terça-feira, 1 de fevereiro de 2005

Elvis Presley - O Primeiro Álbum

Hoje andei ouvindo novamente o primeiro álbum de Elvis Presley. Fazia tempo que tinha parado para ouvir com maior atenção. É curioso. Remoendo minhas velhas lembranças me recordo que comprei o segundo disco antes desse, o que me levou a ter uma impressão de que o primeiro álbum de Elvis era bem menos rico musicalmente do que o segundo. De certa maneira isso é uma verdade já que as sessões que deram origem a "Elvis" (1956) contaram com mais recursos, mais músicos, mais instrumentos, enfim, mais capricho. Além disso não podemos esquecer que o First Album contava com várias canções dos tempos da Sun Records e essa gravadora, como bem sabemos, era uma pequena empresa, quase fundo de quintal. Recursos tecnológicos e produção requintada realmente não eram bem com eles (pobre Sam Phillips!).

Pois bem. O disco abre com "Blue Suede Shoes" que é definitivamente um dos maiores clássicos da história do Rock mundial. É interessante que li muitas e muitas vezes certos jornalistas dizendo que Carl Perkins, autor da música, era o predestinado para seguir o sucesso de Elvis. Um acidente o tirou de cena e abriu caminho para que Elvis se tornasse quem foi! Será mesmo? Olhando para trás, hoje mais maduro, não posso deixar de pensar que esse pensamento é de uma bobagem sem tamanho. Quem em sã consciência realmente criou tamanha abobrinha que perdurou por anos e anos a fio em revistas e livros? Santa bobagem, Batman. Mas enfim.... são clichês do jornalismo. Confesso aqui publicamente que nunca gostei muito de "I'm Counting on You" do Don Robertson. Ele era genial em músicas românticas, mas aqui Elvis não chegou a uma gravação irrepreensível. Ficou algo pelo meio do caminho. Talvez sua simplicidade seja um pouco demais da conta.

"I Got A Woman" é aquela música profana que Ray Charles criou em cima de uma linha de melodia gospel. Ele sabia o que fazia. Bem no meio do sul racista e evangélico ele ousou criar algo tão fora dos padrões como essa música. Se já era herege no piano de Charles imaginem o choque que causou na voz de Elvis Presley com toda aquele gingado considerado indecente pelos puritanos. Era certamente uma coisa do capeta encarnado. Depois dela vem "One-Sided Love Affair" do Bill Campbell. Certamente é o primeiro belo arranjo do álbum, uma harmonia maravilhosa entre o vocal inconfundível de Elvis, piano, bateria e demais instrumentos. Estão numa sincronia ímpar. Provavelmente seja a melhor gravação em termos técnicos de todo o álbum, só perdendo talvez nesse quesito para "I'm Gonna Sit Right Down and Cry (Over You)", sim, aquela música que os Beatles tentaram copiar sem sucesso em seu programa de rádio na BBC. Se nem os Beatles conseguiram recriar essa sonoridade imaginem o nível que a música como um todo apresenta. Obra prima.

Já a dobradinha "I Love You Because" e "Just Because" nunca fez muito minha cabeça. A primeira é muito, digamos, melancólica (de um jeito ruim de ser). Falta também um melhor equilíbrio entre vocal e instrumentos de apoio. Elvis está muito à frente o que sempre me intrigou pois ele ao longo da carreira sempre fez questão que sua voz fosse encoberta pelo seu grupo musical (opinião aliás com a qual o Coronel Parker não concordava). A segunda é um skiffle. Até aí nada demais. O problema é que os ingleses acabaram com o tempo se tornando os mestres desse ritmo. Como Elvis não era inglês... Deixemos isso de lado. "Tutti Frutti" talvez seja uma das músicas de Elvis mais conhecidas no Brasil, mas nos Estados Unidos e no resto do mundo ela é mais associada a Little Richard que a compôs e a gravou originalmente. Certa vez Elvis se referiu ao rock como "chiclete". Provavelmente estava lembrando dessa gravação. Maledicências à parte, não há como negar, a gravação de Pelvis é um dos pontos altos do álbum. Só ele tinha essa capacidade de mastigar e engolir a letra de uma música como ouvimos aqui. A cultura adolescente surgiu assim, em gravações como essa, não se engane.

Por fim, não podemos deixar de mencionar a clássica "Blue Moon". Poucos sabem, mas esse take quase foi jogado na lata de lixo da Sun Records porque afinal de contas Elvis esqueceu a letra bem no meio da sessão. Sam Phillips porém viu mais a frente. Ele percebeu que havia uma grande linha melódica ali - e Steve Sholes, produtor de Elvis na RCA Victor também percebeu a mesma coisa. Resultado? Ela foi encaixada no disco. Tinha tudo para ser um take alternativo descartado, acabou virando um clássico absoluto! Nada mal. Então é isso. Nada como ouvir de novo um disco que mudou a história da música para sempre. Ainda acho que o álbum seja esquelético em suas propostas sonoras?! Tudo depende do ponto de vista usado, meu caro, realmente tudo depende...

Pablo Aluísio.

17 comentários:

  1. Elvis Presley (1956)
    Lado A
    1. "Blue Suede Shoes" (Carl Perkins) 1:58
    2. "I'm Counting on You" (Don Robertson) 2:24
    3. "I Got A Woman" (Ray Charles/Renald Richard) 2:23
    4. "One-Sided Love Affair" (Bill Campbell) 2:42
    5. "I Love You Because" (Leon Payne) 2:29
    6. "Just Because" (Sydney Robin/Bob Shelton/Joe Shelton) 2:32

    Lado B
    N.º Título Duração
    1. "Tutti Frutti" (Dorothy LaBostrie/Richard Penniman) 1:58
    2. "Trying to Get to You" (Rose Marie McCoy/Margie Singleton) 2:31
    3. "I'm Gonna Sit Right Down and Cry (Over You)" (Howard Biggs/Joe Thomas) 2:01
    4. "I'll Never Let You Go (Lil' Darlin')" (Jimmy Wakely) 2:24
    5. "Blue Moon" (Richard Rodgers/Lorenz Hart) 2:31
    6. "Money Honey" (Jesse Stone) 2:34

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  2. Off toppic: Pablo, achei um filme em que o título nacional é muito melhor que o original. Se trata de Sunset BLVD, que no Brasil se chama Crepúsculo do Deuses. É mole?
    Esta passando agora no Tele Cine Cult.

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  3. Esse é considerado um dos melhores filmes de todos os tempos. Clássico absoluto da era de ouro de Hollywood. Não vá perder...

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  4. Eu sei, já assisti três vezes e estou vendo de novo. É legal ver que o tal crepúsculo se refere e personagem da Gloria Swanson, mas também e ela própria cuja carreira estava e declínio até este filme e ao mordomo que era um diretor alemão tido como maldito e jé havia sido demitido pela própria Gloria por conta de um filme fracassado. Numa coincidência profética há uma cena em que ela pede para ao jovem William Holden ler um roteiro e manda o mordomo lhe trazer uma bebida no que ele pensa "hum, uma bebida...", ou seja justamente a bebida que seria responsável pelo crepúsculo de outro deus, o Willian Holden. Realmente um negocio genial.

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  5. Billy Wilder foi um dos maiores gênios da história do cinema. Esse filme é apenas uma amostra de sua genialidade. Não sei se você sabe, mas essa mansão onde a história se passa seria usada como locação de outro clássico alguns anos depois, nada mais, nada menos do que "Juventude Transviada" com James Dean. Essa velha mansão, dos tempos da antiga Hollywood, infelizmente foi demolida alguns anos atrás.

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  6. Da mansão eu não sabia, que coisa fora de série.

    Uma curiosidade: naquela época havia tabacaria nas... farmácias! e no filme vão comprar cigarro em uma e tem cachimbos, fumos, isqueiros, etc. Velhos tempos mesmo.

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  7. Pablo, duas coisinhas sobre o post do Elvis:

    1) Você diz "da Sun Records e essa gravadora, como bem sabemos, era uma pequena empresa, quase fundo de quintal. Recursos tecnológicos e produção requintada realmente não eram bem com eles (pobre Sam Phillips!)" o que e a mais pura verdade, mas convenhamos, que imã que essa gravadora tinha para atrair os maiores gênios do rock pra ela, não é?

    2) Esse mesmo post está assinado por você, mas enquanto eu lia não parecia seu estilo de escrever; foi você mesmo que o redigiu?

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  8. Realmente, uma farmácia que vendia ao mesmo tempo remédios e cigarros... Existe um filme com Rock Hudson chamado Sinfonia Prateada em que ele entra em um estabelecimento comercial que vendia sodas (refrigerantes), fumo e remédios, tudo em um mesmo lugar. Certamente eram lojas que primavam pela versatilidade... rsrsrsrs

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  9. Sim Serge, o texto é meu. Se assino obviamente fui eu que escrevi. Acho que você estranhou porque é um estilo mais solto e livre. Como por muitos anos escrevi análises de discos com as músicas separadas, com compositores, etc e seguindo uma fórmula, você estava mais acostumado com aquela forma. Aqui deixei a forma de lado para escrever conforme os pensamentos vinham à mente. Sobre a Sun: por ser pequenina e nada intimidante, ela acabou atraindo todos os tipos de aspirantes a artistas, até mesmo a um motorista de caminhão da companhia de eletricidade de Memphis. Coisas do destino.

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  10. Com o FHC fazendo campanha a favor da maconha e com a balela da maconha medicinal, talvez as farmácias voltem a vender fumo.

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  11. Sobre o seu texto, além do estilo, eu estranhei porque você escreveu "Quem em são consciência " e não "Quem em sã consciência" que seria o correto. Como você, ao contrario de mim, nunca erra, eu pensei ser um texto de algum convidado. Desculpe!

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  12. Nossa! Obrigado pela observação, nem tinha reparado. Foi o maldito corretor ortográfico do programa que de tempos em tempos me prega essas peças.

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  13. PS: Sempre que encontrar erros assim me avise. Eu sempre reviso os textos, mas nem sempre consigo localizar todos os erros.

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  14. Eu erro muito porque, apesar de ser datilografo formado e diplomado, sou péssimo digitador. Ai é esse coisa que você sempre vê. Apaga, corrige, apaga de novo. Não se pode ser bom em tudo.

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  15. O problema foi o corretor automático do celular. Você escreve "Sã" e ele geralmente troca por "São", "Cão" ou "Tão" - é um inferno! rsrsrsrs

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  16. Existe uma compilação gigante, de 24 CDs, chamada "The Complete Sun Singles". Baixei em 2009 e ainda a tenho guardada. Como amante da sonoridade cinquentista, muitas vezes ouço gravações contidas nesta compilação.
    Começa em 1952 e vai até 60 e cacetada. SE um dia tiverem oportunidade de conhecer, vale a pena. Pelo menos eu, gostei bastante do que vi alí.

    Abraços e fiquem com Deus.

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  17. Eu tenho essa coleção Roberto. É realmente um material muito importante do ponto de vista histórico pois dá uma visão ampla do que foi a Sun Records, fugindo um pouco de se limitar apenas às suas maiores estrelas como Elvis, Perkins, Cash e Lewis. Realmente é um item extremamente valioso para quem procura entender os rumos dessa pequena (mas vital) gravadora de Memphis.

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