quinta-feira, 5 de julho de 2001

Direito Processual Civil. Atos Processuais.

Direito Processual Civil. Atos Processuais. Tipos de Atos Processuais. Comunicações dos Atos Processuais. Dos Atos das Partes. Dos Atos do Juiz. Atos Processuais pelos meios eletrônicos. Como são feitos na prática. Decisões recentes do STF e STJ sobre Atos Processuais. 

Segue uma exposição organizada sobre os atos processuais no âmbito do Código de Processo Civil (CPC) brasileiro, contemplando definição, classificação, comunicações, atos das partes, atos do juiz, atos por meios eletrônicos, prática e algumas decisões recentes do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e do Supremo Tribunal Federal (STF).

Se quiser, posso em seguida trazer um quadro cronológico (últimos 5 anos) de decisões que tratam de nulidade de atos processuais.


1. Definição de ato processual

  • O ato processual é toda manifestação jurídica humana praticada no processo (pelas partes, pelo juiz, pelos auxiliares da justiça) que tenha por fim constituir, modificar, conservar ou extinguir direitos ou situações jurídicas processuais. (DireitoNet)

  • Como ensina a doutrina: “o processo se desenvolve mediante atos praticados pelas partes, pelo juiz ou seus auxiliares”, formando uma “cadeia de atos”. (JusBrasil)

  • O CPC trata dos atos processuais em seu Título V – Dos atos processuais (arts. 154 a 261) – ali se disciplinam forma, tempo, lugar, comunicações dos atos etc. (TRT-2)

Características importantes:

  • São atos no âmbito do processo (“processuais”), ou seja, vinculados ao procedimento. (DireitoNet)

  • Podem ter efeitos imediatos ou depender de homologação, decisão etc. (ex: art. 200 do CPC: os atos das partes “produzem imediatamente” efeitos, salvo disposição em contrário). (Trilhante)

  • Relevância: se um ato processual for praticado de forma irregular, pode haver nulidade ou prejuízo ao direito da parte interessada.


2. Classificação / tipos de atos processuais

Podemos classificá-los sob diversos critérios. Aqui apresento os tipos centrais:

2.1 Quanto ao agente (quem pratica)

Segundo o CPC e a doutrina, distinguem-se ao menos três grandes grupos:

  • Atos das partes (autor, réu, terceiros intervenientes, Ministério Público). (JusBrasil)

  • Atos do juiz (pronunciamentos jurisdicionais, despachos, decisões interlocutórias, sentenças). (IDP)

  • Atos do escrivão ou chefe da secretaria / auxiliares da justiça (por exemplo: certidões, termos, vista dos autos). (JusBrasil)

2.2 Quanto à função ou conteúdo

Na doutrina encontra-se, por exemplo:

  • Atos postulatórios (ex: petição inicial, contestação) – inseridos nos atos das partes. (JusBrasil)

  • Atos instrutórios (ex: produção de prova, exame pericial, depoimento) – visam à instrução do processo. (JusBrasil)

  • Atos dispositivos (ex: desistência da ação, transação, renúncia) – modificam, extinguem ou prescindem do direito de agir. (DireitoNet)

  • Atos reais ou “de evento” (alguns autores classificam) – fatos ou atos que produzem efeito por si mesmos, embora nem sempre haja manifestação de vontade típica. (JusBrasil)

2.3 Quanto à forma, tempo, lugar e comunicação

  • Forma: o CPC dispõe que os atos processuais não dependem de forma determinada, salvo quando a lei exigir. Art. 154, § 1º e § 2º do CPC. (TRT-2)

  • Tempo: há regras específicas para a contagem de prazos (arts. 172 a 199 do CPC). (TRT-2)

  • Lugar: também o lugar de prática dos atos está disciplinado (arts. 172‐176 do CPC). (TRT-2)

  • Comunicação dos atos: para que produzam efeitos, muitos atos dependem de comunicação (citação, intimação, carta, Diário de Justiça). CPC trata no Capítulo IV (arts. 200 a 242) “Das comunicações dos atos”. (TRT-2)


3. Das comunicações dos atos processuais

A comunicação dos atos processuais é um aspecto crucial porque, sem comunicação válida (citação, intimação), muitos atos não produzem plenos efeitos ou podem ser anulados.

3.1 Citação, intimação, cartas

  • A citação é o ato pelo qual se chama o réu a juízo, de modo a possibilitar sua defesa.

  • A intimação é o ato pelo qual se dá ciência a alguém dos atos e termos do processo para que pratique ou possa praticar ato.

  • As cartas (cartas rogatórias, cartas precatórias) são formas de comunicação entre jurisdições ou entre juízos diferentes.

  • O CPC prevê essas formas no capítulo das comunicações (arts. 200 a 242). (TRT-2)

3.2 Forma eletrônica de comunicação

  • A Lei 11.419/2006 (informatização do processo judicial) permite que os atos e termos processuais “sejam produzidos, transmitidos, armazenados e assinados por meio eletrônico”. (TRT-2)

  • O Superior Tribunal de Justiça já reconheceu que a “intimação por meio eletrônico” (publicação em Diário de Justiça Eletrônico + comunicação à parte) tem o mesmo efeito da intimação pessoal. (Superior Tribunal de Justiça)

  • Porém há limites: por exemplo, o STJ entendeu que a citação por redes sociais (WhatsApp, Facebook etc) não está autorizada, por falta de previsão legal. (Superior Tribunal de Justiça)

  • Também importante: o tribunal passou a adotar o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) “Diário da Justiça Eletrônico Nacional (DJEN)” como meio oficial de publicação dos atos judiciais do STJ, o que afeta a contagem de prazos. (Superior Tribunal de Justiça)

3.3 Efeitos práticos da comunicação

  • A contagem dos prazos processuais frequentemente começa no primeiro dia útil subsequente à publicação no DJe ou no sistema eletrônico, conforme a Lei 11.419/06 e jurisprudência. (Superior Tribunal de Justiça)

  • A comunicação válida é requisito de regularidade do ato — se for inválida, pode haver nulidade ou devolução dos prazos.

  • No ambiente digital, advogados devem ficar atentos aos sistemas de intimação e publicação (e-SAJ, PJe, etc), porque a ciência pode se dar automaticamente ou por clique, conforme cada tribunal/região.


4. Dos atos das partes

4.1 Conceito e natureza

  • Conforme art. 200 do CPC: “Os atos das partes consistentes em declarações unilaterais ou bilaterais de vontade produzem imediatamente a constituição, modificação ou extinção de direitos processuais”. (Trilhante)

  • Exceção: a desistência da ação só produzirá efeitos após homologação judicial. (Trilhante)

  • Os atos das partes abrangem: petição inicial, contestação, reconvenção, manifestações das partes, acordos, pedidos, etc. (IDP)

4.2 Tipos/qualificações

  • Unilaterais: praticados por uma parte independentemente da outra (ex: petição inicial). (Canal Educação)

  • Bilaterais: dependem de acordo entre as partes (ex: transação, desistência após contestação). (Canal Educação)

  • Ainda: atos postulatórios, atos instrutórios, atos dispositivos. Já vistos na seção 2.2.

4.3 Efeitos e requisitos

  • Produzem efeitos imediatos, salvo previsão contrária.

  • Necessitam, em muitos casos, de observância de requisitos formais (ex: assinatura, procuração do advogado, etc).

  • Se praticados de forma irregular (ex: fora de prazo, sem procuração, etc), podem ser considerados ineficazes ou nulos.


5. Dos atos do juiz

5.1 Conceito e classificação

  • São os pronunciamentos jurisdicionais (e outros atos relacionados) que o juiz pratica no curso do processo. (IDP)

  • O CPC distingue (art. 203 e 204):

    • Despacho: ato judicial de encaminhamento, sem conteúdo decisório relevante. (IDP)

    • Decisão interlocutória: resolve questão incidente no curso do processo, sem por fim ao processo. (Wikipédia)

    • Sentença: decisão que resolve o mérito ou extingue o processo com ou sem resolução do mérito. (IDP)

5.2 Efeitos e requisitos

  • O juiz deve motivar suas decisões, observar princípios como contraditório, ampla defesa, devido processo legal.

  • A prática irregular de ato judicial (ex: sem intimação da parte, sem base legal, com ofensa ao contraditório) poderá ensejar nulidade ou anulação.

  • A publicação ou comunicação da decisão é requisito para início da contagem de prazo recursal ou cumprimento de ato.

5.3 Exemplos práticos

  • Juiz despacha: por exemplo, manda juntar documentos, designa audiência.

  • Juiz decide interlocutoriamente: indeferimento de tutela provisória, designação de perito.

  • Juiz sentença: julgando procedente ou improcedente o pedido principal.


6. Atos processuais pelos meios eletrônicos: como são feitos na prática

6.1 Base normativa

  • A Lei 11.419/2006 regula a informatização do processo judicial, permitindo que “atos e termos processuais sejam produzidos, transmitidos, armazenados e assinados por meio eletrônico”. (TRT-2)

  • O CPC também prevê que tribunais podem disciplinar a prática e comunicação de atos processuais por meios eletrônicos (art. 154, § 1º). (TRT-2)

6.2 Prática corrente

  • Petição inicial, recursos, manifestações das partes são protocoladas eletronicamente (sistemas PJe, e-SAJ, etc).

  • Publicação de decisões, intimações por meio de Diário de Justiça Eletrônico (DJe) ou equivalente. (Superior Tribunal de Justiça)

  • Comunicação via sistema eletrônico aos advogados previamente habilitados: o advogado recebe “intimação eletrônica” que poderá gerar aviso no sistema, e a contagem de prazo tem início.

  • O Superior Tribunal de Justiça implantou robôs para automatizar atos processuais, como baixas, intimações, petições. (Superior Tribunal de Justiça)

6.3 Aspectos práticos relevantes

  • A habilitação do advogado no sistema eletrônico (token, certificado digital) é pré-requisito para atuação.

  • A parte deve observar o “dia útil subsequente à publicação” para início de prazo no caso de DJe.

  • Importante controle de autenticação, integridade, para garantir validade jurídica dos atos eletrônicos. (E-Publicações UERJ)

  • Limitações: nem todos os meios são válidos para determinados atos (ex: o STJ negou a citação por WhatsApp/rede social). (Superior Tribunal de Justiça)

6.4 Desafios práticos

  • Acesso desigual a tecnologia (exclusão digital) pode comprometer efetividade. (E-Publicações UERJ)

  • Falhas de sistema ou “não ciência” podem levar a prazos perdidos ou alegação de nulidade.

  • Cuidados com segurança, certificação e problemas de autenticação ainda persistem.


7. Decisões recentes do STF / STJ sobre atos processuais

Aqui alguns destaques relevantes:

  • Em 28/08/2023, a Terceira Turma do STJ decidiu pela impossibilidade de citação por redes sociais (WhatsApp, Facebook etc) por ausência de base legal. (Superior Tribunal de Justiça)

    “A dificuldade de encontrar o réu não justifica a citação por meio de redes sociais…” (Superior Tribunal de Justiça)

  • Em 25/09/2024, o STJ publicou que os atos judiciais da corte passarão a ser publicados no DJEN (Diário da Justiça Eletrônico Nacional, CNJ) e que essa mudança afeta a contagem de prazos. (Superior Tribunal de Justiça)

  • Em 2016 (e reiterado posteriormente) o STJ já havia decidido que as comunicações por meio eletrônico (como publicação no DJe) equivalem à intimação pessoal, desde que observados os requisitos. (Superior Tribunal de Justiça)

Esses exemplos evidenciam tendências: a digitalização dos atos, a importância da forma válida de comunicação e os limites para inovação (como uso de redes sociais ainda questionado).


8. Reflexões finais

  • Os atos processuais são o “combustível” do processo — sem a prática adequada de atos das partes, do juiz ou comunicação válida, o processo não anda ou poderá ser anulado.

  • A classificação (partes/juiz/auxiliares) ajuda a organizar os deveres, poderes e efeitos de cada sujeito.

  • A comunicação e os meios eletrônicos ganharam enorme relevância e exigem atenção especial: onde, como e quando se comunica um ato pode fazer a diferença entre eficácia e nulidade.

  • A digitalização traz ganhos (rapidez, rastreabilidade) mas não elimina a necessidade de observância das garantias processuais (contraditório, ampla defesa, acesso).

  • A jurisprudência do STJ reflete que, embora o processo eletrônico seja permitido, inovações formais não previstas em lei (ex: citação via rede social) ainda geram resistência.

  • Na prática, advogados e partes devem estar atentos aos sistemas eletrônicos dos tribunais, aos prazos decorrentes da publicação eletrônica, e às formalidades: autenticação, assinatura digital, habilitação, ciência da intimação.


quarta-feira, 4 de julho de 2001

Direito Processual Civil. Ação. Definição de Ação.

Direito Processual Civil
Ação. Definição de Ação. Teorias da Ação. Teoria Imanentista da Ação. Teoria Concreta da Ação. Teoria Abstrata do Direito de Ação. Teoria Eclética da Ação.  Teoria da Asserção. Características de cada teoria. Críticas a cada teoria. Adoção do processo civil às teorias. Diferenças entre teoria Eclética e Teoria da Asserção. Teoria da Asserção e carência de ação. Efeitos práticos. Críticas contra a Teoria da Asserção da Ação. Decisões recentes sobre o tema pelo STF e STJ.

A questão das teorias da ação é central na Teoria Geral do Processo e no direito processual civil, porque trata da natureza do chamado “direito de ação” — isto é, de como se justifica e caracteriza o poder que o autor possui de provocar a atuação do Judiciário para tutela de seu direito ou pretensão. A seguir faço uma exposição analítica e crítica, abordando todos os pontos que você mencionou:

1. Ação: definição e significado

Conceito de ação

  • Em sentido amplo, a ação é o direito subjetivo público que assiste ao indivíduo de provocar o Estado-juiz (o Poder Judiciário) para que este dirima o conflito de interesses mediante decisão. É a aptidão que o particular tem de submeter uma pretensão ao órgão estatal.

  • Em sentido estrito / concreto, “ação” também designa o comportamento processual do autor (atos iniciais: petição inicial, etc.).

  • No direito brasileiro domina a visão de que ação é um direito público subjetivo, autônomo face ao direito material (i.e. não é mera derivação passiva dele).

  • O art. 5º, XXXV, da Constituição (“a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”) consagra o direito de ação como direito fundamental de acesso ao Judiciário.

A partir desse conceito surgem as teorias da ação, que procuram explicar a natureza, os limites e os efeitos do direito de ação.


2. Principais teorias da ação: panorama e características

Vou apresentar as teorias clássicas na ordem histórica, suas ideias centrais, pontos fortes e críticas, e depois mostrar qual delas (ou quais) influenciam o processo civil brasileiro.

2.1 Teoria Imanentista (ou civilista, clássica)

Ideia central / definição

  • Essa é a teoria mais antiga, ligada ao direito romano-germânico, com forte influência do direito privado. Um de seus expoentes no direito moderno é Friedrich Carl von Savigny.

  • Para a teoria imanentista, a ação está imanentemente ligada ao direito material: não haveria direito de ação se não houvesse direito material a ser tutelado ou exercido. A ação simplesmente seria a exteriorização ou meio de exercer o direito material.

  • Em outras palavras, o direito material e o direito de ação são a mesma coisa ou, ao menos, não há autonomia entre eles.

Características / implicações

  • A jurisdição e o processo são subordinados ao direito material: não haveria ação sem direito material legítimo.

  • Se o direito material do autor não existir, não existe ação ou não tem sentido o processo.

  • São muito frágeis as distinções entre direito material e direito processual.

  • A ação é concebida como algo derivado, não como direito autônomo.

Críticas principais

  • Não explica bem as ações declaratórias, em que não há violação concreta, mas apenas pedido de declaração (o autor pleiteia apenas a confirmação de que não há obrigação ou relação).

  • Conduz a uma confusão entre mérito e admissibilidade: se tudo depende do direito material, não há lugar para pressupostos ou condições processuais.

  • Não permite explicar a persistência do processo, os atos intermediários, e a existência de litispendência ou coisa julgada material: se a ação não existir por ausência do direito material, muitos institutos processuais ficam sem justificativa.

  • Não compatível com a visão moderna do processo como instrumento constitucional e autônomo.

2.2 Teoria Concreta da Ação (ou teoria do direito concreto da ação)

Ideia central / definição

  • É uma reação à teoria imanentista. Um dos autores associados é Adolf Wach.

  • Para essa teoria, o direito de ação só existe se o autor tiver de fato o direito que afirma, isto é, se a pretensão for procedente (o direito material existir). A ação é “concreta” porque está condicionada à existência real do direito material postulável.

  • A ação é vista como um direito autônomo, mas condicionado à procedência do pedido.

Características / implicações

  • A ação depende da existência do direito material (como na imanentista), mas reconhece uma separação formal entre ação e direito material — porém ele condiciona o direito de ação à procedência.

  • Se, em sentido abstrato, o autor não tiver direito material, não há ação.

  • O processo (judício) existe se objetiva concretizar um direito previamente existente.

Críticas principais

  • Se a ação só existe quando o direito existe de fato, muitos casos não poderão sequer ser levados ao Judiciário — o que compromete o acesso à jurisdição.

  • Também dificulta a delimitação entre mérito e admissibilidade: a averiguação da existência do direito material recairia desde logo na fase inicial, levando a um exame antecipado do mérito.

  • Implica que muitas demandas “deveriam ser rejeitadas” já de início, sem permitir ao autor demonstrar sua pretensão — ameaça à ampla defesa e ao contraditório.

  • Não é compatível com a noção de ação como direito público de provocação estatal.

2.3 Teoria Abstrata da Ação (ou teoria do direito abstrato da ação)

Ideia central / definição

  • Apareceu com teóricos como Giuseppe Chiovenda, Degenkolb, Plósz.

  • Para essa teoria, o direito de ação é abstrato e autônomo: existe independentemente da existência ou não do direito material que se pleiteia.

  • Basta que o autor tenha (ou afirme) uma pretensão juridicamente tutelável: não importa se no final ela será reconhecida ou rejeitada — o Judiciário só vai examinar o mérito depois.

Características / implicações

  • A ação não depende de prova da existência do direito material no momento inicial.

  • O processo deve existir independentemente de quem vença.

  • O direito de ação é um direito de petição: o autor pede que o juiz se pronuncie, mas não garante que seu pedido será acolhido.

  • A verificação da existência ou não do direito material (mérito) caberá ao juízo de mérito, e não compõe o exame de admissibilidade.

Críticas principais

  • Pode levar a excesso de demandas manifestamente improcedentes (se não houver filtro inicial).

  • Menos critérios materiais são exigidos inicialmente para “filtrar” causas que claramente não têm base jurídica.

  • Pode onerar o Judiciário, porque muitas ações sem razoabilidade terão de ser recebidas e depois rejeitadas no mérito.

  • A separação radical entre ação e direito material pode parecer artificial ou demasiado formal.

2.4 Teoria Eclética da Ação (ou teoria intermediária / temperada) — Liebman

Ideia central / definição

  • É, historicamente, uma tentativa de conciliar os excessos das teorias anteriores e veio a influenciar fortemente o direito processual moderno, inclusive no Brasil.

  • O principal nome é Enrico Tullio Liebman.

  • Para ele, a ação é um direito abstrato-autônomo, mas condicionado à presença de requisitos (chamados “condições da ação” ou “condições de admissibilidade”) que devem ser verificados antes ou simultaneamente à análise do mérito.

  • Ou seja: a ação existe independentemente do direito material, mas para que seja admitida (i.e. para que o auctor obtenha o pronunciamento do juiz, com resolução do mérito), precisa preencher certos requisitos.

Condições da ação (segundo Liebman / teoria eclética clássica)
Liebman originalmente mencionava três condições essenciais:

  1. Legitimidade ad causam — a parte deve ter legitimidade para agir (relação entre sujeito e a pretensão).

  2. Interesse de agir (ou interesse processual) — deve haver utilidade e necessidade no provimento jurisdicional pleiteado.

  3. Possibilidade jurídica do pedido — não pedir algo que o ordenamento jurídico proíba ou que seja inviável juridicamente.

Obs.: com o tempo, a “possibilidade jurídica do pedido” passou a ser vista por muitos estudiosos como elemento do mérito (i.e. não uma condição de admissibilidade). No CPC/2015, o Código optou por não usar expressamente a “possibilidade jurídica do pedido” como condição da ação, mas como aspecto do mérito. (JusBrasil)

Características adicionais

  • As condições da ação não se confundem com o mérito: elas são requisitos de admissibilidade processual, não de existência do direito material.

  • Se alguma condição for ausente, o processo deve ser extinto sem apreciação do mérito (carência de ação).

  • As condições são de ordem pública, podendo ser conhecidas de ofício pelo juiz, a qualquer tempo e grau. (Estratégia Concursos)

  • Também para Liebman, as condições devem ser observadas na fase inicial (ou antes da “resolução do mérito”).

  • A teoria eclética foi traduzida ao direito brasileiro como um modelo intermediário, adotado em linhas gerais pelo CPC. (EMERJ)

Críticas à teoria eclética

  • Alguns autores entendem que a dicotomia entre admissibilidade (condições) e mérito não é clara ou que muitas vezes serão atravessadas provas para reconhecer a ausência das condições, o que pode gerar confusão entre méritos e admissibilidade.

  • A teoria é acusada de excesso de formalismo, exigindo condições rígidas que nem sempre são fáceis de observar à partida.

  • Outro ponto é que, com o CPC/2015, o legislador não mencionou diretamente as “condições da ação” como no CPC/73, o que leva a debates se essa noção foi ab-rogada ou transformada (alguns críticos questionam se cabe ainda falar em condições da ação no novo regime). (Tede PUCSP)

  • Também há críticas de que a teoria eclética impõe um juízo preliminar rígido demais, podendo limitar o acesso à jurisdição.

2.5 Teoria da Asserção (in statu assertionis, teoria della prospettazione)

Ideia central / definição

  • É uma teoria mais moderna, que busca conciliar efetividade e economia processual com os requisitos de admissibilidade.

  • Segundo essa teoria, as condições da ação devem ser avaliadas com base nas alegações do autor contidas na petição inicial, i.e. in statu assertionis (na situação afirmada), em cognição superficial, sem investigação aprofundada.

  • O juiz, nessa fase inicial, supõe provisoriamente verdadeiras as alegações do autor, apenas para verificar se, “se tudo fosse verdade”, estaria cumprida a legitimidade e o interesse de agir.

  • Se, nessa análise superficial, as condições aparecem presentes, o processo segue. Se não, o juiz extingue por carência de ação.

  • A verificação mais aprofundada (se as alegações são falsas, se os pressupostos não se confirmam) se dá na fase de mérito. Se na fase de mérito se constatar que as alegações não correspondem à realidade ou que alguma condição não estava presente, aí sim se rejeita o pedido, com julgamento de mérito — resultando em coisa julgada material.

Características / implicações

  • A aferição inicial é simplificada, rápida, sem produção probatória profunda.

  • Evita-se que o juiz “mergulhe no mérito” para afastar a existência das condições da ação, de modo a preservar a finalidade constitucional do direito de acesso à jurisdição.

  • Ela busca um equilíbrio entre efetividade e o controle de demandas manifestamente inadmissíveis.

  • As condições da ação (legitimidade, interesse) devem estar aparentes nas alegações iniciais; se dependerem de provas complexas ou da impugnação do réu, pode-se discutir no mérito.

  • A teoria da asserção costuma tratar a carência de ação como matéria “prévia”, mas sua verificação depende da petição inicial, e não de exame profundo.

Críticas à teoria da asserção

  • É acusada de fragilizar o controle das condições da ação — admitir demandas com alegações frágeis ou inverossímeis, levando a aumento de indevidos processos que depois serão rejeitados.

  • Pode gerar insegurança jurídica, pois decisões de extinção sem maior investigação podem “descartar” causas que teriam mérito.

  • Há risco de que “alegações fantasiosas” ou temerárias sejam admitidas apenas para que o processo vá adiante.

  • A coisa julgada formada ao julgar mérito pode consolidar entendimento errado sobre ausência de condições, sem que fosse feita verificação adequada.

  • Alguns críticos dizem que a teoria da asserção “invade o mérito”, porque pressupõe que tudo que o autor alega é verdadeiro para analisar admissibilidade, o que distorce a distinção entre admissibilidade e mérito.

  • Também se discute se essa teoria é compatível com princípios do contraditório e da ampla defesa, quando decisões de extinção são tomadas prematuramente.


3. Adoção no processo civil brasileiro: qual teoria “vigora”?

No Brasil, a doutrina dominante diz que o direito processual brasileiro é influenciado pela teoria eclética (modelo intermediário). (Revisão Ensino Jurídico)
No entanto, há uma tensão muito clara entre a teoria eclética (frequentemente invocada como fundamento) e a orientação jurisprudencial, especialmente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que adota muitas vezes a teoria da asserção para verificação das condições da ação. (Superior Tribunal de Justiça)

Alguns pontos concretos:

  • O CPC/2015 não menciona explicitamente “condições da ação” como o CPC/73 fazia, mas conserva dispositivos que levam à extinção sem resolução de mérito em casos que corresponderiam às hipóteses de carência de ação (e.g. arts. 267, § 6º, 301, 485, etc.). (Tede PUCSP)

  • A doutrina majoritária entende que o CPC/2015 adotou tacitamente a teoria eclética, ou uma versão modificada dela, e que as condições de legitimidade / interesse de agir permanecem como pressupostos de admissibilidade. (Juspodivm)

  • Por outro lado, o STJ tem reiterado que para efeitos de extinção por carência, a análise das condições da ação (legitimidade, interesse) deve ser feita com base nas alegações da petição inicial (teoria da asserção) — sem exame aprofundado, salvo se o caso exigir investigação mais densa (i.e. parâmetro de mérito). (Superior Tribunal de Justiça)

  • Em suma: o processo civil brasileiro “opera” com um modelo híbrido: teoricamente eclético, mas com uma tendência interpretativa assertiva (teoria da asserção) em muitas decisões judiciais.

Essa dualidade é precisamente um dos temas centrais de debates atuais.


4. Comparação: teoria eclética × teoria da asserção

Vou destacar as principais diferenças entre essas duas teorias (eclética e asserção), com foco nos efeitos práticos:

Critério Teoria Eclética Teoria da Asserção
Natureza da ação Direito abstrato-autônomo, condicionado a requisitos (condições) Direito processual que admite as condições com base nas alegações iniciais
Momento da verificação das condições Antes da análise do mérito, fase preliminar ou incidente Na petição inicial, por cognição superficial, presumindo verdadeiras as alegações
Profundidade do exame Mais rigoroso, pode demandar análise factual ou probatória para constatar ausência de condição Exame sumário; se for necessário exame mais aprofundado, isso se desloca ao mérito
Repercussão de constatação de ausência Extinção do processo sem resolução de mérito — carência de ação; não forma coisa julgada material sobre o mérito Extinção por carência se na fase inicial a alegação não mostra condições; mas se o juiz só descobrir depois que a condição não existe, ele julga no mérito (rejeição de pedido) com coisa julgada
Segurança jurídica / controle Maior controle das condições, menor chance de demandas “fantasiosas” Menor rigor inicial, favorece acesso à jurisdição, mas pode gerar inundação de pedidos
Risco de invasão de mérito Há risco de “mergulhar no mérito” para averiguar a condição, o que alguns consideram equívoco A teoria da asserção evita que o juiz adentre o mérito para analisar admissibilidade, preservando a função inicial da petição
Compatibilidade com contraditório / ampla defesa Mais compatível com aprofundamento processual das partes Dependendo de como for usada, pode ferir o contraditório se julgamento prematuro for feito antes de oportunizar defesa

Em essência, a teoria da asserção é mais “generosa” ao autor (favorece a admissão inicial da demanda), enquanto a teoria eclética tende a exigir maior robustez desde o início, como mecanismo de filtro.

Uma diferença crucial: segundo a teoria da asserção, o juiz não deve recusar imediatamente uma demanda simplesmente porque não viu prova ou porque há dúvida — ele supõe verdadeira a alegação inicial se for minimamente plausível. Já na teoria eclética, se já houver indícios claros de ausência de legitimidade ou de interesse, o juiz pode (e deve) extinguir.


5. Teoria da asserção e carência de ação: efeitos práticos

A carência de ação (ou extinção por falta de condições da ação) é a figura processual que corresponde à ausência dos requisitos de admissibilidade (legitimidade, interesse, possivelmente possibilidade jurídica). A teoria da asserção molda como essa carência será apreciada:

  • Se, na petição inicial, as alegações do autor não demonstram minimamente que existe legitimidade ou interesse, o juiz pode extinguir o processo por carência, sem resolução de mérito — com base na teoria da asserção.

  • Se as alegações são suficientes para supor que a condição exista (in statu assertionis), o processo segue até o mérito.

  • Se, na fase de instrução ou no mérito, se verifica que, de fato, a condição não existia (ex: o autor não era legítimo, ou não havia utilidade na tutela), então o juiz rejeita o pedido, com julgamento de mérito — e aí se forma coisa julgada material sobre essa questão (i.e. não cabe nova ação com mesma pretensão alegando falta de condição).

  • Por isso, com a teoria da asserção, há uma distinção entre extinção por carência (quando na exordial já se nota a falha) e rejeição liminar no mérito (quando se descobre no curso do processo).

Esse modelo dá mais chance ao autor de “seguir adiante” e fazer sua prova, reduzindo decisões extintivas prematuras que poderiam impedir a análise do mérito.

Por outro lado, também demanda cautela — porque, se aceita demasiadamente demandas frágeis apenas com base em alegações, pode gerar uso abusivo do processo.

Vale destacar que, no entendimento do STJ, as condições da ação devem ser averiguadas segundo a teoria da asserção: o tribunal exige que a análise de legitimidade ou interesse se baseie nas alegações iniciais, sob pena de indevida extinção antecipada. (Superior Tribunal de Justiça)
Por exemplo:

“As condições da ação são apuradas de acordo com a teoria da asserção. Assim, o reconhecimento da legitimidade das partes se dá com base nos argumentos formulados na petição inicial.” (Superior Tribunal de Justiça)

Outro caso prático recente: no Boletim Informativo do TRF1 (2025), há referência à teoria da asserção e ao dever de observância do contraditório: antes de extinguir por carência, deve-se garantir possibilidade de manifestação das partes. (Tribunal Regional Federal da 1ª Região)

E em artigo recente (2025) discute-se a aplicação da teoria da asserção na legitimidade ativa de beneficiários terceiros de contratos de honorários advocatícios — mostrando que decisões judiciais indevidas vêm sendo criticadas quando afastam ação sem analisar mérito, com base em ilegitimidade suposta. (Migalhas)


6. Críticas contemporâneas à teoria da asserção da ação

Além das críticas já apontadas, aqui vão algumas observações pontuais contemporâneas:

  1. Fragilidade no controle de admissibilidade
    Ao admitir qualquer pretensão que pareça minimamente legítima, pode-se admitir demandas claramente infundadas, onerando o Judiciário.

  2. Risco de decisões precipitadas
    Em casos em que a ausência de condição é evidente (por exemplo, parte manifestamente ilegítima), a teoria da asserção pode impedir extinção imediata e forçar tramitação até o mérito, com desperdício de recursos.

  3. Coisa julgada em questões de condição
    Ao rejeitar no mérito uma condição que, se considerada inadmissível, poderia ter dado extinção por carência, forma-se coisa julgada material — o que impede reabertura por ausência de condição no futuro, mesmo que se demonstre que a condição realmente não existia. Isso pode gerar efeitos injustos se o controle inicial foi superficial.

  4. Tensão com o contraditório e a ampla defesa
    Quando o juiz extingue de ofício com base em teoria da asserção, sem oportunidade de contraditório aprofundado, pode-se violar o princípio da ampla defesa. Por isso, é necessário garantir oportunidade mínima às partes.
    Um acórdão recente do TRF1 enfatiza que, antes de extinção por carência, deve haver observância do contraditório. (Tribunal Regional Federal da 1ª Região)

  5. Descompasso entre doutrina e prática
    A doutrina muitas vezes pauta-se pela teoria eclética, enquanto a prática jurisprudencial, especialmente do STJ, favorece a teoria da asserção, gerando insegurança sobre qual critério aplicar em casos concretos.

  6. Questão da compatibilidade com o CPC/2015
    Alguns doutrinadores afirmam que o CPC/2015 “desfigurou” ou “aboliu” a noção clássica de condições da ação, migrando para o regime de pressupostos processuais gerais ou integrando parte dessas matérias ao mérito. Isso pode criar incompatibilidade com a teoria da asserção em sua versão mais pura. (Tede PUCSP)

  7. Possível aumento da litigiosidade irresponsável
    Se autores perceberem que basta alegar minimamente para seguir em frente, pode haver estímulo a demandas especulativas ou “aventurosas”.

Por essas razões, muitos doutrinadores defendem uma “teoria da asserção moderada” ou temperada, que admita exame superficial, mas com salvaguardas e limites — por exemplo, exigir plausibilidade mínima, permitir impugnação pelo réu, permitir extinção logo que surjam provas fortes de ausência de condição, etc.


7. Decisões recentes do STF / STJ sobre teoria da asserção ou condições da ação

Embora o tema “teoria da ação” não seja frequentemente objeto de julgamento exclusivo no STF (mais comum no STJ e tribunais regionais), há decisões e entendimentos relevantes que refletem essa tensão. Aqui alguns exemplos:

  • STJ (Revisão / Súmulas / Jurisprudência pacífica)
    O STJ tem consistente jurisprudência no sentido de que as condições da ação devem ser analisadas de acordo com a teoria da asserção: o tribunal entende que o juiz deve valorar as alegações iniciais para decidir extinção por carência ou prosseguimento. (Superior Tribunal de Justiça)
    Por exemplo, já se decidiu que:

    “A análise das condições da ação, tal como a legitimidade ativa ad causam, que porventura acarretarem a extinção do processo sem resolução de mérito, são aferidas à luz da teoria da asserção, de modo que, demandando tais questões exame mais aprofundado, esta medida implicará julgamento de mérito.” (cj.estrategia.com)

  • STF
    Não identifiquei decisões recentes do STF especificamente focadas na teoria da asserção da ação (ao menos não nos materiais pesquisados). Em geral, o STF trata mais de temas constitucionais de processo (duplo grau, devido processo, direito de petição etc.).

  • Tribunais regionais
    Como mencionado, o TRF1, em boletim informativo (2025), já publicou entendimento sobre teoria da asserção, reiterando que o contraditório deve ser observado antes de extinção por carência. (Tribunal Regional Federal da 1ª Região)
    Tribunais estaduais também têm aplicado a teoria da asserção em decisões de legitimidade ou interesse: por exemplo, TJDFT já reconheceu que legitimidade passiva e outras condições da ação devem ser aferidas com base nas alegações iniciais (“as questões relacionadas às condições da ação … são aferidas à luz do que o autor afirma na petição inicial”) (TJDFT)

Esses casos mostram que o sistema judiciário brasileiro já opera de fato — sobretudo no STJ — segundo a teoria da asserção para decidir extinções ou admissibilidade.


8. Síntese e reflexões finais

  • As teorias da ação (imanentista, concreta, abstrata, eclética, asserção) refletem diferentes visões sobre a relação entre direito material, direito processual, e o papel do Judiciário.

  • O modelo mais equilibrado e historicamente influente no Brasil é a teoria eclética, que sustenta que a ação é um direito autônomo, mas condicionado ao cumprimento de requisitos (condições) que devem ser verificados como admissibilidade.

  • A teoria da asserção tem ampla adesão jurisprudencial (notadamente no STJ) para fins de verificação das condições da ação, porque valoriza a narrativa inicial do autor e busca evitar decisões extintivas precipitadas.

  • No entanto, essa teoria não está isenta de críticas: risco de demandas especulativas, insegurança jurídica, fragilidade no controle de admissibilidade, e tensão com o contraditório e ampla defesa.

  • Em prática, o direito processual brasileiro opera em um modelo híbrido: teoricamente eclético, mas com forte influência assertiva no exame das condições da ação.

terça-feira, 3 de julho de 2001

Processo Civil - Recursos - Execução - Jurisprudência 2025

Processo Civil - Recursos - Execução - Jurisprudência 2025

Qual é a diferença entre recurso conhecido e não conhecido e recurso não recebido e recebido no processo civil?

Essas expressões aparecem com frequência nas decisões judiciais no processo civil brasileiro, e embora pareçam semelhantes, não significam exatamente a mesma coisa.

📌 1. Recurso conhecido e não conhecido

🔹 Diz respeito à admissibilidade do recurso — ou seja, se o tribunal pode ou não analisar o mérito dele.

Recurso conhecido → o tribunal entende que o recurso preenche os requisitos de admissibilidade (tempestividade, preparo, cabimento, interesse recursal, legitimidade, regularidade formal etc.).
👉 Nesse caso, o tribunal passa a analisar o mérito do recurso, podendo dar ou negar provimento.

Recurso não conhecido → o tribunal entende que o recurso não pode ser apreciado, porque faltou algum requisito de admissibilidade.

👉 Ex.: recurso intempestivo, ausência de preparo, erro grosseiro no tipo de recurso, ausência de interesse recursal etc.
⚖️ Aqui, o tribunal não entra no mérito.

📌 2. Recurso recebido e não recebido

🔹 Refere-se à decisão do juiz a quo (o juiz da causa de onde partiu o recurso), no momento de admitir ou não o recurso para envio ao tribunal.

Recurso recebido → o juiz de 1ª instância (ou relator, no caso de alguns recursos) admite o recurso e o encaminha ao tribunal para julgamento.

Recurso não recebido → o juiz entende que o recurso não deve nem sequer subir (não tem cabimento, foi interposto fora do prazo, não houve preparo, etc.).

👉 Nesse caso, a parte pode impugnar a decisão de não recebimento por meio de um agravo de instrumento (art. 1.015 do CPC) ou agravo interno, dependendo do recurso.

🔑 Diferença central:

Recebido/não recebido → fase inicial (juiz de admissibilidade).

Conhecido/não conhecido → decisão do tribunal (juiz ou órgão colegiado decide se analisa o mérito do recurso ou não).

📖 Exemplo prático:

A parte interpõe uma apelação.

O juiz de 1º grau pode receber ou não receber essa apelação.

Se for recebida, vai ao tribunal.

Lá, os desembargadores podem não conhecer (se faltar algum requisito) ou conhecer e analisar o mérito.

-----------------------------------

Processo Civil - Execução
Aqui vão alguns destaques recentes de decisões do STF e do STJ sobre o cabimento de recursos no processo civil, e os entendimentos que vêm sendo firmados. 

Principais entendimentos recentes

Tema 1.155 / STF — Repercussão Geral

O Tema 1.155 vem sendo debatido no STF e trata de filtros ao cabimento do recurso extraordinário. 
Tribunal de Justiça de São Paulo

A ideia é reforçar que nem toda alegação de violação de norma constitucional autoriza o recurso extraordinário; é necessário que haja repercussão geral. 
Tribunal de Justiça de São Paulo

Também está em discussão o que conta como ofensa constitucional “direta”, versus ofensa reflexa ou dependente de normas infraconstitucionais — essas últimas tendem a ser consideradas como não tendo repercussão geral. 
Tribunal de Justiça de São Paulo

Agravo Interno vs. Decisões que negam seguimento a Recursos Especial ou Extraordinário

O STF reforçou que, em certas hipóteses, o agravo interno é o único meio cabível contra decisão que nega seguimento ao recurso extraordinário ou especial, principalmente nos casos em que foi reconhecida a ausência de requisitos de admissibilidade. 
TRT 5ª Região

Em resumo: se tribunal de instância inferior negar seguimento ao RE ou REsp por ausência de requisito (ex: repercussão geral, divergência, etc.), a parte pode interpor agravo interno para que o tribunal reexamine. 
TRT 5ª Região

Princípio da Fungibilidade de Recursos — STJ
No STJ, em casos recentes, a aplicação do princípio da fungibilidade (quando há dúvida objetiva sobre qual recurso seria o cabível) tem sido reexaminada com rigor: o tribunal tem afirmado que não cabe aplicar fungibilidade se estiver claro qual o recurso legalmente adequado. 
Superior Tribunal de Justiça

Exemplos: decisão que acolhe impugnação do cumprimento de sentença extintiva → apelação; decisão interlocutória parcial ou negativa de provimento de impugnação → agravo de instrumento. Se a parte usar apelação quando devia usar agravo de instrumento, em geral não será aceito recurso por fungibilidade, salvo dúvida objetiva. 
Superior Tribunal de Justiça

Retratação nos Tribunais de Origem em Recursos Repetitivos ou Repercussão Geral

O CPC prevê (art. 1.030, inc. V, alínea c) que, se o tribunal de origem tiver um precedente qualificado (repetitivo ou de repercussão geral) e divergir dele, o Presidente ou Vice-Presidente do tribunal de origem pode (ou deve?) oferecer a retratação antes de enviar o recurso ao tribunal superior. 
PGE MS

Isso significa que, se o acórdão recorrido divergir do entendimento consolidado (ex: STJ repetitivo, STF repercussão geral), há o dever do tribunal local de reconsiderar (retração) para seguir o precedente, evitando recurso desnecessário. 
PGE MS

Negativa de seguimento por base em precedentes dominantes ou súmulas

Se a decisão de instância inferior estiver em conformidade com precedente dominante (de STF ou STJ) ou súmula aplicável, o Tribunal pode negar seguimento ao recurso especial ou extraordinário. 
PGE MS

Em tais casos, a parte pode suscitar agravo interno ou, como último recurso, reclamação (CPC art. 988) para garantir aplicação correta do precedente. 
PGE MS

-----------------------------------

Quadro prático e as últimas decisões relevantes do STF/STJ sobre (1) responsabilidade do garantidor na execução civil/executiva e (2) responsabilidade do responsável tributário em execução fiscal, com indicações de como esses julgados costumam afetar a prática forense.

1) Regra geral — quem é o garantidor e até onde vai a responsabilidade

Em regra, o garantidor (fiador, interveniente/hipotecante, garantidor hipotecário etc.) responde nos limites da garantia contratada: quando a garantia é real (hipoteca, alienação fiduciária, bem dado em garantia) a responsabilidade costuma ficar vinculada ao bem garantido, salvo cláusula contratual que imponha responsabilidade pessoal ou solidariedade expressa.

O STJ tem decisões recentes confirmando que, se o garantidor deixou de ser proprietário do bem dado em garantia (por permuta, por exemplo) e as hipotecas foram baixadas, é possível afastar sua permanência no polo passivo da execução. 

2) Jurisprudência prática do STJ (pontos recentes e relevantes)

Garantidor hipotecário que permutou imóvel — 3ª Turma do STJ afastou a responsabilidade de garantidor hipotecário que permutou o imóvel dado em garantia e deixou de ser proprietário, quando a hipoteca incidente sobre as unidades recebidas foi baixada: isso demonstra tendência do STJ a não estender automaticamente responsabilidade pessoal além do bem garantido. 

Limitação à manutenção no polo passivo — decisões e análises apontam que, sem elemento que ligue a pessoa ao débito (cláusula, assunção de obrigação, confissão), a manutenção do garantidor na execução pode ser afastada. Há entendimentos que tratam o garantidor como legítimo para integrar a lide quando houver vínculo claro com o título executivo; caso contrário, pode-se requerer exclusão. 

Garantias alternativas (seguro-garantia, fiança) — o STJ já reconheceu que garantias como seguro-garantia e fiança bancária são aptas a suspender cobranças/executivos quando idôneas, o que impacta estratégias de defesa/garantias. 

3) Responsabilidade do responsável tributário (execução fiscal): panorama e decisões recentes

A execução fiscal parte da Certidão da Dívida Ativa (CDA), que goza de presunção de liquidez e certeza; o ônus de comprovar ausência de responsabilidade recai sobre quem figura como responsável. Contudo, o STJ e STF têm disciplinado e restringido hipóteses de responsabilização, exigindo prova objetiva de hipótese legal de responsabilidade (art. 128–135 do CTN). 

Sucessão e dissolução empresarial — o STJ publicou decisões sobre responsabilidade tributária em sucessão/dissolução, enfrentando quando e em que condições tributos podem ser cobrados de sucessores/gestores; decisões recentes (2024/2025) abordaram limites dessa responsabilização e critérios probatórios. 
Superior Tribunal de Justiça

Alçada e execução baseada em CDA única com débitos de exercícios diferentes — a página de repetitivos do STJ incluiu julgados sobre alçada em execuções fiscais baseadas em CDA com débitos de exercícios diferentes — isso pode afetar estratégias processuais (competência/valor) e questionamentos sobre validade/segmentação da cobrança. 
Superior Tribunal de Justiça

4) STF — pontos de atenção
O STF vem acompanhando temas tributários relevantes (temas de repercussão geral e de legitimidade ativa/passiva em execuções) e, em 2025, houve suspensão/adiamentos em julgamentos sensíveis (ex.: Tema 1153 sobre legitimidade do credor fiduciário em execuções), o que indica instabilidade jurisprudencial em pontos específicos. Atenção aos temas que o STF leva a repercussão geral. 
alsadv.com.br

5) Consequências práticas e orientações processuais
Para o credor/executante: documentar robustamente vínculo entre garantidor e obrigação (cláusulas de solidariedade/assunção, registros imobiliários, manutenção da garantia), acompanhar alienações do bem e atualização dos registros para preservar legitimidade passiva. Use seguro-garantia/fiança quando possível.

Para quem figura como garantidor / responsável tributário: atacar legitimidade ativa/passiva (ilegitimidade de parte), demonstrar ausência de vínculo com o débito, provar transferência do bem/baixa da garantia, e impugnar a CDA quando for o caso (ex.: falta de certeza/liquidez). Invocar recentes precedentes do STJ que limitam a responsabilização pessoal quando a garantia era estritamente real. 

6) Principais decisões para leitura (seleção rápida)
STJ — 3ª Turma: garantidor hipotecário que permutou imóvel e foi excluído do polo passivo (março/abril 2025 — notícias/jurisprudência sobre caso). 

STJ — página de repetitivos sobre alçada em execução fiscal baseada em CDA com débitos de exercícios diferentes (26 jun. 2025). 
Superior Tribunal de Justiça

STJ — entendimento sobre arrematante e dívida tributária anterior (30 out. 2024) — limitações à responsabilização automática do arrematante. 
Superior Tribunal de Justiça

STJ — decisões sobre responsabilidade tributária em dissolução/sucessão (fev. 2024). 
Superior Tribunal de Justiça

STJ — decisões recentes sobre seguro-garantia/fiança suspendendo cobranças (jun. 2025). 

Direito Processual Civil - Tomo V

Ação Rescisória
A ação rescisória é uma ação especial que visa desconstituir a coisa julgada. Ora, uma sentença que transita em julgado, na qual não cabem mais recursos, não poderia mais ser modificada como via de regra. Porém até dois anos após isso acontecer ainda cabe uma última saída para quem deseja modificar a decisão. É justamente essa a função da Ação Rescisória.

A ação rescisória se encontra disciplinada no novo código de processo civil a partir do artigo 966. Nesse artigo temos as hipóteses em que a ação rescisória seria cabível. Vamos ver as situações em que ela pode ser manejada em juízo.

Ação Rescisória seria cabível, a saber:

I - se verificar que foi proferida por força de prevaricação, concussão ou corrupção do juiz;

Nesse primeiro caso temos o uso da ação rescisória em razão da não imparcialidade do juiz. Mais do que isso, a ação rescisória seria cabível quando o juiz agir de forma tipificada, criminosa. Ora, um dos pilares da sentença é ela ser proferida a partir de uma decisão do juiz agindo de forma imparcial, honesta e ética. Quando isso não ocorre teremos uma clara situação de injustiça. Sentença injusta não pode prevalecer, tem que ser rescindida.

II - for proferida por juiz impedido ou por juízo absolutamente incompetente;

Mais um inciso que se refere a casos em que o juiz não fez seu juízo de valor seguindo os preceitos de lei, não decidiu de forma isenta e legal. Aqui temos casos em que o juiz objetivamente preferiu ajudar uma das partes, pelos motivos já demonstradas pelo próprio CPC quando se refere aos casos de impedimento dos juízes. O juiz é impedido quando, entre outras situações, não tem isenção e imparcialidade para julgar determinado caso concreto. Um exemplo bem claro acontece quando um juiz julga uma ação envolvendo parentes próximos ou seu cônjuge. Seria absurdo esperar que uma parte não fosse prejudicada quando a outra parte conta com laços familiares com aquele que vai decidir, no caso o próprio juiz.

Também seria absurdo esperar que um juízo (aqui entendido como órgão do poder judiciário) pudesse ir além de sua competência determinada por lei. Quer um exemplo? Seria cabível ação rescisória se uma vara do trabalho julgasse uma ação envolvendo um caso típico de direito de família. O juizo do trabalho faz parte de um ramo específico do poder judiciário federal. Decide questões envolvendo empregados e empregadores ou casos de conflitos trabalhistas latu senso. Já o juizo que julga direito de família é via de regra juízo estadual, com sua competência bem delimitada pela matéria cível envolvendo a ação.

No próximo texto escreverei mais sobre as demais hipóteses, sempre valorizando uma linguagem menos técnica, mais adequada ao leigo na ciência jurídica.

Ação Rescisória - Competência
A regra de ouro em relação à competência da ação rescisória é que ele jamais será julgada por um juiz de primeiro grau. Ação Rescisória é ação originária dos tribunais, nada mais, nada menos do que isso. Além disso a Ação Rescisória será, via de regra, julgada pelo próprio tribunal que julgou a ação original que está sendo objeto de pedido de rescisão na rescisória.

Vamos colocar isso em termos simples e práticos? Pois bem. Ação julgada, transitada em julgado no Superior Tribunal de Justiça, será alvo de uma ação rescisória. Pergunta-se, onde essa ação rescisória será interposta? Ora, no próprio STJ. O mesmo vale para todos os demais tribunais. Julgou a primeira ação que transitou em julgado, irá igualmente julgar sua ação rescisória. Regra de ouro, via de regra.

Agora imagine uma ação que se originou em um juízo de primeira instância. Qual será o tribunal competente? Aquele a que o juízo é relacionado na segunda instância. Exemplo: Ação federal original transitada em julgado na primeira instância. Tribunal competente? O Tribunal Regional Federal da região correspondente. Há exceções a essa regra em relação a algumas questões internacionais envolvendo outros países em que há um "pulo" direto do juízo de primeira instância para o Superior Tribunal de Justiça (STJ). Nesse caso e só nesse caso o tribunal competente será o STJ e não o TRF.

Outro aspecto interessante: um ação com três capítulos na sentença. Capítulos 1,2 e 3. Os dois primeiros capítulos transitam em julgado em primeira instância. Como se trata de um juiz estadual a competência da ação rescisória será do respectivo Tribunal de Justiça. Acontece porém que o capítulo 3 virá alvo de controvérsias, de recursos, que vão parar no STJ. Nesse caso teremos a competência do STJ em relação apenas ao capítulo 3 da sentença. Porém se houver um claro sistema de dependência entre os capítulos todos deverão ser julgados pelo tribunal mais superior, no caso o STJ.

Da Ação Rescisória - Legitimidade
1. Quem pode ser parte legítima para acionar uma ação rescisória?
As partes do processo original, seus sucessores, o Ministério Público e terceiros juridicamente interessados.

2. Em que hipóteses o Ministério Público será parte legítima na Ação Rescisória?
Quando tiver sido parte no processo originário, quando deveria ter sido chamado para o processo, como no caso de participação obrigatório como fiscal da lei, quando era necessária sua atuação e em casos expressamente previstos em lei.

3. Quando haverá legitimidade para terceiros em ação rescisória?
Quando houver um prejuízo real da sentença original. O terceiro aqui é aquele determinado como juridicamente interessado, que tem realmente um elo, uma parte dentro da relação jurídica e foi efetivamente prejudicada pela sentença na ação principal. 

Honorários de Sucumbência
Os chamados honorários sucumbencias são aqueles que a parte vencida em uma ação paga para o advogado da parte vencedora. Esses honorários serão fixados pelo juiz na sentença, levando-se em conta alguns critérios como o tempo que durou a causa, a complexidade da ação e o trabalho desenvolvido pelo nobre advogado.

Questão interessante ocorre quando os honorários sucumbenciais são enviados para a sociedade de advogados. Ora, essa verba é personalíssima, é devida ao advogado, mas a jurisprudência entende ser possível seu envio direto para a conta da sociedade de advogados, desde é claro, que conte com a manifestação de vontade do advogado nesse sentido.

E em relação aos juros, quando eles serão devidos? Pela jurisprudência eles serão devidos desde o trânsito em julgado da sentença. E caso a sentença seja omisso sobre eles? Nesse caso o advogado poderá pleitear em ação própria. Por falar em pedidos de honorários na fase executiva é importante frisar que os honorários poderão ser pedidos ou em ação autônoma, própria para isso, em petição própria ou então como parte do pedido executivo da própria ação.
 
Dr. Pablo Aluísio
Advogado e mestre em Direito e Processo do Trabalho

segunda-feira, 2 de julho de 2001

Direito Processual Civil - Tomo IV

Teoria Geral do Processo Civil:

Negócio Jurídico Processual - Limites - O chamado negócio jurídico processual é uma das grandes inovações do novo CPC. O artigo 190 e seu parágrafo único trazem o embasamento legal para sua existência: Art. 190.  Versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição, é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo. Parágrafo único.  De ofício ou a requerimento, o juiz controlará a validade das convenções previstas neste artigo, recusando-lhes aplicação somente nos casos de nulidade ou de inserção abusiva em contrato de adesão ou em que alguma parte se encontre em manifesta situação de vulnerabilidade.

A primeira questão é entender que esse negócio jurídico processual só será cabível quando se tratar de direitos em que são admitidos a autocomposição. Importante não confundir com direitos indisponíveis. São coisas distintas. Poderão celebrar esse tipo de negócio jurídico processual todas as pessoas capazes sob o ponto de vista processual. Admite-se que pessoas relativamente incapazes assistidas por seus assistentes possam também celebrar. Há um aspecto curioso envolvendo partes que se encontram em situação de vulnerabilidade. A doutrina costuma citar como exemplos os consumidores e os trabalhadores em lides trabalhistas. Nessas situações ambos estão em posição de vulnerabilidade perante os fornecedores, o produtor e os empregadores.

Os contratos de adesão também clamam por maior atenção. Muitas vezes esses contratos de adesão podem trazer cláusulas que prejudiquem as partes mais fracas, principalmente quando são escritas em letras miúdas, em linguagem excessivamente jurídica. Nesses casos e quando a outra parte que adere a esse tipo de contrato não tem assistência jurídica, os juízes geralmente tornam ineficazes esse tipo de negócio jurídico processual. A cautela é justificada. Nessas hipóteses o juiz poderá agir de ofício ou através de requerimento da parte.

Outro aspecto importante é o momento em que se poderá alegar a existência desse negócio jurídico processual. Como é normal a inclusão de cláusulas desse tipo de negócio antes do surgimento dos processos, costuma-se dizer que ele pode ser alegado no começo da ação. Também poderá ser contratado o negócio durante o transcorrer do processo, sendo que nesse caso o juiz poderá inclusive participar das tratativas, sempre procurando dosar as mudanças para não prejudicar a parte mais fraca no processo. Sempre respeitando os limites impostos pela lei, como por exemplo, negando a criação de um recurso próprio para essa determinada ação, impedindo que se mude regras de competência absoluta, inibindo o freio negocial em relação a uso de determinados recursos, etc. 

Dos Pressupostos Processuais - Da Legitimação Extraordinária
1. Qual e a base jurídica da legitimação extraordinária?
Na vigência do CPC de 1973 a base seria apenas legal. Atualmente em nosso novo Código de Processo Civil autores como Fredie Didier já defendem uma ampliação desse conceito, mudando-se o critério da lei pelo critério do ordenamento jurídico, bem mais amplo. Obviamente que a lei processual ainda mantém seu destaque, porém não seria equivocado invocar outras fontes normativas, desde que coerentes com o sistema processual, o ordenamento jurídico como um todo.

2. Seria possível uma legitimação extraordinária baseada em negócio jurídico processual?
Sim, de acordo com a mais moderna doutrina e tomando-se como base o nosso atual Código de Processo Civil, isso seria plenamente plausível.

3. A legitimação extraordinária negocial seria ampla?
Não tão ampla. De maneira em geral a doutrina é relativamente confortável com a legitimação extraordinária negocial no polo ativo. Porém no polo passivo há interesses mais complexos a serem levados em consideração. Para isso porém seria essencial uma comunicação ao autor da mudança de legitimação. E ele teria que concordar com a nova situação jurídica dentro do processo. Tampouco haverá mudança no direito material, mas apenas processual.

4. A legitimação extraordinária passiva negocial é possível?
Dentro da doutrina atual, não! Pois nesse caso teríamos grande possibilidade de ocorrer a chamada "fuga do processo" do réu, que transferiria sua legitimação para um terceiro, muitas vezes atuando apenas como um homem de palha, para fraudar e lesar o autor do processo. No máximo o réu poderia ampliar o pólo passivo, com concordância do autor, mas sem se excluir do processo.

5. É possível legitimação extraordinária negocial durante o processo, quanto ele já está em andamento?
Alguns autores admitem, porém com a concordância de todas as partes. O consentimento nos autos seria essencial e indispensável.

6. Qual é a diferença entre Substituição processual e representação processual?
Na representação processual o sujeito se encontra no processo em nome alheio, defendendo direito alheio, daquele que representa. Nesse caso o representante não é parte. Na substituição processual temos situação diferente. O sujeito se apresenta em nome próprio, defendendo direito alheio.

7. O que comporta o interesse de agir?
São bem amplas as explicações sobre o interesse de agir processual, mas dois elementos estão quase sempre presentes na doutrina: necessidade e utilidade em agir processualmente, invocando a jurisdição.

8. O que seria a utilidade sob ponto de vista processual?
Dentro do interesse de agir encontra-se a utilidade que a atividade jurisdicional vai proporcionar à parte. Haverá utilidade quando o juiz entender que o processo trará algum resultado útil ao jurisdicionado. Tem aptidão para melhorar sua situação jurídica processual e material de alguma forma.

9. O que seria a necessidade sob o ponto de vista processual?
É o outro ângulo do interesse de agir. A parte teria real necessidade de invocar o poder jurisdicional do poder judiciário. Nasce daí a expressão "necessidade da jurisdição"

Gratuidade da justiça
Um processo é caro. A parte precisa arcar com diversas custas processuais. Para não deixar os mais pobres sem acesso à justiça criou-se o instituto da gratuidade da justiça. Já vinha previsto de forma sucinta no código de processo civil de 1973 e agora ressurge de forma mais disciplinada no novo código de processo civl. A lei trata da questão no artigo 98 e 99 do CPC. Algumas peculiaridades são novas, outras são adaptações do passado e até aspectos da jurisprudência foram incorporados a esse artigo legal.

O artigo 98 traz um rol das despesas e custas pelas quais o beneficiário da justiça gratuita terá direito. Um aspecto curioso é que não haverá dispensa dos honorários de sucumbência. Caso o beneficiário não tenha como suprir ou pagar esses honorários a exigibilidade estará suspensa por até cinco anos. Se nesse período ele tiver mudanças em sua vida financeira e econômica, então terá que finalmente pagar os honorários sucumbenciais.

O beneficio da gratuidade também não engloba as multas que a parte venha a sofrer no processo. Essas terão que ser pagas. Uma inovação do novo CPC foi a decisão de incluir também as pessoas jurídicas como beneficiárias da justiça gratuita, algo que inexistia no código anterior. O pedido desse benefício deverá ser formulado pela parte em momento próprio, conforme disposto no caput do artigo 99 do CPC. Cada momento tem sua peça processual respectiva, por essa razão é bom ler a letra da lei.

Presume-se verdadeira a insuficiência de recursos quando pedido por pessoa natural e mesmo que essa esteja assistido por advogado particular não se poderá indeferir o pedido apenas por essa razão. Deve haver provas e elementos presentes no processo para que o juiz venha a indeferir o pedido de gratuidade da justiça. Em caso de recurso o pedido de gratuidade dispensa o preparo. Caso o julgador entenda que não é cabível essa gratuidade ele terá que dar prazo para que a parte providencie o pagamento do preparo. Não poderá rejeitar o recurso por falta de preparo sem dar esse prazo para a parte.

Caso o pedido seja revogado e descubra-se que houve má fé da parte essa terá que pagar o decúplo do valor a título de multa. Caso não pago o processo será extinto sem julgamento de mérito e enquanto esses valores não forem pagos não haverá como a parte entrar com nova ação.

Pablo Aluísio.

Direito Processual Civil - Tomo III

Da Prova no Processo Civil:

Prova Diabólica - Muito se fala na chamada prova diabólica. De forma equivocada se afirma que ela seria a prova a ser produzida negando fatos negativos, que não existiram. Não é bem assim. A prova diabólica é aquela que sua produção se mostra extremamente difícil ou praticamente impossível. Imagine a situação de alguém que precisa provar que não tem nenhum outro imóvel de sua propriedade, em nenhuma outra cidade do país. Para provar isso ele teria que juntar certidões negativas de cartórios em todo o Brasil. Complicado não é mesmo? Sim, é um caso clássico de prova diabólica.

Outra situação seria a produção de uma prova que se encontra em arquivos fechados, cujo acesso seria negado pela próprias leis. Como ter acesso a algo que se a própria lei nega sua produção? Em casos assim o juiz inicialmente deverá usar as regras de distribuição do ônus da prova para chegar a uma decisão no processo. Também quando a prova é duplamente diabólica - para ambas as partes - o juiz poderá usar a técnica de "risco de inesclarecibilidade". Ele colocará na balança o risco de não esclarecimento da questão pelas partes. Aquela que assumiu o maior risco no processo será a parte derrotada no mérito.

Não se deve confundir ainda a prova diabólica com a conhecida "inversão ope legis". Nesse caso a inversão do ônus da prova é resultado da própria lei que assim determina. Veja o caso do direito do consumidor. No caso da propaganda enganosa o ônus é invertido pela própria lei que determina que o ônus de provar que não houve a propaganda enganosa passa ao fornecedor do produto. Não é o autor que deverá provar a sua afirmação, os fatos constitutivos de seu direito, mas sim o réu (o fornecedor) que deverá provar que isso não corresponde à verdade dos fatos.

Da Prova - Do Princípio da Comunhão da prova

1. O que é o Princípio da comunhão da prova?
Também conhecido como Princípio da aquisição processual da prova ou homogeneidade da eficácia probatória. Esse princípio determina que não importa quem produziu a prova no processo, se autor ou réu, mas sim que a prova foi produzida e a partir desse momento passa a fazer parte do processo. Mesmo que venha a prejudicar quem a produziu, não poderá mais ser retirada da relação processual. A prova se torna pública.

2. De Acordo com esse princípio se torna irrelevante saber quem produziu a prova?
Sim, de maneira em geral esse é um dos efeitos mais conhecidos desse princípio processual.

3. O que são provas típicas e provas atípicas?
Provas típicas são aquelas expressamente inseridas dentro do CPC ou em leis esparsas de natureza processual. Provas atípicas são aquelas que não estão previstas, mas que são aceitas por estarem de acordo com os princípios gerais de direito processual. São admitidas, apesar da lacuna legislativa.

4. Cite alguns exemplos de provas atípicas.
Temos, por exemplo, a prova estatística (muito usada no direito americano), a prova por amostragem, a prova cibernética e em sede processual penal a reconstituição dos fatos. Nenhuma dessas provas inominadas estão previstas no Código de processo civil.

5. Há possibilidade de aceitar uma prova atípica por negócio jurídico processual?
Sim, autores como Freddie Didier não encontram problemas nesse tipo de solução jurídica. Um exemplo? As partes determinam que a prova estatística será inserida no processo após entrarem em acordo sobre a pessoa que irá realizar esse trabalho. Em caso de provas típicas poderíamos ter uma prova testemunhal colhida por escrito e não em audiência, desde que obviamente fruto de um negócio jurídico processual.

6. O que diz a CF sobre a Prova processual ilícita?
Como regra geral ela será inadmissível no processo. Essa regra porém não é mais absoluta, pois em sede de processo penal poderá ser levada em conta pelo juiz em proveito do réu.

7. Qual é a diferença entre Prova Ilícita e Prova Ilegítima?
A prova ilegítima contraria normas de natureza processual e a prova ilícita contraria normas de natureza material. Para autores como Didier essa diferenciação porém não tem maior importância porque ambas, como regra geral, não serão aceitas no processo.

8. O que é Prova Ilícita por derivação?
É a prova que foi licitamente colhida, mas que é fruto de um iter, um elo, que começou de forma ilícita. É a famosa teoria dos frutos da árvore envenenada (fruits of the poisonous tree). A prova em si é lícita, mas foi colhida seguindo uma outra prova, essa ilícita. O que a torna imprestável para o processo é justamente essa ligação, esse elo que liga as duas provas. O nexo de causalidade a torna ilícita por derivação.

9. Haveria possibilidade de termos uma Prova ilícita negocial?
Penso que essa hipótese não poderia ser possível. O máximo que poderíamos ter seria a negociação processual que seria realizado entre as partes excluindo um determinado tipo de prova a ser utilizado futuramente no processo. Mesmo assim é um assunto ainda não pacificado dentro da jurisprudência.

Pablo Aluísio.
Advogado e escritor de livros jurídicos.

domingo, 1 de julho de 2001

Direito Processual Civil - Tomo II

Processo Civil - Recursos:

Apelação - Teoria da Causa Madura
Imaginemos a seguinte situação. O juiz de primeiro grau profere sentença terminativa. A parte recorre com apelação. Caso o tribunal decida afastar as causas alegadas pelo juiz em primeiro grau, anulando a sua sentença, poderia o tribunal de segunda instância avançar na questão do mérito da ação? A resposta é afirmativa, porém sempre levando em conta que a ação deve estar "madura", ou seja, pronta, ideal para a decisão. Caso seja necessários outros procedimentos ela deverá retornar ao primeiro grau, caso contrário haverá ofensa ao princípio do devido processo legal, ampla defesa e duplo grau de jurisdição.

Porém uma vez estando a "causa madura" o tribunal pode seguir em frente, anulando a sentença terminativa de primeiro grau, julgando em segunda instância o mérito, pela primeira vez dentro do processo. Uma inovação que já vinha sendo aplicada no CPC de 1973, mas que agora faz parte expressa no CPC novo. Sempre lembrando que nesse caso a sentença terminativa será anulada e não reformulada. E o tribunal enfrentará finalmente o mérito da ação.

Será necessário pedido expresso do recorrente para ser aplicada a regra da causa madura em seu recurso? Parte da doutrina entende que sim, porém esse é uma questão de ordem pública e como tal deve ser aplicada mesmo sem pedido expresso do recorrente. O Superior Tribunal de Justiça defende e aplica a tese de que a teoria da causa madura é um reflexo do próprio efeito devolutivo do recurso, em sua profundidade. E o STJ vai além, afirmando que também poderá haver reformatio in pejus nesse caso. Sem dúvida uma aplicação da teoria madura que avança em seus objetivos.

Outra questão interessante a se tratar nesse tema. A teoria da causa madura se aplica apenas à apelação ou a todos os recursos do CPC. Parte da doutrina entende que seria aplicável a todos os tipos de recursos, inclusive extraordinários, mas o STJ colocou um freio nessa questão. Para esse tribunal superior a teoria da causa madura é algo próprio do recurso de apelação e apenas a esse, sem ampliações. Até porque está prevista no CPC justamente na parte que trata da apelação.

Outra inovação digna de nota, que não exista no CPC de 1973 é a previsão de aplicação da teoria da causa madura em relação a pedidos extra petita e citra petita. O tribunal, afastando a sentença de primeiro grau, ou melhor dizendo a anulando, pode seguir em frente, mesmo nesses casos. O mesmo se aplica para recursos que alegarem falta de fundamentação por parte do juiz de primeiro grau. Está permitida a aplicação de causa madura nessa hipótese, sem receios. 

O Recurso Agravo
Agravo é um gênero de recurso. Na realidade temos três espécies de agravo em nosso sistema processual civil. Em comum todos os tipos de agravo apresentam o mesmo prazo: 15 dias. Quais são então os três tipos de agravo determinados pela lei processual brasileira?

a) Agravo de Instrumento
Recurso cabível contra decisões interlocutórias em primeiro grau. As hipóteses são determinadas no CPC. E quando essas decisões interlocutórias não estiverem previstas? Nesse caso será cabível apelação, em parte preliminar. O mesmo vale para as contrarrazões desse mesmo tipo de recurso.

b) Agravo Interno
Cabível em segundo grau, em sede de tribunal. É cabível contra decisões monocráticas proferidas no tribunal de segundo grau.

c) Agravo em recurso especial e extraordinário
Cabível em sede desses dois tipos de recursos, o especial de competência do STJ e o extraordinário em sede de STF.

Obs: Existe ainda outro agravo, pouco citado, previsto na Lei 12.016/2009. Esse agravo específico é cabível contra decisão monocrática de relator contra decisão que viole grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas. Esse tipo de agravo é geralmente manejado por pessoa jurídica de direito público ou Ministério público. Usado principalmente contra liminares.

O Agravo retido não existe mais depois da promulgação do novo CPC. O antigo Agravo regimental também deixou de existir segundo alguns autores. Agora em seu lugar é usado o Agravo Interno. Caberá a cada tribunal adequar seu regimento interno nessa direção, afinal de contas as hipóteses que eram usadas para justificar o uso do antigo agravo regimental agora são as mesmas determinadas pelo CPC para o agravo interno.

Pablo Aluísio.

Direito Processual Civil - Tomo I

A Conexão no Processo Civil - Questões Pertinentes - A conexão é prevista no código de processo civil. Porém é pertinente perguntar se ela sempre será aplicada ou pelo contrário haverá casos em que o juiz, no caso concreto, optará por sua não utilização. Está com a razão a segunda hipótese. De fato nem sempre a conexão será aplicada, principalmente quando ela trazer tumulto aos processos envolvidos. Até porque nessa situação estaria perdida a própria razão de ser da conexão.

E caso não seja aplicada a conexão, haverá sempre nulidade? Certamente não! A nulidade só será aplicada quando uma das partes provarem que houve efeitvo prejuízo processual. Não será uma nulidade aplicada automaticamente, sem se levar em conta os aspectos peculiares de cada processo. O bom senso deverá prevalecer. A conexão não pode ser usada para os fins contrários que justificam sua aplicação.

A Cláusula de Eleição de Foro
Instituto muito recorrente é a cláusula de eleição do foro, quando as pares aceitam a determinação de um foro processual diferente do que é estabelecido, como regra geral, pela lei processual civil. Antes de qualquer coisa é importante citar que só haverá eleição de foro em relação à competência relativa. A competência absoluta não pode ser modificada por cláusula contratual.

A cláusula de eleição de foro e aplicada geralmente e está limitada às ações que digam respeito a direitos e obrigações. Ou seja seu espaço natural se encontra em contratos e disposições em favor de terceiros. Essa cláusula deverá ser necessariamente escrita, não podendo ser meramente verbal. Ela também deve ser clara e objetiva, indicando exatamente qual é o negócio jurídico em que deverá ser aplicada. Nada de previsões genéricas e sem foco. E na jurisprudência do STJ se enconra diretriz que afirma que essa cláusula não irá prevalecer quando o próprio contrato estiver sendo discutido, sobre sua validade. Algo óbvio até, pois o contrato (o negócio jurídico principal) determina a sorte da cláusula de eleição de foro (que é parte do contrato, tendo a mesma sorte do mesmo).

Processo Civil - Sentenças definitivas
Sentenças definitivas geram coisa julgada material. É o tipo de sentença que deve sempre ser buscada em uma ação. A verdadeira sentença definitiva é aquela determinada pelo inciso I do artigo 487 do CPC. É a sentença que venha a acolher ou rejeitar o pedido formulado na ação ou na reconvenção. Essa é considerada pelos doutrinadores como a sentença definitiva pura, stricto sensu. Todas as demais (quatro no total) são consideradas falsas sentenças definitivas, ou seja, sentenças definitivas impuras. Isso porque nelas não ocorre a decisão sobre o mérito, decidindo quem tem ou não razão em seu pedido.

Além dessa sentença definitiva de mérito, há ainda as sentenças homologatórias de mérito. Nelas o juiz não decide o mérito, não determina quais pedidos são ou não procedentes. Ele apenas se limita a homologar uma declaração das partes. São elas: Aquela que se limita ao reconhecimento da procedência do pedido formulado na ação ou na reconvenção. Aqui o réu se submete ao que é pedido pelo autor. Aquela em que ocorre transação, ou seja, as partes abrem mão de parte de suas pretensões em favor da outra, para que assim venha a surgir um acordo. A renúncia, que é aquela em que o autor abre mão de seu direito e finalmente a sentença que reconhece a existência de prescrição e decadência. Essa última não é, porém, sentença homologatória de mérito propriamente dita.

O novo CPC traz uma recomendação importante. O juiz sempre deve buscar a sentença definitiva de mérito, pois o processo como tal tem como destino final, em primeira instância, esse tipo de decisão. Todas as demais são buracos no meio do caminho (com as chamadas sentenças terminativas). O processo bem sucedido é aquele que chega ao final com o juiz determinando quem tem ou não razão.

Em relação à sentença definitiva de transação há elementos interessantes. Ela não se limita ao pedido da ação. Pode ir além. Também não se limite aos moldes subjetivos da ação original, procurando dar espaço para a inclusão de terceiros. Esse tipo de sentença também tem sido incentivada nos meios processuais, pois as próprias partes chegam a um acordo, a uma conciliação, limitando-se o juiz a homologar essa transação. É forma de resolver a lide de forma consensual, pelas próprias partes.

Direito Processual Civil - Sentença Extra Petita
Ao sentenciar o magistrado deve dar exatamente aquilo que está sendo discutido pelas partes. Nem mais, nem menos e nem algo que não foi pedido. A sentença Extra Petita é aquela em que o juiz erra e dá a uma das partes aquilo que ela não pediu. Pode ir além, pode condenar alguém que sequer fez parte do processo, incluindo alguém de fora, que está fora do processo, extra, fora, aquilo e aquele que não fez parte da lide levado ao poder judiciário.

A sentença Extra Petita é uma sentença nula porque ofende o principio da congruência que é justamente aquele que determina a exata correspondência entre o que foi pedido e o que deve ser deferido pelo magistrado. Se o autor pede A, o juiz deve analisar esse pedido de A e não de B ou de C. É uma questão bem lógica e fácil de compreender.

E o que deve fazer o autor quando surgir em seu processo uma sentença Extra Petita? Bom, o recurso cabível será a apelação. Não se deve usar antes os embargos de declaração caso eles não tenham efeitos infringentes. O certo mesmo será a apelação. E o tribunal deverá primeiro anular a sentença de primeiro grau, para depois entrar no mérito e decidir, dando resultado prático para a parte através da chamada teoria da causa madura. 

Sentença Ultra Petita
O que é uma sentença Ultra Petita? É aquela em que o juiz dá ao autor mais do que foi pedido. Vamos supor que o autor faça o pedido de 100 kgs de determinado produto. Se o juiz proferir sentença dando ao autor 200kg desse mesmo produto teremos então uma sentença ultra petita. É dado na sentença algo maior e em maior quantidade do que foi pedido pelo autor. É aquela sentença que extrapola o pedido do autor.

Também será uma sentença Ultra Petita aquela que defere pedido a uma parte que não fez o pedido deferido no processo. Imagine uma sentença em que A e B são autores e o juiz defere o pedido para A, B e C. Ora, C não fez pedido de determinado produto no processo e não pediu nada. Outro exemplo ocorre em sede de litisconsorcio. A, B e C são litisconsortes e fazem um pedido de 100kg de um produto. O juiz defere o pedido, mas apenas para A, dando a ele todos os 100kg. Estamos aqui na presença mais uma vez de uma sentença ultra petita.

O recurso cabível contra uma sentença ultra petita será a apelação. Nos casos específicos também caberá embargos de declaração, desde que haja efeitos infringentes. Essa apelação contra a sentença ultra petita não deve pedir a anulação de toda a sentença, mas apenas da parte que extrapolou o pedido. È uma apelação que irá atacar apenas o capítulo da sentença que esteja em desacordo com o pedido do autor. Como uma faca que corta apenas a parte excedente de uma maçã.

Sentença Citra Petita
Também conhecida como sentença infra petita. Do que se trata? Essa é aquela sentença que dá menos do que foi pedido pelo autor, que fica aquém do pedido. Também será uma sentença citra petita aquela que não satisfaz a todos os envolvidos no pedido da ação. A,B e C fazem um pedido e o juiz só defere o pedido de A, ignorando os demais pedidos da ação. Em relação à contestação seria citra petira a sentença que ignora a fundamentação da defesa, que não enfrenta as alegações do réu da ação.

Como a sentença citra petita é basicamente uma sentença que se omite, o recurso cabível tecnicamente seria os embargos de declaração, porém vários autores também citam a apelação como recurso adequado. No caso da apelação se pergunta: O tribunal deverá enviar de volta para a primeira instância o processo ou pelo contrário poderá enfrentar o pedido no tribunal diretamente? Penso que o certo é julgamento pelo tribunal, desde que existam as condições no processo conhecidos como "processo maduro", onde não sejam necessárias mais produções de provas, etc.

No caso da sentença citra petita alguns autores entendem também que toda a sentença será anulada para nova decisão. Não haverá como aproveitar as partes já decididas, como nos casos de sentenças ultra petita. Essa opinião é discutida e não há uma decisão definitiva sobre ela. Cabe ação rescisória ou uma nova ação no caso de pedido que nunca foi julgado nem pela primeira instância e nem pelo tribunal? O lógico seria a possibilidade de se entrar com uma nova ação, já que pedido que nunca foi julgado é dito como pedido que nunca existiu. Pelo menos seria essa a opinião de alguns doutrinadores. Para o STJ porém essa tese não prospera. No caso de ação em que ocorreu sentença citra petita o certo é o uso da ação rescisória após o trânsito em julgado e desde que não tenha ultrapassado o prazo de dois anos para seu manejo.

Pablo Aluísio.