agora, gostei da comunidade vampiresca na cidade, principalmente de lady Anne. Uma francesa muito bem educada, jovial, ali na casa dos 200 anos de idade. 

Ela me ofereceu uma recepção em sua casa ao estilo colonial. Não faz muito tempo e escravos trabalhavam acorrentados naquelas plantações de algodão. Pobre gente negra. Foram escravos por muitos séculos, tratados como animais. Depois dizem que os vampiros são perversos... nenhum vampiro escraviza outro vampiro, mas os seres humanos certamente escravizaram seus semelhantes. 

De minha parte a conversação à mesa foi agradável. Ela é uma anfitriã de mão cheia. É a tal coisa, boa postura e elegância vem de um berço aristocrático. Gente grossa com dinheiro é apenas gente grossa. Elegância e fino trato social é outra coisa. Falamos sobre tudo, mas principalmente da lástima que a Europa se tornou. Penso até mesmo em deixar o velho continente para trás... Quem sabe eu possa me estabelecer na jovem América, passando temporadas entre Estados Unidos e Canadá, que é um país dos mais agradáveis para se viver. Até porque adoro clima frio. 

Cap. 8 - Psicótico Perverso
Paris, 5 de outubro de 1823
Eu fui um ser humano normal, ha muitos anos, há muito tempo. Era jovem e cheio de vida, pensando que meu futuro iria ser brilhante. Quando me tornei vampiro, deixei as lembranças do jovem de lado Meus pensamentos sao outros. O que me levou a escrever essa cartas de lembranças foi deixar registrado na tinta da pena de meu lápis um pouco das lembranças dos meus entes familiares que como meros mortais estão todos mortos. Não tenho saudades de nenhum deles. Era um grupo de patifes da pior espécie, gente que nunca prestou! 

Eu poderia definir todos eles cmo psicóticos perversos! Hoje em dia, analisando tudo com coerência a paciência não teria outra definição para aquela gente. O grande patriarca da família, o meu avô, era um sujeito asqueroso. Batia na esposa (minha avó, claro!) e a deixava em cárcere privado. Louvado hoje em dia em prosa e verso, era em essência um tremendo de um canalha. Naqueles tempos não havia direitos da mulher e o marido podia ser o abusador supremo, que nada acontecia. Com um bando de filhos covardes, deu no que deu. Todos foram crescendo com sérios problemas emocionais. Alguns foram em vida bem doidos mesmo. O meu próprio pai não era o que se podia considerar de um sujeito normal e o pior de tudo é que ele amava aquele velho bastardo que era o seu pai. Até hoje nunca entendi como um filho que sofreu tanto nas mãos do próprio pai conseguia ter tanto afeto com ele! 

Eu não tive muito contato com esse meu avô. morava em cidades diferentes. No pouco contato que tive, criei a impressão de que ele era mesmo um sujeito estranho. Não parecia ser nada inteligente. Parecia ser rude e burrão. Não formulava nenhum tipo de pensamento mais bem elaborado. era rude e grosseiro. Eu me lembro dele cuspindo dentro de casa e isso para mim era a maior das seboseiras. Não parecia muito limpo e não era. Na família se dizia que ele nunca tomava banho. Tinha grande pés que arrastava pela casa. Não demonstrava qualquer tipo de empatia com o próximo, nem com a esposa que maltratava, nem com os filhos que ele expulsava de casa assim que atingiam a maioridade. Certamente tinha algum distúrbio mental. Provavelmente estava no espectro autista, mas naqueles tempos as pessoas comuns nem sabiam o que era isso. 

Nunca pareceu gostar de ninguém. Suas demonstrações de afeto eram estranhas. Ele tinha um cavalo que gostava muito quando jovem. Quando esse morreu, ele trouxe os ossos para os fundos de um cômodo da sua própria casa. Imagine ter um esqueleto de um bicho desses dentro de casa. O velho era muito estranho. Quando a esposa morreu, ele pareceu comemorar pois haveria um prato a menos na mesa, menos despeas. Ela havia doado toda a sua vida para viver ao lado desse velho asqueroso e ao morrer ele não demonstrava nenhum tipo de sentimento humano. Era ou não era um psicótico pervero? Depois eu é que sou chamado de monstro por ser um vampiro. Seres humanos são bem piores, pode ter certeza disso. 

O fim do velho foi trágico. Ele viveu muito, chegando a 96 anos de idade! Vaso ruim não quebra, dizia a sabedoria humana. Já tinha perdido a razão, vivia quase nu, gritando dentro de casa. A família nem tinha coragem de interná-lo em um asilo e nem tampouco de levar ele para a rua. Viveu seus últimos dias preso dentro de casa. Até que a revolução francesa eclodiu. Ele tinha títulos de nobreza e não escapou da turba. Eles o pegaram e o levaram para a guilhotina. O velho nem tinha forças mais para andar. Em poucos segundos sua cabeça rolou. Uns garotos que estavam ao pé do cadafalso jogaram bola com ela. O velho teve o fim que merecia. Depois sua carcaça foi jogada numa caçamba de lixo. Bom final para o tipo de ser humano que ele foi em vida. 

Cap. 9 - Lena, Filha de Paul 
Paris, 14 de outubro de 1890
Vampiras, de modo em geral, são mais sádicas e perversas que vampiros. Isso a experiência de séculos me ensinou. Veja o caso de Lena, filha de Paul. Uma mulher que poderia ser dita como bela, mas longe dos padrões de beleza das grandes modelos clássicas. Ele era alta, longos cabelos castanhos e belas pernas. Também destacaria seus quadris, ótimos para despertar o desejo dos homens como se falava entre os humanos. Era bem branca e tinha uma bela voz. Tinha um semblante que despertava meus desejos mais íntimos e era conhecida como Thatiana entre os mais próximos. Eu me lembro de imaginar várias vezes ela em minha cama, completamente nua. 

Só havia um problema com Lena. Ela só amava cretinos. Quanto mais imbecil e idiota fosse o homem, mais ela parecia ficar perdidamente apaixonada. Isso me fazia duvidar de seus dotes intelectuais, afinal se fosse uma mulher realmente inteligente jamais iria se encolver com aquele bastardos. O homem com quem se casou era uma piada ambiente. Um soldado raso, imbecil até dizer chega. Uma daquelas figuras que você não conseguiria nem ter uma conversação amigável de trato social. Ao que me consta ela ficou fisurada nele por causa de seus dotes penianos. Dizem que homens são escravos de vaginas bem delineadas. Ora meu caro, mulheres também se tornam escravas de homens com penis robustos. 

De qualquer maneira ela selou seu destino. Casou com ele, teve duas filhas. Entrou para um ramo protestante conhecido também pela idiotice. De bela mulher se tornou uma crente das mais feiosas. Parou de se cuidar. Ficou feita mesmo, desleixada, com seu apelo sexual indo pelo ralo depois de duas maternidades. Ainda assim eu cheguei a desejá-la alguns anos depois quando a reencontrei por acaso. Era uma ruína de mulher, não parecia nada com o tesão que conheci pela primeira vez em uma prestigiada e tradicional faculdade de direito em Paris. 

Com uma certa pena a mordi e a transformei em uma vampira. Meus caros, ela virou uma das vampiras mais perversas que se tem notícia. Lena, filha de Paul, ficou falada entre as criaturas da noite. Todos queriam saber seus últimos crimes, suas últimas atrocidades. Ela chegou a levar 20 homens negros para a cama e depois os esquartejou sem dó e piedade. E tudo com aquela imagem de garota da vizinhança. Era mesmo sedenta por sexo e sangue. Tenho que voltar a encontra-la pois como a transformei em vampira sou responsável por ela. Tenho que parar a Thatiana mais cedo ou mais tarde. Tenho que destrui-la. Sei que farei isso algum dia...

Cap. 10 - O Medíocre por Opção
Paris, 1 de outubro de 1823
O meu pai nasceu nos tempos da revolução francesa. Era um homem inteligente, mas embora tenha nascido na época certa, onde a educação e o conhecimento estava ao alcance de todos, ele nasceu no lugar errado e na família errada. Veja, meu pai era um homem inteligente, mas nasceu no meio de gente tosca, ignorante e perversa, a começar pelo próprio pai dele que mal sabia ler e escrever e era um perverso de carteirinha, que batia na esposa, filhos e até empregados com requintes de crueldade. Era obviamente um psicótico não diagnosticado! Os irmãos dele eram todos brutalizados, rudes, figuras grotescas. Assim ele deixou seu potencial de lado para afundar no meio dessa família de asnos, que apesar das injustiças que sofreu ao longo de sua vida, sempre os amou profundamente. 

Dessa forma ele que parecia ser a única pessoa inteligente no meio daqueles imbecis, acabou também se tornando um asno, deixando a escola e o saber de lado, abraçando a negatividade e burrice de todos aqueles parentes asquerosos dele. Foi um caso de história trágica mesmo. Depois, mais velho, adquiriu uma doença grave e nunca mais se recuperou. Foi definhando com essa doença grave e sem cura até a morte. Morreu abraçando a estupidez, ignorância e idiotice de seus familiares obtusos. 

Eu e meus irmãos fomos pessoas inteligentes, mas obviamente sofremos por causa da pobreza que as escolhas de nosso pai sempre fez ao longo de sua vida. Ao invés dele procurar se instruir, se formar, ele viveu de empregos medíocres e funções subalternas, algo que não era para ele por causa de sua inteligência que ele de fato nunca desenvolveu. Lutamos para subir na vida, mas sempre houve limites para pessoas pobres como nós. O pai muitas vezes pode destruir não apenas os seus sonhos, mas os de seus filhos também. 

Quando jovem eu tive muitas vezes raiva do meu pai. Muitas vezes foi grosseiro e estúpido comigo e tudo feito de forma gratuita. Quando era jovem e bem de saúde era igualmente um escroto de marca maior. Infelizmente seguiu os passos de meu avô, um sujeito pra la de tacanho. Com a velhice e a doença passei a ter piedade e compaixão. De certa maneira ele foi mesmo uma vítima, de todos aqueles parentes estúpidos, daquela mentalidade medíocre que existia entre sua própria família. Sobre eles eu sempre quis distância. Era mesmo gente rasteira, do esgoto produndo. É o tipo de gente que nunca quis ao meu redor, em nenhuma época de minha vida. 

Pablo Aluísio.